Indícios de calmaria
" Não lute para que haja paz no mundo sem primeiro conquistar a sua paz interior! "
Beatrice
Sinto uma sensação gélida percorrer todo meu corpo, mais um indício que o Midwinter iria chegar.
O festival prometia deixar meus dias e de todos os aldeões um tanto alvoroçado. A celebração da chegada do inverno era marcada por uma festa bem animada, repleta de danças alegres que nos convidam a entrar no ritmo e ótimos pratos. Variavam de coelhos, aves, veados e javalis perfeitamente assados, a deliciosos pães, geleias e meu prato preferido. As suculentas tortas de frutas e acredito ter tirado a sorte grande já que minha mãe faz as mais perfeitas que tive a honra de provar.
Triste, é que a festa dure uma única noite e seja uma das poucas tradições de New Paradise. Era raro algum estranho vir para celebrar o Midwinter, em algumas vezes pessoas com um certo parentesco com algum aldeão, vinha festejar conosco. E é isso que eu mais gosto, a festa é nossa, feita por nós e para nós.
A alegria vai tomar todo o vilarejo como sempre faz, ora por brincadeiras, ora por desafios de arremesso de adagas, combates de espadas e competições de arco e flecha. Não há como negar, estou ansiosa e já posso sentir a felicidade me chamar para ser seu par. Posso ver o sorriso se formar em meus lábios só de imaginar.
Creio que esta festa vai me fazer bem, já que ando com meus devaneios acorrentados no que vivenciei na gruta. Antes até que pensei que poderia esquecer, apagar definitivamente a sensação macabra que me encobrira, mas me enganei.
É como se todas aquelas vozes estivessem em minha mente agora. Parece que minha cabeça vai explodir a qualquer momento, explodir e liberar todos esses murmúrios aprisionados em minha alma. Tenho vontade de gritar para que se calem, pois receio não aguentar viver com elas dentro de mim.
Mas não posso deixar isso tomar conta do meu ser. Não posso deixar ninguém saber... Não vou permitir que isso seja uma pertubação imaginária que criei mais uma vez... Não vou.
Me arrepiei mais uma vez e decidi não pensar sobre isto, enterrá-los para não voltarem a me persuadir é a melhor opção.
Escolho um vestido azul de mangas longas que se abriam nas mãos e que se assentavam perfeitamente em meu corpo. Faço uma trança um pouco frouxa em meus cabelos e coloco uma capa para me proteger do frio. O vento álgido me surpreendeu quando passei pela porta de minha casa, o que me fez estremecer completamente.
Avisto à beira da floresta meus irmãos, todos duelavam um contra o outro. O retinir das espadas ecoava em meus ouvidos intensamente. Golpes, estocadas e diferentes movimentos de defesa eram feitos rapidamente por eles.
Bianka usava uma saia vermelha e preta com uma blusa branca. Era inacreditável ver como executava os golpes mesmo com aquele trajes. Ao me ver estagnada olhando o combate, fez menção para que parassem.
- Está pronta? - Bianka se aproximou de mim. Sua respiração pesada, mostrava o cansaço que a luta causara. - Temos que ir na casa de Ray.
- Sim, já estou.
- Só espere um pouco, vou pegar um capa e já vamos. - Disse arfante antes de adentrar a casa.
Edward e Leonard se aproximaram de mim. Ambos trajavam camisas de mangas longas e por cima destas um colete. O frio fez com que colocassem uma capa por cima de seus ombros para barrar as rajadas de vento.
- Bom dia Trice. - Leonard me cumprimenta.
- Bom dia meus irmãos. - Digo abrindo um sorriso de lado.
- Vai a casa de Ray? - Edward pergunta com o cenho franzido - Preciso de sua ajuda na fabricação de algumas ferramentas, diga a ele para me procurar quando estiver aqui. - Pediu.
- Claro, direi sim. Irão fazer o que hoje? - Digo mudando de assunto.
- Bom... o festival será daqui a alguns dias - Leonard faz uma pausa para colocar sua espada de volta na bainha - Precisamos acompanhar alguns homens em uma caçada. - Conclui entusiasmado.
- Com esse frio, teremos sorte se encontrarmos um bando de veados ao norte. - Edward diz se afastando e indo em direção as outras casas.
- Afinal, sem nós não há festa. - Leo brinca seguindo Edward.
- Boa caça! - Gritei vendo-os partir.
- Vamos Trice! - A voz de Bianka me sobressaltou - Preciso passar! - E percebi que ainda estava a bloquear a porta.
- Me desculpe, não havia percebido - Digo retirando-me de seu caminho - Acho melhor irmos logo.
[...]
- Isso está delicioso! - Digo bebericando o chá que Ray nos serviu. - É feito com que erva?
- Na verdade, é feito com flores - Sorriu enquanto colocava uma bandeja com pãezinhos na mesa - São flores de Alfazema, tem um arbusto perto do riacho.
- O aroma é maravilhoso! - Bianka diz degustando o líquido.
Segurei a caneca de ferro com ambas as mãos e deixei que o efeito tranquilizante do chá se espalhasse pelo meu corpo. O líquido fervente ajudou a nos aquecer depois de entrarmos na floresta e percorremos o caminho gélido até a casa de Ray.
Contamos a ele sobre a gruta e confesso que sua reação não foi a que havia imaginado. Não houve surpresa em seu olhar, ele apenas perguntou como a encontramos. Não hesitamos em contar que foi seguindo um homem encapuzado na escuridão da floresta e que por curiosidade voltamos no dia seguinte. Preferi não dizer nada sobre o que me incomodava. Afinal, era melhor manter a minha lucidez.
- Humm... primeira vez que provo algo tão magnífico. - Bianka diz com um dos pãezinhos já pela metade.
Pego um e mordo. A explosão de sabores invadiu minha boca, era levemente adocicado, macio e recheado com uma geleia de framboesa extraordinária.
- Pelos Deuses! É uma delícia! - Digo, deixando evidente a sensação que me causara. - Você que faz?
- Sim. - Ele fez uma pausa para se sentar na mesa que ali jazia e suas feições demonstraram angústia rapidamente.
Respeitamos o silêncio que se estendeu logo depois. A mágoa é perceptível em seu rosto.
- Eu acabei por aprender a preparar... alguns pratos no passado... - Ray disse como se formulasse cada palavra antes de dizê-la, dando para ver como estava difícil para ele mesmo pronunciá-las - Este... - Pegou um dos pãezinhos e olhou-o como se fosse ainda mais impossível terminar a frase - Era o que eu preparava especialmente para Mollie... ela adorava... - Um sorriso se formou em seus lábios, como se sua filha estivesse parada diante de seus olhos.
A quietude tomou conta novamente e me trouxe uma sensação de desconforto com o que obriguei Ray a reviver. Deve ter sido horrível para ele suportar a perda da esposa e da filha.
- Bom, acho melhor voltarmos. - Pronunciei quebrando o silêncio.
- Sim, agradecemos o chá e os pãezinhos, estavam saborosos. - Bianka diz levantando-se da mesa e tirando Ray de seus pensamentos.
- Me perdoem meninas... eu...
- Tudo bem Ray, nos vemos no festival? - Bianka mudou repentinamente o rumo da conversa.
- Não tenho certeza se irei.
- Por favor, adoraríamos que fosse - Pedi delicadamente - Poderia até fazer esses pãezinhos maravilhosos para levar, tenho certeza de que todos gostarão... por favor? - Implorei na tentativa de convencê-lo.
- Ficar aqui não lhe ajudará em nada - Bianka conclui e ambas o encaramos a espera de sua resposta. Ele suspirou profundamente.
- Já que insistem tanto irei comparecer - Disse por fim, abrindo um sorriso - E já que tocamos neste assunto... - Ray abriu um pequeno armário de madeira, entalhado com desenhos de flores e retirou dois pacotes amarrados com um barbante. - Espero que gostem.
Ele entregou um para mim e outro a Bianka.
Puxei o laço com cuidado e encontrei um tecido quando o abri. Apoiei o embrulho no primeiro móvel que encontrei, retirei o conteúdo e paralisei arquejando ao roupa perfeita que Ray havia me presenteado.
Um vestido branco de veludo com mangas que chegavam até o cotovelo e abandonavam o tecido macio para terminarem em seda, com uma faixa de tecido prata separando-os. A parte de cima também possui a faixa prata e esta forma um decote quadrado. No meio, um cinto prata abaixo da cintura, que desce na parte da frente do vestido formando um V e deixando cair uma ponta até quase terminar a saia.
Era divino.
Bianka se encontrava com o mesmo fascínio nos olhos que estava. Segurava um vestido vermelho groselha de mangas longas. Também deslumbrante, todo de seda e com arabescos prateados em seu busto.
- Obrigada! Mas não podemos aceitar...
- Pare com isso e aceito logo meu presente! - Ray pronunciou. - E continuem olhando tem mais.
Voltei meus olhos ao embrulho, assim como percebi que minha irmã fizera e encarei a joia a minha frente. Um cordão fino de prata com uma pedra bruta vermelha como pingente. Era linda.
- Vocês gostaram? - Ray perguntou.
- Como poderíamos não gostar, são perfeitos! - Bianka diz maravilhada. - Obrigada.
Vi o sorriso em seu rosto ao perceber que realmente havíamos gostado.
Observei a pedra rubra novamente e senti algo dentro de mim se acalmar.
Como uma sensação de paz que perfurou o meu coração e resolveu torná-lo a sua morada.
Algo que ultimamente... Parecia faltar em mim.
❄️ ❄️ ❄️
Hallo Leute!!! Mais um capítulo fresquinho para vocês!!!
Aqui estão os trajes de Trice e Bianka:
Os vestidos dados por Ray serão postados somente no dia do Midwinter, como uma surpresinha.
Esperamos que estejem gostando e não se esqueçam de dar estrelinhas.
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