Vinte e sete: Flocos de neve
Maya saiu da casa de Bec cheia após toda a comida que dona Nancy havia a dado. Seu coração, no entanto, estava atribulado. Ela não queria voltar para casa e ter que continuar a conversa com os pais, não agora. Recusando a décima ligação de Samuel, ela resolveu ir a lugar que não ia a boas semanas. O único lugar que a acalmava.
— Então Maya, hoje você não pode entrar. — disse Samantha, olhando com pena para a garota.
— Como assim eu não posso entrar? A semanas vocês disseram que iam me ligar e nada. Eu estou com saudade das crianças!
— É porque a gente tem novos voluntários, foi criada uma nova escala e hoje é dia de um deles...
— Eu faço amizade rápido, posso ajudar a pessoa de hoje...
— Só pode ser um por quarto May, você sabe disso.
— Bom, o novo voluntário já chegou?
— Ainda não, mas...
— Então eu entro até ele ou ela chegar. — ela juntou as mãos e virou a cabeça, olhando para loira. — Por favor Samy, vai ser rapidinho, eu prometo que quando a pessoa chegar eu saio. Eu só preciso ver como as crianças estão.
Samantha respirou fundo. Porque ela nunca conseguia dizer não para esses jovens? Eu ainda vou ser demitida uma hora dessas.
— Cinco minutos. Quando o voluntário chegar, saia antes que algum enfermeiro te veja! — ela liberou a catraca, vendo Maya sorrir.
— Eu ainda te compro um presente!
— Espero que seja bem caro!
— Adivinhem quem está aqui? — Maya abriu a porta do quarto, tapando o rosto com as mãos. A voz das crianças mais lindas que ela já havia conhecido inundou se coração.
— Tia Maya! — eles gritaram em coro e correram para abraçá-la. Maya tirou as mãos do rosto e viu Theodora, Ellie, Naomi e Bryan com os corpinhos ainda mais magros e fracos. O coração dela se partiu.
— Eu estava com tanta saudade de vocês. — ela disse, tentando não chorar, e se virou para o Bryan. — Onde está o Benjamin?
— Ele teve uma apresentação da escola hoje tia, não pôde vim. — ele sorriu triste, e a abraçou de novo. — Mas to feliz que você ta aqui.
— Tia May, você não sabe o tanto de coisa que a gente aprendeu! — disse Theo, pegando com dificuldade um violão que estava no canto da parede. — Eu sei tocar!
— Vocês ganharam um violão! Quem deu e ensinou a vocês?
— O príncipe! — todos responderam juntos. Maya os olhou confusa.
— Quem é o prín...
— Diretamente do reino de Estrelária, o príncipe cheg.... — Nicholas disse alto, abrindo a porta e parando de falar ao ver Maya. Ele usava literalmente uma fantasia de armadura azul escura, e carregava uma boa réplica de coroa na cabeça, o que o fazia parecer um príncipe da pandemia devido à máscara descartável. Ela ficou boquiaberta.
— Nick?
— Ele é o príncipe, tia! — disse Naomi, apontando com o dedinho. Ela vestia uma fantasia de indiazinha, que combinava com os olhinhos puxados.
— Ah é, a tia Maya era a princesa do tio Nicholas vocês não lembram? — disse Ellie, olhando para os dois.
— É verdade! — bradou Bryan, levantando uma espada de mentira que segurava. — Podemos fazer hoje o casamento real!
— Não não, nada de casamento. — Maya riu, abaixando a espada do garotinho. Nicholas coçou a nuca.
— Então...
— Então você é o novo voluntário. — Maya cruzou os braços olhando para ele.
— Eu fiz meu cadastro, não era para você saber.
A porta do quarto se abriu, revelando a enfermeira Meredith. Ela arregalou os olhos para os dois, e ambos souberam, no mesmo instante, que estavam encrencados.
— Eu vou fingir que não estou vendo novamente os dois juntos aqui.
— Para de ser chata, tia Mer. — disse Bryan, puxando Maya pelo braço. O garotinho piscou para Theo, que pegou Nicholas e colocou à frente dela. Os dois se olharam desesperados. — Nós queremos o casamento!
— Eu posso ser o padre! — grita Ellie, ficando na frente dos dois e juntando as mãozinhas.
— Não Ellie, você é garota, eu sou o padre e você é freira! — diz Bryan.
— O que a freira faz? — a garotinha cruzou os braços chateada.
— Fica do meu lado. — ele entrelaçou os bracinhos aos dela.
— Eu sou a planta do altar então! — diz Theo, ficando parada sorrindo ao lado deles. Todos sorriram.
— Vocês precisam descansar! — diz Meredith preocupada. Naomi chega perto dela e retira o anel da mão dela.
— Com licença tia, deixa eu pegar emprestado. Eu sou a daminha!
— Mas o que...
— Tio Nick e tia Maya, vocês aceitam se casar? — diz Bryan, com um grande sorriso no rosto.
— Eu acho que não é assim que se pergunta. — diz Ellie ao lado dele baixinho.
— Aceito. — diz Nicholas, para a surpresa de Maya. Ele segura na mão dela, e Naomi ergue a aliança.
— Responde tia Maya! — Theo diz alto, pensando no mesmo momento que ela era uma péssima atriz, porque plantas não falavam.
— A-aceito. — ela disse por vencida, vendo o brilho nos olhos das crianças. Nicholas coloca o anel no dedo dela e a olha, sentindo o coração acelerado. Maya quase não respirava.
— Vamos dizer juntos Ellie... — diz Bryan baixinho para a garotinha. — Eu vos declaro marido e mulher! Pode beijar a noiva.
Assim, Nicholas se aproximou e deu um beijo na testa de Maya. As crianças ficaram tão felizes que gritaram. Toda a felicidade parou para eles, no entanto, quando Theo desmaiou.
Tudo, a partir daí, foi um completo alvoroço.
Meredith pegou a garotinha no colo desesperada e a levou para outro lugar, pedindo que Nick e Maya olhassem as outras crianças. Naomi começou a chorar.
— Não chora meu amor. — Maya abraçou a garotinha, sentindo seu coração se partir.
— Ela já desmaiou três vezes nessa semana, tia. — Naomi respondeu, com os olhinhos cobertos de lágrimas.
— Tio Nick, você pode orar com a gente de novo igual aquele dia? — diz Bryan, surpreendo Maya. Orar? Nicholas orava com eles?
— Claro, podemos sim. — ele segurou a mão do garotinho, percebendo que não havia mais como esconder de Maya. Todos se juntaram e deram as mãos, e assim Nicholas começou a orar.
— Deus, pedimos hoje que você proteja a Theo...
— Ela é a nossa amiga, e nós a amamos muito. — continuou Ellie, com os olhinhos apertados.
— Por favor papai do céu, cuida dela. — disse Naomi, apertando firme a mão de Maya.
— Por favor. — diz Bryan, sem conseguir falar mais. Maya segurou uma lágrima e terminou a oração.
— Amém.
Quando terminaram, as crianças sentaram, tristes, cada uma em sua cama. Nicholas e Maya se olharam, pensando no que poderiam fazer em um momento como aquele. Assim, olhando para o violão, ambos tiveram uma ideia. Eles cantaram juntos.
A música podia ser capaz de gerar vários sentimentos, e dentre eles, acalmar corações preocupados.
Enquanto Nicholas e Maya cantavam, os dois estavam tão angustiados quanto as crianças, mas não podiam deixar transparecer. Quando terminaram a quarta música, e Nick tocou a última cifra, Meredith entrou na sala no mesmo instante, com um semblante cansado.
— Theo está bem. — ela sorriu, vendo as crianças aliviadas. Todas em suas camas já haviam se rendido ao cansaço do dia, não conseguindo levantar. Maya se despediu de cada uma delas com Nicholas e saiu, junto com a enfermeira.
— Foi minha culpa? — Maya perguntou para Meredith do lado de fora, deixando as lágrimas que ela segurava caírem. — Eu quebrei a regra, não podem duas pessoas no quarto...
— Não minha querida, claro que não. — a senhora olhou com carinho para ela, segurando em sua mão. — Sabe a quanto tempo eu sou enfermeira pediátrica? Muito. Antigamente podiam entrar 5 voluntários nas alas desde que tivessem cuidado e não tinha problema. Essas novas regras do hospital são apenas burocráticas, não é culpa sua, Theo tem piorado a dias.
— Tem algo que eu possa fazer? Os pais dela estão conseguindo pagar o tratamento? Eu posso tentar...
— Ela já recebeu uma doação, seu amigo não te contou? — Meredith olhou para Nicholas, que mais uma vez respirou fundo. Ele não era realmente capaz de conseguir fazer nada em segredo? — Oh, também não era para contar. Deixe de bobagens, garoto. Você vendeu seu carro para ajudar no tratamento deles, deveria contar isso à sua namorada.
— Nós não somos namorados. — os dois responderam juntos, sentindo o embaraço da situação.
— Oh, me perdoem pelo erro então. De qualquer forma, o que vocês fazem pelas crianças quando os pais delas não podem estar aqui... é lindo de se ver. Deus abençoe vocês. O que podemos fazer agora por eles é orar.
— Obrigada por tudo, Meredith. — disse Nicholas, sorrindo fraco. Mal a enfermeira sabia que ao invés de ele ajudar as crianças, eram elas que o ajudavam.
— Obrigada. — Maya respondeu baixo, limpando o rosto e abraçando o próprio corpo.
— Vão com Deus, e ah! Parabéns pelo casamento. — Meredith sorriu e Maya correu de volta para devolver a aliança.
— Então, para onde você pretende ir agora? — perguntou Nicholas na entrada do hospital, depois de bons minutos em que os dois estavam sentados no banco pensando em Theo.
— Qualquer lugar menos para casa. — Maya sorriu fraco, vendo pequenos flocos de neve cair. Ela se agarrou ao casaco e chutou o chão, que começava a ficar branco.
— O que aconteceu?
— Em resumo? Minha mãe voltou e quer que eu vá morar com ela. Além de tudo, meu pai traiu ela no passado, então, foi por isso que ela foi embora.
— É um motivo plausível. — ele assentiu.
— É, não é? — ela sorriu fraco, olhando para ele. — E você, sem carro de novo?
— Eu não conseguiria levar ele de avião para Londres, então, no fim o dinheiro dele teve o melhor destino que eu consegui encontrar.
— Londres? — Maya o olhou confusa. — Você... vai embora?
— Vou. — ele disse, de cabeça baixa. — Em resumo, o divórcio saiu, minha mãe vai se mudar e eu vou com ela. Como bônus, passei para a universidade de lá.
— É um motivo plausível. Parabéns, eu... estou feliz por você. — ela disse sem conseguir sorrir. Seu coração, que já estava apertado, parecia querer a sufocar.
— Você também vai embora, não é? Fiquei sabendo de Harvard.
— Como você sabe?
— Seu pai postou orgulhoso. — Nicholas respondeu, sentindo o celular vibrar no bolso. Ele pegou e viu uma mensagem de Samuel, perguntando se ele sabia onde Maya estava.
— Desde quando você segue o meu pai? — ela o olhou curiosa. Nick travou.
— Foi... foi quando ele consertou o meu carro. Levei na oficina e ele me deu as redes sociais. É bom aprender sobre mecânica. — ele disse rápido, respondendo a Samuel que ela estava com ele.
Samuel, respirando aliviado em casa ao lado de Hattie, pensou em como, pela primeira vez, estava feliz por Maya estar segura com o garoto. Depois de tudo que havia acontecido, ela precisava mesmo de um tempo para pensar. Nicholas guardou o celular de volta no bolso depois de dizer a ele que a traria de volta cedo em casa.
— Ok. — Maya riu dessa vez, pensando que aquela era a pior desculpa que ela já havia escutado. — Então... você ora com as crianças.
— Rose, eu...
— Quando aconteceu? — Maya o interrompeu, sentindo a primeira dose de alegria do dia. Ela quis chorar. A voz dentro do seu coração quis gritar e dizer que não seria mais jugo desigual, mas isso seria se precipitar mais. Era recente, e agora... agora ela havia acabado de descobrir que ele iria embora.
— A algumas semanas. — Nick sorriu, olhando para baixo. — Eu fui ver o Dylan, e depois... eu não sei explicar. É como se...
— Como se Deus tivesse presente o tempo todo em cada parte da sua vida e você nunca tivesse percebido? — Maya completou, olhando nos olhos dele. Nick assente.
— Mais ou menos assim. — ele confessou, passando os dedos debaixo dos olhos dela e retirando uma lágrima que havia ficado parada ali. — Então... sua mãe?
— Você estava certo, perdoar não é tão fácil assim. Eu achei que eu tinha perdoado ela, mas...
— Ei! — Nick segurou a mão dela. Os dois estavam de luva, mas mesmo assim, sentiram o quando as mãos se tocaram. Maya o olhou. — Eu não estava nada certo. Você precisa dar um tempo... para si mesma e tudo ficará mais claro. Vamos, acho que a nevasca está aumentando, vou te levar a um lugar.
— E nós vamos de que? Andando? — Maya olhou para o ponto de ônibus vazio. O próximo que ela pretendia pegar só passaria daqui a uma hora.
— Como alguém me disse uma vez, eu gostaria de ir voando, mas não tenho asas, então...
— Muito engraçado, Campbell.
— Não foi você que me ensinou a grande prática de andar a pé? — ele sorriu e se levantou, não soltando a mão dela. — Vamos, Olsen, é só uma quadra daqui.
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