Vinte e seis: Atrito
Becca havia descoberto um dos grandes motivos da sua ansiedade durante a sua terapia: ela tinha medo da sua avó morrer.
Dona Nancy sempre dizia que carregava consigo uma saúde de ferro, mas Bec sempre encontrava exames e remédios escondidos que a faziam pensar que não era bem assim. Isso a deixava com medo. Medo de que, quando a avó se fosse, ela ficaria sozinha no mundo.
Era como se a ansiedade e o medo andassem juntos, criando vários "e se" na mente dela. O aperto no peito, a náusea e a tristeza pareciam, por muito tempo, ter se tornado seus mais fiéis companheiros, mas desde que ela procurou ajuda, ela descobriu que eles não a controlavam mais.
Ela estava cansada de ficar ansiosa com medo de se sentir ansiosa. Era uma frase ambígua, mas para ela, fazia todo sentido. O pastor John havia explicado a ela que não era da vontade de Deus que ela levasse a uma vida de constante preocupação, causando uma mente dividida.
Sentimento nenhum deveria ser responsável por controlar nossa vida e nossas atitudes.
Sendo assim, Bec se curou. Ela ainda tinha alguns momentos em que se sentia ansiosa por determinada situação, mas eles não regiam a vida dela mais.
A garota descobriu que, mesmo quando a avó morresse, ela não estaria sozinha. Nunca. Cristo estava com ela, e descobrir isso a alegrava todas as manhãs, seguindo o exemplo de sua avó.
Nancy sempre acordava com um grande sorriso a cada nascer do sol ligando o seu rádio de louvores, e repetia: alegre-se na soberania de Deus. Assim, a alegria e o descanso no criador se tornaram constantes na vida de Rebecca.
Nem se olhar no espelho e ver mais espinhas nascerem ou mesmo o vídeo dela nas redes sociais que Kevin havia postado havia a abalado, porque ela estava ocupada se lembrando de quem ela era.
— Querida, vem aqui! — dona Nancy a gritou, fazendo a garota sair do quarto com o celular na mão.
— Oi vó, o que foi? — ela perguntou distraída em um site de teste vocacional. Quando ela olhou para a senhora, a viu segurando uma roupa em frente à sua antiga máquina de costura.
— Tenho um presente para você, minha neta. — Nancy sorriu e levantou o vestido da mesa, segurando em frente à Rebecca, que quase deixou o próprio celular cair no chão.
— Vó! É... é lindo!
— Estava a meses costurando esse vestido de formatura para você. Eu sei que hoje em dia a moda mudou, então se você quiser que eu altere alguma coisa...
— Não vó. — Becca pegou o vestido, colocando em frente ao corpo e segurando em frente ao espelho. Ela tocou as pequenas pedrinhas em tom de prata cravadas em meio ao bordado do tecido rosa, e sentiu vontade de chorar. — Ele está perfeito. Perfeito.
— Que bom que gostou, agora me devolva antes que você suje o vestido. Vá tomar banho e volte mais tarde para experimentar, preciso fazer os últimos ajustes. O que você tanto faz nesse celular?
— Eu estava fazendo um teste vocacional. — ela devolve o vestido, vendo a avó abaixar os óculos.
— E o que raios é isso menina?
— É para eu saber se o curso que escolhi para a faculdade é o certo.
— Bobagem! — a senhora se levantou e pegou uma carta que estava na escrivaninha de madeira dela. — Um site dessas modernidades de internet não vai dizer o que é melhor para você. Pare de escutar o mundo e ore que Deus te dará a resposta.
— E Deus vai mandar a resposta como, vó? Por fax? — Bec sorriu pegando a carta.
— Quem sabe, não é?
— Ai meu Deus vó! — Bec arregala os olhos. — Eu recebi uma carta de Harvard! Eu mandei com Maya para o curso de Arquitetura e...
— O que foi? — Nancy olha preocupada ao ver a expressão triste da neta.
— Eu não passei.
— E você queria mesmo fazer arquitetura?
— O teste vocacional dizia que...
— Eu já disse que não entendo nada disso. — ela segurou nas mãos da neta e depois pousou uma mão em seu peito. — O que tem aqui, em seu coração?
Uma batida na porta interrompeu a conversa das duas. Quando Becca abriu e viu Maya com os olhos cheios de lágrima, ela abraçou a amiga e as duas foram para o quarto conversar. Dona Nancy foi preparar um café na cozinha com bolinhos.
— ... e foi isso Bec. Eles mentiram para mim todos esses anos. Como o meu pai pôde...
— Você descobriu que seu pai é humano,
amiga. — Bec suspirou, segurando na mão dela. — Ele não é perfeito, nem ele nem sua mãe.
— Eu sei, mas...
— Não, você não sabe. May, seu Samuel sempre foi o seu herói. Desde criança você sempre foi mais próximo dele do que da sua mãe, imagina como ela não deve ter se sentido quando descobriu a traição? Ela deve ter ficado perdida e desesperada sem saber o que fazer. Os dois erraram, mas eles tentaram fazer o que era melhor para você.
— E o que eu devo fazer? Voltar lá, abraçar os dois e dizer que eu os perdoo?
— Bom, sim! — Becca assentiu, fazendo Maya sorrir em meio ao choro. — Sentir raiva deles vai mudar alguma coisa? Não. Você pode voltar atrás no passado e mudar tudo o que aconteceu? Também não. E mesmo que você voltasse e tentasse mudar alguma coisa, não dá para saber o que aconteceria. Eu queria ter uma mãe e um pai, mas não tenho, então... não desperdiça isso.
As palavras de Rebecca tocaram Maya. Sem saber como responder, a garota apenas assentiu e olhou para baixo, vendo um envelope de Harvard na cama da amiga que ela não havia reparado antes.
— Bec, você passou? — May sorriu, pegando o envelope esperançosa. Pelo menos isso seria uma notícia boa no dia dela. As duas realizariam o plano de morar juntas no campus da mesma universidade! O que também significava — ela pensou, em seu lado magoado — que ela não precisaria ir morar com a mãe e a nova família.
— Então... — Bec tocou na mão dela e soltou uma respiração profunda, a impedindo de abrir. — Não.
— O que? Não pode ser! Isso... não é possível.
— Está tudo bem, amiga. — Bec sorriu triste. — Talvez não era pra ser.
— Mas Becca, suas notas são ótimas e você queria fazer arquitetura... tem outras faculdades...
— Eu só mandei uma carta para Harvard, May, não tentei outras universidades. — ela deu de ombros. — Minha avó conversou comigo e eu acho que ela tem razão. Talvez Deus tenha outros planos para mim, e eu nem tinha certeza mesmo sobre arquitetura. O fato de eu gostar de desenhar não significa que talvez eu goste de desenhar prédios chatos. — ela sorriu.
— Eu não posso ficar sem você. — Maya sentiu outra lágrima descer. — Como eu vou para outro estado sozinha?
— Você não vai sozinha. — Bec piscou. — Tem a sua mãe.
— Eu ainda não sei sobre isso. — Maya engoliu uma saliva. — E o que você vai fazer?
— Bom, eu acabei de receber a carta também
então, ainda não pensei nisso. — Becca sorriu e amarrou o cabelo curto com uma xuxa. — Acho que esse ano vai ser bom para eu decidir qual curso eu quero realmente fazer. Posso aceitar aquele emprego na sorveteria e juntar um dinheiro para a faculdade também. O dinheiro da aposentadoria que vovó Nancy juntou é bom guardar caso ela precise para remédios, ou para pagar alguém para vim cuidar dela de vez em quando.
— Eu vou sentir tanto a sua falta. — Maya abraçou a amiga, e Nancy entrou no quarto com o café e os bolinhos, fazendo as garotas rirem.
— Parem de conversar e venham comer, vocês estão muito magrinhas!
Nicholas, por sua vez, estava em uma encruzilhada. Scoot havia mandado mensagem marcando um jogo de videogame na casa do Jim, e desde de que ambos haviam chegado, o clima estava estranho. Completamente estranho.
— Aí os cara, que bosta é essa que vocês dois estão fazendo? — Jim apontou para a televisão, com o rosto indignado. — Porque você está perseguindo o Nick, Scoot? É para ir atrás do monstro!
— Foi mal cara, me confundi. — Scoot respondeu como desculpa, atordoado com as palavras de Bright no dia do ensaio do baile.
— Acontece. — Nicholas assentiu nervoso, imaginando que o amigo loiro já devia estar sabendo sobre os seus sentimentos por Maya. O que ele iria fazer?
— Oi gente, o que vocês estão jogando? — Amber aparece na sala, sentando no sofá no meio dos meninos.
— Quem te chamou? — Jim a olhou com rivalidade.
— Ninguém precisou, a casa também é minha.
— Sai daqui Amber, vá procurar o que fazer caramba! Quando suas amigas aparecem eu não fico enchendo o saco...
E os dois começaram a brigar. Scoot olhou para Nicholas e o chamou para andar até a porta, deixando os dois irmãos ruivos se xingarem. Nick o seguiu, decidindo ser honesto com o amigo. Os dois precisavam mesmo conversar.
— A Bright estava certa, não estava?
— Bright? O que ela te falou...
— Eu não acredito que você fez uma coisa dessa comigo, cara.
— Me deixa explicar, tudo...
— Você é um otário, sabia? Eu devia arrebentar a sua cara! — Scoot o empurrou, sentindo o peso da traição.
— Não é culpa minha eu ter me apaixonado pela Maya! — Nick disse alto, atraindo o olhar assustado de Amber e Jim, que finalmente haviam parado de brigar.
— É o que? — Jim disse chocado.
— Esse filho de uma... — ele respirou fundo, apertando as mãos em punho. — esse duas caras que diz ser nosso amigo Jim ficou com a Maya pelas minhas costas!
— É o que? — quem disse agora foi Nicholas, incrédulo. — Do que você está falando? Eu não fiquei com a Maya!
— Ficou sim, a Bright...
— A Bright mentiu. — disse Amber, com as mãos enfiadas no bolso da calça. — Desculpa entrar no meio da conversa, mas antes de vocês se socarem e sujarem a minha casa de sangue...
— A nossa casa! — Jim interrompeu, de forma necessária. Todos reviraram os olhos.
— A nossa casa! — ela continuou. — Bright me disse que ia falar isso para você Scoot, mas não teria como ela saber se algo assim rolou mesmo ou não. Ela ainda gosta de você Nick, e eu sei que ela parece uma pessoa horrível, mas ela só... se sente sozinha. — ela olhou para Nicholas, que respirou fundo. — Você foi o único namorado que, em algum momento, realmente se importou com ela, então... ainda está sendo difícil para ela te esquecer.
— Ah, fala sério. — Jim disse, soltando os ombros.
— Então você não ficou com ela? — Scoot soltou as mãos, se virando para Nicholas.
— Não. Eu não faria isso com você. Nós somos irmãos. — Nick respondeu, olhando triste para o amigo.
— Se gostava dela esse tempo todo porque me falou para sair com ela, em primeiro lugar?
— Aconteceu depois, cara... não vamos falar sobre isso. O que importa é, não vai acontecer. Eu vou embora para a Inglaterra no fim do mês, e a Maya gosta mesmo é de você.
— Como é? Inglaterra? — Jim anda até os dois, indignado. — Como é que eu perco isso tudo? Alguém pode me atualizar sobre a vida de vocês? Porque aparentemente eu estou sendo colocado de fora!
— Eu e minha mãe vamos nos mudar para lá, também consegui passar em uma universidade de música.
— Eu irei para Massachussetts. — Scoot aproveitou para contar também. — Consegui passar em Harvard.
— Mais um motivo que liga você e Maya. Ela com certeza também deve ter passado. — Nicholas disse, sentindo um aperto no peito.
— Bom, eu não passei em lugar nenhum. — Jim respondeu, abrindo os braços. — Mas ninguém se importa, não é mesmo? A briga de vocês já acabou? Porque eu quero mesmo voltar ao nosso jogo.
— Está tudo bem. — Scoot sorriu, fazendo o toque de mãos que ele e Nick faziam desde criança. — Mas quanto ao jogo, está na minha hora Jim.
— Eu também preciso ir a um lugar. — disse Nicholas, olhando o horário no celular. — Fica para outro dia.
— Valeu cara, até mais. — Scoot abraçou o ruivo, e se virou saindo. Amber ficou triste ao vê-lo passar pela porta, e gritou:
— Tchau, Scoot. — ela acenou com vergonha, pensando no porque havia feito aquilo.
— Tchau. — ele acenou de volta, indo embora.
Depois disso e de empurrar Jim, Amber correu para o quarto pensando se havia feito o certo em ter entregado a amiga. Ela estava cansada de tanta mentira e manipulação. James, por outro lado, se sentou no sofá, pegando o celular e abrindo no Instagram.
A primeira foto postada era a de Rebecca, sorrindo com um chapéu na cabeça em uma praça ensolarada. Ele curtiu e passou os próximos minutos ali, sem perceber que ele estava a cada dia mais apaixonado pela chokito. Se Scoot e Nicholas tivessem mais tempo para repararem no amigo, teriam percebido que ele também precisava conversar.
Ela não havia aceitado o seu convite para o baile. Todas as mensagens que ele havia mandado haviam sido ignoradas, e nada o deixava mais indignado do que pensar que ela preferia ir com o Norman do que com ele. Revoltado, ele jogou o celular para o lado, e voltou a jogar.
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