Capítulo 27
POV do J.V.
O tempo aguardando no ponto do ônibus se arrastou em um silêncio desconfortável, que não foi quebrado nem mesmo no instante em que um ônibus chegou, Angela fez sinal para ele e indicou para que J.V. a seguisse.
Com um misto de desconfiança e preocupação, J.V. seguiu Angela e se sentou ao lado dela, aguardando que Angela falasse alguma coisa... qualquer coisa.
Mas apenas outro longo silêncio se estendeu.
Não poderia descrever a sua relação com Angela como sendo perfeitamente harmônica - de fato, os dois nunca tinham exatamente sido amigos próximos, mas também nunca tinham exatamente sido inimigos. Se fosse forçado a descrever, porém, diria que eram apenas duas pessoas que não eram exatamente desconhecidas mas que, de fato, não se conheciam muito bem, cuja sua maior conexão nascia do fato de que ambos eram ligados a Natália de uma forma ou de outra.
J.V. entendia que Angela se sentia, de certa forma, insegura com relação a sua relação a Nath, pois eram, de fato, extremamente diferentes: Angela já tinha dezoito anos contra os dezesseis de Nath, sem contar que não fazia parte da Igreja, onde J.V. e Nath tinham sido criados desde muito novos. Segundo os rumores que se ouvia pela cidade, a família de Angela havia se mudado para Felicidade na tentativa de afastá-la das 'más influências' que ela seguia na cidade grande, mas a mudança não parecia ter sido de grande ajuda para a então adolescente que havia saído da casa dos pais no dia seguinte do seu aniversário de dezoito anos.
Agora, eles mal se olhavam na cara, pelo que ele sabia.
E é claro que o burburinho na cidade havia explodido sobre o assunto. Mil e uma teorias sobre quais seriam os reais motivos por trás daquela 'revolta' abrupta, mas J.V. nunca havia realmente acreditado muito em nenhum deles.
Por mais que ele e Angela nunca tivessem sido muito próximos, não via nela essa 'má influência' toda, nem tanto essa 'revolta' que as pessoas pareciam querer pintar sobre ela. Então as suas roupas e a música que você ouvia ditava o que sentia por dentro?
Grande mentira!
As músicas podiam até expressar algumas coisas que você sentia, mas nunca tudo. Nada era tão completo assim... e era um absurdo julgar alguém pelo gosto musical ou pelas roupas que usava.
Nath gostava de Angela, e isso havia sido o bastante para que J.V. desse seu apoio para a relação das duas, e continuaria sendo enquanto ambas estivessem felizes com isso... E ele nunca havia se arrependido disso. Nunca.
Mas talvez ele devesse ter tentado um pouco se aproximar um pouco mais de Angela durante esse meio tempo.
Ele havia hesitado em parte porque queria que Angela se sentisse segura em sua relação com Nath - os dois eram apenas amigos, ela não precisava vê-lo como uma ameaça - e em parte porque não queria se intrometer demais na relação da menina que enxergava como uma irmã, mas isso o levava ao presente momento: em que Angela o estava arrastando pelo braço para algum lugar que ele não sabia onde era e ele não sabia muito bem como perguntar.
– Então, quando, exatamente é o caminho onde você vai começar a me explicar o que está acontecendo?
Angela soltou um suspiro impaciente, mas não o respondeu imediatamente e - em alguns instantes, ela realmente não ia precisar dizer mais nada.
O ônibus virou a esquina e, o único edifício no morro quase no fim da cidade já despontava e era de fácil visão, mesmo de dentro do veículo.
– O hospital? Mas porque é que nós estamos indo para o hospital?
Angela olhou para o teto por alguns minutos e suspirou antes de se virar na direção de J.V.. com a expressão que uma mãe exausta pode usar para encarar uma criança de dois anos de raciocínio particularmente lento.
– João Vítor, querido. Por que é que as pessoas vão para o hospital?
– Tá, tá, eu sei... é só que, você pode me dizer o que aconteceu?
– Eu não sei direito, a Nath estava meio histérica no telefone, – Angela finalmente admitiu, passando a mão pelos cabelos com frustração. – eu só entendi alguma coisa sobre você não estar respondendo as mensagens e ver se eu conseguia entrar em contato com você. Ah, e alguém chamado Liam aparentemente quase foi de arrasta pra cima.
– O QUÊ?
– Ah, então isso faz sentido para você? Eu não conheço ninguém com esse nome, então fiquei meio perdida, e--
A voz de Angela foi lentamente se misturando ao som de fundo em sua mente enquanto J.V. tentava desesperadamente organizar sua mente.
– O Liam se machucou? É sério?
– Você sabe o que 'ir de arrasta pra cima' quer dizer? – Angela olhou para ele em choque mais uma vez, e J.V. se lembrou de mais um dos motivos pelos quais ele não gostava de andar muito com Angela.
Ela o fazia se sentir idiota.
– Mas você não ajuda, né, J.V., – Natália diria, rindo e cutucando-o no estômago com seu cotovelo. – pensa um pouquinho, amigo.
Mas, enviando um pedido de desculpas para Nath mentalmente, J.V. meneou a cabeça.
Foi mal, Nath, mas dessa vez simplesmente não vai dar. Meu cérebro desligou em 'arrasta pra cima'.
– Eu sei, Angela, mas custa você dar um pouquinho mais de informação?
– Não sei, custa você entender que eu não tenho um pouquinho mais de informação? – Angela soltou, irritada. – Poxa, a Nath tava quase histérica no telefone, eu mal entendi o que ela tava querendo dizer... você sabe como ela lida com tensão.
Ou como ela não lida, é claro, ficou implícito no silêncio de Angela. Soltando um suspiro irritado, J.V. tentou aliviar a tensão que havia se acumulado subitamente em seus músculos no pescoço.
– Sim, eu sei. – concordou, respirando fundo mais uma vez. – Então, o que você sabe?
– Que alguém chamado Liam está no Hospital, que a Nath está com ele, que ela precisa falar com você e que ela teve que dar um depoimento para a polícia o que, como você pode imaginar, deixou os pais dela superfelizes. – revirando os olhos, Angela acrescentou. – De alguma forma, eu sei que isso vai acabar sobrando pra mim, e o mais engraçado é, eu nem faço ideia do que é que aconteceu.
– E mais nada?
– Bem, eu também sei que eles estão no quinto andar, no quarto 502, e que para chegar lá só precisamos nos identificar na portaria e pegar o elevador. Ajuda?
Forçando um sorriso, J.V. assentiu e decidiu permanecer em silêncio o resto do caminho. Não apenas porque ele estava nervoso, mas também porque Angela claramente estava nervosa também e conversar não estava acalmando nenhum dos dois.
Precisavam chegar ao hospital.
É claro, como toda vez que as coisas precisam acelerar, o caminho até o hospital foi insuportavelmente lento. Era como se houvesse algo no além que soubesse que ele precisava se apressar, e, para seu bel-prazer interior, colocava todo tipo de sinal fechado, engarrafamento ou outra forma de se atrasar em seu caminho.
Mas, felizmente, logo a fachada do Hospital se ergueu por trás das árvores, no canto mais afastado da cidade. A localização havia sido escolhida para, segundo diziam os moradores, preservar a paz e promover a cura dos pacientes internados ali, mas o Hospital era tão longe do centro da cidade que J.V. sempre achou que era incrivelmente inconveniente toda vez que, por qualquer motivo, alguém precisava de cuidados médicos maiores do que o postinho de saúde podia oferecer.
A portaria não foi difícil de encontrar – e nem tinha sido por causa da grande placa azul neon com os dizeres pintados em um branco que J.V. poderia jurar que brilhava no escuro. – não, era simplesmente difícil deixar passar a mulher de olhos similares a besouros e grande carranca sentada em uma grande cadeira de plástico branco, olhando para todos os que entravam como se fossem meros camponeses, implorando por uma audiência com sua rainha.
– Boa tarde. – Angela cumprimentou quando chegou a sua vez, e a mulher a encarou de cima a baixo, claramente examinando e julgando as suas roupas e, a julgar pelo seu olhar, Angela não havia passado no teste. – Somos Angela e João Vítor, queremos visitar Liam do quarto 502. Aqui estão as nossas identidades. – Mostrando a identidade dela, Angela fez um sinal para que J.V. entregasse o seu próprio documento, o que ele fez.
A mulher pegou o documento de Angela como quem pega um pano de chão sujo que nunca havia sido lavado na vida.
– Não quero confusões no meu Hospital, – ela disse, seu tom de voz anasalado irritando J.V. profundamente, mas o mesmo se forçou a esboçar um sorriso.
– Não vamos causar confusão nenhuma, prometo. – disse, usando a sua melhor impressão de 'eu sou um bom garoto'. A mulher pareceu voltar a sua atenção para ele, examinando-o por um longo momento.
– Não sei... – ela disse, seu olhar adquirindo um brilho predatório que subitamente deixou J.V. sem graça e sem ação. – Conheço bem meninos como você e não me importo muito com o tipo de confusão que vocês fazem, agora, garotas como ela, – a mulher disse, sinalizando para Angela com a cabeça, – esse tipo de confusão eu quero fora do meu Hospital.
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