Capítulo 80 | Resiliência
Isaque Campbell
8 meses depois...
Acordei com o som mais gostoso desse mundo: o riso de Anne. O sol filtrava pelas cortinas, deixando a manhã com uma leveza única. Ela estava ali ao meu lado, pijama folgado, cabelos desarrumados e aquele brilho nos olhos que sempre me hipnotiza. Era impossível olhar para ela e não sentir o coração apertar de amor.
Vê-la assim, despertando com um riso tão puro, me fazia acreditar que estava fazendo algo certo na vida. Ela era a prova viva de que o amor verdadeiro transforma tudo ao redor. Eu sabia que a perfeição era inalcançável, mas isso nunca me impediu de tentar ser o melhor homem que ela merecia. Todos os dias, eu acordava decidido a ser digno desse sorriso que agora iluminava minha manhã.
Enquanto a observava, ela soltou outra risada inesperada, tão leve e espontânea que me pegou desprevenido. Passei a mão pelo rosto, ainda meio perdido no sono, tentando entender o que a fazia tão feliz. Era impossível não sorrir junto com ela.
— Bom dia, meu príncipe — ela disse, me puxando para um beijo. Aquele sabor doce que eu desejaria provar em todas as manhãs da minha vida.
— Bom dia, meu amor — respondi, enquanto a abraçava. — Qual o motivo de tanta felicidade logo cedo?
— Sonhei com amoras — respondeu, com uma naturalidade que já me deixou em alerta. Quando Anne dizia algo assim, eu sabia que vinha um pedido inesperado.
— Lá vem... — retruquei, levantando a sobrancelha.
— Isaque, eu preciso de amoras! — declarou com aquele olhar que misturava charme e determinação. Suspirei, passando a mão pelos cabelos e tentando lembrar se amoras sequer estavam na estação.
— Amor, onde eu vou encontrar amoras agora?
— Não sei, meu bem. Mercados, feiras... só sei que estou precisando de amoras bem frescas!
Olhei para sua barriga enquanto ela se ajeitava na cama. Claire deu um chute como se estivesse apoiando a mãe.
— Acho que a Claire também quer amoras — brinquei, arrancando mais uma gargalhada dela.
— Amor, você sabe que quando você realiza meus desejos, ela fica ainda mais feliz!
— Já percebi que com a Claire na jogada eu perco qualquer debate... — bufei, fingindo frustração. — Tá bom, vou atrás dessas benditas amoras frescas.
Quando tentei me levantar, ela me puxou para outro beijo. Como resistir? Havia algo na delicadeza dela que sempre me fazia querer ser melhor.
— Fica aqui descansando enquanto eu saio.
— Claro, cavalheiro — respondeu, brincalhona.
Levantei, coloquei uma camisa, calcei os chinelos e peguei minha carteira e as chaves. Antes de sair, me abaixei para beijar sua testa.
— Volto antes de você sentir minha falta — prometi, piscando para ela.
Anne sorriu, revirando os olhos.
— Você sabe que isso é impossível. Eu sempre sinto sua falta.
Saí rindo, descendo as escadas e já pensando onde, pelo amor de Deus, eu encontraria amoras frescas fora da estação. Essa mulher e nossa filha tinham um poder sobre mim que eu nunca entendi — mas, com toda a sinceridade, nem queria entender.
Lá estava eu, dirigindo pelas ruas da Califórnia, na saga para encontrar amoras frescas. Claro, não ia enfrentar essa missão sozinho, então quase arrastei Esther comigo, porque, vamos combinar, as mulheres têm um dom natural para essas buscas impossíveis.
— Você sabe que, tecnicamente, isso não é meu trabalho, né? — ela provocou, rindo enquanto caminhávamos em direção ao mercado. — Cadê o seu crédito de marido-herói?
— Ei, eu só trouxe você porque gosto da sua companhia, irmãzinha — respondi com um sorriso travesso. Ela revirou os olhos, mas riu junto.
Depois de um estacionamento lotado e corredores apinhados de gente, finalmente chegamos à seção de frutas. Mas, é claro, amoras frescas estavam fora de cogitação. Depois de alguns minutos olhando para as prateleiras, minha última esperança foi uma caixa de amoras congeladas. Não era a ideia, mas era o que tinha. Com um suspiro de resignação, fui para o caixa enquanto Esther me lançava um olhar divertido.
— Vai com fé, irmão. Anne vai adorar sua criatividade. — Não sei se era sarcasmo ou encorajamento, mas aceitei de qualquer forma.
Depois de deixar Esther no escritório, voltei para casa e encontrei Anne na cozinha. Com o cabelo preso em um coque bagunçado e uma espátula na mão, ela parecia estar travando uma guerra contra a farinha de trigo.
— Amor, não faz isso com a farinha. Ela não pode se defender — brinquei, encostado na porta.
Ela se virou com um olhar afiado, mas não conseguiu disfarçar o sorriso.
— A culpa é dela! Olha o que fez no balcão! — resmungou com uma voz meiga, e eu soltei uma risada baixa.
— Vida, você está falando da farinha... ou da cozinheira? — provoquei, entrando na cozinha.
— Está contra mim agora? — perguntou, semicerrando os olhos, mas logo sorriu quando passei os braços ao redor da sua cintura e a beijei.
— Sempre a seu favor, minha rainha.
— Certo, querido esposo... mas cadê minhas amoras? — perguntou, já começando a procurar pela cozinha.
— Estão ali, em cima da ilha — apontei. Seus olhos brilharam por um segundo, mas logo se estreitaram ao ver a embalagem.
— Congeladas? — perguntou, segurando a caixa.
— Amor, juro que fiz o possível pra encontrar frescas. Não estão na estação! E, olha, Esther é testemunha de que quase peguei o jatinho pra buscar no Brasil. — Fiz drama, e ela riu enquanto se aproximava.
— Você é incrível — disse, me abraçando. — Não importa se estão frescas ou congeladas. O que importa é o quanto você se esforça por mim.
— Ah, amor, você sabe que me desmonta, né? — sorri, sentindo o calor do abraço dela.
— Agora, senta aí e deixa eu te mimar com um café da manhã digno — a conduzi até a cadeira com cuidado. — Nada de esforços desnecessários nessa reta final.
— Eu só queria fazer panquecas, mas a farinha... bom, ela tinha outros planos. — Fez drama, e eu gargalhei enquanto lavava as mãos.
— Relaxa. O mestre aqui vai mostrar como se faz.
Ela tossiu de brincadeira.
— Boa sorte, chef. Vou torcer pra que você vença a guerra contra a farinha.
Ri, pegando a massa para começar a preparar as panquecas.
Com as panquecas prontas, o mel, calda de chocolate, amoras e suco devidamente dispostos, arrumei a mesa com um toque romântico. Eu sabia que Anne adorava esses gestos. No mercado, lembrei de comprar uma rosa branca, e esse era o momento perfeito para surpreendê-la. Enquanto ela ainda estava no banheiro, finalizei tudo e deixei a rosa ao lado do prato dela.
Quando ela voltou e viu a mesa, seus olhos brilharam.
— Você é incrível, meu amor — disse, sorrindo ao pegar a rosa. — Obrigada!
— Vocês merecem, princesas — respondi com um sorriso, abaixando para beijar sua barriga antes de nos sentarmos.
Enquanto nos servíamos, ela perguntou:
— Vai pra empresa hoje?
Neguei com a cabeça.
— Vou trabalhar de casa.
— Eu também.
Depois do café, acabamos no sofá. Anne adormeceu ali, apoiada em mim, culpa do cansaço da gravidez. Enquanto eu admirava aquele momento tranquilo, o celular dela começou a vibrar com uma chamada de vídeo da Layla. Pela expressão dela na tela, já sabia que vinha algo não muito bom.
— Oi, Layla — atendi.
— Isaque, você não acredita! — ela exclamou, gesticulando. — Samuel resolveu brincar de chef e encheu a casa com cheiro de alho!
Eu ri alto, depois me dei conta de que poderia acordar a Anne, e silenciei a risada.
— Deixa eu adivinhar... Você tá enjoada.
— Muito! — ela respondeu, bufando. — Preciso sair daqui antes que esse cheiro me enlouqueça!
— Já tentou conversar com ele?
— Isaque — a voz de Samuel surgiu ao fundo, e logo ele apareceu na câmera. — O cheiro tá incrível, mas a madame decidiu implicar só porque dei Danone pra ela em vez de café.
— Tá certo, irmão. Deve evitar cafeína na gravidez — respondi, ainda rindo.
— Homens são todos iguais! — Layla bufou novamente, e eu não me aguentei.
Nisso, Anne abriu os olhos lentamente, confusa com a situação.
— O que tá acontecendo?
— Layla tá enjoada porque o Samuel exagerou no alho — expliquei.
— E eu tenho amoras! — Anne declarou do nada, como se fosse uma grande revelação. Layla arregalou os olhos.
— Frescas?!
— Congeladas, você quer? — Anne respondeu casualmente.
Layla me lançou um olhar fulminante.
— Amoras congeladas? Isaque, como você deixa isso acontecer?
Eu ri, levantando as mãos.
— Onde acha amoras frescas fora de estação, Layla?
Anne, satisfeita, mordeu uma, que estava na tigela ao lado do sofá.
— Estão deliciosas.
— Viu só? Anne é grata a Isaque — provocou Samuel, aproveitando a brecha.
— Eu sou grata, mas o cheiro de alho ainda tá horrível! — Layla retrucou.
Desligamos a chamada em meio a mais provocações. Anne olhou para mim, rindo.
— Que tal macarrão alho e óleo no almoço? — brincou, rindo.
— Só se você prometer não reclamar do cheiro depois — respondi, puxando-a para um abraço.
Ela riu, apoiando a cabeça no meu ombro.
— Samuel e Layla nunca perdem a mania de se provocarem — ela disse.
— Mas o amor deles é inspirador — comentei, observando a chuva fina misturada ao brilho do sol pela janela.
— Vamos comer algo agora? — Anne perguntou.
— O que a madame deseja?
Ela fez uma expressão teatral de pensativa.
— Panquecas de frango bem recheadas, chefe.
— Pedido aceito, madame — respondi, levantando-me com um sorriso.
Levantei do sofá decidido a preparar as panquecas. Enquanto eu separava os ingredientes, Anne ligou o som e a música suave se espalhou pela nossa cobertura. Em poucos minutos, ela apareceu na cozinha, sorrindo e dizendo que queria ajudar. Tentei insistir para que descansasse, mas ela não aceitou.
— Sabe, nosso casamento é tão... perfeito — ela disse, enquanto mexia na massa.
Eu a olhei por cima do ombro e sorri.
— Perfeito a ponto de me fazer sair em busca de amoras fora de estação logo cedo — brinquei, chegando perto e beijando sua testa.
Ela riu, empurrando de leve meu ombro.
— Mas falando sério, amor, estar casado com você é o maior presente da minha vida. Ter você como minha esposa e, agora, como mãe da nossa pequena, é mais do que eu podia sonhar.
Anne me olhou com olhos brilhando, enquanto eu continuava:
— Quero ser o melhor pai que posso para Claire, assim como você já é a melhor mãe do mundo pra ela.
— Você já é um ótimo pai, e nem precisa provar nada — respondeu, e meu coração se aqueceu. — Eu sei que nossa filha vai ser muito amada.
— Sempre — respondi, recheando o frango na frigideira. — Quero dar o melhor para ela.
— Eu te amo muito, sabia? E falaria isso milhões de vezes, se fosse preciso — disse ela, com um sorriso que parecia iluminar tudo ao redor. Me perdi no brilho dos olhos dela, como sempre.
Sem pensar duas vezes, cedi. Desliguei o fogo, deixei a espátula de lado e caminhei até Anne. Não precisei dizer nada; simplesmente a puxei para perto, selando nossos lábios em um beijo profundo, quente e íntimo. Naquele instante, tudo o que existia era ela. O toque suave, o perfume familiar, o calor que fazia meu coração acelerar. Mesmo que se passem anos de casados, ela ainda me fará sentir como na primeira vez. Anne é uma jóia rara com facetas que nunca deixam de surpreender; um mapa cheio de caminhos que desejo desvendar; uma poesia que nunca me canso de ler.
Quando nos afastamos, nossos olhares se encontraram, e foi como reviver o nosso primeiro beijo. A mesma intensidade, o mesmo desejo incontrolável, o mesmo fogo que nos consome estavam ali, vivos, queimando entre nós. Sem precisar de palavras, apenas no olhar, deixei transparecer o quanto ela é tudo para mim, o quanto estou irremediavelmente apaixonado por ela.
Sorrimos, retomando o ritmo da tarde, enquanto preparávamos a mesa e nos sentávamos para o almoço. Entre um prato e outro, conversávamos sobre o futuro da Claire, sonhando acordados sobre como será tê-la conosco, ouvir seu primeiro choro, segurar suas pequenas mãos. Era impossível não sorrir ao imaginar como nossa vida seria transformada por sua chegada.
Quando terminamos a refeição, Anne me olhou com aquele brilho peculiar nos olhos, um sorriso travesso surgindo nos lábios. Antes que eu pudesse perguntar, ela lançou uma ideia completamente inesperada:
— Que tal irmos para o quarto? Quero te mostrar algo.
Curioso, acompanhei-a. O quarto estava com um clima acolhedor, e Anne me guiou até a cama, onde pegou uma caixinha que estava escondida na gaveta.
— O que é isso? — perguntei, intrigado.
Ela sorriu.
— Lembra que eu disse que estava trabalhando em algo especial?
Assenti, sem saber o que esperar. Anne abriu a caixinha, revelando um pequeno par de sapatinhos de bebê feitos à mão, com detalhes delicados em rosa.
— Eu fiz pra Claire — explicou, emocionada. — Queria que ela tivesse algo único, algo que mostrasse o quanto já é amada antes mesmo de nascer.
Fiquei sem palavras por alguns segundos. Peguei os sapatinhos com cuidado, como se fossem o objeto mais precioso do mundo.
— Anne... Isso é incrível. Você tem um dom, sabia?
— Obrigada, amor. Mas sabe, enquanto eu fazia, só conseguia pensar: “Será que estou pronta para tudo isso?”
Sentei ao lado dela, segurando sua mão.
— Escuta, você não precisa estar pronta sozinha. Estamos juntos nessa. E mais do que isso, temos Deus ao nosso lado. Ele vai nos guiar, assim como sempre fez. É Ele quem vai nos capacitar para criar nossa filha nos caminhos d'Ele.
Ela respirou fundo, relaxando um pouco mais.
— Eu só quero ser a mãe que Claire merece...
— E você será. Aliás, você já é.
Beijei sua mão e a puxei para um abraço, sentindo o cheiro suave do perfume dela. Ficamos ali por um tempo, conversando sobre nossos sonhos e planos para a nova fase que se aproximava.
Eu sabia que o caminho seria desafiador, mas naquele momento, no nosso quarto, com as risadas que compartilhávamos, tive certeza de que nossa família já estava começando a trilhar o caminho certo, independente dos receios e desafios. Estava confiante, primeiramente em Deus, depois na nossa força como casal.
Quando a campainha tocou, já imaginei que era o Marcos. O cara sempre aparece de surpresa, e o porteiro sempre deixa ele entrar (mesmo eu já tendo liberado isso há alguns meses). E, claro, lá estavam ele e a Melissa, com aquele sorrisão de quem aprontou alguma coisa. Marcos segurava uma caixa enorme nos braços, parecendo que tinha acabado de sair de uma loja de bugigangas para bebês.
— Fala, casal! — cumprimentei, enquanto segurava a porta para eles entrarem.
Melissa foi direto para Anne, e as duas já começaram aquele abraço caloroso que só mulheres conseguem fazer. Marcos, por outro lado, veio direto para mim, já soltando sua peculiar marca de ironia.
— Pelo amor de Deus, Anne, você precisa gostar desse presente — ele anunciou, dramático, enquanto eu olhava para aquela caixa com uma mistura de curiosidade e desconfiança.
— E o que tem aí? — Anne perguntou, visivelmente animada.
— Adivinha! — Melissa respondeu, pegando a caixa das mãos do Marcos com um entusiasmo que me fez achar que ali dentro tinha ouro.
— Para com o suspense, mulher. Abre isso logo! — falei, rindo.
Anne abriu a caixa devagar, como quem desembrulha um presente de Natal... Só para tirar de lá uma almofada. Uma almofada.
— Isso é... uma almofada? — perguntei, sem disfarçar a cara de interrogação.
Melissa riu e corrigiu:
— Não é apenas uma almofada, meninos. É um travesseiro de amamentação.
Eu e Marcos nos encaramos por um segundo antes de cair na risada.
— Cara, isso vende mesmo? — perguntei, tentando entender o apelo.
— E como vende! — Marcos respondeu. — Em formato de U, velho! É alta tecnologia pra bebês.
Anne, como sempre, entrou no clima:
— Eu já te mostrei, Isaque. Isso ajuda a colocar o bebê numa posição confortável. — E foi logo testando o travesseiro, colocando na barriga como se já estivesse com a nossa filha nos braços.
— Serve pra quando eu der mamadeira também? — brinquei, e eles riram como se eu tivesse contado a piada do ano.
— Quero só ver você usando isso, Isaque — provocou Marcos, apontando para o travesseiro como se fosse um prêmio de loteria.
Anne, então, mudou de assunto, como só ela sabe fazer:
— E o bebê de vocês, quando vem?
Melissa respondeu, tranquila:
— Estamos tentando, mas no tempo de Deus.
E aí, como esperado, Marcos não perdeu a chance de alfinetar:
— Enquanto isso, me divirto com você e o Samuel nesse show de paternidade.
— Bem engraçadinho — retruquei, com um olhar que já dizia tudo. — Quero ver tua piada quando for a tua vez.
Depois de um rápido agradecimento entre as meninas e mais algumas risadas delas no sofá, Marcos veio até mim com aquele ar de quem queria puxar um papo mais sério.
— E aí, como tá sendo? — ele perguntou.
Soltei um suspiro misturado com riso:
— Cara, ontem comemos pizza de camarão quase duas da manhã. Hoje de manhã fui atrás de amoras e só achei congeladas... Tá tranquilo, né?
Ele riu, balançando a cabeça:
— Boa sorte, irmão. Mas sei que você será um pai incrível.
Dei um tapinha nas costas dele e confessei:
— Espero muito isso. Amanhã temos ultrassom, e, pra ser sincero, tô mais ansioso do que gostaria.
Ele parou por um momento e me olhou sério:
— Cara, você e Anne oraram tanto por isso. A gente também. Deus tá cuidando da Claire. Não tenha medo.
Respirei fundo, tentando deixar aquelas palavras entrarem. Sabia que ele estava certo, mas a jornada até ali tinha sido cheia de altos e baixos. Só queria ouvir do médico que tudo estava bem.
— Lembra da sua pregação domingo passado? — ele perguntou.
— “Deus age até nas causas impossíveis” — completei, já sabendo onde ele queria chegar.
— E agora vai duvidar, homem de pequena fé? — provocou, com um sorriso que conseguiu arrancar um meu também.
— Tô firme. Amanhã teremos boas notícias.
— É assim que se fala! — respondeu, me dando outro tapinha no ombro.
— E aí, o que tanto conversam? — Melissa perguntou lá da sala.
— Nada que você precise saber, curiosa! — retruquei, enquanto caminhávamos para lá.
Ela riu e, antes que eu pudesse retrucar, soltou:
— Vocês dois são mais tagarelas que a gente!
Ri e me joguei no sofá.
Depois de uma tarde de boas conversas com Marcos e Melissa, a casa ficou silenciosa. Eu e Anne aproveitamos a noite para relaxar, assistindo a um filme e petiscando sem pressa. Mas, mesmo com o clima tranquilo, não conseguia evitar o peso da expectativa para o dia seguinte: a consulta com a obstetra.
A manhã chegou, trazendo consigo um friozinho no estômago que nenhuma xícara de café conseguiu aquecer. No consultório, o ar-condicionado parecia ter sido regulado para congelar qualquer vestígio de calma, mas Anne, com sua blusa quentinha e semblante sereno, parecia imune. Eu, por outro lado, sentia cada batida do meu coração como se fosse um eco dentro do peito.
Quando chamaram o nome dela, engoli seco. Era chegada a hora de enfrentar mais um marco dessa jornada. Entramos na sala de exame, e a Dra. Madison nos recebeu com aquele sorriso sereno que, por um instante, conseguiu amenizar minha inquietação. Anne segurou minha mão, apertando de leve, como se buscasse forças, mas eu sabia que aquele gesto também era para me confortar.
Enquanto Anne deitava na maca, a Dra. Madison ajustava o aparelho de ultrassom. Cada pequeno detalhe do momento parecia amplificado. A respiração dela, o som do gel sendo espalhado na barriga, o clique do aparelho... Tudo parecia sincronizado com minha ansiedade. Então, a tela começou a ganhar vida, e lá estava ela: Claire.
Minha filha.
Pequena, mas cheia de vida, movendo-se com energia, como se quisesse nos dizer que estava bem.
— Temos uma bebê bastante animada aqui hoje — comentou a Dra. Madison, com um sorriso ao observar a tela. — Vocês têm uma bebê muito ativa aqui!
Anne virou o rosto para me olhar, os olhos brilhando de esperança. Eu retribuí o olhar, tentando esconder o alívio que já começava a invadir meu peito.
— Está tudo bem, doutora? — Anne perguntou, a voz cheia de expectativa.
A médica assentiu.
— Pelo que vejo, Claire está ótima. Vamos continuar verificando, mas vocês podem ficar tranquilos.
Enquanto ela prosseguia com os exames, ficamos em silêncio, hipnotizados pela imagem na tela. Cada movimento, cada detalhe era uma confirmação do milagre que estava crescendo ali. Quando vimos a pequena mãozinha de Claire abrir e fechar, como se acenasse para nós, senti meus olhos arderem. Era um gesto tão simples, mas com tanto significado.
— Tenho uma notícia maravilhosa — disse a Dra. Madison, finalmente. — Vocês já podem respirar mais aliviados. A gravidez de risco não é mais uma preocupação. Anne, você está saudável, e Claire também. Tudo está caminhando para um parto tranquilo.
Anne soltou um suspiro longo, como se estivesse guardando aquele momento há meses. Lágrimas começaram a rolar por seu rosto, mas dessa vez eram de puro alívio e gratidão.
— Eu sabia que Deus estava cuidando de nós — ela murmurou, a voz embargada.
— Sempre esteve — respondi, apertando sua mão. Meu coração estava tão cheio que mal cabia no peito. Olhei para a Dra. Madison e, com um nó na garganta, acrescentei: — Nossa fé nos trouxe até aqui. Sabíamos que Ele não falharia.
A médica sorriu, genuinamente feliz por nós.
— Vocês têm uma jornada linda pela frente. Aproveitem cada momento.
Saímos da sala com o coração mais leve. Na recepção, enquanto Anne marcava a próxima consulta, fiquei ali, observando-a. Não apenas como minha esposa, mas como a mulher incrível que Deus me deu. Ela era forte, tão resiliente, de uma maneira que eu só podia admirar.
— Está me olhando por quê, amor? — perguntou, percebendo meu olhar fixo.
Sorri, balançando a cabeça.
— Só estou agradecendo a Deus por você. E por nossa pequena.
Ela encostou a cabeça no meu ombro enquanto caminhávamos em direção ao carro.
— Deus nunca falhou conosco, Isaque. Nem por um segundo.
— E nunca falhará — afirmei, abrindo a porta para ela.
No caminho de volta para casa, o sol parecia mais brilhante, o dia mais leve. Uma paz indescritível tomou conta de mim. Tínhamos enfrentado tanto, mas tudo aquilo nos trouxe até esse momento. Claire já estava nos ensinando o que realmente importava: confiança em Deus, perseverança e o poder do amor.
E agora, mais do que nunca, estávamos prontos para recebê-la, com um coração cheio de fé e gratidão.
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