Capítulo 63 | Vamos Para Itália
Anne Green
Estávamos no carro, o silêncio confortável preenchido apenas pelo som suave da estrada sob os pneus. Isaque dirigia com a calma de quem finalmente deixara para trás todas as tempestades. Eu o observava, sentindo uma onda de gratidão e alegria tomar conta de mim. Parecia surreal que, depois de tudo, finalmente estávamos livres. Não havia mais barreiras, mentiras ou segredos. Eu queria explodir de felicidade, pular no colo dele, abraça-lo e dizer o quanto ele significava para mim. Meu coração, antes tão inquieto, agora estava em paz.
— Como será o final? Eles vão pagar por isso? — perguntei, querendo uma confirmação do que já sabia, mas ainda precisando ouvir.
— A polícia está investigando. Henrique provavelmente será preso e perderá a licença. Quanto à Gabriela... não denunciei, mas ela será transferida para outro setor ainda essa semana.
Um alívio doce preencheu o ar ao ouvir suas palavras. Senti um peso gigantesco sair de mim, e meu sorriso se abriu sem esforço.
— Como mulher, consigo imaginar a dificuldade de estar grávida de alguém que rejeita o filho, e ainda ser induzida a falsificar um teste de DNA e colocar a responsabilidade em outra pessoa — comentei, com empatia. — Claro que isso não justifica a mentira dela para você, ela poderia ter pedido ajuda ou conversado antes que a situação chegasse a esse ponto. O que ela fez foi um crime, mas acho que, além de uma transferência de trabalho, Gabriela precisa de suporte psicológico, especialmente por causa da gravidez.
— E o que você quer dizer com isso? Sei que ela foi induzida a falsificar o teste, mas isso não muda o fato de que ela me enganou. Não posso simplesmente ignorar o que aconteceu e ser amigo dela — respondeu ele, enquanto eu olhava para a avenida à frente.
— Não precisa ser amigo dela, só ser mais compreensivo. Ela já está mentalmente abalada, e agora, com a gravidez rejeitada pelo pai, a situação piora, entende?
Isaque refletiu por um momento e depois me encarou:
— Eu já disse que a perdoei. O que mais você acha que devo fazer?
— Acho que cancelar a transferência seria um bom começo, porque ela não vai se sentir bem em um setor onde não se identifica. Eu posso falar com ela, tentar entender e, quem sabe, ajudar de alguma forma.
Ele arqueou uma sobrancelha, surpreso.
— Como diz a Bíblia: “a mulher sábia edifica”. Se você acha que deve fazer isso, não vou transferi-la.
— Obrigada por entender — sorri para ele. — Nem sei como descrever o alívio que sinto agora — confessei, soltando um suspiro.
Isaque, com seu jeito brincalhão, lançou um sorriso de canto, aquele que sempre fazia meu coração acelerar.
— Pode expressar me beijando — respondeu com seu tom arteiro, sem desviar os olhos da estrada. — E, sim, estou lembrando do propósito, caso você queira perguntar.
— Engraçadinho — respondi, rindo, enquanto ele estacionava o carro em frente à casa dos pais.
Ao sair do carro, fui tomada por uma sensação de encantamento. A casa dos pais de Isaque era mais impressionante do que eu jamais poderia ter imaginado. Seus jardins eram como algo saído de um conto de fadas, perfeitamente arranjados, com flores e árvores que pareciam ter sido cuidadas com amor e dedicação. O verde intenso contrastava com a arquitetura clássica da casa, que impunha respeito e elegância. Fiquei ali, parada por um momento, absorvendo tudo, sentindo uma mistura de admiração e nervosismo.
Quando caminhamos pelo portão, meu coração bateu mais rápido. A porta, imponente e decorada com detalhes em ferro forjado, parecia ser a entrada para um novo capítulo em nossas vidas. Isaque abriu a porta com a confiança de quem pertencia àquele lugar, mas eu não conseguia esconder o fascínio nos meus olhos.
Assim que entramos, o hall me tirou o fôlego. O chão de mármore refletia a luz suave dos lustres, criando uma atmosfera de sofisticação e tranquilidade. Tudo ali exalava cuidado e bom gosto. Isaque apertou minha mão por um momento, como se quisesse me lembrar de que eu estava segura ao lado dele, e sorriu, percebendo meu deslumbramento.
— Você já conhece meus pais, não precisa ficar nervosa — disse ele, com carinho.
— Conheço seus pais, mas nunca estive aqui antes — respondi, ainda encantada.
Ele sorriu de novo, dessa vez com uma ternura que me fez corar.
— Então acostume-se. Você já é quase da família.
Meu coração deu um salto ao ouvir essas palavras, uma mistura de emoção e expectativa se formando dentro de mim.
Fomos recebidos por uma mulher sorridente, usando um uniforme casual, com os cabelos escuros e uma expressão amável.
— Sejam bem-vindos, Sr. Campbell e...
— Anne... Anne Green — respondi, retribuindo o sorriso.
— Seus pais já estão descendo — ela disse para ele antes de se retirar, deixando-nos sozinhos por um momento.
Logo, a voz calorosa de Esther preencheu a sala.
— Anne! Finalmente na minha casa! — Ela se aproximou com um sorriso aberto, irradiando uma energia acolhedora.
— Estava devendo essa visita — respondi, sorrindo de volta.
— Você vai me contar tudo o que aconteceu no jantar — ela disse, olhando de relance para Isaque.
Ele assentiu, sério, mas com uma calma tranquila.
— Vou contar tudo na presença da mãe e do pai. Quero que todos saibam — disse, sua voz grave e suave ecoando pelo ambiente.
Logo, Luisa e o pastor Jean desceram as escadas, com sorrisos largos e olhares iluminados.
— Que alegria imensa recebê-la em nossa casa! — exclamou o pastor Jean, se aproximando com os braços abertos.
— Seja muito bem-vinda, querida — disse Luisa, me abraçando calorosamente. — E você, Isaque, finalmente tomou juízo. Deus é justo e cumpre o que promete.
— O que Deus te prometeu e cumpriu? — perguntou Isaque enquanto sentávamos no sofá.
— Ele me disse que iria trazer você de volta, e assim fez — respondeu Luisa, com um sorriso acolhedor.
— Graças a Deus que nossa família está crescendo — acrescentou o pastor Jean, me lançando um olhar carinhoso. — Quando Isaque nos contou sobre vocês e a África, ficamos tão surpresos quanto esperançosos. Ver Deus agindo de maneira tão poderosa na vida de dois jovens como vocês é realmente emocionante. A história de vocês é linda, e sei que vocês farão uma grande obra juntos.
— Obrigada, pastor Jean — respondi, sorrindo suavemente, tocada pelas palavras dele.
Luisa, com sua natural curiosidade, logo mudou de assunto.
— Agora, queremos saber sobre Gabriela — disse, sentando-se na poltrona. — Isaque, você quase nos matou de susto com toda aquela história. Estávamos tão preocupados.
— A verdade é que o filho não é meu — declarou Isaque, sua voz firme, mas carregada de exaustão. O alívio foi palpável no ar, como se todos tivessem prendido a respiração até aquele momento.
Eu olhei em volta e vi o pastor Jean e Luisa relaxarem, suas expressões tensas se dissolvendo em surpresa. Esther estava de olhos arregalados, completamente pasma.
— Foi uma armação — Isaque continuou, seus olhos cor de mel refletindo uma frustração contida. — Gabriela queria me prender a ela e armou tudo com o próprio pai do bebê, que é biomédico, o mesmo que falsificou o teste de DNA. Ele não quer assumir o filho e eles tentaram jogar a responsabilidade para mim. Foi uma loucura, mas já denunciei, e agora... Deus fará justiça.
O silêncio que se seguiu foi cortante. Os olhos dos pais de Isaque e de Esther quase saltaram de seus rostos, chocados com a revelação. O choque misturava-se com o alívio, e eu sentia o peso daquela verdade se dissipar no ar.
— Meu filho... Em que situação você se meteu? — disse o pastor Jean, atônito.
— Como essa garota teve coragem de fazer uma coisa dessas? — questionou Luisa, chocada. — Brincando com a vida de todos como se fosse um jogo infantil...
— Está tudo resolvido agora, e acredito que Deus está ajustando as coisas — disse Isaque, recostando-se no sofá e suspirando.
— Sim, está certo, meu filho. Só não desvie do caminho novamente — respondeu o pastor Jean, ainda refletindo sobre a situação.
— Gabriela sempre foi obcecada por Isaque — disse Esther, entrando na conversa. — Ela parecia uma sombra, sempre perseguindo Isaque. Eu aconselhei ele a se afastar, mas não adiantou, e olha no que deu.
Isaque parecia perdido em seus próprios pensamentos, os olhos fixos no móvel à nossa frente, sua voz carregada de arrependimento.
— Eu estava cego, não percebem? Não conseguia pensar direito em meio àquelas loucuras. Como consegui chegar ao ponto de colocar álcool na boca? Só de lembrar me dá ânsia de vômito. Como fiz tanta besteira? Como me deixei levar tanto pela carne?
O ambiente ficou em silêncio por um momento, até que Luisa, com sua serenidade habitual, quebrou a tensão.
— Você estava agindo sob o peso do “velho homem”, Isaque. Às vezes, Deus permite certas coisas para nos guiar a um propósito maior. Talvez, se isso não tivesse acontecido, você ainda estaria preso a alguém que te fazia mal, no caso, Julia. Mas Deus já sabia que você e Anne precisavam se encontrar, e Ele permitiu esse caminho. Agora, tudo está indo bem, graças a Deus. Você voltou para Cristo, está começando um relacionamento com a mulher que ama, e logo se casarão. Quem sabe em breve nos darão netos.
Meu rosto esquentou de imediato, uma mistura de surpresa e diversão tomou conta de mim. As risadas suaves que ecoaram pela sala aliviaram o clima, e quando olhei para Isaque, vi seu sorriso tímido, refletindo a mesma leveza que eu sentia naquele momento.
— Isaque sempre sonhou em ter filhos — disse Esther, me lançando um olhar travesso.
— Com a mulher certa — respondeu ele, acariciando meus ombros.
O pastor Jean, com sua típica seriedade misturada com bom humor, interrompeu.
— E o casamento? Quando será? — perguntou ele, e eu senti meu coração acelerar, como se estivesse prestes a saltar do peito.
— Pai! — exclamou Esther, rindo. — Vai deixar a Anne constrangida!
— Ela precisa se acostumar com nossa família — disse ele, sorrindo abertamente.
— Você está tão vermelha quanto um tomate nesse exato momento — a voz grave de Isaque soou baixinho ao meu ouvido, reverberando em mim e me deixando ainda mais sem jeito. A proximidade dele, o tom provocador, fazia com que minhas bochechas queimassem ainda mais.
Eu tentei manter a compostura, mas sentia cada olhar fixo em mim, esperando por uma resposta.
— Então... — gaguejei, ainda buscando palavras que não me traíssem. — O casamento... Quando será o casamento? Não falamos sobre o dia do casamento... — Olhei para Isaque, tropeçando nas palavras, sentindo o rubor tomar conta do meu rosto.
Ele apenas sorriu com aquele ar tranquilo que me desarmava por completo.
— Breve, o mais breve — disse, sua voz calma, mas firme.
Minhas sobrancelhas se ergueram em surpresa, e meu coração deu um salto involuntário. Eu sabia que estávamos caminhando para isso, mas ouvir de Isaque, assim, tão diretamente, fez tudo parecer ainda mais real.
— Isso mesmo! — exclamou Luisa. — Cristão não pode demorar para casar, ainda mais quando são dois jovens lindos como vocês. E se têm certeza do amor que sentem, não há razão para esperar. Aproveitem a juventude e desfrutem um do outro!
Eu tossi discretamente, tentando disfarçar o rubor que insistia em subir pelo meu rosto, enquanto todos riam da minha evidente timidez.
— E Esther, não vai casar? — Isaque perguntou, lançando um olhar travesso para a irmã.
— Não tenho pressa. Quero terminar a faculdade e passar na OAB primeiro — ela respondeu com determinação.
— E ficar só de namorinho com Caleb? Nananinanão, mocinha — provocou o pastor Jean, balançando a cabeça em desaprovação brincalhona. Esther soltou um suspiro, revirando os olhos.
— Acho bom ele vir aqui pedir sua mão, já que você é a caçula — Isaque brincou, recebendo em troca um olhar mortal de Esther.
— E por que você não pediu a mão de Anne aos pais dela? Me poupe, Isaque — Esther retrucou rapidamente, com um sorriso desafiador.
— Irei pedir, tenha calma — disse Isaque, e eu apenas observava a cena, sentindo meu coração aquecer com aquele jeito provocador, mas sempre carinhoso dele.
— Vocês crescem, mas continuam se provocando, não é? — comentou Luisa, entrando na brincadeira com um sorriso no rosto.
O ambiente estava leve e descontraído, mas então Isaque mudou o tom, sua expressão ficando mais séria.
— Mas agora, quero que todos sejam sérios por um momento — ele começou, chamando a atenção de todos. — Preciso contar algo que nunca tive coragem de compartilhar antes. Esther já sabe, então pode sair se quiser.
— Não vou sair, engraçadinho — Esther retrucou, mantendo o tom leve, mas visivelmente curiosa.
— Diga, Isaque — encorajou o pastor Jean, ajeitando-se no sofá, pronto para ouvir.
Com a voz firme, mas carregada de emoção, Isaque finalmente contou sobre Jonathan e como o havia ajudado com a cirurgia. Enquanto ele falava, eu via a surpresa nos rostos de Luisa e do pastor Jean, que acompanhavam atentamente cada detalhe, surpresos e admirados com o que ouviam.
— Eu não sabia como vocês reagiriam, por isso nunca tive coragem de contar — concluiu Isaque, franzindo os lábios, seu olhar hesitante, como se estivesse se preparando para qualquer reação.
Luisa, sempre acolhedora, olhou para ele com ternura.
— Filho, você poderia ter nos contado antes. Sabe que sempre te apoiamos. Isso é algo sério, e você não precisava carregar esse fardo sozinho — disse ela, sua voz suave e maternal.
— E não iríamos lhe julgar — acrescentou o pastor Jean, sua expressão serena, mas cheia de orgulho. — Na verdade, estamos impressionados com sua generosidade e justiça ao ajudar Jonathan, mesmo depois de tudo. Deus com certeza se agradou da sua atitude, e nós vemos o quão humilde e justo você foi.
Isaque, visivelmente aliviado, apenas assentiu, analisando a situação com os olhos sérios, mas grato.
— Obrigado pelo apoio — ele respondeu, sua voz carregada de gratidão enquanto se ajeitava no sofá. Ele passou o braço ao meu redor, suas mãos alisando carinhosamente meu ombro, e eu senti a conexão entre nós se fortalecer ainda mais naquele momento de sinceridade e aceitação.
Eu estava finalmente relaxando, aproveitando a tarde tranquila, quando tudo desmoronou. Meu pior pesadelo entrou em cena.
Gatos.
Nunca fui fã desses felinos. Não que eu os odiasse, mas também não era o tipo que falava com eles em voz de bebê ou os chamava de “fofinhos”. Sabia que a Esther tinha gatos, mas só de ouvir falar, nunca tinha encontrado com os felinos cara a cara.
Então lá estávamos nós, quando eles apareceram, gigantes! Sério, pareciam aqueles gatos de filme que malham na academia desde filhotes. Eu congelei na hora. E claro, Isaque estava ao meu lado, segurando o riso.
— Relaxa, amor, eles são dóceis! — Ele sorriu, aquele sorriso que geralmente derretia meu coração, mas naquele momento só me deixou mais alerta. Dóceis... Aham. Um dos gatos, o maior, com o pelo todo desgrenhado e um olhar de vilão de desenho animado, começou a se aproximar. Eu juro, foi como se minha vida estivesse passando diante dos meus olhos. Tentei me afundar no sofá, mas não teve jeito. O gato parou bem na minha frente, me encarando. Parecia que ele estava me desafiando.
“Calma, Anne,” pensei. “Finja que não tem medo. Eles sentem quando estamos com medo, né? Sentem cheiro de pavor.” Foi aí que a confusão começou. Esther, sem a menor ideia do meu pânico interno, balançou um brinquedinho para o gato. E ele, como se estivesse competindo nas Olimpíadas dos Gatos, pulou no sofá... bem do meu lado!
Minha reação? Um grito totalmente involuntário, seguido de um salto nada gracioso em direção ao colo de Isaque. O resultado? Gargalhadas por toda a sala, menos de mim, obviamente. O pior? O gato achou que eu fazia parte da brincadeira e começou a tentar subir em mim, como se eu fosse uma árvore.
Isaque, rindo mas com aquele toque de cavalheiro que eu amo, pegou o gato no colo e o afastou de mim, enquanto eu tentava manter a dignidade... ou pelo menos o pouco que me restava. Não enganei ninguém. Nem os gatos.
— Você tem medo de gatos, Anne? — perguntou Esther, com uma inocência genuína.
— Não é exatamente medo... É mais um pavor intenso — respondi, tentando não parecer uma louca.
— Leva eles lá pra cima, Esther — interveio Luisa, levantando-se.
— Desculpa, Anne, eu não sabia mesmo! Se eu soubesse, teria deixado eles lá em cima desde o início — disse Esther, com uma expressão de arrependimento quase fofa.
— Tá tudo bem, de verdade — forcei um sorriso, mais aliviada quando vi os gatos saírem de cena.
Quando Luisa e o pastor Jean saíram para conferir o almoço, eu ainda estava no sofá, me recuperando do susto, cada músculo tenso, ainda sentindo a sombra dos gatos me rondando.
— Você sabe que pavor é basicamente medo, né? — Isaque brincou, sua voz suave me trazendo de volta para a realidade.
— Eu sei... Mas pavor soa menos dramático — respondi, me aproximando dele, aproveitando o momento de leveza depois do caos. — E falando em animais, quando é que eu vou conhecer o Duque?
— Agora mesmo. Ele deve estar na área de lazer, correndo por aí — disse Isaque, se levantando, com aquele jeito tranquilo.
Ele me ofereceu a mão, e eu aceitei, grata por finalmente encontrar um animal que eu sabia que não iria tentar me escalar como uma árvore.
Ao caminhar para a área de lazer, senti como se estivesse entrando em um cenário de filme. A grama impecável, as árvores altas criando sombras perfeitas, e a piscina refletindo o sol como um espelho cintilante. Era como se tudo ali fosse cuidadosamente orquestrado para impressionar, e não pude deixar de admirar o ambiente sofisticado. Só que um detalhe roubou completamente minha atenção: um rosnado baixo, vindo da sombra de uma das árvores.
E então eu o vi: Duque. Um doberman que mais parecia uma escultura viva, com sua pelagem preta brilhante e aqueles olhos profundos, me observando com uma intensidade quase hipnotizante. Meu coração disparou no mesmo instante. Eu sabia que Isaque amava aquele cachorro, sempre falava sobre como ele era leal e protetor. Mas, agora, frente a frente com ele, percebi o quanto aquele animal era imponente. Ele parecia medir cada movimento meu, como se estivesse avaliando se eu era digna de estar ali.
Duque avançou alguns passos, seus músculos visivelmente tensos. Engoli seco, e tentei parecer confiante. Ao meu lado, Isaque parecia completamente à vontade, como se não percebesse o tumulto que se desenrolava dentro de mim. Respirando fundo, me abaixei um pouco e estendi a mão, tentando transmitir calma.
Duque se aproximou lentamente, farejando minha mão antes de roçar o focinho com um toque leve.
— Oi, Duque — minha voz saiu um pouco mais suave do que eu esperava, mas ao menos ele não rosnou.
Isaque lançou um sorriso discreto.
— Ele gosta de você. Normalmente, ele não confia em pessoas novas tão facilmente.
Senti uma mistura de alívio e orgulho. Minha mão percorreu o pelo macio de Duque, que agora parecia muito mais relaxado ao meu lado. De alguma forma, essa aprovação silenciosa do cachorro parecia um marco importante. Uma espécie de teste que eu havia passado. Eu sabia o quanto Duque significava para Isaque, e esse momento reforçava a ideia de que eu também estava me tornando parte da vida dele.
Isaque se abaixou ao meu lado, acariciando Duque.
— Ele nunca se adaptou muito bem à vida na cobertura. Gosta de correr livre, de espaço. — Ele fez uma pausa, lançando-me um olhar de soslaio. — Breve ele terá uma irmãzinha morando com ele.
Senti uma onda de calor subir pelo meu corpo.
— Que irmã, Isaque? — tentei disfarçar, arqueando a sobrancelha, mesmo sabendo exatamente aonde ele queria chegar.
— Ora, Molly, é claro — ele respondeu com um sorriso tranquilo, como se aquilo fosse a coisa mais óbvia do mundo. — Quando casarmos, Molly e Duque vão morar juntos, não é?
Meu coração saltou. Isaque se levantou, cruzando os braços, me olhando com aquele jeito provocador, mas ao mesmo tempo tão carinhoso, que me fez sorrir. Também me levantei, tentando manter meu olhar firme no dele.
— Claro — respondi, tentando não deixar transparecer o nervosismo que me invadia. — E onde pretende morar? Na cobertura? Ou vai mudar?
Ele ponderou, como se já tivesse pensado nisso há muito tempo.
— Pretendo vender a cobertura. Vamos usar a casa de campo nos finais de semana, mas pensei em comprar uma casa maior na cidade, num condomínio. Algo espaçoso e seguro para... — ele fez uma pausa, me observando —... as crianças.
Senti o peso e a doçura de suas palavras ao mesmo tempo, como se ele estivesse desenhando o futuro que queria para nós.
— Gosto da ideia — admiti, com um sorriso sincero. — Mas, pra ser honesta, sou apaixonada pela natureza. Talvez a gente possa passar mais do que só os finais de semana na casa de campo. — Dei de ombros. — Sempre amei o campo. A Suíça, por exemplo, é o lugar mais lindo que já vi. Incrível, como nas fotos.
Ele arqueou a sobrancelha, puxando-me pela cintura de novo, como se quisesse me ancorar ali, naquele instante.
— Se você ama tanto a Suíça, podemos ir juntos. — A voz dele soou baixa, íntima, fazendo meu coração acelerar ainda mais. — E quanto à casa, será nossa. Podemos ir para a casa de campo quantas vezes quiser. Inclusive, que tal nos casarmos lá?
Sorri, surpresa e encantada ao mesmo tempo.
— Não seria uma má ideia.
Ele me guiou até uma cadeira na sombra, e continuamos conversando enquanto o cheiro do almoço tomava conta do ambiente, aumentando minha fome.
— E então, quando vamos pra Suíça? — perguntei brincando.
— Quando você quiser, meu amor — ele respondeu, me lançando um olhar que fez meu estômago dar voltas.
Isaque entrelaçou os dedos nos meus, suas mãos quentes, e eu senti uma onda de conforto percorrer meu corpo.
— Anne... tenho uma notícia pra te dar.
Meu coração apertou um pouco.
— Só não me diga que é algo ruim... — brinquei.
— É porque combinamos de passar o fim de semana na casa de praia com o pessoal, mas... surgiu uma viagem de negócios e precisamos estar lá no sábado. Vamos ter que sair daqui na sexta — ele disse, com aquela tranquilidade que só ele tinha.
— Viagem a negócios? Pra onde? E como assim, eu não sabia disso? — perguntei, arqueando as sobrancelhas, um misto de curiosidade e leve frustração.
— Foi de última hora, amor. É na Itália. Estamos fechando uma parceria com uma fabricante italiana de carros de luxo. A filial deles precisa de uma nova linha de veículos de alta performance, e bom... precisamos negociar diretamente com a fábrica — ele explicou, como se fosse algo normal trocar um fim de semana na praia por uma negociação de carros na Itália.
Franzi os lábios, tentando digerir a ideia de que nossos planos seriam trocados.
— Não dá pra adiar? Já combinamos tudo com o pessoal, e agora vamos desmanchar tudo assim, do nada? — perguntei, cruzando os braços, fazendo uma pequena careta. Logo depois, uma dúvida surgiu. — Pera aí... E por que o Marcos não vai? Ele está sempre nessas negociações — acrescentei, franzindo o cenho.
— Não tem como adiar. E o Marcos... — ele deu de ombros — está atolado com os preparativos do casamento. Achei melhor deixar ele fora dessa, sabe? Ele precisa descansar um pouco. — Isaque sorriu de canto, tentando amenizar a situação, e eu acabei assentindo. Fazia sentido, com o casamento de Marcos chegando, melhor deixar ele focar nisso.
Soltei um suspiro.
— Tudo bem, me rendo. Mas, só pra você saber, está me devendo um fim de semana na praia! — brinquei, apontando o dedo em sua direção.
Ele riu, aquele riso galante de sempre, e me puxou pela cintura.
— Terá todos os finais de semana na praia que quiser, meu amor — respondeu, a voz carregada de charme.
Antes que eu pudesse responder, ouvimos Luisa nos chamar para o almoço. Ele enlaçou o braço no meu pescoço, me puxando para mais perto enquanto caminhávamos em direção à cozinha.
— Então... — disse ele, com um sorriso travesso. — Andiamo in Italia, amore mio!
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