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Capítulo 25 | Carona

Anne Green

Desde que cheguei em casa ontem à noite, Isaque não saiu da minha cabeça. Fico sorrindo sozinha, parecendo uma adolescente apaixonada, e isso é a última coisa que eu queria agora: me apaixonar.

Acordei antes mesmo do despertador tocar, com ansiedade e aquele frio na barriga. Contava os minutos para vê-lo no escritório, mas a ideia de encontrá-lo de novo me deixava nervosa.

A imagem dele me olhando ontem no shopping, admirado com o vestido que eu experimentei, continuava viva na minha mente. Foi a primeira vez que o vi nervoso perto de mim, e ele fica irresistível quando me elogia.

O despertador tocou e me trouxe de volta à realidade, lembrando-me de tentar afastar esses pensamentos antes que fosse longe demais e eu acabasse me apegando a ele. Mas a tentativa foi em vão quando me dei conta de algo importante: hoje é o dia do cinema.

Levantei, fiz minha rotina matinal, me arrumei com uma roupa social, maquiagem leve e cabelo ondulado. Antes de sair do quarto, me ajoelhei na cama e orei. Falei com Deus sobre Daniel, pedi por várias áreas da minha vida, e, desta vez, senti o desejo de interceder por Isaque, para que seu coração fosse quebrantado e ele pudesse sentir novamente a Presença de Deus.

Terminei a oração e fui para a cozinha. Tomei café sozinha, pois meus pais já haviam saído, e, ao pegar minha bolsa no hall de entrada, algo me surpreendeu ao me aproximar do carro: percebi que o pneu estava furado.

Suspirei, olhando para o relógio e percebendo que não teria tempo para trocá-lo. Minha opção era chamar um Uber, mas não encontrava nenhum disponível.

O nervosismo começou a aparecer, e, ao tentar ligar para Layla para pedir ajuda, ela não atendeu.

Eu precisava pensar em outra saída.

Respirei fundo, tentando ignorar o nervosismo, e decidi ligar para Isaque, explicando a situação e o motivo do meu atraso.

— Bom dia, Isaque, aconteceu um pequeno incidente e vou me atrasar.

— Incidente? Você está bem?

— N-não! Quer dizer, sim! Estou bem. É que o pneu do meu carro furou e não consigo encontrar um Uber para ir até a empresa. Vou acabar atrasando.

— Está em casa?

— Estou. Vou tentar chamar o Uber mais uma vez.

— Estou indo aí.

— Quê? Não! Isaque? Isaque!?

Ele encerrou a ligação. Meu coração acelerou ainda mais ao saber que ele estava a caminho, e logo vi sua Maserati virando a esquina. Fiquei sem fôlego.

— Como conseguiu fazer isso? — perguntou ao descer do carro.

Eu mal conseguia responder, perdida em sua presença. Isaque vestia uma calça social preta, camisa branca e um paletó sem gravata. Os óculos de sol davam um toque extra ao charme dele, e o perfume que ele usava dominava o ambiente, mesmo ao ar livre.

— Anne? — chamou minha atenção, parando à minha frente. — Ainda está dormindo? — brincou, tirando os óculos e colocando-os na gola da camisa.

— Ah, desculpa! Bom dia. O que disse? — falei, tentando me recompor.

— Como conseguiu furar o pneu? — perguntou, inspecionando o carro.

— Acho que aconteceu ontem à noite, mas acabei esquecendo completamente disso — respondi, cruzando os braços enquanto me aproximava.

Ele pegou o celular e fez uma ligação rápida.

Caio, bom dia. Preciso que troque um pneu de uma BMW i5. Vou passar o endereço…

Observava-o, ainda surpresa com a prontidão.

— Eu ia resolver — comentei quando ele desligou.

— Resolveu tentando pegar um Uber e deixando o carro aqui? Só quis ajudar.

— Eu ia resolver no caminho, mas agradeço pela ajuda — suspirei. Ele indicou o carro dele, convidando-me a entrar.

Ele abriu a porta do carona para mim, e logo que deu a partida, perguntei:

— Posso escolher uma música?

— Não, porque com certeza vai ser evangélica — respondeu, e eu ergui a sobrancelha, assimilando sua resposta seca e decidida.

— Prefere os vidros abertos ou o ar ligado? — perguntou em seguida.

— Vidros abertos. Gosto da brisa da manhã.

Ele abaixou os vidros, colocou os óculos de volta e apoiou o braço na janela. Isaque dirigindo era uma visão encantadora, e eu precisava me concentrar para não continuar admirando-o tanto.

— Tem algo em mim? — perguntou com um sorriso malicioso, ao perceber meu olhar. Corei e virei o rosto para a janela, tentando disfarçar.

— Como assim?

— Você estava me olhando — respondeu, divertindo-se com minha reação.

— Estava observando a rua… vendo as lojas — improvisei, mas ele deu um sorriso cético.

— Uhum — murmurou, mexendo na ponta do nariz.

A verdade é que, embora Isaque não seja cristão e eu tente ao máximo não me envolver emocionalmente, não consigo deixar de admirar sua beleza e seu jeito.

Mesmo com tão pouco tempo de convivência, nossa interação na empresa e fora dela tem um impacto diferente em mim. Não é como com Daniel, com quem posso conversar, rir e sair sem que isso me afete de maneira especial. Com Isaque é diferente.

Cada momento que passamos juntos parece suficiente para que ele não saia da minha mente. E não é apenas por causa de sua aparência; há algo nele que me provoca um sentimento que nem consigo descrever. É uma conexão quase inexplicável, como se já nos conhecêssemos antes, e sinto uma paz quando estou ao seu lado.

Mas, infelizmente, ele não parece interessado em se reaproximar de Deus, e isso para mim é uma barreira. Não consigo imaginar ter algo sério com alguém que não compartilha a fé que é central na minha vida. Acredito que, se uma pessoa não consegue amar a Deus, dificilmente poderá me amar de verdade.

Mesmo assim, valorizo muito nossa amizade e o tempo que passamos juntos, sem criar expectativas.

Isaque virou na rua onde fica a cafeteria Gocce di Caffè e estacionou em frente, e não pude evitar sorrir com sua atenção aos detalhes.

— Já volto — disse ele, descendo do carro.

Olhei para o relógio, eram 07:45. O interessante de estar com o dono da empresa é que ele parece despreocupado com o horário.

Aproveitei o momento sozinha no carro para me olhar no espelho interno, ajeitar a maquiagem e retocar o batom. Meu celular vibrou com uma notificação, e eu suspirei ao ver o mesmo número que vinha me incomodando há dias. Bloqueei o celular e recostei a cabeça no banco, respirando fundo.

— Está tudo bem? — perguntou Isaque, entrando de volta no carro.

Estava tão distraída com a mensagem que nem percebi sua volta.

— Sim, obrigada.

— Aqui, para você — disse, me estendendo um copo.

O aroma era delicioso, o que me fez suspirar.

— O que é isso?

— Cappuccino de avelã — respondeu, dando partida no carro. — Prova e me diz o que achou.

Dei um gole, e o sabor doce junto ao aroma de avelã me fizeram suspirar mais uma vez. Era maravilhoso.

— Nossa, Isaque, é ótimo! — exclamei, aproveitando cada gole. — Obrigada.

Ele sorriu discretamente, mantendo os olhos na estrada por trás dos óculos escuros.

— Já sei o que quero que você faça — disse, com o braço apoiado na janela e os olhos ainda na estrada.

— Como assim?

— A aposta de ontem. Ganhei e já sei o que quero que você faça — explicou.

Senti um frio na barriga ao lembrar da aposta, temendo o que estava por vir.

— Pensei que tivesse esquecido — comentei, apreensiva.

— Jamais — disse, lançando-me um olhar rápido. — É o seguinte: ganhei a aposta e quero te levar a um lugar, e você não pode recusar.

— Que lugar, Isaque? Pega leve, por favor.

— Vou pegar leve. Te disse que sou bonzinho — respondeu, com um sorriso travesso.

Eu estava quase me arrependendo de ter aceitado a aposta.

— Então, fala onde é — insisti.

— Você vai jantar comigo amanhã à noite — ele disse, e eu fiquei paralisada.

Um jantar? Um jantar casual ou... um encontro? Será que devo perguntar? Eu jamais aceitaria um encontro com Isaque!

— Não vai responder? — ele perguntou, olhando para mim.

— É-é... Jantar? Só nós dois? — perguntei, ganhando coragem.

— Isso, um jantar só eu e você — respondeu naturalmente.

— Mas que tipo de jantar? — eu estava nervosa, tentando descobrir se era um encontro. — Tipo, um jantar comum ou algo mais formal, onde eu precise me arrumar com mais formalidade?

Eu estava completamente sem jeito, sem saber o que dizer ou pensar. Isaque, claro, parecia estar se divertindo com isso.

— Exatamente, Anne. Um jantar em um restaurante específico — disse educadamente. — Pode se arrumar, porque o lugar para onde quero te levar é bem famoso.

— Famoso? Como assim? — perguntei, minha curiosidade aguçada.

— Primeiro, me diz se vai aceitar. Depois, te conto onde é — ele respondeu, e eu revirei os olhos. Estava difícil resistir.

Por alguns segundos, considerei recusar. Não ia aceitar um encontro com Isaque.

— E então?

— Tudo bem, eu vou — disse, mesmo que minha intenção inicial fosse recusar.

Mas eu não ia facilitar. Só aceitaria com uma condição, e isso seria uma oportunidade.

— Mas... — fiz uma pausa dramática, e ele ergueu uma sobrancelha, interessado. — Tenho uma condição.

— Pra jantar comigo precisa de condição? Não sabia que você era tão difícil — brincou, com um sorriso no rosto.

— Eu vou jantar com você se você for comigo ao próximo culto na igreja — declarei, vendo-o suspirar e balançar a cabeça.

— Eu fui gentil, e você pega pesado, Anne — disse ele, enquanto nos aproximávamos do estacionamento.

— Qual o problema, Isaque? Acho justo eu também fazer um pedido — insisti, manhosa. Ele soltou um longo suspiro.

— Me recuso — respondeu, determinado.

— Então, também me recuso a jantar com você — devolvi, mantendo minha posição.

Ele estacionou o carro e tirou o cinto, olhando para mim com um ar de curiosidade.

— Por que você quer tanto que eu vá à igreja? Minha família e o Marcos já não insistem o suficiente? — perguntou, inclinando-se levemente na minha direção.

Também me inclinei, tirando o cinto.

— E por que quer tanto me levar para jantar?

Ele parou por um instante, seus olhos fixos nos meus.

— Porque quero passar mais tempo com você — respondeu, e eu congelei, tentando disfarçar o impacto que suas palavras tiveram em mim.

— Então, venha comigo à igreja, Isaque — insisti, sem desviar o olhar.

Ele abaixou a cabeça, respirando fundo.

— Eu não consigo, Anne. Me desculpa — disse, abrindo a porta do carro.

Senti uma determinação surgir dentro de mim. Sei que, no fundo, ele tem vontade, mas parece ser dominado por suas próprias dúvidas.

Desci do carro e fui até ele.

— Vamos fazer assim: — parei ao seu lado para ele me escutar. — Eu fico com você no primeiro andar, onde tem menos gente e é mais tranquilo, pode ser? — sugeri, esperando uma reação.

— Eu não quero me aproximar de Deus, Anne, não insista — respondeu, caminhando em direção ao elevador privativo do estacionamento.

Suspirei profundamente, e silenciosamente fiz uma oração:

“Senhor, toca no coração de Isaque. Eu estou fazendo a minha parte”.

— Tudo bem — concordei, um pouco frustrada.

Chegamos ao andar do escritório, e ele parou à minha frente quando saímos do elevador.

— Sinceramente — suspirou. — só estou fazendo isso por sua causa.

Um sorriso imediato surgiu no meu rosto, e meus olhos brilharam. Eu queria gritar de felicidade ao ver que ele tinha aceitado ir à igreja.

— Então, amanhã é o jantar — falei, animada.

Ele sorriu de lado, balançando a cabeça.

— Passo para te buscar amanhã às 19h — ele disse, mordendo de leve os lábios com um semblante satisfeito.

Eu mal podia acreditar que tinha aceitado jantar com Isaque Campbell.

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