Capítulo 23 | Vestido Preto
Anne Green
Ao final do culto, apressei-me para sair e procurá-lo, mas ele já não estava mais lá. Certamente tinha ido embora para evitar falar com alguém.
— Procurando por Isaque? — Marcos apareceu do meu lado, com aquele sorriso que indicava que sabia mais do que estava disposto a dizer. Assenti sem pensar duas vezes. — Ele já foi. Inventou uma desculpa de que veio só para falar algo com o pai, mas não engoli essa. Se fosse isso, ele ligaria.
— Será que ele está com saudade da igreja? Ou quem sabe... está pensando em voltar? — murmurei, ainda buscando uma explicação lógica.
Marcos me olhou com uma expressão enigmática, como se soubesse algo que eu não.
— Tenho quase certeza de que tem um motivo bem específico para ele aparecer por aqui assim, de repente. Afinal, Isaque havia prometido que não pisaria mais na igreja. E, do nada, ele surge. Não te parece estranho?
A curiosidade me consumiu.
— E qual seria esse motivo? Você tem algo em mente?
Ele abriu um sorriso, pronto para me responder.
— Com certeza, tenho, e está bem à minha fren...
Melissa apareceu de repente, interrompendo o momento.
— Marcos? — Ela perguntou, sem perceber o que estava acontecendo. — Isaque ainda não voltou?
— Sumiu, não responde minhas mensagens — respondeu ele, visivelmente frustrado.
Eu queria saber o que ele estava prestes a revelar, mas Melissa o distraiu completamente. Quando estava prestes a insistir no assunto, senti meu celular vibrar no bolso. Desbloqueei a tela quase automaticamente, sem grandes expectativas.
Então, meu coração disparou. Era ele.
Isaque.
Ele começou com um pedido direto, mas que já demonstrava interesse:
Isaque: Você pode vir aqui?
Eu, ainda tentando entender a situação, perguntei:
Anne: Onde você está?
Isaque: No estacionamento do shopping, ALA C.
Ainda desconfiada, me perguntando se deveria mesmo ir, quis confirmar:
Anne: Está sozinho?
Isaque: Sim. Vem sozinha, e não se preocupe que não vou te sequestrar 😂
Eu sorri com a resposta, mas não perdi a chance de brincar de volta:
Anne: Acredito que você não seria capaz 😅
Isaque: Realmente eu não seria capaz de sequestrar uma bela donzela 😌
Anne: 🤭 Vou cumprimentar algumas pessoas aqui e chego aí.
Isaque: Recomendo que você venha até aqui de carro porque o caminho daí pra cá está sem muito movimento.
Aquilo me fez sorrir. Aquele cuidado em tão pouco tempo... mas eu sabia que havia algo mais. Respondi, já me sentindo mais à vontade:
Anne: Vou de carro, obrigada por dizer.
Isaque: Disponha. Estou te esperando 😉
Eu estava nervosa, o coração disparado e as mãos suadas, mas ao mesmo tempo tomada por uma empolgação irresistível para encontrar Isaque. No entanto, um lampejo de lucidez me fez parar e lembrar: eu precisava manter o controle, não podia me deixar levar. “Não se apaixone, Anne. Lembre-se de que ele não é cristão e não compartilha dos seus princípios”, repeti mentalmente, tentando me convencer.
— Por que esse sorriso de boba? — Layla perguntou, se aproximando com aquele ar curioso.
Mostrei as mensagens para ela, incapaz de conter um sorriso bobo que me escapava.
— Vai lá, menina! O príncipe está te esperando para um momento a sós! Anda logo! — exclamou, vibrando de entusiasmo.
Sua empolgação me pegou de surpresa. A possibilidade de ficarmos a sós nunca tinha passado pela minha cabeça. Um frio na barriga tomou conta de mim.
— Fala para o Daniel, o Marcos e a Melissa que eu precisei sair e depois converso com eles — disse, já me apressando para buscar o carro.
No caminho para o shopping, que ficava quase ao lado da igreja, a ansiedade tomou conta de mim. Eu não conseguia entender por que Isaque estava no estacionamento tão cedo, o que aumentava ainda mais a agitação dentro de mim. Meu estômago parecia um turbilhão e o coração batia a mil por hora, enquanto eu lutava para manter a calma.
Ao chegar na entrada do estacionamento, procurei uma vaga na ALA C, e de longe avistei a Maserati cinza de Isaque. O coração, que já estava acelerado, deu um salto inesperado.
Assim que estacionei, ele desceu do carro, encostando-se nele com as mãos enfiadas nos bolsos da calça preta, irradiando uma confiança que me deixou sem ar. A frieza que ele demonstrara no dia anterior parecia ter sumido, o que só aumentava o mistério sobre o motivo desse encontro. Não era para ser algo apenas profissional?
Desci do carro e caminhei em sua direção, sentindo uma tensão quase evidente no ar. A visão de Isaque ali, encostado na Maserati, o olhar fixo no meu, enquanto seus fios ondulados caíam despreocupadamente sobre a testa, me deixou completamente fascinada. A cada passo que eu dava, ele me estudava com os olhos, percorrendo meu corpo dos pés à cabeça. Meu coração parecia querer escapar do peito, e minhas bochechas queimavam tanto que eu podia jurar que estavam incandescentes.
O estacionamento estava deserto, apenas carros, motos e nós dois sob uma iluminação suave que tornava o ambiente intimamente silencioso. Um calor invisível que me fazia querer esquecer tudo. Se eu não tivesse meus princípios, teria coragem de beijá-lo ali mesmo, porque cada fibra do meu ser implorava por isso — tudo o que eu queria era estar perto dele.
Isaque pigarreou e afastou-se do carro assim que me aproximei.
— O que você quer falar comigo? — perguntei, parando em sua frente.
Ele era mais alto, e eu precisei erguer a cabeça para encarar seus olhos, que pareciam prender os meus.
— Boa noite, antes de mais nada — ele disse, e só então percebi minha falta de educação.
— Perdão, boa noite — respondi séria, ainda com a frieza de ontem pesando entre nós.
— Primeiro, quero pedir desculpas por ter sido grosseiro no jantar e frio ontem — ele disse, dando um passo à frente. Agora ele estava tão perto que eu podia sentir o calor sutil de sua presença.
— Frio? Você foi um bloco de gelo — retruquei, e ele riu.
Ah, aquele sorriso. O sorriso que me desmonta por completo.
— Segundo, quero te levar para tomar o melhor chocolate quente da cidade — ele disse, e a animação tomou conta de mim antes que eu pudesse disfarçar.
Ele lembrara do chocolate quente! A ideia de finalmente prová-lo me deixou quase eufórica.
— Não brinca! É aqui no shopping? — perguntei, feliz como uma criança.
— Sim. Quer ir?
— Claro que sim! — exclamei, incapaz de conter minha alegria.
Ele sorriu e balançou a cabeça, como se achasse meu entusiasmo divertido.
— Está rindo de quê, Isaque? — questionei, tentando recuperar minha seriedade.
— Estou começando a te conhecer, e acho interessante como você pode ser tão madura e, ao mesmo tempo, se empolgar tanto com um simples chocolate quente — ele comentou, e eu senti minhas bochechas corarem.
— E eu percebi que você adora rir de mim — retruquei, arqueando as sobrancelhas.
— Não estou rindo, apenas admiro isso em você, Cerejinha.
— Isaque, não me chame de Cerejinha! E eu nem sei de onde você tirou isso — resmunguei, revirando os olhos.
Por dentro, eu me sentia uma adolescente nervosa e empolgada, incapaz de controlar as emoções que ele despertava.
— Então, prometo parar, Srta. Anne — ele disse, recuperando a seriedade.
Eu sabia que ele estava brincando, mas não podia deixar que ele tivesse a última palavra.
— Por que Srta. Anne, Sr. Campbell? — perguntei, fixando meus olhos nos dele.
— Ou Cerejinha, ou Srta. Anne. Você escolhe.
— Para com isso, Isaque, e vamos logo tomar o chocolate quente porque eu estou morrendo de desejo — falei, me afastando.
Antes que eu pudesse dar mais um passo, ele me segurou delicadamente pelo braço. Meu corpo congelou instantaneamente. O brilho nos olhos dele encontrou o meu, e por um momento, o tempo pareceu parar.
— O que foi? — perguntei, a voz baixa e cuidadosa, tentando decifrar aquele olhar.
— Nada — ele murmurou, soltando meu braço com a mesma suavidade. — Vamos?
— Claro. — Sorri, tentando esconder o turbilhão que ele deixara dentro de mim.
Entramos no elevador rumo ao andar superior do shopping, e o silêncio nos envolveu. O perfume marcante de Isaque preenchia o pequeno espaço, invadindo meus sentidos e me fazendo suspirar, sem que eu conseguisse evitar.
— Eu vi que você esteve na igreja hoje — comentei, tentando quebrar o silêncio entre nós.
— Foi coisa rápida — ele respondeu, sem muitos detalhes.
— As pessoas ficaram agitadas quando te viram, como se você fosse uma celebridade internacional.
O elevador se abriu no andar desejado e saímos juntos.
— Eu percebi o alvoroço. Ninguém esperava me ver ali.
— Nem eu esperava — confessei, enquanto caminhávamos lado a lado pelo shopping.
— Isso não vai se repetir — afirmou ele com firmeza. Achei melhor não comentar nada para não repetir o clima estranho do jantar.
De repente, ele parou diante de uma vitrine e apontou para um vestido preto elegante, exposto com perfeição.
— Aquele vestido é a sua cara.
Eu me aproximei do vidro, encantada com a peça.
— É perfeito! — exclamei, admirando cada detalhe.
Isaque se posicionou ao meu lado, observando atentamente o vestido.
— Quer experimentar? Acho que vai ficar incrível em você — disse, e meu rosto esquentou com o elogio.
— E desde quando um homem tem paciência para esperar uma mulher experimentar roupas? — brinquei, tentando aliviar a tensão.
Ele sorriu de lado, com aquele ar confiante que parecia dizer que estava disposto a esperar o tempo que fosse.
— Quero mesmo ver você usando esse vestido. Se gostar, será meu primeiro presente para você.
A ideia me deixou tentada. Mordi os lábios, pensando se deveria aceitar.
— Então você me diz se ficou bom, certo? — perguntei, caminhando em direção à loja.
Ele assentiu, e entramos juntos.
Falei com a vendedora, que prontamente buscou o vestido para mim. Enquanto isso, notei que as meninas na loja não desgrudavam os olhos de Isaque. Algumas eram tão lindas que poderiam ser modelos, mas ele não parecia dar atenção a nenhuma delas. Na verdade, ele não tirava os olhos de mim.
No provador, vesti o modelo com cuidado. O vestido era longo e elegante, com um corte acinturado, uma fenda discreta na perna direita, gola alta e sem mangas. Ao me olhar no espelho, senti que ele parecia feito sob medida para mim.
Saí do provador e encontrei Isaque sentado em um banco de frente para os provadores, esperando por mim. Quando nossos olhares se cruzaram, seus olhos quase saltaram para fora ligeiramente, e ele me estudou dos pés à cabeça sem disfarçar.
— Ficou... — ele se levantou devagar, ainda me observando. — Perfeito em você.
— Obrigada — respondi com um sorriso, mas provoquei: — Embora eu ainda não tenha certeza se gostei.
Na verdade, eu amei o vestido, mas ver Isaque se atrapalhar nos elogios era mais divertido do que admitir isso.
— Anne, você está... — ele começou, mas desviou o olhar, como se precisasse se recompor.
— Estou...? — provoquei, arqueando as sobrancelhas.
— Linda — completou ele, e seus olhos encontraram os meus com uma intensidade que fez meu coração acelerar.
— Vai levar? — a vendedora perguntou, interrompendo o momento.
Levei o vestido até o caixa, mas antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, Isaque tirou o cartão da carteira e pagou, entregando a sacola em minhas mãos como um presente.
— Obrigada, Isaque — agradeci com um sorriso sincero.
— Por nada — respondeu ele, breve e direto, mas havia algo nos seus olhos que parecia dizer muito mais do que as palavras que usou.
Saímos da loja e, enquanto caminhávamos, uma curiosidade se formou em mim. Não consegui resistir.
— Por que você gostou do vestido?
— Preto é a minha cor preferida, e ele destacou os seus olhos — respondeu com simplicidade, mas suas palavras fizeram meu rosto corar instantaneamente.
Andar com Isaque era como acompanhar uma celebridade. Ele atraía olhares por onde passava, como se carregasse uma aura magnética que o tornava irresistível aos olhos das mulheres. No entanto, ele não dava a mínima para nenhuma delas. Não desviava um olhar sequer. Tudo nele transmitia uma confiança serena e desinteressada, o que só aumentava seu charme.
Quando chegamos à cafeteria, fui surpreendida pela beleza e aconchego do lugar. Tons suaves de azul, mesas brancas lembrando jardins românticos, e uma vitrine repleta de doces, bolinhos, tortas, salgados e bebidas tentadoras. Meus olhos brilharam.
— Se Layla estivesse aqui, ela ia surtar — comentei, imaginando a empolgação da minha amiga diante de tantas delícias. — Que lugar lindo, Isaque.
— Normal — ele respondeu, sem demonstrar entusiasmo.
Eu revirei os olhos, divertida.
Nos acomodamos em uma mesa perto da janela, e ele fez o pedido sem hesitar: dois chocolates quentes da casa. Segundo ele, era o melhor da cidade.
Enquanto esperávamos, senti seu olhar em mim várias vezes, embora ele tentasse disfarçar.
— Me tira uma dúvida — falei, atraindo sua atenção. — Isso aqui não tem nada de profissional, não é, Isaque?
Ele sorriu, aquele sorriso travesso que fazia meu coração bater mais rápido.
— Já pedi desculpa por aquele meu comportamento. E qual o problema de convidar uma colega de trabalho para um chocolate quente no domingo à noite? — perguntou, arqueando uma sobrancelha. — Mas, para cumprir o combinado de manter nossas conversas no âmbito profissional, podemos falar das planilhas pendentes, que tal?
— De jeito nenhum! Hoje é domingo, relaxa — protestei, cruzando os braços.
Ele riu, ajeitando-se na cadeira.
— Então apenas aproveita, Anne. Prometo que serei uma boa companhia. — Ele piscou, me fazendo sorrir.
— Vamos ver se esse chocolate quente é realmente o melhor da cidade — provoquei.
— Se eu estiver certo, o que eu ganho?
Fiquei alerta.
— O que você quer? — perguntei, receosa da resposta.
Ele fez uma pausa, o sorriso cheio de mistério.
— Se for o melhor chocolate que você já experimentou, você faz o que eu quiser. Se não for, eu faço o que você quiser. Só não vale blefar.
Refleti por um momento, mas acabei aceitando o desafio.
— A hora da verdade chegou — declarei, observando a atendente trazendo nossos chocolates à mesa.
— Obrigado — ele agradeceu, e a moça não conseguiu esconder o encantamento enquanto o encarava.
Peguei a xícara e dei o primeiro gole. Assim que o líquido quente tocou minha língua, fechei os olhos, saboreando. Era uma explosão de doçura perfeita.
Quando abri os olhos, encontrei Isaque me observando com uma expressão de expectativa e diversão.
Eu já sabia. Ele tinha razão. Era o melhor chocolate quente que já provei na vida.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro