Capítulo 17 | Propósito
Anne Green
O modo como ele me olhava deixava uma certa apreensão no ar. Eu sentia um frio na barriga. Se Layla estiver certa, e ele realmente se declarar, não faço ideia de como vou reagir. A tensão estava evidente, mas não tinha como fugir do momento.
— Pode falar, Dan — disse, tentando soar confiante, mas meu coração estava disparado.
— Então...
Antes que ele pudesse continuar, o garçom chegou com as batatas fritas e dois coquetéis de frutas sem álcool, interrompendo o início de sua fala. A mesa se encheu do cheiro delicioso da comida, mas a tensão entre nós permaneceu.
— Como eu estava dizendo... — Dan pigarreou, buscando retomar a coragem. — Nos conhecemos há um bom tempo e sempre tivemos uma boa relação, certo? — Ele fez uma pausa, o nervosismo evidente na forma como tamborilava os dedos sobre a mesa.
Assenti, incentivando-o a continuar. Eu já previa o que viria a seguir, mas não estava preparada.
— Sempre te admirei. Você é uma mulher sábia, uma cristã exemplar, entre tantas outras qualidades que me encantam... — Ele soltou uma risada leve, tentando quebrar a tensão.
Sorri com a sinceridade de suas palavras, e, embora estivesse tocada, não sabia ao certo como reagir. Minhas mãos, quase involuntariamente, brincavam com a pulseira no meu pulso enquanto tentava manter a atenção no que ele dizia, sem deixar transparecer a confusão dentro de mim.
— Obrigada — respondi, com um sorriso tímido, sem saber o que mais dizer naquele momento.
— Vou ser direto porque estou bem nervoso — ele sorriu, o nervosismo evidente. — Eu gosto de você, Anne. Queria saber se você acha que eu teria alguma chance de conquistar seu coração, de termos algo sério. Sei que nos reencontramos há pouco tempo, mas já nos conhecemos há muito, e esse sentimento sempre esteve aqui. Não quero mais adiar isso.
Suas palavras fizeram meu coração disparar ainda mais. Daniel sempre foi um homem atraente, bonito e de muitas qualidades. Ele era dedicado a Deus, inteligente, alguém com quem era fácil conversar. Mas, por mais que tudo nele fosse louvável, eu nunca o vi de forma romântica. Além disso, Layla, minha melhor amiga, era apaixonada por ele, e isso tornava a situação ainda mais delicada.
Poderia dar uma chance a Daniel? Talvez. Ele era o tipo de homem que muitas mulheres considerariam perfeito. Mas algo em mim hesitava, como se algo não se encaixasse, e o fato de saber dos sentimentos de Layla me fazia sentir ainda mais culpada.
Nesse momento, o garçom retornou, agora com uma pizza fumegante. O aroma encheu o ar, e por um instante, nos distraímos com a visão da massa dourada e do queijo derretido. Era como se o simples ato de comer nos desse uma pausa, uma chance de respirar antes de enfrentar novamente a seriedade da conversa.
Ele serviu as fatias, distribuindo também as bebidas, e nos desejou uma boa refeição antes de se retirar. Aproveitamos o momento para elogiar a pizza, mas era claro que Dan não havia esquecido a pergunta pendente.
— E então, Anne? — Ele me olhou com expectativa, aguardando minha resposta.
— E-eu... — Respirei fundo, buscando coragem. — Você me pegou de surpresa, Dan — admiti, torcendo os lábios e desviando o olhar por um segundo.
— Eu não espero uma resposta definitiva agora — ele se apressou em dizer, tentando me aliviar. — Pensei que, talvez, pudéssemos fazer um propósito juntos. O congresso está chegando, certo? Podemos orar durante até lá, e quando voltarmos, se for da vontade de Deus e você quiser, podemos conversar novamente sobre isso. O que acha?
A ideia, de certa forma, parecia sensata. Não era uma pressão imediata e me dava tempo para refletir. Daniel era um homem agradável, e talvez até fosse possível que, com o tempo, eu desenvolvesse sentimentos por ele. Mas a sombra de Layla pairava sobre cada pensamento. Como eu poderia aceitar, sabendo o quanto ela gostava dele?
“O que eu faço, Senhor?”, pensei.
Enquanto a dúvida me consumia, minhas expressões entregavam meu conflito interno. Brincava com minha pulseira, suspirava e desviava o olhar, sem saber ao certo o que fazer.
— Dan, eu gostei da sua proposta, de verdade. E, sinceramente, acho que poderia aceitar agora mesmo. Mas eu preciso de um tempo para pensar, pelo menos até amanhã. Pode ser? — perguntei, esperando que ele compreendesse.
— Claro, Anne. O tempo que você precisar — respondeu, com um sorriso tranquilo.
Eu senti um alívio imediato, mas sabia que, ao chegar em casa, minha mente estaria a mil, especialmente ao pensar em como contar tudo isso a Layla.
Mudamos de assunto rapidamente, afastando a tensão da declaração. Conversamos sobre coisas aleatórias, rimos, brincamos e, claro, saboreamos a sobremesa com satisfação. A noite na pizzaria com Daniel, apesar do início inesperado, acabou sendo muito divertida. Passei um tempo leve e agradável com ele, e, tirando o fato de que fui pega de surpresa com seus sentimentos, o resto da noite foi tão bom que eu certamente repetiria.
Quando Daniel pediu a conta, eu insisti em dividir, mas ele fez questão de pagar tudo. Foi nesse momento que nossas atenções foram capturadas por vozes familiares. Marcos entrou na pizzaria com uma garota ruiva, e, logo atrás, Isaque e Gabi apareceram também. Não pude evitar olhar para Isaque; ele vestia uma camisa preta, shorts de linho branco e um tênis que complementava perfeitamente seu visual. Ele estava incrivelmente charmoso. Meu coração, que ainda processava a declaração de Daniel, disparou de novo, mas dessa vez por outra pessoa. Como isso era possível? Eu não deveria sentir isso. Eu não poderia estar sentindo algo por Isaque!
— Não acredito — Daniel murmurou, franzindo os lábios. — Justo hoje? O que eles estão fazendo aqui?
— Boa pergunta — concordei, ainda surpresa.
Eles nos viram e se aproximaram. Gabi, com um sorriso forçado, já parecia desconfiada ao nos ver juntos. Marcos e Isaque estavam confusos, e a ruiva, que eu não conhecia, parecia mais amigável. Provavelmente era Melissa, a noiva de Marcos, de quem já tinha ouvido falar.
— O que estão fazendo aqui, amores? — Gabi perguntou com sua típica voz monótona.
— Oi, acho que não nos conhecemos ainda — disse a ruiva com um aceno simpático. — Sou Melissa.
— Prazer, sou Anne — respondi, apertando sua mão. Ela parecia bem diferente de Gabi, o que me tranquilizou.
— O que fazem aqui sozinhos a essa hora? — Isaque perguntou, franzindo o cenho, como se estivesse questionando nossa presença ali.
— Vocês... — Marcos começou a insinuar algo, apontando o dedo, um mal-entendido óbvio em sua expressão.
— N-não! — me apressei em corrigir, quase desesperada. Daniel balançou a cabeça em negação.
— Boa noite para vocês também — ironizou Daniel, tentando manter a tranquilidade. — Amigos não podem sair para comer depois de um bom culto?
— Claro, acho isso ótimo — Gabi respondeu, mas havia uma ponta de malícia em sua voz.
— Está melhor, Mel? — Daniel perguntou à ruiva, mudando o tom para algo mais amistoso.
— Sim, graças a Deus! Esses anjos aqui cuidaram muito bem de mim — ela respondeu, com um sorriso genuíno.
Isaque, por sua vez, parecia menos à vontade.
— Já estão de saída? Porque poderíamos nos sentar todos juntos — ele sugeriu, olhando para Daniel e para mim.
— Já estamos de saída — respondeu Daniel, claramente desconfortável, enquanto pegava a carteira para pagar.
Gabi apontou para uma mesa vazia com quatro cadeiras, insistindo:
— Podemos nos sentar ali, querido.
Ele a ignorou completamente, chamando o garçom para juntar as mesas.
Eu posso estar enganada, mas observar Marcos e Melissa juntos como um casal e, ao mesmo tempo, Isaque e Gabi interagindo, me deu a impressão de que eles também estão envolvidos em algo. Havia uma certa tensão no ar, uma cumplicidade discreta entre os dois, que me fez pensar se talvez houvesse mais entre eles do que simples amizade. Mesmo que Gabriela parecesse incomodada por Isaque estar perto de mim, sua admiração constante por ele não passou despercebida.
Foi impossível para nós simplesmente levantar e sair. A iniciativa dele nos pegou desprevenidos. Daniel e eu nos entreolhamos, sem saber o que fazer. Estava claro que Daniel não gostou nada da situação, e eu também não entendia por que Isaque estava sendo tão insistente.
— Já que insiste... — Daniel pigarreou, ajeitando a manga da camisa, resignado.
A noite, que havia começado tranquila e até divertida, agora parecia caminhar para algo mais complicado, e eu mal sabia como lidar com todos esses sentimentos conflitantes que estavam surgindo de uma só vez.
O garçom juntou as mesas, e logo Isaque se sentou ao meu lado, fazendo-me suspirar com seu perfume intenso e marcante. Seus olhos cor de mel encontraram os meus, e senti um arrepio percorrer meu corpo. Nesse instante, pensei: "Como vou aceitar um relacionamento com Daniel se não sinto o mesmo por ele? Não estremeço nem sinto borboletas no estômago como sinto com Isaque." Mas logo interrompi meus pensamentos, desviando o olhar para qualquer coisa que não fosse ele.
— Sua amiga, Layla, pediu para me seguir no Instagram — sua voz grave capturou toda a minha atenção, e o rubor rapidamente subiu ao meu rosto.
Eu não acredito que Layla fez isso!
— Se ela não fizesse, não seria Layla — murmurei, sem pensar, e me dei conta de que ele ouviu.
— E como ela me conhece? — ele perguntou, levantando uma sobrancelha, curioso. Meu coração acelerou. Será que ele pensa que eu falo sobre ele?
— Esther — respondi rápido, quase sem pensar. — Layla segue sua irmã. Provavelmente viu seu perfil nos amigos em comum e decidiu seguir — falei, tentando soar convincente. Isaque apenas ergueu uma sobrancelha, como se ainda estivesse desconfiado.
Antes que eu pudesse acrescentar algo, Marcos interrompeu a conversa.
— Anne, domingo eu e Melissa vamos visitar sua igreja — disse Marcos, e Melissa concordou com entusiasmo.
— Que ótimo! — respondi, sorrindo. — Se tiverem interesse, podem até se inscrever para o congresso de jovens.
— Perfeito, Anne. O Marcos já me falou do congresso, fiquei empolgada — Melissa comentou. — Já participei antes, quando Isaque era líder. Lembro de fazermos luau, ele tocava violão e eu cantava. Sinto falta dessa época — ela disse, olhando de maneira sugestiva para Isaque, que a observava em silêncio.
— Isaque deveria ir para o congresso também. Gabriela vai viajar durante a semana toda, então ela não vai. E Daniel, com certeza, deve ir — Marcos afirmou com naturalidade.
— Por que com certeza? — Daniel retrucou, levantando uma sobrancelha.
— Tenho compromissos — Isaque disse, desviando o assunto.
— Só presumi — Marcos deu de ombros, lançando um sorriso travesso para mim e Daniel.
— Isaque sempre tem compromissos aos domingos para não ir à igreja — brincou Daniel, rindo.
— Sou um homem ocupado, mesmo aos domingos — Isaque respondeu com um sorriso contido, enquanto olhava o cardápio.
O assunto mudava constantemente: carros, futebol, trabalho, e histórias antigas. Isaque falava pouco, mas se iluminava ao discutir sobre carros, e Melissa o complementava, discutindo suas composições musicais. Isaque ajudava comentando sobre notas de violão, enquanto eu admirava a interação entre Marcos e Melissa, percebia o quanto eles se encaixavam. Pareciam feitos um para o outro.
Melissa é completamente diferente da irmã. Enquanto Gabi é falsa e presunçosa, Melissa é doce e amável, sempre falando com paixão sobre Deus e suas composições. Mal posso esperar para vê-la cantar, e o melhor é que ela aceitou o convite para cantar na igreja no domingo, junto com Marcos.
Gabriela não parava de admirar Isaque o tempo todo, mas ao mesmo tempo, parecia fumegar de raiva por ele estar sentado ao meu lado. Daniel, por outro lado, mantinha os olhos fixos em mim, e eu tentava evitar qualquer olhar que pudesse denunciar alguma coisa. Enquanto isso, Isaque apenas observava tudo, principalmente eu e Daniel, sem se envolver diretamente.
Quando a pizza deles chegou, como nós já tínhamos terminado, Daniel pagou a conta e nos levantamos para ir embora.
— Até sábado, Anne — disse Melissa, sorrindo.
— Nos vemos no sábado — respondi ao casal.
— Tchau, pombinhos — brincou Gabi, com um sorriso malicioso. — O que foi? Só estou brincando — ela disse, ao notar os olhares repreensivos.
— Gabriela, melhor tomar cuidado com esse álcool — zombou Daniel, referindo-se ao fato de que só ela havia pedido um coquetel alcoólico, enquanto até Isaque optou por um sem álcool.
— Sei muito bem me cuidar, querido — retrucou ela.
— Tchau, pessoal — Daniel se despediu enquanto nos afastávamos da mesa.
— Até amanhã, Anne — disse Isaque, seus cabelos caindo levemente sobre a testa, e seus olhos, que eu não conseguia parar de admirar, fixos nos meus com um olhar sereno e carinhoso.
Marcos pigarreou, interrompendo o momento.
— Amanhã? Não era feriado? Achei que não iríamos trabalhar — disse Gabi, preocupada.
— Amanhã não trabalhamos, só sábado. Sábado teremos uma reunião importante, então vamos precisar ir para a empresa — respondeu Melissa.
— E como você sabe? Como Isaque vai ver ela amanhã, então? — Gabi questionou, desconfiada.
— Sou gerente do RH, esqueceu? — Melissa revirou os olhos.
— Gabriela, para de ser maluca e curiosa. Amanhã não temos expediente — zombou Isaque.
Eu me despedi rapidamente, antes que houvesse mais perguntas, e senti o olhar de Isaque me acompanhando enquanto me afastava.
Do lado de fora do restaurante, Daniel me deu um abraço e um beijo suave na testa.
— Pensa com carinho — ele disse, se afastando levemente, ainda perto do meu rosto.
— Vou pensar, sim — respondi com um sorriso gentil.
Entrei no carro e fechei a porta. Encostei a cabeça no banco e suspirei, confusa. Eu realmente não sabia o que fazer. Isaque parecia estar em todos os meus pensamentos, mesmo tendo acabado de conhecê-lo, enquanto a declaração repentina de Daniel me colocava em um dilema difícil de resolver.
E, para piorar, como eu vou contar isso para Layla?
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