Capítulo 10 | Gocce di Caffè
Anne Green
— Você vai se atrasar logo no segundo dia, querida? — gritou minha mãe ao entrar no quarto, puxando as cortinas e deixando a luz invadir o ambiente.
Instintivamente, apertei os olhos e cobri-os com a mão, tentando me proteger da claridade repentina. Quando finalmente consegui me acostumar, espreguicei-me e olhei para minha mãe, que estava com um cesto de roupas sujas, recolhendo mais peças da cadeira da escrivaninha para lavar.
— Que horas são? Meu celular não tocou — perguntei, ainda com a voz rouca de sono, enquanto sentia Molly, minha bolinha de pelos, se esfregando nos meus pés. Ela sempre dormia comigo, mesmo tendo sua própria caminha bem ao lado da minha.
— São 6:30 — respondeu minha mãe, e eu pulei da cama tão rápido que fiquei tonta. Estava atrasada! Precisava sair de casa às 7h, e mal teria tempo de tomar café. — Achei estranho você ainda não ter descido, mas imaginei que estivesse se arrumando aqui.
— Nem ouvi o despertador! Deus te mandou aqui, senão estaria dormindo até agora — falei enquanto corria para o banheiro, já sabendo que não teria tempo para um banho.
— Te espero lá embaixo. Pelo menos toma um café rápido — disse minha mãe, fechando a porta.
Fiz minha higiene, vesti uma roupa social, coloquei os saltos e ondulei os cabelos. Fiquei na dúvida sobre a maquiagem, mas optei por algo discreto, com tons neutros. Quando estava prestes a sair do quarto, Molly bloqueou a porta, latindo sem parar. Seus potes de água e ração estavam cheios, então não era fome. Quase me irritando com seus latidos insistentes, me lembrei: eu ainda não havia orado.
Voltei, ajoelhei-me na cama e comecei uma oração rápida, mas logo percebi que não podia apressar esse momento. Eu estava falando com o Dono do tempo, então não fazia sentido orar com pressa. Decidi dar a Deus toda a prioridade que Ele merecia.
Ao terminar, um versículo veio à minha mente: “Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas serão acrescentadas a vocês”. Mateus 6:33. Era a confirmação de que eu não poderia abrir mão da minha prioridade.
Agora sim, Molly me deixou sair do quarto. Desci as escadas correndo, cumprimentei meus pais rapidamente na cozinha e fui direto para o hall pegar minha bolsa. O relógio no meu pulso marcava 6:58. Eu tinha que estar na empresa às 7:30, mas o trânsito não ajudaria, então precisava sair imediatamente.
Apesar das insistências dos meus pais para que eu tomasse um café com o bolo de leite que minha mãe fez na noite anterior, pedi que ela embrulhasse um pedaço para eu comer mais tarde.
Coloquei a bolsa no banco do carona, liguei o carro e, antes de sair, meu celular tocou. Olhei para a tela com as sobrancelhas franzidas, mas logo senti meu coração acelerar ao ver quem era.
— Bom dia! Já está a caminho? — a voz dele estava rouca, mas estranhamente reconfortante.
— Estou saindo agora. Alguma coisa?
— Será que você poderia passar na cafeteria Gocce Di Caffè, que é no seu caminho, e pegar um café pra mim? Se não for incômodo.
Arqueei as sobrancelhas com o pedido. Eu sou assistente financeira, não dele. Mas, como era no caminho, não custava nada. O que me intrigava era a maneira como ele parecia tentar criar intimidade. Ontem, me chamou de “cerejinha”. Hoje, estava me ligando às 7h da manhã para pedir um café. Interessante.
— Tudo bem — respondi. — Alguma preferência?
— Mocaccino. Posso te transferir o dinheiro. Qual é seu Pix?
— Não precisa — respondi, tentando ser gentil.
— Sério, vou te mandar o Pix — insistiu, mas não queria aceitar.
— Só um café, então?
— Isso.
— Ok, estou indo — finalizei.
Após desligar, dei partida no carro e segui para a cafeteria. Quando cheguei lá, senti um par de olhos me observando. Ao virar, vi Daniel, segurando dois copos de café.
— Bom dia! — Cumprimentou com um sorriso largo. — Você também gosta do café daqui?
— Bom dia! Na verdade, o Isaque me pediu para passar e pegar um pra ele — respondi, ainda surpresa com o pedido.
Ele ergueu as sobrancelhas, incrédulo.
— Segundo dia e ele já te mandou comprar o café, aqui, na cafeteria favorita dele? — Perguntou, como se fosse algo extraordinário.
— Sim, por quê?
— Porque o Isaque é extremamente exigente com café. Não deixa ninguém comprar pra ele, só ele mesmo — explicou, tirando o celular do bolso. — Ele sempre checa se a temperatura está perfeita, nem quente demais, nem morna. Sério, ele é um verdadeiro viciado em café.
Ri do jeito como Daniel falou, mas levei um susto ao olhar no relógio e ver que já eram 7h20. Nem percebi o tempo passar.
— Dan, estou atrasada! — exclamei em pânico. — Preciso pedir logo o café! — corri até o balcão.
Aguardei impaciente, tentando manter a calma. Logo uma atendente jovem, visivelmente mais nova que eu, apareceu com toda a tranquilidade do mundo para me atender.
— Dois mocaccinos e um croissant de chocolate com morangos, por favor — pedi rapidamente. Ela assentiu, caminhando com calma para preparar o pedido.
Enquanto esperava, comecei a balançar as pernas de ansiedade, já antecipando o que Isaque diria sobre meu atraso.
— Relaxa, Anne, foi ele quem te pediu pra vir aqui. Ele sabe que demora — disse Daniel, colocando a mão sobre meu ombro, tentando me acalmar.
— Só não quero problemas — murmurei.
— E não vai ter — respondeu com suavidade, encarando-me nos olhos.
Notei, naquele olhar brilhante, o mesmo carinho que ele me dedicava nos tempos da faculdade. Daniel gostava de mim mais do que como amiga, e agora eu me perguntava se aqueles sentimentos estavam voltando. Mas, infelizmente, eu não sentia o mesmo e não queria alimentá-los.
Desviei o olhar e pigarreei.
— Obrigada.
A atendente colocou o pedido sobre o balcão e finalizei o pagamento. Agradeci rapidamente e caminhamos até a saída.
— Nos vemos na empresa — despediu-se Daniel com um sorriso contido.
Entrei no carro e, sem hesitar, acelerei. O tempo era curto e eu já estava atrasada.
Estacionei no espaço reservado aos funcionários e avistei a Maserati de Isaque. Olhei no relógio: 7h45. Quinze minutos atrasada. A ansiedade me dominava.
O croissant que eu tinha devorado no carro já me salvava da fome naquele momento, senão a situação seria pior.
Peguei o elevador e, para minha surpresa, lá estava Gabi, com uma pasta em uma mão e o celular na outra.
— Chegando só agora? — perguntou, com seu tom falsamente amistoso. O desdém no rosto dela era inconfundível.
— Sim — respondi de forma breve, sem vontade de prolongar a conversa.
— Isaque não gosta de atrasos — soltou uma risadinha sarcástica.
"Eu não te perguntei", pensei.
— Não precisa se preocupar, ele mesmo pediu para eu buscar o café dele — rebati, enquanto ela lançava um olhar fulminante para os copos que eu segurava.
Chegamos ao andar e saímos sem trocar mais nenhuma palavra. O ciúme estava evidente no rosto dela, ao saber que Isaque confiava em mim para buscar seu café.
Respirei fundo, engoli a ansiedade e encostei meu cartão de acesso na fechadura digital. A porta destravou com um clique suave. Entrei com passos hesitantes.
Os olhos cor de mel de Isaque encontraram os meus, e um pequeno, quase imperceptível, sorriso desenhou-se em seus lábios perfeitamente esculpidos. Ele não estava nem um pouco irritado, ao contrário do que eu temia.
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