Capítulo 08 | Pudim Caramelizado
Anne Green
A caminho do restaurante onde Layla almoçava com Lucas, seu irmão mais velho, um único pensamento dominava minha mente: o apelido.
Como ele ousou? Em questão de horas desde que nos conhecemos, Isaque já me chama por um apelido carinhoso? E por que, afinal, eu não o impedi? Era como se algo em nós se conectasse, como se já tivéssemos nos encontrado antes. — Refletia, sem conseguir disfarçar a inquietação.
Eu sempre fui confiante, mas de alguma forma, Isaque conseguira me deixar vulnerável. Precisava cortar qualquer tentativa dele de ultrapassar a barreira profissional. Fui avisada sobre sua fama de mulherengo e sobre como as mulheres se rendem aos seus pés, sem negar sua beleza estonteante. Mas eu? Eu não sou como elas. Tenho princípios sólidos, e Isaque, claramente, já os deixou para trás. Não quero ser mais uma de suas conquistas fáceis.
Ao chegar no restaurante rústico, avistei Layla no primeiro andar. Ao seu lado, um homem loiro e fardado tomava um suco amarelo. Quando me viu, seus olhos brilharam, e um sorriso aberto tomou conta de seus lábios.
— Só assim pra te ver, Anne! — Lucas disse, levantando-se para me abraçar.
— Pois é, já faz um tempo! — Respondi com um sorriso. — Como você está, Lucas?
— Estou bem, e você? Pelo visto, está ótima! — Ele comentou, me lançando um olhar observador.
— Obrigada. — Sorri educadamente.
— Claro que está ótima, afinal, conheceu o Isaque. — Layla disparou sem qualquer sutileza. Lhe lancei um olhar repreensivo, mas já era tarde.
— Quem é Isaque? — Lucas perguntou curioso.
— A ovelha perdida da igreja. — Layla respondeu, levando um garfo de alface à boca.
— Não acho certo chamá-lo assim. Devemos profetizar que ele voltará para Cristo, não concorda? — Argumentei, tentando desviar a conversa.
— Defendendo ele, irmãzinha? — Layla zombou, mas seu sorriso era brincalhão.
— Esse tal de Isaque é o homem que você tanto pediu a Deus? — Lucas questionou, mastigando alguns tomatinhos cereja.
— De jeito nenhum! — Exclamei quase rindo. — Primeiro, eu não estou procurando relacionamento, e segundo, ele nem é cristão. Seus valores são completamente diferentes dos meus.
— Talvez você seja o instrumento para trazê-lo de volta para Cristo. — Layla disse, arqueando as sobrancelhas em provocação.
— Ah, por favor, não vem com essa de “namoro evangelístico”. Esquece isso, Layla. Ele não é para mim.
— Mas me diga, ele é bonito pessoalmente? — Ela perguntou, curiosa, e eu não consegui conter um leve sorriso.
— É... normal. — Tentei disfarçar.
— Não acredito nesse “normal”. — Lucas fez aspas com os dedos, e Layla riu em cumplicidade.
— Ele é um homem de 25 anos, bem-sucedido na empresa, impecavelmente vestido e com grande influência, apenas isso. — Declarei com uma falsa indiferença, ainda que não pudesse negar a mim mesma a beleza impressionante de Isaque.
— Sei... — Layla ironizou. — Seus olhos dizem outra coisa.
— Nada a ver. — Afirmei, desviando o olhar para mudar de assunto. — E ninguém aqui me oferece nada?
— Você já almoçou e ainda quer mais? — Lucas perguntou rindo.
— Sempre tem espaço para uma sobremesa. — Falei, pegando o cardápio.
Mesmo tendo almoçado em outro lugar, não resisti ao pudim caramelizado. Chamei o garçom e fiz meu pedido, que prontamente anotou em um tablet.
— Tenho algo para contar, mas já sei que você vai surtar, Layla. — Confessei, atraindo toda a atenção dela, que largou o garfo para me ouvir.
— Conta logo!
— Ele me chamou de “cerejinha”. — Falei, apertando os lábios.
Layla soltou um gritinho de excitação, seus olhos brilhando de alegria. Ela era uma romântica incorrigível.
— Cerejinha? Por quê? — Lucas perguntou, enfatizando o apelido.
Eu não queria admitir que era por causa das minhas bochechas, mas sabia que era esse o motivo.
— O ponto não é o motivo. É a audácia dele, de me dar um apelido tão rápido! — Reclamei, fingindo irritação.
— Então, por que você não o impediu? — Layla perguntou, provocativa.
— Na próxima vez, vou fazer isso. — Respondi, tentando soar firme. — Foi muita ousadia!
— Amiga, acho que ele está interessado em você. — Layla sorriu, como se estivesse torcendo por nós dois.
— Eu não entendo... — Comecei a falar, mas fui interrompida pelo garçom, que trouxe o pudim à mesa. — Você acha que, só porque ele é filho de pastor, isso o torna o homem ideal para mim? Ser filho de pastor não garante nada.
Mas, por dentro, a incerteza continuava a me assombrar.
— Não é isso, amiga, na verdade é porque, às vezes, eu sinto que ele pode se arrepender e voltar a qualquer momento, mesmo sem o conhecer de verdade. Mas tudo o que dizem sobre quem ele era antes me faz acreditar que o chamado dele ainda não acabou, apenas está travado por ele mesmo, esperando o momento certo para reacender — disse ela, olhando nos meus olhos. Minhas ideias se perderam nas palavras de Layla, como se fizessem sentido. — Por isso penso que você possa ser um instrumento na vida dele. — Quando ela disse isso, interrompeu meus pensamentos no mesmo instante.
— Você está pensando longe demais — respondi, enquanto levava à boca um pedaço do pudim. Estava maravilhoso, suculento e bem caramelizado.
Pudim sempre foi minha sobremesa preferida. Não importa se estou triste ou com raiva, basta um pudim para me alegrar na hora. Meu irmão sempre fazia isso quando me irritava e queria fazer as pazes.
— A conversa está ótima, mas vou ter que voltar ao trabalho — Lucas disse, tirando a carteira do bolso. — Foram cinco roubos hoje de manhã, nas mesmas ruas e em horários próximos. Um caos, gente correndo e gritando por todo lado — ele disse, levantando-se. — A conta já está paga.
— Obrigada, maninho — Layla agradeceu.
— Vida de policial é só correria — comentei, sorrindo para ele. Ele assentiu e devolveu o sorriso.
— Até mais, Anne! — disse, me dando um beijo na testa. — Tchau, Lay — despediu-se da irmã com um beijo na testa também, e saiu.
Lucas sempre foi um irmão presente para Layla. Ele escolheu ser policial logo após o ensino médio, e desde então é um excelente profissional. Sempre tive um carinho especial por ele, quase como um irmão, já que o meu não está mais presente. Lucas preenche esse vazio. Ele é realmente um homem de bem.
— Então... — Layla captou minha atenção, que estava focada no pudim.
— Então o quê?
— Agora somos só nós duas. Me conta sobre o Isaque. — Ela estava esperançosa, não iria desistir facilmente.
— Amiga, sinceramente, não tenho interesse — respondi com um tom educado, mas direto. Ela pareceu desapontada.
— Então... Me conta sobre o Daniel — ela disse, mudando de assunto. — Você me disse no WhatsApp que reencontrou com ele.
— Ah, sim, verdade! — Exclamei, empolgada. — Ele está tão diferente... Por que vocês não voltam a ser amigos? Vocês eram tão próximos.
— Não temos mais contato, lembra?
— Posso te passar assim que eu conseguir.
— Melhor não. Seria muito fácil eu voltar a sentir algo por ele, e quero focar na minha promoção na empresa — ela disse, tomando um gole de água e mordiscando um pedaço do pudim.
— Ele, sim, é uma boa pessoa para você se reaproximar — comentei. — Cristão, boa aparência, gentil, excelente profissional...
— Que só queria minha amizade, até porque sempre foi apaixonado por você, e você sabe disso.
— Foi um livramento naquela época, amiga. Lembra que você só queria namorar, beijar e curtir? Estava distante de Deus e poderia facilmente ter sido tentada — comentei, e ela riu, revirando os olhos e balançando a cabeça em negativa.
— Eu amadureci — ela disse, e eu concordei. Layla realmente amadureceu nos últimos anos. Antes, era do tipo cristã “assanhadinha”, mas agora está mais séria em relação a relacionamentos. Admiro isso nela.
Conversamos por mais alguns minutos sobre a empresa, a promoção dela, e o congresso que estávamos organizando na igreja. Depois, pagamos a conta com o dinheiro que Lucas deixou e saímos do restaurante.
Nos despedimos na saída e cada uma foi para o seu carro. Faltavam poucos minutos para acabar meu horário de almoço e eu precisava voltar para a empresa. Isaque havia mencionado que estaria fora o dia todo, então provavelmente trabalharia com Daniel e Sara.
Enquanto retocava a maquiagem no espelho interno do carro, meu celular vibrou. Olhei a notificação e suspirei, franzindo o cenho. Eu sabia exatamente onde aquilo poderia levar. Decidi que não iria respondê-lo.
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