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Capítulo 7 - A Joia

9400 palavras

Nem sei por quanto tempo estou nesse carro, completamente calada. Desde a hora que saí do consultório de Ferdinand, Brian me acompanhou e disse que iria me levar para casa, e após confirmar meu endereço, entramos no carro e ele não disse absolutamente mais nada. Tudo que fez foi se manter olhando para frente e para os lados.

Me concentro em pensar no que Ferdinand disse, de que iria fazer pesquisas sobre minha situação por entre as consultas que fizesse. Eu fiquei extremamente aliviada por saber que ele não irá cobrar essa minha nova visita, mas ele ter dito que esse se tratar de uma situação mais extrema, eu acabo não ficando mais tão aliviada.

Dou um suspiro, olhando para o meu recente "guardião", que está mais quieto que um peixinho dourado, e o pior de tudo, eu não sei como começar um assunto com ele. Ele apenas ligou o GPS do carro no computador de bordo, não tocou no rádio e em nenhuma outra função do carro, e apenas começou a dirigir sem dizer nada.

E tenho que admitir, ficar ouvindo o som da chuva ou o ronco do motor já me entediou a muito tempo, por mais que seja uma Mercedes.

Nem pra ele me deixar mexer no computador de bordo pra colocar uma música, ou pra explorar quantas funções malucas esse carro deve ter... Pelo menos alguma coisa pra eu me distrair, ainda mais se for olhar pelo ponto que estou bem curiosa pra descobrir mais desse carro. É a primeira vez que ando em um carro tão luxuoso.

É a primeira vez que ando em uma Mercedes, e não posso mexer em nada.

Olho em volta, já reconhecendo meu bairro, e após mais alguns poucos minutos, estacionamos em frente a minha casa. Mesmo assim, o silêncio se mantém. – Então...? – Corto o silêncio.

- O que? Não é essa sua casa? – Ele diz, erguendo uma sobrancelha, e olhando novamente para o painel do GPS. – É aqui mesmo, é o endereço que falou... E foi aqui que vim a última vez.

Cerro um pouco meu olhar – Me refiro a ser só isso...

Brian pisca por algumas vezes, sem deixar de me observar. Ele se ajeita no banco apoiando uma mão no volante, cerrando seu olhar – Desculpe, acho que não entendi.

- Sei lá, você disse que seria meu guardião e... Bem, só vai me deixar em casa? – Fico olhando para ele, esperando por uma resposta que não vem. Preciso ser mais direta – Eu sei que devo estar soando ridícula, mas realmente não acredito que seja só isso. Eu não me sinto mais segura.

Ele da um suspiro pesado, abrindo o porta luva do carro e revirando por alguns segundos, já eu não entendo nada. – É, de certa forma você não está segura... Ainda pelo menos.

- Ainda? – Percebo que ele retirou uma caneta do porta-luvas, rabiscando em seu próprio pulso averiguando se está funcionando. Ele então segura meu braço esquerdo também pelo meu pulso, rabiscando algumas coisas. Parecem símbolos – O que é isso?

Ele não me responde, terminando de rabiscar até chegar perto da junta do meu antebraço. Eu tento me soltar, mas ele segura com mais firmeza. Brian coloca a palma da sua mão sobre meu braço por alguns segundos, e quando ele finalmente afrouxa, puxo meu braço de volta – Isso vai garantir algumas horas de proteção. Só faça o favor de não lavar o braço.

- Olha, se for ver o estilo de proteção que você fez da última vez, realmente vou me sentir muito segura... – Ironizo erguendo as sobrancelhas.

- Da última vez eu não tinha obrigação de te manter viva. – Ele bufa sem olhar para mim.

Dou uma risada de deboche – E agora você é obrigado?

- Infelizmente sou! – Responde seco, me causando certo incomodo. – Olha garota... Acho que ainda não entendeu que você é só um trabalho para mim, não é?

Cruzo os braços, o encarando por alguns segundos. Balanço a cabeça assentindo por algumas vezes, sentindo meu sangue ferver – Então, eu sou apenas um trabalho? É isso?

- É, o que me significa dor de cabeça... Mas infelizmente se eu não cumprir esse trabalho, não terei dinheiro para pagar esse carro aqui. – Ta legal. Isso foi a gota d'água.

Se eu sou só um trabalho, farei questão de tornar as coisas bem mais complicadas para ele. 

Abro a porta, empurrando com o pé com força e pulo para fora, sem me importar com a chuva. No momento isso não me incomoda. Posso sentir como Brian me olha com espanto pela minha atitude. Acabo fechando a porta com muito mais força que o necessário, imaginando a possibilidade de todos os vidros estourarem.

Me abaixo até poder olhar nos olhos de Brian, e dou um sorriso maldoso em satisfação da minha ação. Esse homem vai ter muito problema comigo, isso eu garanto.

Ele torce a boca e abaixa o vidro lentamente, me encarando nos olhos. Posso ver a raiva queimando como chamas incessantes nos olhos dele.

Brian respira fundo apertando a boca olhando para frente, e depois para mim. Estou pronta para ouvir ele me xingando, e vou continuar com minha melhor cara de afronte – Aliás garota! Acho que tem alguém te esperando!

Ouço o que Brian diz, com a voz saindo por entre os dentes em um tom raivoso. Estranho isso e, ainda sorrindo da mesma forma de antes, me ergo novamente, olhando em direção à porta de casa esperando ver meu pai, mas estou enganada. Meu sorriso se desmancha.

Ricardo está ali.

Ai caramba, agora complicou foi tudo. – Divirta-se e boa sorte! Vai precisar! – Ouço Brian dizendo e dando uma gargalhada maldosa, arrancando com o carro e subindo a rua, me deixando para trás, incrédula com a reviravolta que acabou de acontecer.

Olho na direção que o carro seguiu por alguns segundos, e aos poucos viro para meu namorado. Ele está acuado embaixo de um guarda-chuva, com os braços cruzados e com cara de poucos amigos. Com toda certeza seu humor está da mesma forma que sua cara.

Aproximo dele em passos curtos, já imaginando o que eu vou ter que falar para tentar fazer ele se acalmar, nem que seja um pouco. – Demorei muito? – Ana Clara, você é uma idiota!

Ricardo mantem seu olhar sério para mim. Ele descruza seus braços, alcançando o celular em seu bolso, apertando uma tecla e me mostrando a tela – Não muito. Apenas alguns minutos aqui, e ligações perdidas desde as duas da tarde.

Mantenho meu silêncio, ainda tentando encontrar alguma explicação.

- E quando venho aqui antes de ir trabalhar, só para ver se você está bem... Você chega no carro de outro? É isso mesmo que eu vi? – Posso ver como ele está irritado, não tenho como me defender sem falar a verdade.

- É, foi isso mesmo que viu, mas não é o que está pensando. – Digo, levando minhas mãos aos seus braços. Sua expressão se endurece, eu sei que não comecei do melhor jeito – É aquela coisa dos meus pesadelos... Aquilo está voltando. Durante a tarde toda eu estive no consultório do psicólogo tentando achar uma solução para isso.

Tento ao máximo entender o que ele pensa, mas seus olhos não dizem nada além de um incomodo intenso. Ele não acredita totalmente em mim, mas posso ver que sua expressão deu uma leve suavizada. – Então por que não me ligou avisando? Eu poderia ter ido te encontrar lá.

Dou um suspiro. Nessa parte ele tem razão. – Foi tudo meio repentino. Só pedi o endereço para a Letícia e fui sem pensar. Desculpe não ter te avisado.

Ricardo balança a cabeça negativamente e torce a boca, sem olhar para mim. Queria tentar resolver um problema, mas acabei arrumando outro. Que coisa mais linda.

Sinceramente, eu gostaria de mandar meu namorado parar com tanta frescura... Mas também entendo o que ele deve estar pensando pelo que viu, e deve mesmo ser difícil acreditar no que eu disse. 

Apenas saco a chave de casa do bolso da minha calça e abro a porta, entrando e somente então olhando de novo ao meu namorado – Se você vai acreditar em mim ou não, agora não estou me importando nenhum pouco. Se quiser voltar lá só para perguntar para o Ferdinand o que conversamos, sinta-se livre porque não irei te impedir. Agora se quiser sair dessa chuva e tirar isso da cabeça, eu irei agradecer. E então?

Ele permanece parado me olhando com cara de poucos amigos. Está indeciso se entra ou não.

É estranho que mesmo com essa cara fechada, continuo pensando como ele é alguém que me atrai... Eu deveria estar com o pensamento no que acabei de falar, mas tudo que minha mente fabrica são momentos em que agarro ele e arranco todas as suas roupas.

Ricardo me observa, como se me analisasse em cada pequeno detalhe, até então chegar ao meu braço. – O que é isso?

Sei o que ele está questionando. – Isso aqui foi o que o Ferdinand e o assistente dele fizeram para manter a tal coisa afastada de mim.

- Rabiscado a caneta? – Ricardo ergue uma sobrancelha.

Dou de ombros – Método temporário. Até eles descobrirem algo mais efetivo.

- Grande solução... – Ricardo diz ironizando, entrando em casa e fechando a porta lentamente.

- É a melhor solução até o momento. – Dou um suspiro cansado, e então fico olhando para ele, agora eu quem cruzo os braços – Resolveu entrar...

- Quero saber por qual motivo você está com essa cara para mim. – Ricardo diz, sem se aproximar um passo que seja. Essa distância me incomoda.

- Talvez por que é o meu pescoço que está em risco... – Reclamo – Eu lembro o que passamos, e sei que tenho o risco de passar por tudo isso de novo. A primeira vez sobrevivi por sorte, mas quem sabe o que será de mim em uma próxima vez. Como posso estar com uma cara melhor?

Meu namorado meu encara por mais alguns segundos, e então reclama em voz baixa erguendo a cabeça – Ótimo, nem me incomodar eu posso... Tudo bem, se é desse jeito, então irei te apoiar a passar por isso.

Não gostei do seu tom, pareceu muito que ele vai fazer tudo, menos me apoiar, mas ainda assim sorrio de satisfação por ele não insistir mais nisso.

Sei que não é a atitude mais certa usar esses argumentos de estar passando por um risco de vida e por resultado manipular meu namorado, mas com certeza é uma forma de evitar muita dor de cabeça para mim mesma por causa de ciúme.

Suavizo meu olhar, alcançando a mão de Ricardo. Agora está na hora da minha melhor carinha de menina meiga – Promete mesmo que vai me apoiar nisso?

Ele assente balançando a cabeça – Prometo sim... – Ele diz com a voz fraca. Claramente ele ainda se sente incomodado, mas tudo bem.

Caminho até a escada, me concentrando em ouvir qualquer barulho que seja. Nada. Volto meus passos em direção a sala, e tanto ela, quanto a cozinha, estão com as luzes apagadas e tudo no mais profundo silêncio. E além do mais, o carro não está na garagem, o que significa isso?

Meus pais saíram, e isso é ótimo.

Após me certificar de que não tem mais ninguém em casa nesse momento, me viro para Ricardo, o puxando para a sala. Sei bem como animar meu namorado, e pela forma como me olha, ele já sabe quais minhas intenções.

O empurro para o sofá e subo em seu colo sem esperar. O seguro pela gola de sua camisa e o beijando em toda a nossa intensidade.

Arranco sua camiseta e jogando pelo chão, e sem esperar ele arranca minha blusa e joga de canto, puxando bem meu corpo para junto do seu. Sentir sua pele quente junto da minha é algo que amo, o calor do Ricardo invade meu ser e nubla meus pensamentos, e tudo que sinto é o mais puro desejo.

Sua boca vem ao meu pescoço, na primeira mordida suave minha pele se arrepia e meu corpo incendeia. Sua língua passeia devagar, resultando em novas mordidas e chupões leves, descompassando minha respiração e me torturando, quero muito mais disso.

Meu corpo pulsa de desejo, e já percebi como Ricardo também já está tomado pela excitação.

E agora, está na hora de ser uma menina muito levada.

Uma menina levada que o fará se atrasar muito para o trabalho.

Estou batucando meus dedos na mesa, tentando me manter acordada. Tenho um teste bem a minha frente, mas minha vontade de me concentrar nessa coisa é praticamente nula. Me encosto na cadeira, olhando em volta. Muitos alunos estão com a cara debruçada sobre a prova, acho que alguns deles sequer piscam.

Volto a olhar para meu teste, buscando pelas questões de múltipla escolha, e por puro tédio eu marco qualquer coisa. Eu quero acabar isso logo e sumir daqui, depois eu dou meu jeito de recuperar minha nota, os professores sempre passam algum trabalho para recuperar a nota mesmo, então fica mais fácil não cair em uma DP.

Me ergo, já com o teste finalizado da maneira mais porca possível, sendo confrontada pelo olhar surpreso de Marina. Eu respondo seu olhar com um sorriso de canto, pego minhas coisas e saio andando, antes que ela pense em perguntar alguma resposta. Basta eu com uma nota ridícula.

Caminho pelos corredores da faculdade, desço alguns lances de escadas e chego ao refeitório, escolhendo uma das várias mesas vazias e me sentando, bufando sozinha. Abro minha mochila, procurando por um pacote de bolachas que já devem ter se esfarelado a essa altura, mas não me importo, só quero comer algo.

Preciso lembrar de trazer pelo menos algum suquinho, ou achocolatado... Faz falta essas horas.

Abro o pacote e começo a mordiscar a primeira bolacha, olhando para os símbolos que Brian rabiscou no meu antebraço ontem à tarde, antes do nosso pequeno desentendimento. Eles ainda estão bem fortes, então consigo ver todas as linhas com total facilidade.

Concentro-me por alguns segundos, tentando interpretar o que quer que seja que ele tenha feito, mas logo dou um suspiro por não entender bulhufas.

Apesar disso, quero testar algo. Mordo mais uma bolacha, e respirando fundo eu fecho meus olhos por alguns segundos. Aguardo por poucos instantes. Conto até dez, mas não acontece nada. Nenhum ser aparece, isso é um alívio.

- Olha quem eu encontro aqui dormindo! – Ouço Tiago de repente, abrindo os olhos e vendo ele se encostando em mim repentinamente, me fazendo pular de susto e me perder em minha própria respiração.

Encaro Tiago, piscando por algumas vezes enquanto me acalmo – Olha quem eu vejo aqui, novamente sem aulas... – Digo, revirando os olhos, enquanto ele da gargalhadas. Esse garoto é maluco.

- Não estou tão sem aulas. É que hoje estão só planejando alguns seminários, e meu grupo já decidiu tudo. – Ele da de ombros, apoiando o rosto na mão e olhando em volta com uma curiosidade tão parecida ao de uma criança.

- Queria eu ter um grupo que se resolve tão fácil como esse seu... – Bufo preguiçosamente, pescando mais uma bolacha, mantendo meus olhos nele, o analisando como posso.

Tiago da um sorriso – Os rapazes não são tão difíceis de lidar. – Ele vira seus olhos a mim, e então para meu braço, logo erguendo a sobrancelha. Ele observa por longos segundos, mantendo a curiosidade em seus olhos. – O que é isso, aderindo a tatuagens?

- É, mais ou menos... – Digo desviando o olhar, ao mesmo tempo que escondo meu braço. Imagina a dificuldade que seria explicar isso para ele, se nem para minha melhor amiga eu quis tentar explicar. – Tatuagens de caneta, tipo as que eu fazia na escola...

- Sei, o pessoal da minha escola também fazia... – Ele comenta. Mesmo com os símbolos escondidos, Tiago ainda mantem seus olhos no meu braço, agora com um olhar diferente. Por algum motivo, tenho a impressão de que ele reconheceu esses símbolos. – Escuta... Posso ver?

Ele está apontando para meu braço, que faço questão de deixar mais junto ao corpo – Não, é que... É pra ser uma surpresa sabe. Só rabisquei pra saber como ficaria, mas não tive tempo de lavar para tirar.

Eu juro que se ele cair nessa desculpa esfarrapada, eu irei ver Tiago como o ser mais inocente que já conheci na vida.

- Ah, certo então... – Ele diz, arqueando as sobrancelhas. Espero alguma insistência dele, mas não vejo nenhuma. Ele apenas saca seu celular e começa a olhar.

Guiada pela minha curiosidade, passo a olhar a tela. Ele está vendo apenas uma rede social dele, mas logo desvio meus olhos. Uma coisa que aprendi há muito tempo atrás e hoje é uma regra de vida: Nunca olhar o celular de ninguém sem autorização, ou por curiosidade. Eu já vi coisas bem desagradáveis por pescoçar celulares dos meus amigos.

- Aliás Clara, quero te perguntar algo. – Olho para Tiago. Ele está passando uma mão pelo seu queixo por algumas vezes – Você sabe porque a Marina fica tão estranha quando estou perto?

Ergo a sobrancelha. – Do que está falando?

- Sabe, ela fica bufando. Faz uma cara feia quando falo com você ou com a Letícia... Parece irritada só por eu estar perto. – Ele diz, batucando os dedos na mesa. Ele aparenta estar calmo, mas pelos seus gestos, acho que está até impaciente por causa disso. – Eu fiz alguma coisa para ela? Disse algo que ela não gostou?

Agora que ele falou, começo a pensar melhor a respeito. É verdade o que ele diz, Marina fica um pouco estranha quando Tiago aparece, e fica ainda pior quando está interagindo comigo ou com a Letícia, mas eu não tenho a menor ideia do motivo disso. A Marina não me falou nada sobre isso, mas eu também nem cheguei a pensar no que poderia ter acontecido.

Tiago falar disso agora me deixou pensativa – Eu não tenho ideia. Ela não me falou nada.

Ele balança a cabeça por algumas vezes, abaixando seu olhar e ficando pensativo – Imaginei que pudesse saber... Fiquei pensando sobre isso em casa, tentando lembrar se fiz algo para ela.

- Ela não costuma fazer do tipo que fica guardando mágoa por mais de um dia, então fique tranquilo. – Digo em um tom tranquilo, o que atraí seu olhar a mim. – Ela é bem espontânea. Se fez algo de errado, com certeza a Marina vai te deixar bem ciente.

Ele arqueia as sobrancelhas – Como ela faria isso?

Dou uma risada de sua curiosidade, olhando aos lados por algumas vezes, como se fosse contar um segredo de estado – Ela é vingativa, então com certeza fará você saber.

Dou risadas pela cara que Tiago faz. Com certeza ele não gostou tanto de saber sobre isso, e apenas desvia os olhos, batendo a mão levemente na mesa por algumas vezes. Me pergunto se ele está imaginando quais vinganças que minha melhor amiga faria, isso é claro, se ela realmente tiver motivos para fazer alguma coisa.

Mas claro, se ela realmente for fazer algo, eu ficarei quieta. Quero ver até onde isso vai.

Uma sensação estranha começa a surgir, algo no meu estomago, ao mesmo tempo que na minha cabeça. Minha visão embaça aos poucos, me fazendo me levantar – Tiago, pode ficar de olho nas minhas coisas só por um instante?

Ele me olha com certa confusão no olhar – Ahn... Claro, mas por que?

- Só vou no banheiro... Eu já volto. – Digo isso, me colocando a andar apressada até o banheiro.

Não sei se andei ou corri para o banheiro, mas em poucos segundos estou de frente ao espelho e me olhando fixamente. Estou suando, sentindo uma estranha sensação de calor pela minha pele, somado a correntes gélidas passando por dentro do meu corpo. Estou ofegante de forma repentina, cada vez mais aflita sem entender o que acontece.

Abro a torneira, juntando uma grande quantidade de água nas mãos e lavando o rosto. Por uma, duas, três vezes eu molho o rosto, descendo as mãos pelo meu pescoço, sentindo o mesmo calor pela minha pele, juntamente a um frio mórbido se contorcendo cada vez mais em cada parte do meu corpo. Meu estomago revira, minha visão volta a embaçar, respiro ofegante mas vou sufocando cada vez mais... Parece que algo está contorcendo meu corpo por dentro, me deixando em cada segundo mais agoniada.

Abaixo a cabeça e fecho meus olhos, sentindo o suor escorrendo pelo meu rosto e por todo o corpo. Respiro fundo por algumas vezes, tentando me acalmar. A sensação lentamente desaparece, e finalmente vou me sentindo melhor. Certo, estou bem. Ergo meu rosto e me vejo no espelho. Agora estou um caco de tão horrível.

Passo as mãos pelo rosto por algumas vezes, tentando voltar ao meu normal, ouvindo vozes de outras mulheres se aproximando e entrando no banheiro. Um pequeno grupo que, até onde sei, são alunas de pedagogia, acaba entrando e param a algumas torneiras de distância, e eu as acompanho com o olhar sem falar nada. Sacudo as mãos e me olho uma última vez, vendo algo parado atrás de mim.

A criatura dos meus pesadelos.

Ele está ali, parado me olhando. Seus olhos vidrados estão em mim, vermelhos, em um estranho pulsar que faz parecer que seus olhos brilham em tons macabros. Ele sorri em um jeito tão macabro que um frio percorre meu corpo, e suas mãos se erguem para mim.

Me viro em um movimento rápido, esperando encarar a criatura e ser pega, mas isso não acontece. Não tem nada ali. Respiro apressadamente, olhando em volta. Não tem nada. As mulheres me olham com estranheza, mas elas não sabem o que eu vi.

Todas as torneiras começam a tremer repentinamente, logo em sequência jorrando água em uma pressão desenfreada, me fazendo me afastar, tentando me proteger dos vários respingos de água com minhas mãos, e as mulheres fazem o mesmo que eu nesse momento.

Um nevoeiro surge no banheiro, e vejo as mulheres se acuando em uma parede, e tento fazer o mesmo. Escuto um ruído alto, como se alguém passasse o dedo no espelho do banheiro. Todas nós olhamos, percebendo que algo está sendo escrito no vidro.

"Olá olá... Clara... Vamos brincar Clara?"

As mulheres gritam com o susto pelo que veem, mas eu mesma não consigo fazer o mesmo, não tenho reação. Repentinamente todos os vidros se estilhaçam, a sensação que tenho é que um golpe extremamente forte foi dado nos espelhos, fazendo estilhaços voarem por todos os lados. Me protejo como posso, ouvindo as mulheres gritando ainda mais alto.

Olho em volta, querendo sair daqui correndo o mais rápido que eu conseguir e não olhar para trás nem por um momento. Moças, por favor, me desculpem por querer deixar vocês aqui, mas nessa hora é o meu pescoço está a prêmio, e não o de vocês.

Penso em me mover, mas minhas pernas estão paralisadas. Só agora percebo como estou tremendo. Por entre a névoa, algo surge parado em meio ao banheiro. Um vulto de uma pessoa, um rapaz... A mesma figura dos meus pesadelos está aqui... Está na minha frente outra vez.

Seu vulto oscila entre presente e não-presente por algumas vezes, sem sair do lugar. Ele desaparece, e posso sentir minhas pernas me respondendo de novo.

Me viro, preparando para correr daqui, mas ele está ali. Parado atrás de mim, me encarando com aquele mesmo olhar. Repentinamente meu corpo é erguido a alguns centímetros do chão, e sinto o impacto de um punho acertando a lateral do meu rosto, arremessando meu corpo para trás com violência. Sinto minhas costas batendo no chão em um baque que retira todo meu ar.

Eu arfo no chão, apalpando em volta sentindo o gelado do chão e dos cacos de vidro, e toda a umidade da água pelo chão e que continua vindo das torneiras estouradas, torcendo para não me cortar com os cacos. Tento me levantar, mas meu corpo é erguido do chão contra minha vontade, novamente a ponto de eu não sentir o chão embaixo dos meus pés.

Minha visão está embaçada, devido ao impacto e a névoa, e ouço os gritos a minha volta. Meu corpo inteiro recebe um impacto que não tenho a menor ideia de onde veio, mas é pesado e arremessa meu corpo para trás, a ponto de eu sentir ele afundando contra a parede.

Eu novamente caio no chão, zonza e sem enxergar tão bem. Dores percorrem pelo meu corpo em pontadas, mas mesmo assim eu tento me erguer. Olho para o vulto a minha frente, está enegrecido e tudo que vejo e o brilho de seus olhos avermelhados.

Ele salta em minha direção, em uma mistura de uma risada com um rugido de uma besta, e fecho meus olhos com força sem nem tentar gritar.

Aguardo, mas nada acontece. Abro os olhos novamente, não vendo mais nada, a névoa havia sumido. Ele havia sumido.

Me ergo devagar apoiando as mãos nas pernas tremulas, sentindo minha cabeça girando e as dores gritando pelo corpo. Olho para o lado, todas as mulheres estão acuadas no chão, olhando na minha direção, assustadas e totalmente confusas.

Eu as entendo, não sei porque estou viva ainda.

Me coloco de pé com dificuldade, me apoiando com uma mão na parede. Olho em volta, percebendo todo o estrago pelo banheiro da faculdade. Os pedaços da parede, os espelhos, as torneiras estouradas e vazando água sem parar.

Olho para mim mesma, estou ensopada, mas pelo menos não estou totalmente suja, isso me poupa de algumas explicações, mas não de todas. Viro meus olhos para as mulheres, que lentamente se levantam também, ainda receosas. – Acho melhor sairmos daqui... Senão vai sobrar para nós...

Elas me olham, e apenas concordam com a cabeça. Nisso, saímos correndo desse banheiro.

Mais um dia de aulas finalizada. Hoje pelo menos não foi tão terrível em quesito aula, o que foi um total alivio... Claro, o alivio facilmente pode desaparecer ao lembrar do fato que preciso ver um filme que nem sei o nome, e apresentar mais um relatório até segunda, e claro, por que a entidade voltou a aparecer e agora estou toda arrebentada, sentindo dores aqui e ali, olha só que mágico.

Quando me encontraram, Marina e Tiago praticamente tiveram um chilique por achar que eu tinha sido espancada por alguém, e insistiram para que eu chamasse a polícia para abrir um boletim de ocorrência, processar a faculdade, procurar culpados. Por sorte consegui convencê-los a se acalmar e fazer entender que eu estava bem.

Apesar de muito relutantes quanto a isso, aceitaram o que eu havia dito com muito custo... Mas seguem desconfiados.

Paro na entrada da faculdade olhando fixamente para o terminal, optando se me arrisco com um ônibus ou não. Marina e Letícia estão ao meu lado, todas nós esperando algum sinal de que toda essa chuva vai aliviar, algo que simplesmente não acontece a dias, sem falar claro dos vários vendavais vindos junto de granizo, e claro, do calor absurdo que está fazendo.

Faz muito tempo que sequer tenho ideia do que seja ver a luz do sol, os meteorologistas da televisão simplesmente dizem que surgiu uma frente chuvosa repentinamente em São Paulo, e ela não se move nada. Eles não conseguem prever quando o clima vai aliviar.

- Meninas, vocês já viram aquele carro por aqui antes? – Letícia comenta em um sussurro para nós, gesticulando com a cabeça em uma direção. Eu e Marina nos entreolhamos, e seguimos a indicação dela.

- Qual deles? – Marina questiona, cerrando o olhar. Acabo olhando também, mas sem encontrar nada de diferente.

- Aquele ali, a Mercedes preta. – Ela diz, e de imediato eu identifico o carro. Ai não.

Marina nega com a cabeça – Nunca vi aquele carro por aqui, deve ser de algum dos mais riquinhos da faculdade... – A porta do condutor é aberta e alguém bem vestido, sai abrindo um guarda-chuva escuro sobre si, olhando justamente na minha direção. Brian. – Mas olha, temos que concordar em uma coisa. O dono do carro é um gatinho gostoso.

Ignoro o que Marina diz com risadas, minha preocupação agora é o rapaz com o longo casaco cinza escuro, terno azul marinho e cabelos desarrumados vindo em minha direção, mesmo que esteja olhando em volta como se procurasse por alguém. Se ele está fazendo isso de propósito, eu não sei dizer, mas eu gostaria que ele apenas passasse por mim como se não me enxergasse.

Pelo menos por esse momento, só para evitar quaisquer olhares ou comentários.

Mas claro, não é isso que acontece. Ele volta a me encarar após alguns segundos, andando calmamente com uma mão no bolso da calça, dando um sorriso de canto de boca – E aí Clara?

Posso sentir meu rosto ruborizando, não sei se é por vergonha, pelas meninas estarem olhando para mim, ou pelo meu sangue estar fervendo de irritação.

Marina me olha com uma expressão de curiosidade, seu sorriso claramente me diz que ela pode lançar algum comentário indecente, ou no mínimo pensando. Já Letícia se mantem em silêncio, afinal ela já conhecia Brian, mas deve estar se perguntando o que ele deve estar fazendo aqui.

- E ai? – Digo por entre os dentes com um sorriso forçado, tentando conter minha irritação.

Acho que minha vontade agora é de socar ele. A lembrança de ontem, de simplesmente me chamar de "trabalho" e depois sair rindo do meu eventual problema com Ricardo ainda estão bem frescas na minha mente, eu ter sido atacada hoje, e agora com esse maldito sorriso cínico.

- Gostaria de perguntar... – Digo, inspirando fundo para manter meu controle – O que está fazendo aqui mesmo?

- Nada demais, apenas... Uma visita cordial a uma amiga de longa data? – Ele mantém seu sorriso, apoiando o guarda-chuva sobre o ombro – Ou será pelo fato de que você me disse onde estudava e me falou para vir te encontrar aqui?

O que? Que conversa é essa agora?

Fico olhando para ele, completamente incrédula do que estou ouvindo, e confusa por não entender onde ele quer chegar. Marina se adianta, o que chama minha atenção – Você é um amigo de longa data da Clara?

Brian olha para Marina de cima, devido à grande diferença de altura entre os dois. A primeiro momento, o rapaz parece olhar para Marina com certa indiferença, mas isso quase que imediatamente desaparece – Exato, eu estive alguns anos a frente da Clara na escola, mas mesmo assim eu ajudava ela e alguns dos antigos colegas em algumas matérias.

Minha melhor amiga cruza seus braços, observando Brian por alguns segundos... Ela já deve ter percebido que é uma mentira, ou no mínimo está muito desconfiada, afinal ela estudou comigo desde a sexta série. Olho para Letícia, que se mantém calada e um pouco contida. Ela deve se lembrar do que aconteceu da primeira vez que nos encontramos com esse rapaz, e talvez isso a esteja incomodando. Volto a olhar para minha melhor amiga, que me observa – Não vai nos apresentar ele?

- Sim claro... Meninas, esse é Brian... – Ai Marina... Você não me ajuda mulher.

Marina pega a mão de Brian repentinamente e improvisando um cumprimento, o que o causa um pequeno espanto que fica nítido quando ergue as sobrancelhas. – Ajudou a Clara na escola, estranho... Estive bem próxima da Clara e não consigo me lembrar de você... Mas enfim, muito prazer, sou Marina.

Já Letícia, ergue uma mão de forma tímida – Oi... Letícia...

Definitivamente a Letícia se sente incomodada, e não tiro a razão dela. Afinal, vamos começar pelo fato de ela saber que essa história de "amigo de escola" é uma mentira horrível, e também, tanto ela quanto eu temos motivos para ficarmos no mínimo acuadas na presença dele.

- Olá meninas, muito prazer em conhecer ambas... E no seu caso Marina, é bom rever você, apesar de também não ter muitas lembranças suas, acho que só te conhecia de vista e pelo que Clara me dizia, mas nunca interagimos... – Brian comenta dando um gesto de cabeça, e apesar de ainda estar desconfiada, Marina concorda. Tenho certeza que ela não engoliu essa história. Logo então ele se vira para mim. – Clara, podemos ir?

Sem nem mesmo notar, recuo um passo – Para...?

- Sei lá, foi você quem me disse para te encontrar aqui. – Brian deu de ombros. Esse cara realmente vai jogar a situação toda nos meus ombros?

- Ah é, nossa... Perdida aqui nos pensamentos por causa da aula... – Digo, balançando a cabeça negativamente.

O homem assente balançando a cabeça – Claro, sei bem como é...

- Meninas, falo com vocês mais tarde. Me confirmam sobre o filme depois? – Digo, fazendo um gesto positivo com as mãos para ambas.

- Mais tarde te mando mensagem confirmar. – Marina diz rindo – Agora vai lá aprontar... Digo... Vai lá aproveitar.

Antes que eu pense em responder, Brian coloca o guarda-chuva sobre mim, então apenas balanço a cabeça algumas vezes. Ta legal, a Marina é assim, uma verdadeira menina brincalhona e sempre faz esse tipo de piada... É minha melhor amiga, é engraçado quando ela faz essas brincadeiras para nós duas rirmos juntos das outras pessoas, mas quando faz comigo já é pessoal.

Ela vai entrar na minha lista negra dessa semana, e eu vou devolver essas brincadeiras que ela fica fazendo comigo.

Agora que penso, ela entra na minha lista negra toda semana... E eu entro na lista negra dela da mesma forma, e no fim nós duas acabamos no bar, dando muitas risadas disso tudo. Acho que isso é um dos detalhes que faz nossa amizade funcionar tão bem a anos.

Mesmo assim, agora estou entrando no carro de um, até o momento, desconhecido das minhas amigas. Isso pode me dar um problema gigantesco, mas espero que a desculpa de sermos antigos colegas de escola realmente acabe colando.

Vejo Brian entrando no carro, e toda a aparência mais amigável dele desapareceu de um segundo ao outro. Ele mantém um olhar sério, ligando o carro e deixando minha faculdade para trás. É, não sei o que mais esse dia reserva.

Estamos andando pela cidade há uma hora e meia hora pelo menos, fugindo de alagamentos e trânsito. Não conheço esses lados, mas sei que ainda estamos por São Paulo... Ou pelo menos acho que seja. Olho para o lado, e Brian continua em seu tedioso silêncio.

E para piorar, esse maluco sequer ligou o rádio.

Passo meus olhos pela rua, esperando qualquer coisa que seja acontecer, mas nada. Não quero mais ficar nisso, tenho que falar algo – Quero te perguntar, como foi que você descobriu onde eu estudo?

Brian finalmente me olha, e então olha para meu braço – Por causa disso. Muito obrigado por não ter apagado os traços, me ajudou muito.

Encaro os rabiscos do meu braço, pisco algumas vezes e então encaro ele de novo. Penso por alguns segundos, me lembrando do que passei hoje mais cedo – Isso aqui não é para me manter protegida?

- É claro que não. Isso é só uma runa de localização. – Ele diz, arqueando as sobrancelhas.

- Perai, então eu poderia ter sido atacada durante todo esse tempo? – Em primeiro momento eu prefiro evitar falar que eu de fato fui atacada hoje. Quero ver a reação dele. Brian balança a cabeça assentindo, e me sinto ainda mais irritada do que já estou – Como você pode ter feito isso?

O rapaz me olha, cerrando as sobrancelhas – Ué, psicologicamente você estava protegida... Se sentiu protegida só com o que rabisquei aí.

- Não é a mesma coisa! – Digo, batendo uma mão na perna com força.

- Olhe pelo lado bom, você não foi atacada. Só relaxa. – Ele diz, de forma descontraída.

Dou uma risada de pura irritação – Muito fácil falar para relaxar quando não é você que está com uma coisa irreal martelando na sua cabeça, e muito provavelmente querendo te matar... Muito fácil falar quando não é você quem foi atacado no banheiro da faculdade! – Grito cedendo a minha raiva, fechando meus punhos com força.

- Isso explica você estar nesse estado. – Ele me responde de imediato, sem nem mudar sua expressão. Seus olhos se mantêm em mim, e logo retornando para a avenida que seguimos, em uma calma agoniante – Vamos olhar pelo lado bom novamente... Você foi atacada, mas ainda está viva, por mais que eu não faça ideia de como conseguiu essa proeza.

Encaro ele por alguns segundos, enfurecida por isso. – É só isso que vai dizer? – Me mantenho encarando Brian, que não me responde nada.

Bufo e xingo em voz baixa, me encostando de novo no banco e encaro a janela. Cruzo meus braços, inconformada com o que acabei de ouvir, querendo deixar minha raiva explodir. Eu quero pular para fora desse carro agora e ir para casa. Dar um jeito nessa situação toda por mim mesma, porque por ele, sei que não terei a menor chance de sair viva dessa história toda.

Ouço um suspiro vindo de Brian, e volto a olhar em sua direção, ele encara alguma coisa. Instintivamente sigo seu olhar, percebendo que estamos em uma área bem comercial, porém eu não tenho a menor ideia de onde estamos. Nunca vim para esses lados de São Paulo. Olho em volta, prestando atenção no grande número de pessoas passando em volta, além dos carros a nossa frente, mas claro, sem ter me acalmado em nada.

Desvio novamente meu olhar, querendo me distrair, mas o que fazer, se nem tem uma música para me ajudar nisso. – Eu não poderia fazer runas de proteção contra uma coisa do abismo por dois motivos. - Brian começa a falar, mas nem faço questão de olhar para ele – Um, eu não conheço nada desse tipo, e dois, como te proteger de algo que está preso dentro de você?

Penso um pouco, tentando assimilar o que ele me diz e buscando uma resposta, mas nada me vem em mente. Continuo do mesmo jeito, de braços cruzados e bufando irritada.

- Bem, eu estive pensando nisso essa noite, e é por isso que estamos aqui... – Ele diz dando um sorriso, entrando com o carro em um estacionamento. Brian sai do carro, e acabo saindo em seguida. Fico curiosa com isso e não tenho muitas opções além de segui-lo.

Ele conversa algo com o manobrista do lugar, ambos trocam um sorriso e um aperto de mão, acho que já se conhecem. Brian pega algo e lança a mim, que acabo conseguindo pegar de puro reflexo.

Olho para o objeto e logo entendo, abrindo e me protegendo da chuva pesada, enquanto Brian leva as mãos aos bolsos da calça e segue andando na chuva em ruidosos passos apressados. Aperto meu próprio passo na tentativa de acompanhá-lo, deixando o guarda-chuva que me deu apenas sobre mim mesma. Penso em questionar onde está indo, mas ele logo entra em uma loja, e acabo o seguindo.

Cada vez mais, eu me sinto uma cachorrinha que só consegue seguir o dono.

Me encontro em uma loja com vários objetos esotéricos, com vários panos em tons variados, em detalhes claramente bordados a mão. Muitas estatuetas em formato de anjos, dragões e criaturas fantásticas pelas estantes, livros mais ao fundo, caixas de incensos, cristais, e sei lá o que mais deve ter aqui. São tantas coisas que não consigo olhar tudo, e o leve cheiro de incenso está me deixando um pouco mais leve e até sonolenta.

- Brian, meu garoto! – Ouço uma voz feminina. Uma mulher morena que aparenta ter seus trinta anos no máximo diz com um largo sorriso, vindo pelo corredor em nossa direção, com os braços abertos. Ela veste roupas leves, apenas uma regata escura e uma saia até a altura dos pés de cor preta com detalhes brancos, rosados e amarelados compondo vários desenhos pelo tecido, e um par de chinelos, ela usa um colar com varias pedras escuras em torno de seu pescoço, pulseiras em ambos os pulsos, além de manter todo seu liso cabelo escuro jogado por cima do ombro esquerdo, é uma mulher realmente bela ao meu ver. Ela espalma suas mãos nos braços do rapaz com empolgação – A quanto tempo não te vejo rapaz.

- Não faz tanto tempo Amanda. Só um mês. – Ele diz em tom neutro.

- Isso não é tempo? – Ela responde com um sorriso, cruzando seus braços – Como está o Ferdinand?

Brian da um suspiro – Continua da mesma forma. Bem melhor humorado nos últimos tempos.

- Entendo, isso é muito bom de se ouvir... Ele superou o incidente com a dama de preto? – Ouço ela falar, mas sem entender o assunto.

- Mais ou menos... Ferdinand nunca comenta sobre isso, então não da pra ter certeza. – Brian da de ombros – Ele está bem, mas acho que ele nunca vai superar totalmente.

Ela balança a cabeça com um sorriso em concordância, virando seus olhos na minha direção com curiosidade – Essa bela jovem está com você?

- É, ela... – Brian olha para mim por cima do ombro – Ela é meu trabalho.

Torço a boca enquanto viro meus olhos o as prateleiras por alguns segundos, avaliando qual deve ser o objeto mais rígido para poder golpear Brian. Novamente me vendo só como um trabalho.

Antes que eu faça minha escolha, e mulher alcança uma pequena escultura de dragão e acerta Brian na testa. Ele resmunga de dor encurvando o corpo para frente, tampando o local atingido com ambas as mãos – Garoto, não a trate assim! Isso magoa sabia?

- E isso me machuca! – Ele diz, fazendo uma cara de poucos amigos. Ver essa cena resultou em risadas de satisfação da minha parte.

Vejo Amanda colocando a escultura novamente sobre a prateleira e ajeitando caprichosamente, logo se virando em minha direção, estendendo a mão em um cumprimento – Sou Amanda, proprietária desta loja.

- Sou Clara... Muito prazer. – Dou o meu melhor sorriso amigável.

- Certo... Então Clara, diga-me o que deseja. – Ela diz suavemente, passando suas mãos pelos panos estendidos, os ajeitando em movimentos precisos – Se está com o Brian não deve ser uma coisa simples.

- Bem... – Começo, mas agora que me lembro, eu somente fui traga aqui pelo Brian. Não tenho a menor ideia do motivo de ter vindo. A mulher me olha, esperando pela minha explicação.

Olho para Brian, que passa a ponta dos dedos na testa – Precisamos de pedras, ou então cristais para... Preparar um colar para essa garota.

Ta, essa conversa está estranha, e quero saber mais. – Para que isso?

- Algo para espantar olho gordo? Grandeza espiritual? – Amanda me questiona com um sorriso divertido, passando uma mão pelo queixo.

- Por favor Amanda... Se estou aqui, é por um motivo um pouco maior e mais sério. – Brian diz, passando os olhos pelas prateleiras da loja, pegando uma pequena caixa com um sol estampado e olhando por alguns segundos.

Vejo como a mulher se tornou um pouco mais séria – Problemas com algo maior então... Espíritos? Demônios? Anjos de novo?

- Problemas com o Abismo. – Ele diz, e posso ver como Amanda ficou completamente tensa. Eu o vejo chegando perto de mim – Estou como guardião dela, e essa garota...

- Ana Clara... – O corrijo, fazendo ele revirar os olhos.

- Isso, Ana Clara... Ela está com problemas com um desses seres. – Brian da um suspiro, levando as mãos a cintura – Procuramos por algo que possa manter essa coisa afastada, ou no mínimo enfraquecida. Imaginei que você poderia ter algo para nos ajudar Amanda.

Fico esperando alguma reação de Amanda, mas não vejo nada. Ela abaixa seu olhar, o que faz eu e Brian nos entreolharmos por um segundo. – Contra o Abismo propriamente dito eu não tenho nada muito útil, só livros com poucas anotações, mas... Podemos improvisar.

Com os olhos, acompanho ela andando para trás do balcão do caixa, pegando um pequeno cordão em tons escuros. Ela pega um pequeno cristal parecido com um diamante lapidado, fazendo um gesto para acompanharmos ela, e assim fazemos, indo para uma pequena porta nos fundos da loja.

Passamos por um pequeno corredor iluminado. A minha direita tem uma pequena porta, que a mulher entra e acende uma luz. Me permito olhar, vendo várias estantes com muitas caixas com papeis brancos colados com fita adesiva na frente, dispostas em prateleiras de ferro. Aqui imagino ser o depósito da loja. Amanda sai da sala com algo em mãos, porém que eu não consigo ver, e novamente nos faz um gesto para continuarmos indo com ela. Chegamos ao final do corredor, que percebo que segue por duas direções com portas abertas.

De um lado existe uma cozinha ampla, uma mesa, fogão e geladeira muito bem cuidados, e dali eu escuto vozes animadas. E a minha esquerda tem uma sala, nela contém uma pequena mesa com cadeiras um pouco mais confortáveis, um sofá de canto, uma televisão LCD que parece ter 32 polegadas, um adaptador de sinal e cabos subindo parede acima. Uma sala de descontração pelo jeito, e não tem ninguém aqui além de nós.

Vejo Amanda deixando as coisas sobre a mesa, estralando seus dedos, e escuto a porta sendo fechada atrás de mim – Não tenho nada contra o abismo, mas existe um feitiço que conheço que provavelmente vai te manter mais segura.

- Feitiço? – Questiono, erguendo uma sobrancelha.

Vejo um sorriso se formando no rosto de Amanda – Você já deve ter visto algumas coisas bem surpreendentes Ana. Não vá dizer que está impressionada só por ver uma bruxa?

- Oi? Bruxa? – abro as mãos, e ela confirma com um gesto de cabeça.

- Bruxa desde os meus quatorze anos, e irmã mais velha de Ferdinand. – Ela diz em sorriso de canto. Caramba, A cada momento eu estou vendo mais coisas que nunca imaginei.

Aliás, ela é irmã mais velha do Ferdinand, olhando agora, os dois realmente se parecem um pouco nos traços faciais. Ela ainda é um pouco mais alta que seu irmão, mas seus olhos e o tom de pele morena são praticamente idênticos, porém seus cabelos são mais escuros que os de Ferdinand.

Amanda coloca o grande cristal transparente sobre a mesa cuidadosamente, junto com duas pedras lapidadas, a maior é fosca e possui tons negros profundos e está lapidada como uma esmeralda, e a menor possui uma lapidação em gema e conta com tons vermelhos vivos muito semelhantes ao sangue, essa sendo mais transparente.

A mulher pega um pequeno pano em tons vermelhos e, em movimentos hábeis, ela ajeita o pano como um pequeno ninho, colocando o cristal como uma base, e as duas outras pedras dispostas sobre o cristal.

- Certo, vou explicar como isso vai funcionar. – Amanda diz, esfregando uma mão na outra freneticamente em uma aparente empolgação. – Para isso, irei utilizar um cristal, e as pedras turmalina negra e granada. Ambas são consideradas como ideais para proteção contra várias coisas, além de proporcionar controle mental e outros benefícios... Bem, ambas costumam fazer jus a fama que possuem.

Balanço a cabeça por algumas vezes, mesmo com dúvidas sobre a veracidade de suas palavras. Considerando tudo que estou vendo desde que entrei no consultório de Ferdinand pela primeira vez, e recém descobrir que ela é uma possível bruxa, darei um voto de confiança a Amanda. Mesmo assim, ainda tenho perguntas – Como fará isso?

Amanda fecha seus olhos, deixando sua mão direita sobre as pedras, mas sem tocar nenhuma delas. – Você verá em breve. – Ela diz, começando a sussurrar algo que não consigo entender.

Penso em me aproximar, mas Brian coloca o braço na minha frente, me impedindo de avançar. Olho para ele, que está movendo a boca pedindo para que eu apenas assista. Apesar de minha vontade de refutar, eu me contenho e faço como ele me diz.

A mulher continua sussurrando algo, e lentamente um forte brilho em tonalidades brancas começam a surgir de sua mão, unida a uma forte corrente de ar quente seguindo em direção a mulher, e tudo se intensifica à medida que Amanda abaixa sua mão até ficar mais próxima das pedras. O vento é tanto que meu cabelo e roupas se movem junto na direção dela.

Amanda leva sua outra mão e as deixa unidas uma sobre a outra, tornando o brilho muito mais forte e me impossibilitando de continuar assistindo. Cubro os olhos com a mão, até o brilho finalmente cessar junto ao vento, e eu conseguir olhar novamente.

Amanda leva as mãos a cintura, com um sorriso de satisfação no rosto, olhando para o pano que antes havia o cristal, onde agora está saindo apenas uma fumaça em tons brancos. Amanda sacode sua mão, afastando a fumaça e revelando apenas uma única pedra no local.

Ela tem um formato de uma grande gema semelhante a um diamante brilhante lapidado, transparente em suas extremidades, e habitando seu interior exatamente no centro, uma pedra menor que funde os tons negros e vermelho vivo das duas pedras anteriores, que espalham seus tons em pequenos fios que se assemelham a raízes.

- Deu muito certo! – Amanda diz satisfeita, tomando a pedra lentamente em suas mãos, e logo me mostrando em um gesto. – O que achou?

- Ela é... Simplesmente linda... – Digo, alcançando a pedra e olhando cuidadosamente, ainda digerindo o que eu vi segundos atrás, e ainda mais a pedra que agora tenho em minhas mãos.

A primeiro momento me sinto perdida no brilho dessa joia, e cada vez mais atraída de forma magnética por ela, pela beleza tão única que ela possui. Existe algo nela, uma energia que sinto emanando dela e correndo pelo braço e espalhando ao meu corpo, algo muito maior escondido em seu interior, que meus olhos não conseguem alcançar.

- Ela não é apenas bonita... Consegue sentir a energia? – Ouço Amanda, ela me tira de um transe que eu sequer imaginava estar. Olho para ela, que carrega um sorriso, que não sei se é de satisfação ou de divertimento da minha reação. Mesmo assim, pega de surpresa, eu entendo sua pergunta, eu consigo sentir a energia que ela mencionou, e afirmo com a cabeça. – Realizei um encantamento sagrado nele, que garante proteção contra seres e energias negativas. Forças hostis não conseguirão afetar quem carregar essa joia.

Lentamente a mulher alcança a joia das minhas mãos, começando a envolver ela na pequena corda, movendo rapidamente por algumas vezes, fazendo nós e mais nós tão rápido que me impressiona. Quantas vezes ela deve ter feito isso?

Ela termina os movimentos, erguendo a pedra lentamente, me mostrando um colar que nunca vi igual em toda minha vida. Brian move sua mão para alcançá-lo, porém Amanda o impede, puxando o colar um pouco mais para si. – Infelizmente, isso não sairá de graça...

- O que? – Brian questiona, erguendo uma sobrancelha.

Amanda da de ombros – Foi o que ouviu. Os materiais para fazer essa joia não são tão fáceis de conseguir quanto parece... Ainda mais fazer o feitiço que fiz... – Ela da um suspiro, virando seus olhos para mim – Desculpe Clara, eu gostaria de deixar de graça para você, ou fazer algum desconto por ser amiga do Brian... Mas não posso fazer isso sem me prejudicar.

O rapaz ao meu lado cruza seus braços e bufa – Ela não é uma amiga, é só meu trabalho.

Reviro os olhos respirando fundo, e olhando para a mulher – Não tem problema, eu irei pagar pelo colar... E também vou querer levar aquele dragão que usou pra bater nele. Pelo andar das coisas, a escultura vai ser muito útil.

Amanda da uma gargalhada – Aquela estátua eu deixarei de cortesia para você quando vier aqui.

Escuto Brian resmungando algo relacionado a "rodas novas", mas ignoro isso – Não se preocupe com valores. Eu pago o colar. – Ele diz calmamente, me fazendo erguer uma sobrancelha com sua atitude.

- Quero perguntar algo... A proteção é garantida? – Digo isso, e Amanda me entrega o colar.

- É, eu acho que sim... – Ela olha de um lado ao outro, com estranheza em seu rosto – Meus feitiços costumam funcionar muito bem em todas às vezes. Por que a pergunta?

- Nada, é que... – Olho para Brian de relance – Eu estou tendo alguns pequenos problemas relacionados à "proteção" ultimamente, então eu prefiro ter essa certeza.

A mulher parece entender o que eu quis dizer, ainda mais pelo meu olhar a Brian. Ela da um sorriso de canto – Pode ficar tranquila sobre isso. A entidade que estiver atrás de você não conseguirá te tocar... E algumas outras criaturas também não.

Assinto com a cabeça, enquanto Amanda segue de volta pelo corredor que viemos, e seguimos atrás dela.

Acabo de entrar no carro de Brian, já colocando o cinto e olhando fixamente para o colar no meu pescoço, o tomando em minha mão. Desde o momento que coloquei ele, senti algo vindo dele. A energia de antes parece ainda mais forte nesse momento, sinto ela emanando do colar, passando ao meu corpo em um calor intenso, e ela me passa uma sensação de conforto muito grande.

Olho para o rapaz, que acaba de se sentar no banco ao lado, já ligando o carro – Pelo jeito gostou do colar novo... – Ele diz calmamente, sem olhar para mim.

- Bom, pelo que Amanda disse, ele vai me garantir uma boa proteção, acho que nela eu consigo confiar nesse assunto... – Dou um sorriso, ainda olhando para a pedra lapidada por alguns segundos, soltando gentilmente próxima ao meu corpo, sentindo o peso que ela faz no meu pescoço – Além que ela é linda.

Ele olha fixamente para mim por alguns segundos, olhando dos meus olhos para a pedra no meu pescoço, ligando o carro – Te deixarei em casa. Preciso pesquisar mais sobre essas coisas para saber como lidar.

Dou um sorriso de deboche, cruzando meus braços – Está se preocupando em lidar com a entidade?

- É, mais ou menos isso... – Ele diz, batucando os dedos no volante – Eu voltarei pela noite para ver como você está.

- Já ouvi algo assim antes, e um certo alguém não voltou. – Dou uma risada afrontosa.

- Dessa vez eu voltarei. – Ele insiste.

Eu o observo de cima a baixo por alguns segundos. Não sei se confio em Brian. Ele já me enrolou antes, e pode muito bem fazer isso de novo.

Além disso, ele pode usar a desculpa do meu colar para ficar longe de mim, com o argumento de "Você já está protegida". Não gosto dessa situação em que estou enfiada, mas não tenho escolhas além de confiar nele. Por algum motivo eu sinto que preciso dele por perto para sair de todo esse problema.

E aliás, estamos tendo mais arranca-rabos do que entendimentos. Duvido muito conseguirmos manter uma amizade com todas essas trocas de farpas que temos... Ele não colabora, e eu simplesmente não consigo deixar barato e devolvo do melhor jeito que consigo.

Bem, espero que tudo isso seja por pouco tempo... Que tudo acabe logo, e eu possa voltar a minha vida normal.

No momento, é isso que eu mais quero. 

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