Capítulo 45 - Retorno à normalidade
3835 Palavras
Apressadamente vou passando as mãos pouco úmidas pelo cabelo, tentando ajeitar essa bagunça de uma forma que me deixe satisfeita. Não imaginei que mesmo com o cabelo acima do ombro, eu ainda teria tantos problemas para mantê-lo arrumado.
Balanço a cabeça de um lado para o outro, conseguindo finalmente me sentir satisfeita com meu visual. Pelo menos não demorei muito tempo, então não irei me atrasar para a aula.
A única coisa que não me agradou tanto foi às roupas que escolhi para hoje, apenas uma regata e um shorts jeans. Não tem nada de errado nelas, exceto pelo fato que mostram muitas das minhas cicatrizes de quando enfrentei a entidade na praia, como se já não bastasse a cicatriz no meu rosto... Mas com o calor de hoje, não tive muita opção.
Passar calor e derreter o dia todo, ou colocar uma roupa leve...
Saio do banheiro e vou apressada para meu quarto para pegar minhas coisas. Minha mochila está aberta, largada sobre a cama, ao lado do meu celular e chave.
Confiro o interior da mochila mais uma vez, me certificando de não ter me esquecido de nada, e me dou conta da pasta com as runas que Brian me deu. Elas me causam um aperto no coração por trazer várias memórias de volta.
Fico reflexiva por um momento. Agora que tudo acabou, será que preciso continuar andando com as runas de cima pra baixo como estive fazendo todo esse tempo?
Essa dúvida também vale para as duas pedras de fogo e raio que deixei na minha janela desde que cheguei em casa ontem à tarde. Uma vez, Brian me disse que para "recarregar" essas runas, era preciso deixa-las sob a luz do sol e também sobre a luz da lua.
A única coisa que tenho certeza de manter comigo a todo momento é meu colar... Só que agora, não existe mais necessidade nenhuma de manter todo esse poder comigo, então por que ainda fazer algo desse tipo?
Pensando um pouco, acho que pode ser melhor prevenir do que remediar. Não existe mais uma entidade do abismo para me incomodar, mas ainda vivo em um mundo complicado. Então manter todas as runas comigo por questão de segurança parece ser uma ideia bem melhor...
É melhor ter poder em excesso e não precisar usar nenhuma vez, do que precisar de poder e não ter nenhum ao alcance.
Vou para a janela e alcanço as duas pedras. Ambas estão bem quentes mesmo com tão pouco tempo de exposição a esse sol matinal. O interior delas brilha continuamente, me dando a certeza que estão carregadas.
Junto as duas e as deixo no bolso lateral do mochila. Pego celular e chaves, e decido sair de casa logo. Se eu continuar aqui, continuarei pensando demais.
Mesmo sem estar atrasada, saio apressada de casa. Já comi faz um tempo e meus pais já saíram, então não tenho motivos para ficar enrolando.
Em um gesto automático, acabo olhando na direção em que Brian sempre estacionava sua Mercedes, e dessa vez, ele não está lá. Ver aquele lugar vazio causa uma estranha sensação de vazio no peito, me parece que está faltando algo importante.
Na verdade, essa sensação se intensificou um pouco mais só agora, nem ontem eu estava desse jeito. Me sinto assim desde o momento que abri meus olhos hoje.
Tenho que me acostumar logo com isso, afinal é o que verei daqui pra frente. Aquela era minha rotina antiga, e agora preciso me acostumar a essa nova rotina, voltando a minha normalidade.
Solto um suspiro pesado, desviando meu olhar e seguindo para o ponto e ônibus.
Avanço pela faculdade, agradecendo aos céus que dentro do prédio está mais fresco do que do lado de fora. Mesmo sendo tão cedo, andar um pouco que seja debaixo desse sol já me causou um calor insuportável. Meu corpo inteiro está suando.
Com um clima desses, seria perfeito estar em na praia, ou quem sabe em um lugar com piscina. Ambos seriam ótimas escolhas para fugir desse calor.
- Ei, Clara?! – Ouço uma voz conhecida. Olho de um lado ao outro procurando o dono da voz, sem conseguir achar, quando noto alguém afastado me olhando e erguendo o braço – Aqui!
- Tiago! – Abro um largo sorriso ao rever Tiago, e vou correndo até ele, junto ao forte sentimento de saudade que me deu ao ver ele.
- Há quanto tempo garota. – Ele diz rindo, me dando um abraço caloroso e me tirando no chão. Antes que perceba, já estou rindo junto dele – Você sumiu... Literalmente... Por onde esteve?
Só agora que me dou conta de que faz dias que não o vejo. Na verdade, faz alguns dias que não encontro ele, nem Marina e Letícia. Acabei falando pouco com todos.
- É que semana passada as coisas ficaram meio bagunçadas pra mim, e eu precisei tirar umas férias para poder ajeitar tudo. – Acabo dando um meio sorriso.
Tiago não me responde, ele aperta os olhos e me encara por alguns longos segundos. Não entendo o que ele está olhando com tanta atenção, afinal ele já viu que tenho uma cicatriz no rosto desde quando voltei da viagem... Espera...
Não é minha cicatriz, ele está encarando diretamente os meus olhos. Agora que me lembro de uma coisa importante. Meus olhos tornaram-se vermelhos desde aquele dia que fui possuída pela entidade.
E de lá pra cá, simplesmente não me encontrei mais com nenhum dos meus colegas. O máximo que fiz foi trocar algumas mensagens com Marina e com Letícia para avisar que eu estava bem... E no fim, não passei disso por estar aproveitando aqueles dias com Brian.
- Você está... Diferente. – Tiago segue me olhando curioso, erguendo suas sobrancelhas.
- Sim, eu sei... Meus olhos estão bem mudados... – Digo em um suspiro, começando a caminhar devagar em direção as salas, e o garoto me acompanha. A última vez que Tiago me viu foi no dia que a entidade tomou posse do meu corpo – Foi depois daquilo que aconteceu lá em casa.
- Fim de semana complicado. – Ele balança a cabeça, levando as mãos a cintura. – Aquilo foi um verdadeiro choque pra todo mundo. Ninguém estava esperando.
- E como, primeiro o Ricardo aparece bêbado, e logo depois fui possuída pela coisa que queria me trucidar. – Ergo os ombros segurando uma risada, enquanto chegamos as escadas e vamos subindo, desviando de alguns outros alunos que vem no sentido contrário – Quando que eu iria imaginar passar por isso?
- É o tipo de coisa que ninguém imagina. – Ele me da um sorriso em resposta.
Balanço a cabeça rindo fraco – Ainda não perguntei isso pra ninguém. Como foi lá em casa depois que "eu" saí?
- Todo mundo ficou bem perdido, o ânimo zerou depois daquilo. – Tiago torce a boca e ergue seu rosto, parecendo refletir – Ficamos lá até seu pai chegar, e depois disso sua mãe estava mais calma, e todos fomos embora. A Letícia foi embora com o tal Gabriel, e a Marina disse que não queria ficar sozinha por estar muito abalada e pediu que eu fosse com ela pra casa. Ela só foi se acalmar depois que teve notícias suas.
- Sim, e na verdade, só peguei no celular pra isso. – Digo erguendo os braços e me espreguiçando, o olhando de canto – Só mensagem avisando que estava bem na segunda-feira quando mexi um pouco no celular...
Tiago solta uma risada – Você não faz ideia de como acalmou a Marina quando deu notícias. Ela estava quase surtando de preocupação.
- Acho que consigo imaginar. – Tiago me ergue uma sobrancelha, e saímos pelos corredores, rumando para a minha sala – Talvez eu ficaria do mesmo jeito se acontecesse com ela.
Ele contém o riso – Será?
Sorrio de canto – Eu não duvidaria.
- Se está dizendo, então irei acreditar. – Ele responde e nós dois rimos.
Chegamos em frente a minha sala e Tiago vai entrando, quando alguém vem andando apressada e por muito pouco não esbarra nele. Reparo ser Letícia. – De... Desculpa Tiago, eu estava distraí... Clara?
A surpresa toma conta de sua expressão. Letícia vem até mim e da um abraço apertado, que logo retribuo.
- Por onde você esteve por todo esse tempo Clara? – Ela diz, se afastando e me olhando.
- Desde aquele fim de semana eu estive "de férias". – Acabo repetindo a mesma resposta que dei para Tiago.
- Você esteve sumida, mandou mensagem semana passada e depois mais nada. – Ela responde sem parar de me olhar, parecendo ainda não acreditar que eu estou mesmo aqui.
- Precisei de um tempo para mim, também fui resolver algumas coisas... – Ergo os ombros – Eu conto tudo... Aliás, onde está a Marina?
- Espera só um pouco que eu vou chamar. – Letícia se vira, colocando só metade do corpo para dentro da sala – Marina! Vem cá agora, é importante!
Passam alguns segundos, e Marina surge na porta, esfregando os olhos e resmungando – Ai, eu to com sono Letícia, só queria cochilar... O que aconteceu... Clara!!!
Qualquer sono que Marina poderia ter parece que desapareceu por completo. Seu olhar se ilumina, e ela vem correndo me abraçar com toda a animação possível, tanta que por muita sorte não me desequilibrei.
- Por que não deu mais notícias? – Ela pergunta sem se afastar de mim.
- Era o que eu estava contando agora... – Tento explicar, mas sua animação é tanta que é até difícil me concentrar no que dizer. – Podemos entrar? Explico o que aconteceu pra todos.
- Por favor, nos conte mesmo. – Marina me solta do abraço, mas logo pega minhas mãos e me puxa para a sala, e posso escutar as risadas de Letícia e Tiago logo atrás de mim – Deve estar com saudade das aulas, ficou tanto tempo longe.
- Mas nem pensar, só de entrar nessa sala já me deu sono. – Devolvo a brincadeira e trocamos risadas.
Chego a minha mesa e me sento, reparando que nossa bagunça matinal rendeu alguns poucos olhares feios em nossa direção. Tanto faz, a sala está praticamente vazia e não tem nenhum professor aqui para nos punir com toneladas de matérias chatas. Se estão incomodados, então que levantem e deem um passeio pelo campus até a hora da aula começar.
Todos se acomodam nas mesas ao meu redor, com seus olhares em mim. – Mas conta, o que andou fazendo durante essa semana que nem oi estava mandando? – Marina fez a mesma pergunta que os demais.
- Ué, tirei esses dias de férias, fiquei resolvendo alguns problemas... – Ergo os ombros, e Marina me encara como se já entendesse que estou escondendo o jogo. – Passei a semana com Brian...
- Agora sim o termo "férias" fez muito mais sentido. – Tiago brinca, e tanto Marina quanto Letícia acabam rindo em resposta.
- Calma, não fiquei só descansando... – Digo erguendo as mãos, pedindo para esperarem.
- É Clara, passando todo esse tempo com o Brian, tenho certeza que descansar foi à coisa que você menos deve ter feito. – Marina diz brincalhona e completamente sugestiva, erguendo uma sobrancelha e sorrindo de canto. Me esforço muito para conter a risada, mas a expressão de devassa que Marina me lança é o bastante para que eu me desmanche em risadas. – Confirmou o que eu disse meses atrás né? E ai, o que achou?
Letícia balança a cabeça negativamente e cobre os olhos, e Tiago coça o queixo, ambos segurando as risadas por causa do rumo que essa conversa está tomando.
- Marina... – Digo respirando fundo e a olhando por longos segundos, lembrando dos vários momentos que tive com Brian na última semana. – Incansável.
- É, eu sei muito bem disso. – Ela concorda com a cabeça, e gargalhamos juntas.
- O que o Brian diria se ouvisse essa conversa sobre ele? – Tiago questiona olhando para Letícia, ela só ergue os ombros e volta a rir.
- É uma boa pergunta. – Marina balança a cabeça rindo, respirando fundo para conseguir controlar o riso – Você passou essa semana na casa dele?
- Sim, fiquei aproveitando com ele até domingo... – Minha animação murcha um pouco – Ai ontem, depois que resolvemos algumas coisas, eu voltei pra casa.
- Você ficou tão amuada de repente... O que aconteceu? – Leticia questiona.
Torço a boca e baixo o olhar – É ai que entra a parte que estive resolvendo problemas.
Eles trocam um olhar, voltando a me observar. – É o que estou pensando? – Tiago é quem diz.
- Sobre a entidade e o que aconteceu depois de eu ter sido possuída? Sim. – Ergo os ombros, juntando as mãos – Vou encurtar um pouco a história. Não lembro o que aconteceu enquanto estive sob controle. Só sei que Brian precisou lutar com a entidade controlando meu corpo, e só lembro a partir do momento que acordei já no consultório do Ferdinand no meio de um ritual de exorcismo, fiquei sabendo que meus olhos haviam mudado para vermelho, acho que por uma consequência de ter sido possuída... Enquanto isso, Brian estava desacordado na ala médica.
- Nossa... – Marina diz em um sussurro – Ele falou mesmo que daria um jeito de te trazer de volta, e saiu às pressas da sua casa. Ele estava bem tenso... E parece que não foi nada fácil.
- Fácil? – Balanço a cabeça e torço a boca – O Brian ficou no limite. Se machucou por inteiro, tomou um corte fundo no ombro, não aguentava levantar o braço e ainda precisou voltar dirigindo, bateu e saiu com o carro para fora da rodovia, deu um jeito de voltar pra estrada... Me falaram que ele chegou pálido de tanto sangue que tinha perdido no caminho de volta... Brian chegou muito perto de morrer, não sei como ele sobreviveu.
Todos estão tensos e concentrados. Nenhum dos meu amigos pisca nesse momento, todos boquiabertos com o que acabei de relatar. – Mas como ele está? – Letícia pergunta preocupada.
- Agora o Brian já está bem. Ele pegou folga essa última semana para repousar e se recuperar de todos os ferimentos. E também descansar a mente de tudo que havia acontecido... – Suspiro.
- Ainda bem que ele está melhor... Que vocês dois estão bem na verdade, depois do que aconteceu, precisavam mesmo descansar. – Marina assente me olhando nos olhos por alguns segundos. Imagino que ela vai perguntar sobre isso, exatamente como todos os outros fizeram... Mas para minha surpresa, ela não pergunta nada.
Confirmo com a cabeça – Sim, no domingo mesmo tudo já estava resolvido, então como não tinha mais o que fazer lá no consultório, só voltei pra casa... Ai ele foi me visitar pra ver se eu estava bem e dormiu lá em casa, segunda fui pra casa dele e ficamos por lá até ontem... E hoje estou voltando a minha vida normal, em definitivo.
- Só que isso não explica porque você ficou tão pra baixo Clara. – Tiago apoia o rosto sobre a mão – Sei lá, tudo deu a entender que essa semana que passou com Brian foi ótima.
Letícia e Marina trocam um olhar rápido, e logo então olham para mim. Pelo visto, as duas já devem ter começado a entender o que significa "voltar a vida normal". Não planejo contar em detalhes que eu e Brian acabamos rompendo o elo que tínhamos, no máximo mencionarei que acabamos nos afastando um pouco.
- Não é nada, só coisa minha... Aliás Tiago, quero te perguntar algo. Você comentou que estou diferente... E essa é uma coisa ruim? – Questiono apontando para meus olhos, sem saber bem qual resposta eu terei.
- Ta brincando Clara? – Tiago abre as mãos, com um sorriso divertido – Não, de jeito nenhum. Apesar de saber o que causou essa mudança nos seus olhos, nem de longe achei uma coisa ruim... Ficou o máximo, acho até que prefiro assim.
- Você sendo você, então, que problema tem? – Marina erguendo as sobrancelhas – Eu pelo menos não vejo problema nenhum, só é diferente.
Respiro aliviada, dando um pequeno sorriso – Por um momento, achei que vocês pensariam que ainda sou a entidade.
- Da pra saber quando é você Clara. – Letícia sorri – Então agora é definitivo, a entidade não já não existe mais?
Reflito um momento com essa pergunta, que a primeiro momento fiz a mim mesma e acabei deixando de lado por acabar me distraindo com várias outras coisas... Mas agora, volto a pensar sobre isso.
Me recordo do fato que no fim, não existia apenas uma, mas sim duas entidades. O lado ruim, que todos nós conhecemos muito bem, e o lado bom que me ajudou tanto e sequer sei o nome, isso se ele tiver um.
Eu gostaria muito de poder ter passado mais tempo com o lado bom. Ter tido a chance de conversar mais, descobrir mais a seu respeito, mostrar para ele mais desse mundo. Fico curiosa em saber qual seria a reação dele ao conhecer o verdadeiro parque Ibirapuera, estar lá e ver tudo com os próprios olhos.
Não só isso, eu o levaria para ver outros lugares, muitos outros... Quem sabe, ele poderia me acompanhar em um dos meus passeios pela Sé, ou então pela Liberdade. Talvez irmos conhecer lugares além desses... Será que ele contemplaria cada um dos lugares que eu apresentaria, do mesmo jeito que fez com apenas uma imagem que criei na minha mente?
Pensar nisso me tira um sorriso, mesmo que me entristeça saber que não vai acontecer.
Eu vi bem como Amanda e Ferdinand conduziram aquele ritual para retirar a entidade do meu corpo, e não acho que Ferdinand mentiria sobre não haver mais vestígios da entidade em mim.
É triste pensar que ele deixou de existir junto com sua contraparte, ele não precisava desaparecer junto... Mas não tinha outro jeito. Preciso aceitar isso, superar e seguir em frente.
- Sim... – Respondo em um fio de voz e abaixando o olhar – Ela não existe mais, finalmente estou fora de perigo... Estou livre, e de volta a minha vida normal.
Marina se aproxima, passando seu braço ao meu redor e me abraçando de lado, me oferecendo um sorriso singelo. Com certeza ela entende muito bem que não estou assim tão feliz por ter voltado, é minha melhor amiga afinal.
- Mas vamos ver o lado bom da coisa, tudo acabou. – Aumento meu sorriso, apoiando o rosto na mão e olhando para todos – Perdi muita coisa enquanto estive fora?
Tiago me balança uma mão – Perdeu nada não, relaxe.
- Você que diz isso, vive por ai furando suas aulas... Inclusive, nem do nosso curso você é Tiago, ta falando o que? – Marina provoca sorrindo de canto e se vira para mim – Perdeu algumas matérias, mas é pouca coisa. Depois te passo, tenho tudo anotado.
- Agradeço e muito Marina. – Sorrio e viro minha atenção para a loira – Aliás Letícia, por que estava saindo com tanta pressa?
- Porque estou com fome. – Ela responde rindo – Eu estava indo comprar alguma coisa, quando quase atropelei o Tiago na porta.
- Mas não seja por isso, vamos lá agora. – Digo me levantando em um pulo. Viro meu olhar para Marina e Tiago – Vocês vêm?
- E ainda pergunta? – Marina se levanta também, se espreguiçando por alguns segundos.
- Achei que estava com sono. – Tiago aponta sorrindo de canto.
- E eu que você tinha aula. – Marina salta as sobrancelhas, devolvendo a provocação.
- Certa pessoa disse uma vez que vivo furando aulas. – Ele rebate levando as mãos aos bolsos da calça, sem deixar de analisar Marina. – Acho que posso escapar da aula de hoje também.
- Depois fica desesperado precisando de nota, e não sabe o porquê. – Marina diz, tocando o ombro de Tiago com a ponta do indicador.
- Sou um fotógrafo em treinamento, posso conversar com meu professor para tentar recuperar minha nota com um belo álbum artístico. – Ele diz erguendo o rosto de leve, passando uma mão pelo queixo assumindo uma expressão pensativa por um curto momento. Tiago abre um sorriso de ainda maior que antes – Só que precisarei de uma linda modelo para fazer boas fotos... O que acha de ser minha modelo Marina?
Não sei por quê... Mas o tom de Tiago não pareceu ser o mesmo de sempre. Estou com a leve sensação de que ele acabou de dar em cima de Marina na maior cara dura.
Marina pisca algumas vezes, permanecendo estática com uma expressão surpresa. Ela junta as sobrancelhas e balança a cabeça negativamente – Mas nem pensar, vai saber quais tipos de fotos você vai querer fazer comigo... Nunca que vou posar pra você.
Letícia se aproxima de mim, cruzando seus braços e olhando atentamente para os dois que permanecem debatendo – Vivem "brigando". Será que termina em namoro? – Sussurra segurando seu riso.
- Esses dois? – Cochicho de volta. Dou uma rápida olhada confirmando que não estão prestando atenção em nós, e balanço a cabeça negando – Estão nisso a tanto tempo, que estou perdendo minhas esperanças.
- É, mas ele ta tentando. – Letícia sorri de canto, cruzando os braços – E não é de hoje.
Concordo com a cabeça – Sim verdade, já faz tempo que ele está nessas indiretas bem diretas.
Marina se vira para nós com uma expressão desconfiada – E o que as duas estão cochichando?
- Sobre quando vocês dois vão pausar esse debate para podermos ir. – Desconverso de imediato. Balanço a cabeça algumas vezes, dando um longo suspiro fingido – O professor vai chegar, e vocês dois ainda estarão aí discutindo.
Marina e Tiago se encaram de canto de olho. Poderia até dizer que saem faíscas de seus olhares. Marina cruza os braços com uma expressão brava, quase fazendo bico, enquanto que Tiago continua sorrindo tranquilo, parecendo satisfeito por ter conseguido algo que queria.
Suspirando, minha melhor amiga concorda ainda com a cara amarrada – Ta bem. Vamos fazer uma trégua por enquanto.
Troco um olhar com Letícia que me ergue os ombros em resposta, e acabamos rindo desses dois. Alcanço algumas coisas que deixei sobre minha mesa, e sigo Letícia para fora da sala.
- Saiba que isso ainda não acabou Tiago. – Ouço Marina resmungando atrás de mim.
Tiago ri baixo – Eu espero que não tenha acabado mesmo.
Olho para os dois por cima do ombro. Marina está mostrando a língua para Tiago, enquanto que o garoto sorri animado passando o braço em torno dos ombros dela e a puxando gentilmente para mais perto de si.
Sorrio com a cena, repensando a pergunta que Leticia fez momentos atrás.
Realmente, acho que terminam em namoro.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro