Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

Capítulo 3 - Ferdinand e o Estranho

6930 Palavras

Durante o caminho inteiro eu preferi ficar quieta, ignorando totalmente qualquer coisa dita pelo meu namorado. Eu até entendo que ele está tentando me fazer se sentir um pouco mais animada, mas hoje eu não estou muito no clima pra me sentir animada para nada.

E ele usar seus clássicos assuntos de joguinhos não está ajudando muito no meu já péssimo humor matinal.

Enquanto ele matraqueava sem parar, me mantive olhando para o céu ou para as gotas de chuva que batiam no vidro, tão idênticos ao meu humor momentâneo. Legal, estou fazendo comparativos do clima com o meu humor, acho que estou sendo bem ridícula.

Tentei me distrair seguindo o trajeto que as gotas faziam pelo vidro, mas isso não ajudou muito, nem ajudou a ignorar o fato de Ricardo ter feito algum caminho errado não uma, mas várias vezes. Ele não quis pedir informação, então acabou perdido mais algumas vezes, entrando em sei lá quantas ruas erradas.

Teimosia sempre foi algo muito característico do Ricardo.

Acho que Letícia ficou impaciente com meu namorado errando tanto o caminho, que ela fez uma rápida busca no celular, ditando o caminho que precisávamos tomar sem muito tato, e eu a agradeço em pensamento.

Acho que não levamos mais que dez minutos para chegar depois que ela começou a indicar o caminho certo. E bem, aqui estamos.

O lugar é em um prédio cinzento, que a primeiro momento pensei ser um ambiente residencial pela sua arquitetura discreta, além disso, a rua está calma e não tem muitos barulhos a nossa volta, com alguns poucos carros estacionados ao redor. Olhando melhor, tenho ainda mais impressão de ser apenas um bairro comum de tão tranquilo... Bairro de mais alta classe pelo que estou vendo, são alguns carros de alto valor a mais do que populares.

Saio do carro junto com Letícia, e seguimos juntas até a porta que tinha uma larga cobertura. Esperamos Ricardo terminar de estacionar o carro e vir ao nosso encontro.

Assim que entramos, mudo totalmente minha concepção sobre aparências. Agora que entramos, vejo como a recepção é ampla, toda pintada com a cor branca, várias fileiras de cadeiras, um bebedouro, uma televisão que parecia ter 32 polegadas e um ventilador desligado.

Por sorte não tem muitas pessoas aqui, passo meus olhos rapidamente contando onze pessoas, acho que não demoraremos muito... Ou talvez sim, sabe-se lá quantas pessoas estão trabalhando aqui em pleno sábado.

Ricardo então se aproximou da recepcionista, e sem espera ele explica sobre minha situação sem se alongar muito. E ela, por sua vez, prontamente responde que devemos ir ao terceiro andar, nos apontando na direção dos elevadores. A recepcionista afirma que é lá que serei devidamente atendida. Dou um agradecimento com um gesto de cabeça, pensando que isso foi bem mais rápido do que eu esperava.

- Espero descobrir logo o que são esses pesadelos. – Comento com a mão na cabeça, apertando o botão do elevador. Apesar que minha ideia de voltar para casa e apenas ignorar continua ecoando na minha mente.

Sinceramente, tenho minhas dúvidas quanto estar aqui.

- Pode ficar tranquila Clara, é só um momento ruim – Ricardo comenta me abraçando. Acabo enrijecendo o corpo por um segundo assim que sinto as roupas molhadas dele. A sensação é agoniante, mas logo acabo cedendo.

As portas abrem, e nós entramos. Não sei dizer o que ta de errado comigo, eu normalmente falo tanto mas hoje estou quieta. Um par de pesadelos conseguiu me afetar assim?

Me olho no espelho do elevador, observando bem meu reflexo no espelho enquanto o elevador subia. Estou mesmo bem mais desarrumada do que costumo estar. Olho para as roupas que escolhi novamente, não são nem perto das roupas que gosto de vestir.

É uma prova de quão estranha estou hoje.

As portas se abrem novamente, dando a um corredor de paredes e pisos de ladrilhos brancos, bem iluminados. Saímos, e já estamos em mais uma sala de espera, mas essa aqui tem algo de estranho, o clima aqui é diferente... Não sei como, não entendo e não sei como explicar, mas esse lugar é diferente.

Me adianto para as cadeiras, quero só ficar quieta no meu canto e deixar o Ricardo resolver isso por mim, mas antes que eu alcançasse um banco, esbarro em alguém. É um cara.

Me vejo surpresa, não posso deixar de olhar esse rapaz bem a minha frente, muito bem vestido com um terno, cabelos negros lisos e pouco penteados, com mechas caídos pelo rosto de um estilo bem parecido com o que eu gosto de fazer mas ele tem seu toque masculino, e um olhar castanho escuro sério em minha direção, intimidador a ponto de eu prender minha respiração por um momento.

Durante alguns segundos, ou o que eu achei serem quase minutos eu olho em sua direção, sem conseguir dizer uma única palavra, seja para insultar ou para pedir desculpas. Estranhamente, olhar para esse cara me faz sentir algo diferente, um nó na garganta e meu estomago se revirando. Me atrevo a dizer que me sinto confortável. E enquanto olho para esse estranho rapaz, eu podia sentir seu coração bater de uma forma que nunca sentiu antes... Espera, por que estou assim?

Meu transe é interrompido quando Ricardo interviu, se colocando na minha frente.

- Toma mais cuidado! – O rapaz encara Ricardo, de uma maneira que pareceu indiferente, acho que considerou Ricardo uma mosca. Sem dizer uma palavra, pega alguns papéis na recepção e caminha pelo corredor, seus passos ecoando pelo lugar que agora parecia silencioso, por fim entrando em uma das salas. – Quem ele pensa que é? – Ricardo bufa sozinho.

- Esquece isso... – Comento em voz baixa, seguindo para a recepção do lugar. Eu comemoro que Ricardo não fez nada, arranjar uma bagunça agora não vai ajudar em nada, mas nessa situação, é melhor eu mesma tentar resolver. – Temos coisa melhor para fazer...

A mulher de aparência jovem sentada atrás do balcão me observa calmamente por de trás dos óculos, entrelaçando seus dedos – Olá. Como posso ajuda-la? – Perguntou com um sorriso. Sua voz soou suave como sua aparência.

- Bom dia moça, bem... Eu... Eu gostaria de fazer uma consulta... Existe alguém disponível para agora? – Pergunto da maneira mais tranquila possível, mas sei que pareci bem vacilante.

Com toda certeza ela deve me achar cara de pau de chegar aqui do nada e pedindo uma consulta tão em cima da hora. Estou preparada para receber um não da forma mais gentil, ou rude possível.

Ou talvez, um pote de óleo de peroba para passar na minha cara de pau.

- Claro, irei consultar. Só um momento, por favor... – A mulher me diz sem alterar seu tom de voz, o que me tranquiliza. Essa mulher já mostrou não ser grossa de graça. Ela olha a tela, passa a ponta dos dedos no canto do rosto desviando o olhar para o lado um segundo, se voltando para seu computador logo em seguida, bate algumas teclas e para por alguns segundos, mordendo a ponta de sua unha, visualmente pensativa. Apoiou o queixo na mão parecendo estranhamente concentrada, digitou mais algumas coisas, moveu o mouse, e então se vira para mim – Até tem sim. Mas me diga, qual o problema?

- Ela está tendo pesadelos e agora está perturbada. – Ricardo diz simplesmente, enquanto passeia os olhos ao redor dando a impressão de procurar algo. Eu não escondo a cara feia quando ele disse o termo "perturbada", acho até que eu poderia bater nele agora, mas eu me controlo. O que Letícia disse antes sobre ele fazer parecer que sou uma doente ou que tenho problemas volta a minha mente, ele fez um extremo pouco caso e foi uma ideia dele mesmo. Acho que agora eu dou um pouco mais de razão a ela. – Queremos dar um jeito pra ela melhorar.

A mulher esfrega os dedos em suas têmporas suavemente – Por favor, me desculpe se me fizer parecer grosseira ou indelicada... Mas este bagunceiro mal-educado está com você?

Observo Ricardo com o canto dos olhos, levo a mão a boca, tentando me segurar para não começar a rir pelo comentário. – É... Está sim. Desculpe pela falta de modos dele.

- Tudo bem... – Suspira alongando os braços sobre a cabeça – Acho que já estou acostumada com esse tipo de arruaceiro por aqui, ainda não sei como não surtei. São mais comuns do que eu gostaria que fossem... – Ela solta um pequeno sorriso de deboche, que acabo copiando por educação. Ricardo revira seus olhos em irritação. Ela ajeita sua postura, voltando a digitar algo, e olhando uma última vez para a tela, a mulher diz – Desculpe pelo desabafo. É só uma frustração diária.

- Não acredito que venha gente bagunceira aqui todos os dias... – Digo, tentando um sorriso.

- Acredite, aparece muita gente complicada nesse lugar... Por sorte nem todos os "complicados" são complicados de aguentar, eu enlouqueceria se fossem... – Ela me responde dando uma risada. Recompondo sua postura em definitivo ela então me diz, passando uma folha junto com uma caneta. – Te confirmando a respeito, sim existe disponibilidade de horário, mas preciso que preencha essa ficha para poder ser chamada.

Dou uma olhada na ficha bem por cima, e então olho em volta para ter certeza se não tem nenhuma outra pessoa esperando. – Ah, não teria problema de preencher aqui?

- Claro que não, sem problema nenhum. Se aparecer mais alguém, só alguém ir um pouquinho para o lado – Ela me responde com um sorriso, me entregando uma caneta.

Respondo também com um sorriso, e então me concentro em preencher a ficha. Meu nome primeiro, Ana Clara Santos. Idade, 20 anos. Altura, 1,57... Nossa, até altura? Data de nascimento, endereço, cidade, escolaridade, se fumo, antecedentes de saúde, se tenho filhos, religião... Perai, religião também?

Ta, isso não deve ser nada, acho que é o normal de ficha dessas... Acho...

Bem, nunca vi uma dessas, mas que é estranha, com certeza é.

Continuo completando essas primeiras informações, achando bem sem noção. Termino de completar as primeiras lacunas, vendo o que mais consta aqui. Informação sobre meus pais, informações do ocorrido...

Ta bem, acho que não tenho outra escolha que não seja terminar de preencher.

Assim que termino, entrego a ficha para a recepcionista. Ela analisa, digitando algumas coisas no computador. Ela coloca a ficha sobre um scanner, e logo depois a tira. Ela bate os dedos algumas vezes na sua mesa, e então me diz – Quem temos disponível é Ferdinand, mas para agora ele não conseguirá te atender. Ele poderá atende-la dentro de uns 20 minutos. – A mulher se levanta e olha ao redor, instintivamente eu acabo seguindo seu olhar. – Por favor, sente-se. O senhor Ferdinand irá chama-la logo.

- Muito obrigado – Digo, me dirigindo a primeira cadeira que vejo. – E desculpe de novo por ele. – Comento antes de me sentar, vendo a mulher concordando com a cabeça, ajeitando os óculos no rosto e se sentando novamente. Bem... Vinte minutos de espera, pouca coisa.

Junto minhas mãos em frente ao corpo, as esfregando uma na outra. Eu esperava que esse lugar fosse frio, mas na realidade é bem mais agradável do que aparenta, pelo menos o ambiente é tranquilo.

Me mantenho em silêncio, assistindo a televisão que havia ali. Procurou Ricardo e Letícia com os olhos, os encontrando perto do bebedouro. Percebo que ele está conversando com bastante animação, como se nada estivesse acontecendo, o que de fato, para eles não está. Nem para mim, o que me faz relembrar como raios eu vim parar aqui.

Continuo olhando para os dois, que estão estranhamente próximos, se a tanto tempo atrás mal olhavam na cara um do outro. Balanço a cabeça, ignorando essa estranha aproximação dos dois e estar aqui por motivos tão ínfimos. Esse tipo de coisa não é importante nesse momento, então volto a assistir à televisão.

A programação é diferente. Mesmo tendo televisão a cabo em casa, eu nunca vi esse canal. O programa fala de tantas coisas ao mesmo tempo, a respeito de outras formas de ver o mundo, os segredos da mente humana e o que ela poderia esconder, os mistérios e o que mais pode existir. Tantas informações de uma só vez fazem a minha cabeça da girar.

Apesar que hoje em dia existe canal de tudo, muito provavelmente deve haver um canal só para essa área, só mente humana... Não sei... A sensação que tenho é que, de certa forma, esse lugar foge um pouco da realidade, não sei como.

Em certo momento, escuto passos ecoando do corredor que a recepcionista tinha observado, e isso acaba atraindo meu olhar. Vejo o mesmo rapaz de antes atravessando a sala de espera e parando na recepção, ele se debruça de leve, apoiando parte do peso no braço e pegando mais alguns papeis com a recepcionista. Admito que nessa hora fiquei tentada em olhar para ele enquanto estava ali, e prestar atenção em cada um dos detalhes que pudesse notar.

Ele ainda estava com o olhar sério, mas isso não o impedia de soltar alguns sorrisos quase discretos para a recepcionista, o que me dão uma pequena sensação de estar lá e ouvir também. Os dois falavam continuamente, pareciam brincar com algo, riam discretamente um para o outro de algumas coisas que não consigo ouvir, muito menos entender... Que coisa bizarra, como eu consegui ouvir os passos dele de longe, mas não consigo entender o que falam?

Admito que sinto uma leve ponta de inveja da recepcionista, mas só balanço a cabeça, afastando esses pensamentos.

Ignoro isso e continuo o analisando, por debaixo do sobretudo que ele veste aberto, que por sinal é muito diferente dos que eu já vi antes indo até metade das coxas, ele veste um fino terno negro muito bem alinhado. Apesar de bagunçado, seus cabelos lisos pareciam muito bem alinhados, caindo pela sua testa e em volta de seu rosto, além de uma discreta barba que começava a nascer em seu rosto.

Em uma hora bem inesperada, ele se vira e me encara por alguns segundos, me pegando de surpresa. Inevitavelmente eu desvio o olhar, constrangida por ter sido pega olhando em sua direção, mas logo meu olhar volta a ele. O vejo erguendo uma sobrancelha com uma expressão que não sei definir. Ele aponta um dedo em minha direção, e então vira o rosto para a recepcionista, que confirma acenando.

Estavam falando de mim?

O rapaz me encara uma última vez, balança a cabeça negativamente, pega alguns papéis da recepcionista e se afasta dando um passo atrás. Escuto a risada dela e então ele rindo junto e erguendo as mãos parecendo se defender de alguma brincadeira, ele então se afasta indo de volta ao corredor. Será ele o tal Ferdinand?

O tempo passa de uma forma bem mais arrastada. Acho que cada segundo está parecendo uma eternidade. Chego até a tentar me entreter usando a parede como inspiração, mas é muito difícil fazer isso sem uma linha de formigas ou qualquer coisa que seja para me ajudar nessa tarefa.

Agora entendi porque minha mãe reclama tanto quando precisa ir ao banco, o tédio que ela deve sentir quando precisa fazer alguma coisa lá deve ser bem igual ao que sinto nesse lugar... Se for pior do que aqui, então não sei o que minha mãe tem na cabeça pra aguentar, pois estou quase enlouquecendo.

Finalmente a mulher da recepção se levanta e me chama. Ela me entrega uma folha que vejo ser a ficha que preenchi antes, e então indica o número da sala que devo ir. Dou uma longa suspirada, a mulher percebe e me da um sorriso compreensivo, acho que ela deve entender como estou me sentindo... Ou no mínimo se sensibiliza ao ver mais uma paciente em potencial. E assim sigo na direção que acabei de receber. Letícia acabou notando que me levantei e acaba me seguindo, Ricardo vem logo atrás de nós.

Chego na porta que me foi indicada, dou algumas batidas e entro devagar em passos tímidos.

Quando entro, me vejo em uma sala espaçosa, com móveis incrivelmente bonitos moldados em madeira escura, vasos com plantas e belas flores espalhadas pela sala, esculturas, uma estante com vários livros e alguns quadros. Tem algumas poltronas e até um sofá de três lugares, e nos fundos uma mesa com um largo notebook que, pela aparência diferente, arrisco dizer valer uma fortuna.

O lugar é tão confortável que é difícil lembrar que se estou em um consultório psicológico. A calma que existe aqui é contagiante, invade e relaxa meu corpo. O ar está frio, mas não é incomodo, além disso praticamente não tem barulhos aqui além dos meus passos e dos demais.

A impressão que se tenho é de estar na sala de uma mansão, algum mega escritório de rico que já vi nos livros, ou algum cômodo de uma casa de alguém muito rico.

E sentado em sua poltrona segurando uma folha em sua mão, e na outra uma xícara branca com algo bem quente dentro, lá está um homem moreno, que parecia não ter chego nem perto dos trinta anos, usando óculos e vestindo um terno vermelho um pouco desalinhado, uma gravata em tom vinho, sua camisa branca com o último botão da gola solto e vestia também luvas brancas, e de pé ao seu lado, estava o mesmo rapaz que esbarrou em mim momentos antes, com um olhar igualmente sério quanto antes.

- Então, você é a Ana Clara... – comenta o homem, se levantando de sua poltrona e fazendo uma pequena reverencia em minha direção, sorrindo educadamente. Acabo me aproximando devagar, enquanto ele diz – Me chamo Ferdinand. Não se sinta acuada jovem moça. Sente-se, por favor.

- O que? Você é o psicólogo? – Letícia pergunta espantada, fechando a porta lentamente atrás de nós.

Ferdinand arqueia as sobrancelhas com o que ouve, olhando para si próprio por alguns segundos, parecendo procurar erros – É, eu... Eu acho que sim... – responde rindo e endireitando sua postura, começando a contar nos dedos – Vamos lá, estava esperando um homem gordinho, de cabelos calvos e barba branca longa, usando óculos, igual o Papai Noel? Pode dizer, não ficarei ofendido.

- Mais ou menos isso. – Ela sorri sem graça, passando um dedo na bochecha. Acho que não esperava essa pergunta – Bem... Óculos você já usa.

- Podem confiar em mim. – diz sacudindo uma das mãos – Essa é só uma imagem generalizada que algumas pessoas tem dos psicólogos, acho que pela ideia de precisarmos passar alguns bons anos da vida estudando... Mas sim, sou bem jovem mesmo, mas garanto que sou mesmo um psicólogo. – Ele se vira para mim. Não sei bem como reagir, nem o que falar para ele. Nunca vim em um psicólogo antes. Ele sinaliza para que eu me aproxime, e faz um gesto para que eu me sente. Eu obedeço, um pouco relutante. – E então moça, pela ficha que recebi, você teve alguns problemas com pesadelos nos últimos dias... Me conte melhor, o que aconteceu?

Agora que estou aqui, volta em mente a sensação do meu problema ser algo ridículo, e a total perda de tempo que é estar aqui. Assim que começar a falar ele vai ficar com uma cara feia pra mim e vai ficar louco para me tratar mal. Ai, o que eu faço?

Tenho que falar algo, ele está olhando pra mim e esperando que eu fale. – Eu não sei bem como falar... – Começo, sentindo minha voz bem vacilante – Nunca estive em um psicólogo antes sabe, me sinto desconfortável com isso.

- Não precisa se preocupar quanto a isso. Primeiro relaxe... Não se pressione tanto, pode seguir seu ritmo... Quero que se sinta confortável antes de começarmos, eu te ajudarei a superar esse problema. – Ele me diz tranquilamente.

Ai caramba, como eu vou fazer isso. Dou um pesado suspiro, é pra acabar logo – Parece ridículo, e na verdade é. São alguns pesadelos que ando tendo...

- Pesadelos? – ele junta as mãos em frente ao corpo, semicerrando seu olhar. Acho que ele começou a me julgar – Certo, conte mais. Isso começou quando?

- Sendo sincera Ferdinand, eu sempre tive esses pesadelos na minha vida. Quando mais nova, eles eram frequentes. – Suspiro o encarando no olhos. O homem está me observando atentamente, assentindo enquanto falo – Eles haviam parado depois de que atingi certa idade, se tornaram bem raros, coisa de uma vez por mês no máximo... Só que nos últimos meses eles voltaram a acontecer, na noite passada acabei tendo um pesadelo desses, e hoje de manhã aconteceu de novo.

Ele balança a cabeça com um semblante pensativo, mas ainda carregando um sorriso – Você passou por um tratamento psicológico anterior para cuidar desses pesadelos?

Nego também balançando a cabeça – Não senhor... Essa é a minha primeira vez.

- Certo... Você sabe o que são os sonhos e pesadelos Clara? - Pergunta apoiando o rosto na mão.

- Os sonhos são coisas as agradáveis... E os pesadelos são as coisas ruins que atrapalham o sono? – Pergunto erguendo as sobrancelhas e os ombros ao mesmo tempo, conseguindo arrancar uma risada do homem.

- Foi uma boa resposta... No nosso cotidiano, e segundo até alguns estudos, os sonhos são como uma grande limpeza cerebral. São reunidas as informações relevantes que teve em seu dia para serem memorizadas, e o que for irrelevante será descartado, contribuindo com sua memória. Em outros campos do estudo, os sonhos são uma maneira da mente no transmitir mensagens, sejam envolvendo aspirações, preocupações e também reflexões de situações e problemas que por algum motivo ainda não foram resolvidos. – Ele termina de falar com um olhar e sorriso calmo, mas falou tanto que só conseguiu me confundir...

E não foi pouco, mas acho que o psicólogo não precisa saber que deu um nó na minha cabeça.

Ferdinand retira seus óculos e então volta a falar – Nessa situação que temos, por se tratarem de pesadelos, então iremos encarar que existe algo te preocupando... Me conte mais a seu respeito... Você estuda? Trabalha?

- Não trabalho, apenas faço faculdade... – Respondo.

Ele balança a cabeça, trocando um olhar com o rapaz de antes, que até agora ficou calado apenas nos observando.

- Existe algo que esteja te preocupando ultimamente? – Continua, não sei se o levo a sério, afinal Ferdinand se mantém sorrindo a todo tempo. Até chega a dar a impressão de que não está me levando nem um pouco a sério – Alguma... Desavença em casa, uma inimizade resultando em conflito na faculdade? Ou então algum outro problema diferente?

- Não... – Respondo pensativa. O único "problema" que tive são algumas das atitudes de Ricardo, mas que normalmente acabo relevando por serem coisas muito pequenas. – Não tem absolutamente nada desse tipo acontecendo.

- Pois bem... – Ele passa uma mão pelo queixo por algumas vezes – Me diga, quais as características dos seus pesadelos?

- Características? – Questiono, pendendo a cabeça um pouco para o lado.

- Sim, me refiro a ambientação que você se encontrava no dentro do pesadelo, as cores, se haviam números, pessoas, algo que se destacava e chamava atenção. – Ferdinand deixa as mãos posicionadas em frente ao seu rosto, como se segurasse uma bola de futebol invisível, e continua a falar sem desgrudar o olhar de mim – Detalhes nesse sentido que podem nos ajudar a interpretar mais sobre seus pesadelos... Podem ser detalhes tanto dos pesadelos atuais, quanto dos que já teve anteriormente.

Começo a me concentrar, abaixando meu olhar. Tento relembrar os pesadelos que tive, tanto hoje quanto ontem à noite. Chego até a me esforçar a lembrar de algo mais antigo, mas não consigo me lembrar de nada.

Já me esqueci de todos os lugares que passei, esqueci o que havia ao meu redor, se haviam pessoas, mas nada. – Eu não consigo me lembrar de muita coisa, quando penso nisso, vem só um escuro na minha cabe... – Algo então me vem em mente em um estalo, a única coisa que não da para esquecer por todas as vezes que já surgiu. – Tem uma coisa, uma pessoa que apareceu nos dois pesadelos e em todos os outros que ja tive.

- Pessoa? Pode me descrever essa pessoa? – Ele diz, eu olho em sua direção, ele agora está com o corpo curvado para frente, nitidamente mais interessado.

- É um rapaz que parece ser bem jovem, bem magro e pálido, sempre sem camisa, usando só uma calça... Tem um sorriso macabro, sempre tem uma fumaça escura rodeando ele... – Assim que paro de falar, percebo como Ferdinand se tornou mais sério. – E além disso, ele me falou umas coisas como se eu não tivesse chance, mas não entendo o que isso significa... Sei que não tem nada a ver e é uma maluquice, mas quando despertei da primeira vez, coisas que deixei desligadas estavam ligadas.

- Esse caso é parecido com outros que vimos recentemente senhor Ferdinand... – Aquele rapaz diz de repente de forma séria. Olho para ele, o vendo passar uma mão pelo queixo com uma expressão fechada estampando seu rosto. – Pensando um pouco, as características apresentadas nesses pesadelos se assemelham muito.

- Também notei isso. – Ferdinand olha para seu assistente, e logo retorna a atenção a mim.

- Acha que pode ter alguma ligação? – Ele diz novamente.

- Provavelmente sim... – Começo a estranhar essa conversa que eles estão levando.

Troco um olhar com Leticia e Ricardo, os dois ficam calados a todo momento. A julgar pelos olhares dos dois, estão perdidos no meio de tanto assunto complicado... Na verdade, não os julgo por estarem assim.

O pior, é que o assunto começou a mudar para algo muito estranho... O tom da conversa deles está bem diferente agora, e não sei ao certo do que estão falando.

Agora que percebo, Ferdinand está com um semblante muito mais sério, seu olhar parece me atravessar, como se olhasse em direção da minha alma.

Ele apoia o rosto na mão, me analisando por alguns segundos. – Essa "pessoa" fazia algo no sonho... Por exemplo, ele te atacou alguma vez?

Agora estou estranhando a situação. Ele foi certeiro em sua pergunta. Olho para Ricardo e Letícia, que para a minha "sorte", continuam calados. Infelizmente eles não podem me ajudar, afinal os pesadelos são meus...

Pelo visto, tenho que me resolver sozinha.

Retorno meu olhar ao psicólogo e respondo. – Sim, nos dois pesadelos eu fui atacada e em vários outros também. Esse pesadelo é um tipo de lenda urbana de invasores dos sonhos ou algo do tipo?

- Talvez... Não... Acho que pode ser outra coisa um pouco mais complicada... – O psicólogo ergue a sua mão, e em um gesto rápido sinalizou para o rapaz ao seu lado, que concordou com a cabeça se aproximou de mim, reclinando a poltrona onde estou.

Foi tão rápido que mal percebi ele se movendo para perto de mim, muito menos tocando minha poltrona. Quando finalmente percebo, meu olhar está voltado para o alto, estou praticamente deitada e perdida por essa ação tão repentina.

Ferdinand então se aproxima, ajeitando os óculos em seu rosto – Podemos fazer um teste de hipnose agora, e ver se essa coisa aparece.

O tom de Ferdinand, apesar de descontraído, me passou uma seriedade muito forte, principalmente por ter se referido ao meu pesadelo como "coisa". Isso me assusta e me deixa acuada. – E isso pode dar certo? – ouço Ricardo perguntando.

- Sim... Com sorte faremos essa coisa reaparecer... – Ferdinand completou repetindo novamente o termo, passando sua mão no queixo e parando bem ao meu lado. – Desta maneira, podemos fazer vocês nos dar mais detalhes deste seu pesadelo, até ajudar a solucioná-lo de forma mais efetiva.

Dou um pequeno sorriso falso – Então vale à tentativa. Já que estamos aqui né...

- Esse é o espirito. Agora Clara... Se me permite te chamar assim... – Ferdinand esfrega uma mão na outra, aparentando se preparar para algo – Respire fundo e limpe sua mente...

- Espera... – Consigo dizer, minha voz agora está vacilante. Olho para Ferdinand, agora também para Ricardo e Letícia que param ao lado da minha poltrona. – Mas o que acontece depois? Eu vou encontrar aquilo de novo?

- Este é só um método que usaremos para tentar descobrir mais sobre seus pesadelos... Acredite, você ficará bem, e com sorte conseguiremos rastrear essa coisa e fazer com que apareça. – Ergo a sobrancelha com esse comentário. Ele disse "rastrear"? – Ainda assim, não temos como saber... Ele pode ou não aparecer. É como o Golden Freddy no primeiro jogo de Five Nights at Freddy's, as chances não são tão altas. Você quer tentar mesmo assim?

Não entendi essa referência que ele usou agora, quem deve ter entendido é meu namorado a julgar pelo aceno positivo que ele lançou... Acho que eu deveria prestar mais atenção nas besteiras que ele me conta sobre jogos com um pouco mais de frequência. Mas ainda sim, sem entender, concordo com a cabeça.

Olho para todos que estão em volta da poltrona, para o psicólogo, a Letícia que me faz um gesto positivo, Ricardo que segura minha mão com um leve aperto e me deu um confortável sorriso, e então olho para aquele estranho rapaz. Por um momento, seus olhos se movem em minha direção, fazendo um gesto positivo para mim.

- Sim... Eu quero tentar. Acho que será o melhor a fazer. – Digo, agora olhando novamente para Ferdinand. Eu tenho uma estranha sensação, como se meu rosto tivesse esquentando, do mesmo jeito quando se fica vermelho por vergonha de algo. Espero não ser isso.

Ferdinand me observa com um sorriso de canto da boca. Ele então une suas mãos como sendo um gesto semelhante a uma reza. – Então primeiro, limpe sua mente, relaxe... E agora feche seus olhos... – Eu obedeço e faço como ele pede. Respiro fundo enquanto fecho os olhos. Sinto uma mão pousando sobre minha testa lentamente, ela se afasta e logo em seguida sinto apenas um dedo sobre minha testa. – Até depois!

Permaneço com os olhos fechados por alguns segundos, abraçada por um profundo e agoniante silêncio. Quando fico cheia de esperar qualquer coisa que seja, abro os olhos.

Uma luz forte ofusca minha visão, percebo que estou deitada em um gramado de um parque. Olho para o alto, o céu está aberto e o sol agradavelmente quente, como sempre gostei. Passo a mão pelo gramado baixo, é perfeitamente alinhado, observo a minha volta, perto de mim consigo enxergar uma rua, e ali passam várias pessoas. Espera...

Não acredito. Funcionou mesmo?

Ta bem, isso começou a ficar muito legal de uma hora para a outra.

Me levanto e olho para minhas mãos e logo toco meu corpo em busca da certeza de que estou aqui, com um pequeno sorriso surgindo em meus lábios. É um sonho, mas é tão agradável, estou sonhando, mas ao mesmo tempo estou acordada. Eu sinto vontade de sair correndo por aqui, fazer o que quiser, acho que não vou tomar bronca de correr descalça em um parque na minha própria cabeça. Vai dar para aproveitar muito aqui.

Minhas roupas não mudaram, mas não sinto o incomodo da luz do sol, na verdade ela me acolhe ainda mais do que acontece normalmente. Ouço as vozes das pessoas, a melodia do cantar dos pássaros, o vento suave me abraçando. Esse lugar é agradável.

Mas... Espera, tudo ficou quieto de repente. Olho de um lado ao outro, tudo está parado, se tingindo de cinza. Ai, o que está acontecendo agora?

Escuto passos na grama, bem atrás de mim, está se aproximando. Uma risada ecoa em todo o lugar, sei que tem alguma coisa atrás de mim. Respiro fundo e me viro devagar. A mesma coisa de antes, com os braços soltos e balançando de um lado ao outro como se estivessem quebrados, o cabelo no rosto e um sorriso bizarro, está se aproximando de mim. Eu pisco, a névoa surgiu de uma vez e já está em todo o lugar.

Eu não tenho que esperar nada, eu não vou ser pega por essa coisa de novo. Me viro e começo a correr para longe, correr para algum lugar. Mas correr para onde?

Não tenho ideia de onde ir. Estou dentro da minha própria cabeça, mas não sei para onde posso correr, muito menos como me esconder. Eu tenho que achar uma forma de escapar, sair de perto dessa maluquice. Essa coisa apareceu. Eu posso acordar agora. Eu posso acordar.

Eu tenho que acordar agora.

Vou na direção da rua, esbarro nas pessoas, elas não olham para mim, me ignoram como se eu não existisse. Paro algumas pessoas, sacudo elas tentando chamar a atenção delas, mas se soltam de mim e voltam a andar para sei lá onde.

Eu não terei ajuda aqui, sendo ignorada desse jeito só acabarei tendo problemas. Olho na direção daquela coisa, ela está parada onde eu estava, mas sei que está olhando em minha direção. Sua pose está assustadora, seu corpo está para frente, os braços pendendo quase arrastando no chão, sua cabeça torcida e de ponta cabeça e o mesmo sorriso de antes. Em um segundo ela desaparece, tudo se apaga, e então volta a minha visão, a coisa sumiu. Olho de um lado ao outro, não sei onde ela está. Percebo que ela reapareceu no parque, mas... Mais perto... Tudo apaga de novo, e então reaparece mais uma vez, a coisa está em um lugar diferente e ainda mais perto. Tudo apaga uma última vez.

Sinto algo atravessando meu corpo, uma dor aguda nos meus braços. Olho para baixo, estacas estão atravessadas nos meus ombros e meus braços, manchadas de sangue. Meu sangue. Uma nova estaca atravessa meu estomago, impactando meu corpo com força. Mais dor, eu grito. Sinto o chão com a ponta dos pés com dificuldade, tento me mexer, mas não consigo. Dói. Dói demais. Minha cabeça é puxada para trás de uma vez, a coisa está acima de mim, desfigurada. Ela abre a boca e grita, vindo em minha direção.

Tudo apaga, sinto o ar mais pesado. Olho de um lado ao outro, não estou mais no parque, meu rosto está contra algo duro, um chão não muito gelado. Ergo meu corpo devagar, estou agora em um corredor. O piso é de madeira, com um imenso tapete vermelho. Ao meu lado tem uma longa janela, e do lado de fora estava escuro e chovendo forte, mas pelos trovões, acho que estou no segundo andar de uma casa. Agora que dou por mim. Meu corpo. Levo minhas mãos aos meus ombros, toco eles, tocou meus braços, minha barriga. Não tem sangue, não tem estacas, buracos. Nada. Estou inteira. Morrendo de medo, mas inteira.

Olho ao redor, e me ponho a caminhar lentamente, atenta em qualquer coisa que seja. Escuto alguns barulhos de batida, que me fazem procurar em volta, sem achar nada. Volto a caminhar por esse corredor, sem ir a lugar nenhum. Não tem portas, a janela não tem trancas ou formas para abri-las.

De repente uma mão recai de forma pesada no meu ombro, tento me virar para ver o quem é, mas meu corpo é erguido do chão e sou arremessada para o alto, batendo minhas costas contra a parede e caindo no chão. Meu corpo todo está doendo depois disso, minha cabeça está girando e nem enxergo direito pelo impacto.

Levanto o rosto, finalmente posso ver seu rosto: Apenas um rapaz que aparentava ter seus 17 anos, cabelos agora brancos e longos, seus olhos avermelhados estavam arregalados em minha direção, e carregava um sorriso de prazer macabro, seu corpo é magro quase posso ver todos os seus ossos de tão esquelético, suas mãos estão abertas como se estivessem tendo espasmos.

Percebo algo se formando atrás dessa criatura, finalmente tomam forma. Quando percebo isso me choca. Os corpos de duas pessoas pendurados por correntes, manchas de sangue por todos os lados. Eu os reconheço... Esses são... Meus pais.

Horrorizada com o que vejo, eu começo a soluçar. Não consigo parar de chorar. Isso não é real... Não é real. Não pode ser real. Eu tenho que acordar. Sair daqui. Me levanto e corro. Não importa para onde, eu vou correr. Eu não vou parar de correr. O quão rápido que eu conseguir... Mas não consigo encontrar uma saída.

É só um pesadelo... É só um pesadelo. Fico ofegante, mas não paro, tenho que continuar.

Algo surge em minha frente, o que me obriga a parar de correr. Isso é diferente desse corredor. Uma imensa porta de pedra, diferente de tudo que encontrei antes. Eu nunca vi algo assim em toda minha vida, é uma porta de pedra mas tem algo nela, algo que a faz incrível. Não consigo me mexer, só olhar para essa porta.

Tirada do transe, sinto algo se envolvendo no meu pescoço, meu corpo é erguido e sou colocada no alto contra a parede. – Não tem como fugir, você será a próxima – Escuto ele falando, sua voz é estranha, arrastada e esganiçada. Essa coisa me soltou no chão, me fazendo tossir sem ar. A porta, é minha única saída. Não sei se devo abri-la, eu sinto que não devo, mas não tinha outra escolha.

Com o restante de força que ainda tenho me lanço para a porta, agarro a maçaneta rustica e a empurro, uso meu corpo para conseguir fazer mais força. Uma luz vem do outro lado, uma luz ofuscante, parecendo com a luz do dia.

Quando dou por mim, estou acordada no consultório de Ferdinand. Olho ao redor, com a visão embaçada, procurando por aquela coisa.

- E então? Como foi? – Ferdinand me pergunta calmamente. Eu estou mesmo de volta?

- Eu... Encontrei ele... – Começo a dizer, meu corpo inteiro está tremendo. Eu não sinto mais dores, mas medo. Apenas medo. Estou suando, estou chorando. Respiro apressada como se acabasse de correr uma maratona. – Meus pais... Eles... Eu não consegui fazer nada... Só consegui fugir por aquela porta...

- O que? Porta? – Ferdinand pergunta, erguendo uma sobrancelha. – Espera! Como era essa porta?!

- Não sei...! Isso por acaso importa?! – Eu grito sem perceber. Ricardo está do meu lado, ele me olha como se não me reconhecesse.

- Ei Clara, se acalme... – Ricardo diz em um sussurro, segurando meu braço. Eu não quero, mas ele então me abraça forte. Sentir isso me acalma.

- Sim, isso importa! – Ferdinand diz sério. Seu tom de voz agora é quase inquisitivo, todo o bom humor de antes parece ter desaparecido. Ele força uma tosse, se abaixando ao meu lado e fala, com o tom mais calmo. – Você não tem ideia de como isso importa Ana Clara... Não sei o que você viu, mas foi um sonho... Espero que seja apenas um sonho...

Olho não olho para Ferdinand. Estou sendo acolhida por Ricardo, tentando me recompor aos poucos. – Espera que seja...? – Consigo questionar.

- É... Bem... – Percebo uma hesitação vinda em seu tom de voz – Mas preciso que se concentre e me diga sobre a porta que você viu, precisamos disso para te ajudar... Acredite, isso realmente importa.

Eu o olho, balanço a cabeça concordando – Eu... Eu estava em um corredor... Aquela porta era estranha, acho que era de pedra e parecia única... Era diferente de tudo, parecia que não devia estar ali... – Respiro fundo.

- Você sentia algo vindo dessa porta? – Ele questiona de repente. Ele com certeza sabe de algo, as eu não tenho ideia do que seja.

Relutante, eu balanço a cabeça levemente. Percebo que o assistente de Ferdinand me serve algo em uma xicara, acho ser um chá quente com uma pequena pétala vermelha dentro, o aroma é adocicado e me passa um estranho calor que percorre pelo meu corpo causando um relaxamento gradativo. Acabo aceitando e dou um pequeno gole, o sabor desse chá também é doce, e quase de imediato meu corpo relaxa, todas as sensações ruins desaparecem. O que é esse chá? – É como se não pertencesse aquele lugar... Não sei como descrever...

- Entendo... – Ferdinand se levanta, olhando para todos nós sem dizer nada. Ele segue em direção ao seu assistente. Ele abre a boca para dizer algo, mas antes olhou em minha direção, o que o fez hesitar. Segurando o braço de seu assistente, ele aproxima e diz algo tão baixo, que sequer consigo ouvir. Os dois estão estranhamente sérios. Ele se afasta, abrindo um largo sorriso, em total contraste de como ele estava há poucos segundos atrás. – Bem, acho que tenho uma ideia de como resolver.

Escutamos um toque de celular sobre a mesa, isso atrai o olhar de todos nós. Foi um toque extremamente familiar para mim... Meu celular está ali na mesa.... Espera? Meu celular?

Apalpo meus bolsos, mas não o sinto comigo. Eu não entreguei meu celular nem a Ricardo e muito menos a Letícia. Mas, espera um minuto... Eu não lembro nem de ter trago meu celular para cá. O que está acontecendo aqui?

- Ah merda... – Ferdinand pragueja com um tom de voz calmo, mas com uma expressão claramente de incomodo, indo em direção a sua mesa. Ele pega meu celular, olha a tela, e então muda seu olhar em minha direção. – Ele é seu, não é?

Olho de Ferdinand para o celular, que acendia uma pequena luz branca acima da tela. Assinto com a cabeça, e ele se aproxima de mim para me entregar o aparelho. De imediato eu ligo a tela, percebendo que há uma mensagem escrita nas notas do celular.

"Olá olá... Clara, não é? Creio que lhe deva um agradecimento por esse novo começo... E como recompensa... Vamos nos divertir..." 

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro