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Capítulo 24 - O poder de um raio

9400 palavras

Mal passou da meia noite de quarta, e o sono já me atingiu com força total... Mas ainda estou aqui acordada, com a cara nos livros usando a pouca coragem que ainda tenho em mim.

Deixei atrasar minhas matérias por pura preguiça no decorrer do dia, e agora estou tentando desesperadamente colocar tudo em ordem.

O tempo que eu poderia estar estudando, fiquei na sala vendo filme acompanhada de um pote cheio de pipocas, com uma nada modesta quantidade de leite condensado sobre todas.

E logo depois disso, ainda fiquei atiçando o Tiago a respeito da Marina. 

É incrível como a curiosidade dele simplesmente se elevou ao máximo quando mencionei o nome dela. Está bem claro que não é só um carinho de amigos, ele sente algo mais. Não colocou isso em palavras, mas a forma como ele age está entregando isso.

Fiquei o dia todo nesses passatempos, além de acabar conversando com Letícia no anoitecer sobre trabalho e talvez ainda querer uma chance na empresa onde ela trabalha. Ela me passou informações muito úteis que, pelo visto, também já passou para Marina quase que ao mesmo momento que falava comigo.

Mas todas essas distrações, a qual não me arrependo de nenhuma, acabaram por tomar todo o meu dia, e antes que eu percebesse, já estava na cozinha jantando com meus pais, sem ter nem pensado nos estudos por uma vez sequer.

Em outras palavras, não tenho a menor ideia de que horas irei dormir.

Me instalei na cama com meu caderno e livro sobre as pernas, além de deixar o celular próximo para caso eu me tenha que anotar ou pesquisar algo. Consegui adiantar algumas coisas, mas ainda tenho que me organizar em mais quantas coisas preciso ler. 

Meus pais já foram dormir a algum tempo por precisarem acordar cedo, isso pelo menos me garante bem mais tranquilidade para estudar.

Meu celular vibra ao e sua tela ilumina, chamando toda a minha atenção. Pego e vejo na tela que tem uma mensagem de Brian.

Sempre estranho quando ele me liga ou manda alguma mensagem. Ele quase nunca tem algo a falar comigo, então qualquer mensagem é uma surpresa. 

E uma mensagem a essa hora da madrugada é, no mínimo, incomum.

Brian: Acordada?
Ana C: Estou sim... Estudando.
Brian: Está estudando bem tarde garota. Amanhã você não acorda cedo?
Ana C: Sim, mas já eu deito... Só preciso terminar tudo. 
Ana C: E aliás, eu não sou a única acordada por aqui. 
Ana C: O que precisa?  
Brian: É que eu queria te dar uma coisa. 
Brian: Um "presente", se assim quiser chamar.  
Brian: E pensei em te entregar agora, se for possível.

Ergo as sobrancelhas com o que acabo de ler. Como assim um "presente"?

Não apenas isso, ele me mandou uma mensagem a essa hora só para falar disso. Não foi para falar da entidade nem nada assim, mas para um presente.

Estranho isso, muito estranho na verdade.

Aliás, eu duvido muito que Brian teria comprado algo para mim. Se ele tivesse me comprado algo, por que raios ele teria me mandado mensagem em pleno começo de madrugada. Isso não faz o menor sentido. Ou ele pode ter sido tímido, e só conseguiu coragem agora.

Não sei se acredito nessa segunda possibilidade. Ele já foi tímido em alguns momentos, mas não foi nada que o impedisse de falar qualquer coisa que fosse.

Não sei o que me impressiona mais agora, muito menos o que me deixa mais intrigada, mas deixo para pensar nisso depois. Ele acabou de me mandar mais uma mensagem.

Brian: Mas está tarde... Irei entender se não der agora.
Ana C: Você me mandou mensagem meio tarde, não acha?
Brian: Ok, entendo. Isso é um não.
Ana C: Ei, eu não disse isso...
Ana C: Que pressa... Eu disse que mandou mensagem meio tarde.
Ana C: E não que não poderia me entregar esse tal "presente" agora.
Brian: Você complica as coisas... 
Ana C: Eu né?  
Ana C: O horário é ruim, e claro que preciso evitar fazer barulho ao sair... Mas acho que consigo ir na calçada para te encontrar e ver o que é.  
Ana C: E não!  
Ana C: Eu não complico!

Tá, eu admito. Às vezes eu complico sim.

E as vezes, faço isso de propósito....

Dou um riso com o que acabo de mandar. Eu gostaria de ter controlado minha vontade de rir, mas escapou. Eu só me divirto com isso. Me pergunto qual deve ter sido a reação de Brian agora, será que ele da sorrisos idiotas e sem sentido igual a mim?

É estranho e acho que as coisas até poderiam ser muito mais fáceis entre nós, mas essa é a maneira que nós conseguimos nos entender, um "provocando" o outro...

Particularmente, estou passando a gostar bastante disso... Quando essas trocas de farpas entre nós são tranquilas, representa bem como nós somos um com o outro. Mas obviamente, odeio quando acabamos indo por outro rumo e nos desentendemos. É simplesmente desagradável.

Brian: Então... Isso é um sim?
Ana C: Isso, pode vir. Eu estarei te esperando.
Brian: Tudo bem... Pode vir abrir o portão?
Brian: Está meio frio aqui fora...
Ana C: Que???
Ana C: Como assim??? Você está agora na minha porta???
Brian: Não. Estou só brincando.
Brian: Estou saindo de casa agora.
Brian: Daqui uns minutos estou chegando por aí. Te avisarei quando estiver perto.
Brian: Mas eu não brinquei sobre estar frio garota. Trate de se agasalhar quando for sair. 

Pisco olhando para a tela do meu celular. Um sorriso estampa meu rosto. Solto o celular na minha cama me deitando para encarar o teto, deixando um questionamento tomar a minha imaginação.

Como eu posso ser tão boba para acabar assim tão feliz só por algumas mensagens?

Nem no início do meu namoro com o Ricardo eu agia assim.

Apesar de ser por algo bobo, é uma sensação boa. Brian e eu tivemos nossos contratempos quando acabamos de nos conhecer, mas agora já estamos bem melhor, ou quase.

Ainda acho que em boa parte do tempo, ele apenas me atura, e não vou mentir que acabo agindo do mesmo modo várias vezes... Mas não significa que eu não goste dele.

No agora, eu deveria apenas voltar a me concentrar nos estudos, e claro, me manter acordada para quando Brian chegar. Pena que é mais complicado do que eu gostaria. Minha mente vagueia sobre o que pode ser esse tal "presente".

Não, por mais que eu queira, eu preciso estudar. Mas antes quero garantir que ficarei acordada. E para isso, nada melhor que uma xícara de café forte e lavar o rosto com água gelada da pia do banheiro. Duvido eu não acordar depois disso.

Lanço as minhas pernas para fora da cama, me colocando de pé no chão frio. De imediato sinto um arrepio percorrendo todo o meu corpo por causa do chão gelado, mas isso não me incomoda.

Aliás o frio de agora me fez pensar, e quero ter certeza sobre algo. Sigo até a janela do quarto, abrindo tudo de uma vez. Uma rajada de vento frio invade meu quarto me causando uma surpresa imediata. Está tão frio que de imediato abraço a mim mesma e esfrego as pernas nuas uma na outra tentando recuperar todo o calor perdido.

Caramba, fez tanto calor nos últimos dias, foi difícil ficar vestida de tão quente que estava nessas semanas. Já perdi a conta de quantos dias e noites eu fiquei sem roupas em casa só para fugir do calor. E do nada, a temperatura cai desse jeito?

Sentindo o meu quarto gélido, e também tremendo pelo frio repentino, fecho as janelas o mais rápido que consigo. Eu gostaria de ter de volta o quentinho que havia aqui no quarto, mas acho que conseguir isso de novo não vai ser uma tarefa fácil.

É, acho que é melhor abandonar esse meu micro shorts e a minha camiseta de pijama por roupas de moletom, e é isso que farei antes do café.

Terminei meu estudo já fazem uns vinte minutos. Olho para mim mesma, estou bem agasalhada com uma calça de moletom cinza e uma blusa de capuz também de moletom, mas com cores rosa com letras em tons brancos, e claro, um par de chinelos brancos.

Não é o melhor dos visuais, mas para o frio que está fazendo essa noite, com certeza da para o gasto.

Estou instalada no sofá da sala em plenas 02:57h da manhã, com muito sono e bocejando a cada minuto, luzes apagadas, o celular bem na minha mão esperando algum sinal de Brian, a televisão ligada em um canal de filmes em um volume baixo, e enrolada na minha mantinha de bichinhos que uso desde meus oito anos.

É uma das poucas coisas que tenho de quando ainda era criança e que está em ótimo estado, abdiquei de usar essa manta aos onze por dizer que já era uma adulta, e voltei a usar aos quinze quando lembrei o quão quentinha ela era.

E bem, agora com meus vinte anos, continuo abraçada a uma mantinha de bichinhos, sem dar a mínima se é uma coisa de criança ou não. É confortável, tá me esquentando, tem história comigo e me trás boas lembranças, então não desgrudo da minha mantinha.

O celular vibra na minha mão, e logo vejo ser uma mensagem de Brian. Mal leio e apenas me levanto do sofá, desligo a televisão e corro para a porta. Olho para o topo da escada de relance, me certificando que meus pais não estão ali parados, prontos para me interrogar, por sorte, o caminho está livre para mim.

Caminho para fora de casa enquanto me abraço por causa do frio, e como se não bastasse, ainda está com um vento gélido. Tento ignorar isso e aperto o passo, rumando para a Mercedes parada em frente de casa.

Está bem escuro e dificulta um pouco ver mais do que os faróis dianteiros e traseiros do carro ainda ligado, mas pela pouca luz do poste próximo, consigo perceber algo, o carro parece estar um pouco diferente.

A porta se abre, e ele sai do carro – Demorei?

- Não muito... – Só um pouco mais de uma hora desde a última mensagem, sem falar que estou caindo de sono.

- Tive um contratempo. Precisei pegar algumas coisas antes de sair. – Ele diz calmamente, dando a volta no carro e chegando próximo de mim.

- Relaxa, não tem problema... – Digo dando de ombros, tentando sem sucesso conter um bocejo.

De automático, acabo por analisar ele por inteiro, notando como Brian está diferente.

Essa é uma das poucas oportunidades de ver Brian fora daqueles ternos alinhados de sempre. Ele veste agora uma jaqueta cinza escuro aberta, uma camisa social branca com os dois botões mais altos abertos, jeans azul claro e um par de sapatos escuros, sem falar do cabelo jogado para trás e apenas uma fina mecha caída pela sua testa.

- Então... – Ele começa, me fazendo olhar em seus olhos – Desculpe vir assim tarde, acabou ficando pronto pouco antes de eu te mandar aquela mensagem.

- Ficando pronto? – Questiono com um pequeno sorriso.

- É, o... – Ele cerra o olhar e ergue as mãos, fazendo aspas – O... Presente...

Acho graça de sua atitude – Estou curiosa sobre isso.

Brian da um pequeno suspiro me olhando, e logo um pequeno sorriso surge em seu rosto. Um sorriso que me afeta de uma maneira que eu não consigo me acostumar – É, eu imagino...

Ele não disse absolutamente sobre o que é, e claro que meu lado mais curioso não deixaria isso passar batido. Brian é alguém bem mão de vaca se for parar pra pensar, ele sempre reclama de ter que gastar mais do que gostaria, por menor que seja esse valor.

Além que não vou esquecer do detalhe que, Brian já mencionou sobre comprar peças novas para seu carro por várias vezes... E pelo que vejo agora ele realmente comprou, e não foram poucas.

Tudo bem, isso já elimina a possibilidade de um presente caro, mas não elimina a chance de ser algo realmente bonito. Mas fico pensando, o que poderia ser?

Seria alguma roupa? Uma blusa, calça, ou um vestido? Não, isso não faz sentido. Ele não sabe o tamanho das roupas que eu uso, então não tem lógica Brian me dar alguma roupa.

Então... Por acaso poderia ser algum tipo de bijuteria? Um novo colar talvez? Pulseiras? Brincos? É, pode fazer algum sentido ser isso, talvez algum colar. Mas também, não faz tanto sentido Brian me presentear com esse tipo de coisa. E não tenho um motivo, só não faz sentido.

E um anel com certeza passa longe de ser uma possibilidade, Brian não tem a menor ideia do tamanho do meu dedo. Na verdade, nem eu sei o tamanho de anel que eu uso, só sei que meus dedos são um pouco gordinhos. Então, também não faz sentido Brian saber algo sobre mim que eu mesma já não saiba.

Não importa o quanto eu tente queimar neurônios tentando descobrir o que seria o tal "presente", simplesmente não tenho ideia. Claro que, pelas aspas que Brian fez tanto agora quanto pelas mensagens, me faz ter um pensamento que possa ser um verdadeiro presente de grego de tão ruim que possa ser.

São possibilidades, muitas possibilidades, nem sei o que pensar. Adivinhar o que possa ser se mostrou uma verdadeira dificuldade, e seu olhar não me diz o que é. O negro dos seus olhos intensificado pela noite consegue instigar mais da minha curiosidade.

E seu sorriso me desestabiliza, diminuindo ainda mais minhas chances de descobrir o que é.

Ele leva sua mão esquerda ao bolso da calça, enquanto com sua mão livre ele pega a minha, levando para mais perto de si gentilmente – Sei que não vai parecer muita coisa, mas... – Ele diz, tirando a mão do bolso com uma pequena caixa.

Uma caixa em tons brancos e linhas vermelhas. Ao sentir a pequena caixinha na minha mão, posso sentia a suavidade do veludo. Meu coração descompassa com o que vejo, meu lábio treme descontrolado, pelo formato, suavidade, tamanho, esse é o mesmo tipo de caixinha quando se presenteia alguém com alguma aliança de compromisso.

Não, eu não sei o que pensar, não sei o que dizer. As palavras me fogem, não sei quais sentimentos eu tenho agora... Eu não sei de nada.

Olho da pequena caixa para Brian – Mas... Brian... O que...?

- Abra. – Ele me pede calmamente, mantendo o sorriso sereno em seu rosto.

Relutante, eu concordo em um gesto. Minha mão treme um pouco, enquanto tento abrir a caixinha e descobrir o seu conteúdo. Não acredito que, de tantas coisas, ele vai me dar logo um anel ou uma aliança de compromisso. Caramba, meu coração está quase pulando para fora do peito de tão forte que ele bate.

- Brian...? – Digo, olhando o conteúdo da caixinha para os olhos do meu guardião, incrédula com o que vejo. Eu não sei o que dizer a ele, é uma surpresa.

O que encontro dentro da caixa é diferente do que eu esperava. Sobre uma pequena almofada avermelhada com bordados em tons amarelos, existe uma pequena e bela joia em tons azuis claros, sendo levemente transparente e possuindo uma lapidação retangular.

- É o que estive preparando para você, após ver seu rendimento. – Ele diz, alcançando a pequena pedra. Mesmo estando escuro, percebo que ela emana uma estranha energia dentro de si, algo visível capaz de criar uma pequena luz em volta de si mesma – Esta é a runa do raio.

Observo seu sorriso, ainda tentando encontrar palavras. Eu não sei dizer o tamanho da surpresa que tenho ao ser esse o presente, por ter pensado tantas coisas e ter passado tão longe, ou então como fui ingênua ao pensar que ele poderia me dar qualquer coisa diferente... De certa maneira, acho que fui interesseira, gananciosa e bem idiota. Eu não sei o que dizer a mim mesma.

Eu só sei que pensei demais, e pensei coisas impossíveis.

- Parece desapontada. – Ele diz me observando na mesma forma calma.

- O que? Não Brian, não é isso... – Balanço a cabeça negando por algumas vezes – É que eu não esperava por isso, eu realmente estou chocada, de muitas formas.

- Mesmo? – Ele me ergue as sobrancelhas, e um sorriso me surge. – Acho que sim, está até fazendo esses quase trocadilhos com choque.

Solto um pequeno riso – Esse trocadilho, que foi péssimo por sinal, saiu sem querer.

- E deu para ver que você não tem muito jeito com piadas. – diz rindo baixo. – Sei que talvez não seja um presente de fato, mas...

- Está tudo bem, só fiquei surpresa... Mas não significa que eu não tenha gostado – dou meu sorriso mais sincero, e é uma verdade. Apesar de não ser algo que eu imaginava, eu gostei da mesma forma – Me conta mais, porque estou curiosa.

- É pra já. – Brian concorda, deixando a pequena pedra sobre a palma de sua mão – No último incidente que precisamos passar, pude observar como você se portou. Você evoluiu bastante quanto ao uso das runas, por isso decidi em te presentear com uma nova.

- E essa aqui... É a runa do raio. – Digo olhando para a pequena joia. Agora que olho melhor, ela possui um pequeno desenho talhado na face virada para cima, e a forma de um pequeno raio no centro. – Me conta mais sobre ela... Aliás, por que dessa vez foi uma pedra?

- Pelo motivo que esse tipo de feitiço rúnico é muito mais indicada para usar com uma fonte de energia externa... Muito semelhante aos feitiços da Amanda. – Ele diz calmamente, fechando seu punho devagar. Ele mantém o sorriso olhando para mim, e de um segundo ao outro alguns raios surgem percorrendo em volta de sua mão, e um brilho branco azulado surge – Poderia usar a energia do seu corpo para ativar essa runa, mas por consequência você poderia se cansar mais rápido devido a força que seria necessária.

Meus olhos permanecem em sua mão, encantada com o que vejo. O brilho dentro da mão de Brian aumenta por alguns segundos, junto a quantidade de raios que percorrem sua mão e agora vão a seu antebraço em um baixo som de uma descarga elétrica.

Brian abre sua mão novamente, e posso ver com mais clareza toda a intensidade do brilho que emana da pedra. Pequenos raios dançam a sua volta, deixando claro que toda essa energia está vindo diretamente da pedra, não de Brian. Aos poucos, a pedra deixa de ter raios a sua volta, e seu brilho suavemente se apaga.

- Incrível... – Digo olhando para a pedra, que volta a seu estado inicial, "apenas" emanando seu brilho branco azulado. Pisco impressionada, voltando a olhar para Brian.

- Não é? – Brian diz, encarando a pequena pedra em sua mão – Usei uma turmalina azul para a criação dessa runa. O esoterismo diz que em dias de tempestade, a força dessa pedra se intensifica e seu brilho torna-se mais bonito, não acredito nessa última parte... Mas por via das dúvidas, resolvi usar essa pedra na hora.

Tenho tantas coisas em mente, perguntar algo é complicado, tanto sobre como usar, qual a força que essa runa pode ter, se existe algum risco de usá-la, mas tenho uma pergunta bem específica para esse momento – Foi você quem fez?

Ele ergue as sobrancelhas, não acho que era essa a pergunta que ele estava esperando. Independente disso, ele mantem o sorrido – Sim, fui eu mesmo... Deu um bom trabalho, não sou nada acostumado em criar runas, então na hora me desgastei bastante com essa...

Se desgastado? Brian não parece tão cansado como faz parecer. Se bem que já vi que ele aguenta muita coisa e nem demonstra tanto. Talvez seja verdade.

Volto a olhar a runa, a pegando da mão de Brian. A observo por alguns segundos, encantada com a luz emanada dela. A energia dessa pequena pedra pode ser sentida ao toque, ela é quente, intensa. Sem perceber, eu seguro a pedra do meu colar e a aperto com força, me permitindo sentir a energia da minha joia de proteção.

Ambas possuem uma energia dentro de si, uma energia forte e intensa. A energia do meu colar é acolhedora, seu calor é como um carinho, transmite calma e me sinto protegida, além de seu poder ser claramente mais forte. A runa é diferente, a energia dela também é quente, mas me passa outra sensação. Força, intensidade, poder, ela não é minha defesa, mas permite com que eu me defenda.

- Você está conseguindo me deixar cada vez mais curiosa sobre isso. – Sussurro sem deixar de olhar atentamente para a pedra. – Existem outros tipos de runas assim?

- Sim existem algumas que são muito melhores utilizando essas pedras. – Ele ergue uma das mãos, contando nos dedos – Existem runas de fogo, terra, vento, gelo, ácido, névoa... A quantidade não é muito grande, mas são usadas essas pedras para não desgastarem demais o corpo da pessoa.

Balanço a cabeça seguidas vezes, olhando da pedra na minha mão ao meu guardião. – Você sabe usar todas essas runas?

- Sei algumas, mas tem muitas que conheço apenas de nome, mas nunca as usei. As que conheço não preciso das páginas com os símbolos e nem das pedras para ativar seus efeitos.

- Lembro que me disse isso uma vez. – Comento cerrando os olhos – Como consegue?

- Memória fotográfica. – Ele ri um pouco – Memorizei cada uma e não preciso que estejam presentes. Depois de um tempo treinando e juntando a minha resistência, nenhuma delas me cansa muito, mesmo que eu as ative sem parar.

Um riso curto me escapa – Poderoso. – Sussurro brincando, arrancando risos dele.

- Na primeira vez, a Amanda se recusou a me ensinar... – Brian diz com um tom um pouco mais sério e desviando seu olhar. De imediato também assumo uma postura mais séria. – Também foi relutante em emprestar o livro de runas para que eu tentasse sozinho... Apesar do medo dela, e da minha insistência, ela decidiu me ensinar.

Sorrio o observando – Você foi um chato, e ela te ensinou?

Ele sorri de volta – Mais ou menos isso, tirando a parte que fui chato... E na época, nós mal nos conhecíamos, então ela não confiava em mim e levou tempo para me ensinar... De qualquer jeito, quer aprender a usar?

Meu olhar se ilumina, meu sorriso cresce e concordo acenando. Minha reação de agora deve ter sido igual a uma criança que acabou de ganhar um brinquedo novo – Quero!

- Certo, é mais fácil do que parece. – Ele se encosta no carro, me olhando – A ativação dessa pedra é muito semelhante a usar a runa do impacto. Você precisa concentrar apenas um pouco da sua energia e fazer com que vá para a runa. É o suficiente para que você sinta a pedra reagindo e transmitindo sua força a você.

Assinto algumas vezes, acompanhando com total atenção. Abaixo meu olhar, sem conseguiu segurar meu riso com a situação.

- O que foi Clara? – Brian me olha curioso, e novamente ele tem um sorriso em seu rosto. O que aconteceu com ele que está tão sorridente hoje?

Não estou reclamando, só estou curiosa.

- Você me ensinando. – Digo rindo, e como se acabasse contagiado, o homem solta um riso junto ao meu, e meu coração erra uma batida – Não fez isso da outra vez garoto, só me entregou as runas.

- Da outra vez garota, eu queria ver o quão longe você podia ir com seu próprio esforço. – Ele diz com um sorriso de canto, erguendo um pouco seu rosto sem deixar de me olhar – E vendo o quanto você evoluiu em pouco tempo, decidi que agora sim eu te daria uma ajuda.

Balanço a cabeça negativamente mantendo um sorriso no rosto – Não te falo nada sobre isso seu chato... – Sorrio olhando a runa – Então... Ela funciona como a runa do impacto...

Olho para a pedra alguns segundos, fechando meus olhos. Certo, é hora de testar. Já fiz isso antes, por várias vezes, e posso fazer outra vez. Sei que irei conseguir, no começo foi terrível, mas agora, por mais que eu ainda tenha um pouco de dificuldade, eu consigo fazer... Pelo menos, eu sei que não irei desmaiar após usar a primeira runa.

Me concentro, respirando profundamente. Tento afastar qualquer pensamento da minha mente, sentimentos ou sensações, tudo, apenas me concentrar. Elas surgem, devagar, tímidas, mas surgem. As ondas que nascem em meu peito e se espalham pelo meu corpo em uma corrente fria, ondas tão suaves mais ainda assim que me fazem parar de sentir o chão aos meus pés. Sinto que meu corpo se move e perderei meu equilíbrio, mas isso não acontece.

Como sempre fiz, guio toda a energia acumulada a minha mão. As energias se intensificam mais e mais e dirigem-se para onde desejo, porem dessa vez eu concentro em tentar passar diretamente para a runa.

Um som intenso de uma corrente elétrica se inicia. O calor emana da pedra e percorre meu braço, mas ele não me queima, a sensação é deste calor fazer parte de mim e de imediato abro os olhos. Os vários raios são perfeitamente visíveis, muito mais poderosos do que eram com Brian, rápidos e destrutivos a ponto de me assustarem.

- Você usou energia demais... – Brian diz o obvio calmamente, mas a essa altura já nem ligo.

Eu só quero soltar tudo isso. Essa quantidade massiva de poder me assombra. A força é muito diferente, não são apenas pequenos raios, é um único feixe elétrico branco azulado cobrindo minha mão e todo o meu antebraço, dificultando visualizar minha mão por trás dos raios.

Descargas elétricas percorrem não apenas do meu braço, mas sim rodeiam o meu corpo, serpenteiam pelo chão a minha volta, é potente o bastante para iluminar uma bom espaço a minha volta.

- O que eu faço?! – Digo aflita, temendo me mexer e acabar eletrocutada.

- Lembre-se, é como a runa do impacto. – Ele diz me analisando, mantendo um sorriso em seu rosto. Ele não está aflito como eu, na verdade parece estar esperando algo – Nessa situação, se concentre e lance toda a energia acumulada de uma só vez.

Confirmo com a cabeça totalmente amedrontada. Engulo em seco, olhando toda a carga elétrica. O medo predomina, mas tenho que tentar. Como a runa do impacto. Como a runa do impacto. Vamos Clara, você consegue.

Aperto os olhos e fecho meu punho com força e o abaixo. Respiro fundo por uma vez e ergo a mão de uma só vez, socando o ar com tudo que tenho. Repentinamente um som de uma explosão reverbera pelo ambiente em um ruído ensurdecedor.

Abro os olhos, respirando fundo de uma vez quando percebo que um repentino clarão branco ocorre no céu, tendo o som de um potente trovão ecoando pelo céu. Além do mais, todos os postes da rua agora se encontram desligados, e não vejo nenhuma luz nas casas próximas.

A quantidade massiva de energia que me rodeava desaparece, mas ao mesmo tempo, toda a força que havia dentro de mim me abandona.

Minhas pernas fraquejam, tremem. Tento me manter de pé, mas é difícil. O cansaço que eu já sentia antes agora parece muito mais pesado. Meus olhos pesam e meu corpo desaba, vencida pelo cansaço que recai sobre mim, porém antes que eu vá ao chão, sinto meu corpo sendo segurado pela cintura, e assim consigo me manter de pé.

- Você fez bem Clara... – Ouço Brian dizendo, mas sua voz parece tão distante por causa do sono, que sequer sei se ele realmente disse algo.

Mal tenho forças para manter meu rosto erguido, mas consigo sentir. Estou sendo segurada com firmeza, encostada em um corpo forte e me passa uma acolhedora sensação de calor. Percebo minhas pernas deixando o chão e acho que estou sendo carregada.

Os sons distantes, ruídos que parece ser de um carro distante, ou latidos de algum cachorro, tudo fica ainda mais longe. O que surge são sons de vozes bem baixo, e meu corpo é deitado, logo coberto por algo.

Teimando contra o cansaço, abro meus olhos, sentindo dificuldades em focar no ambiente escuro. Me sento devagar, passando uma mão no rosto buscando acordar.

Quando dou por mim, me encontro deitada no sofá, e a única fonte de luz presente é de um pequeno feixe brilhante emanando da mão de Brian.

- Você exigiu demais de si mesma... – Ouço a voz do meu guardião. Viro meus olhos o procurando, o encontrando de pé ao meu lado. – Estava cansada, e se forçou demais.

- Acho que sim... – Digo com a voz fraca, abaixando o olhar.

- Mas... – Ele continua dizendo – Você foi bem, conseguiu de primeira.

- E estou esgotada... – Digo com um sorriso fraco, deitando a cabeça, lutando ao máximo para me manter acordada. Mas é uma tarefa é muito difícil.

Um bocejo duradoura acaba escapando, e cada vez mais sinto as garras do sono me puxando.

- Está, por hora descanse. Você gastou muita energia. – Brian diz suavemente, abaixando ao meu lado, levando sua mão ao meu cabelo devagar. Seus dedos passeiam lentos pelos fios até chegar a minha nuca, mantendo o ritmo do carinho enquanto ele tem um sorriso de pura ternura no rosto – Amanhã conversamos.

- Amanhã? – Minhas palavras saem como um sussurro, não sei se pela nossa proximidade ou o meu sono. Um novo bocejo surge, meu cansaço é maior.

- Sim, depois da sua faculdade... – Ele me responde no mesmo tom de sussurro que eu – Irei te ensinar sobre as runas... Cada uma das que você tem.

Dou um pequeno sorriso convencido, que logo é subjugado pelo meu nada querido sono. Cada segundo é mais difícil me manter consciente – Eu já aprendi um pouco...

- Eu vi Clara, e estou contente com o que você mostrou... Então na primeira chance que tivermos, quero que me mostre tudo que aprendeu. – Ele diz, acarinhando meu cabelo em uma suavidade que a muito tempo não sinto. 

Ele me conforta, meu corpo relaxa com tal carinho, me faz bem... E não quero impedi-lo de continuar.

Diferente da frieza e toda a indiferença que vi no olhar de Brian na primeira vez que o vi, agora ele está diferente. Os olhos escuros dele são acolhedores, calmos, me fazem me sentir realmente protegida. Sua expressão para mim é suave, unida a um sorriso que combina com ele.

Abaixo um pouco o olhar, encarando o sofá. Algo me vem em mente, da maneira como ele apenas me entregou as runas naquele dia no metrô. 

Tudo bem que ele parecia já ter confiança em mim, de que eu iria conseguir, mas como ele agiu depois me incomodou – Por um tempo achei que não estava nem ai sobre o assunto das runas... Tinha me entregado e nunca mais falou nada...

Meus olhos pesam e se fecham. Não ouço nada, imagino que já estou dormindo, porém, posso escutar um suspiro. – Eu sei... Confiava em você para usar as runas, mas não totalmente, ainda tinha um pé atrás a seu respeito... Quis observar você sem interferir.

- Só confiava, e nunca perguntou nada... – Sussurro com os olhos fechados. Um novo bocejo me surge que logo abafo contra meu travesseiro. Passo uma mão pelos olhos, e sem perceber estou fazendo manha igual uma criança.

- Confesso que... Por um momento não quis pensar em você ou nisso tudo. Parte de mim usou isso como uma desculpa para que você ficasse longe... Não posso me envolver demais com quem protejo. – Ouço sua voz sussurrada, e essas palavras me acertam em um baque.

É claro que ele usaria isso para se livrar de mim, é claro que ele iria querer ficar longe, criar o máximo de caminhos possíveis para se manter distante de mim, saber disso me magoa...

Por um momento seu carinho cessa e torno a abrir os olhos. Ele encara o chão com um pesar no rosto, respirando fundo devagar e voltando aos carinhos... Lentos, mais suaves, melhores do que estavam antes.

Se Brian quer distância, por que não para de cuidar de mim como está fazendo agora? – Mas uma outra parte quis ficar perto, a parte que confiou que você conseguiria... Não menti sobre você poder ser independente e se proteger sozinha... Não quero que você se sinta presa e impedida de fazer o que quer...

Sinto um beijo lento na minha testa, suave e acolhedor, junto a toques ainda mais protetores sobre meu cabelo.

- Durma Clara... Amanhã conversamos – Ouço sua voz, antes de finalmente adormecer.

Apoio o rosto na mão, tentando me concentrar nesse final de aula. Admito que a aula de hoje até está interessante e tento ao máximo me manter atenta como Marina costuma fazer, mas outra coisa tem minha atenção por inteira.

Hoje quando acordei, estava sozinha na sala. Despertei no susto um pouco antes da hora. Não demorei nada para ver onde eu estava. Meu celular estava bem ao meu lado, e por inteiro carregado. Saí da do sofá e estava bem disposta, e corri para fazer um café da manhã caprichado em plenas cinco da manhã.

Bem, no meio do café, eu me lembrei de Brian. Ele estava em casa ontem à noite, porém quando acordei, não havia o menor sinal dele. Claro que achei estranho estar no sofá e ele não estar por perto. Então imaginei que ele seria cara de pau o bastante para dormir na minha cama, mas não foi isso que aconteceu.

Corri para meu quarto, mas ele não estava lá, e logo corri para o banheiro, mas nada também. Olhei outra vez na sala como se ele fosse aparecer como mágica, mas não havia o menor sinal de Brian, e aliás, a casa toda estava trancada, e a chave estava sobre um dos sofás.

Não sei como, mas Brian conseguiu sair da minha casa e deixou tudo trancado.

Imagino que tenha sido usando a runa do molde.

Acabei por ignorar isso e segui com a minha manhã, vim para minha faculdade normalmente e fingi que não aconteceu nada. Meu plano de seguir o dia normalmente estava indo muito bem, mas logo Brian me mandou mensagem, me pedindo para encontrá-lo no shopping aqui do lado, na hora que eu saísse da aula.

Desde essa mensagem, eu estou contando os minutos para saber o que ele quer falar. Apesar do sono, eu lembro bem o que falamos ontem à noite, de cada palavra.

É inevitável não ficar contando os minutos, por sorte falta pouco. Olhar o celular, anotar algo no caderno, olhar o celular de novo, e assim segue esse círculo vicioso.

Finalmente da o horário, e sou a primeira a guardar tudo na mochila. Confiro se está tudo comigo, celular, carteira, cadernos, tudo. Ótimo, posso sair daqui.

Disparo para fora da sala em passos largos, com certeza Brian já deve estar lá. O detalhe é, lá onde? Onde raios ele vai estar me esperado?

Bom, vou primeiro ao ponto de encontro mais obvio, a praça de alimentação. Se não o encontrar por lá, então mandarei uma mensagem.

Passo por todos os vários alunos o mais rápido que consigo, e vou apressada para o shopping. Neste horário, muitas pessoas estão transitando de um lado ao outro em um espaço não muito grande. Acaba sendo muito difícil não esbarrar em uma pessoa ou outra, mas pelo menos consigo alcançar o shopping.

O ar condicionado do shopping ajuda muito a aliviar o calor que sinto. Imaginei que hoje estaria bem quente, a julgar pelo frio que estava essa noite, mas claro, está um calor terrível. Está insuportável sair de qualquer lugar e encarar o terrível ar puro. Está quente demais, abafado, parece que existe uma densa massa de ar quente em toda a cidade.

Logo cedo meu celular já acusava quase 30 Cº de temperatura, isso um pouco antes das 9 da manhã é de assustar um pouco... Agora, pleno meio dia, está muito mais quente, e a sensação térmica já passou dos 42 Cº faz tempo.

Eu estou derretendo só por ter saído pouco tempo no sol, e claro, ter andado depressa está me fazendo passar mal. A impressão que tenho agora é de que esse calor não vai passar tão cedo. Acho que vou comprar uma garrafa bem grande de água para me refrescar antes de encontrar com Brian.

Avanço pelo shopping, subindo direto para a praça de alimentação. Já saco meu celular do bolso, pronta para mandar alguma mensagem caso eu não o encontre, mas não é necessário. Brian acaba de se levantar, olhando para mim, e timidamente eu vou até ele.

- Demorei? – Digo assim que chego a mesa, notando duas latas de refrigerante fechadas, copos e dois pratos com fatias de pizzas, várias folhas espalhadas e um largo envelope aberto na mesa. Uma caneta e várias coisas grifadas em várias folhas.

Puxo a cadeira e me sento, olhando das folhas para meu guardião, que acabara de se sentar também. – Não demorou, eu cheguei faz pouco tempo... Imaginei que pudesse estar com fome, espero que goste de refrigerante e esse sabor de pizza – Ele diz, pegando as várias folhas para si, colocando um dos pratos a minha frente, junto a lata de refrigerante.

- Fome eu estou, e sede mais ainda. – Digo em um sorriso, entregando as folhas restantes e ajeitando meu prato a minha frente. Minha curiosidade me pedia para ver o que estava anotado nas folhas, mas deixo para questionar. Agora estou mais interessada em comer, e meu guardião não perde tempo. Ele já abre sua lata enquanto me olha – Refrigerante de laranja, meu sabor favorito, e ainda nesse calor... Poderia te beijar em agradecimento agora.

É o que Ana Clara!? O que eu acabei de falar?

Meu rosto está queimando de vergonha pelo que acabou de escapar da minha boca. Brian está estático, me olhando fixamente com a lata próxima a boca, além que ele está boquiaberto com o que ouviu. 

Com certeza ele não esperava por isso.

- Ah... Então... – Ele começa, erguendo as sobrancelhas – Então ta né...

- É, só... Deixa pra lá. – Dou uma meia risada, que ele acaba copiando. 

Acabo abrindo meu refrigerante na mais pura pressa, dando um longo gole para tentar me controlar. Eu não vou deixar uma dessas escapar de novo.

Brian continua me olhando, colocando de volta a lata na mesa. Ele olha dos meus olhos a minha boca por algumas vezes, e logo olha fixamente a minha boca, como em uma expressão de um menino pidão. 

Por acaso ele levou o que eu disse em consideração?

Não vai me dizer que ele está pensando nisso? É agora que ficarei pensando em beijar ele, escapou sem que eu perceba, e agora estamos assim. O que fazer?

- Bem... – Ele começa a falar desviando o olhar para o lado um momento, passando o indicador pela bochecha – Isso foi inesperado. Até esqueci o que iria falar... – Seu tom de voz saiu um pouco sem graça e isso deixa ele extremamente fofo.

- Tente se lembrar. – Digo sorrindo de canto, pegando alguns talheres e começando a cortar minha pizza e mordendo um pedaço, voltando a olhar meu guardião – Coma Brian... – Sussurro o observando. Ele ficou surpreso mesmo.

Ele parece sair de um transe, pegando seus talheres e também começando a comer. Eu espero que ele diga algo. Por mais que Brian abra a boca para tentar falar, nada vem dele, mas está nítido como ficou sem saber como responder o que eu propus sem perceber.

- Está boa, não acha? – Mantenho meu sorriso, comendo mais um pedaço da minha pizza.

- Está ótima, as pizzas daqui são muito boas... – Ele diz com um meio sorriso, olhando de seu prato a minha boca outra vez, me trazendo novas sensações, novas vontades. Já não sei o que está me segurando nessa cadeira, agora eu quero mesmo beijar ele, e acho que Brian quer o mesmo que eu. O vejo respirando fundo, me tirando dos meus pensamentos – Temos que falar Clara, é importante.

- Tudo bem, sobre o que é? – Questiono o olhando, agora voltando a encarar a seriedade nele.

- Sobre a entidade. – Qualquer sorriso que eu tinha desaparece, dando lugar a tensão de ouvir sobre essa criatura que vive me dando dor de cabeça.

Balanço a cabeça por repetidas vezes, juntando as mãos a minha frente. – Claro... – Respondo junto a um suspiro tenso. – Só acho chato que nunca conversamos.

- Como? – Ele ergue uma sobrancelha.

- É o que eu acho, sabe? – Brian pisca algumas vezes – Só falamos disso. Entidade aqui, entidade ali. Nós nunca conversamos de fato Brian... E agora que penso nisso, é fato que eu simplesmente não te conheço.

Seus olhos vão a mesa por um momento, aparentemente pensativo – Tem razão...

Apesar que lembro-me de ontem a noite. Ele disse que não pode se envolver com as pessoas que protege... Com certeza isso deve incluir abrir mais de sua vida para os outros. 

Balanço a cabeça negativamente, antes que acabemos perdendo o foco – Esquece, acho que não passamos muito disso. – Forço um sorriso, mas tudo que vejo é a boca de Brian se curvando para baixo – O que queria falar?

- Bem... Está relacionado a isso. – Brian ergue uma pasta junto as várias folhas. Ele sequer tentou manter o assunto sobre não termos uma conversa descontraída que não estivesse relacionada com aquela coisa, mas relevo e dou minha atenção ao que Brian me mostra – Eu estive analisando muitas coisas desde o primeiro encontro, e estou vendo as mudanças óbvias. A aparência se alterando, força aumentando, aquela coisa está mais poderosa que antes.

Concordo olhando em seus olhos – Isso nós dois sabemos bem Brian, onde quer chegar?

- Quero chegar no ponto que ele está conseguindo poderes maiores, capacidades sobrenaturais que antes ele não tinha. – Ele diz em um tom sério, voltando seu olhar para as folhas, dando um gole em seu refrigerante, e me olhando como se esperasse uma resposta minha.

- Tipo? – Questiono erguendo uma sobrancelha, voltando a comer.

- Tipo possuir um corpo animatronico, nem sei de quantas formas aquilo me surpreende. Antes, sua entidade não era forte o bastante para fazer algo assim... – Brian passa uma mão pelo rosto. Ele parece inquieto – Sendo sincero, já encontrei muitas criaturas, mas nunca vi uma possessão daquelas. Muito menos imaginei ver uma alteração física como a que ele fez naquela noite.

Assinto pensativa, relembrando tudo que aconteceu naquela fatídica noite. Começo a refletir em todas as aparições que a entidade teve até o momento. – Acho que estou deixando passar algo.

- E esse algo seria...? – Ele me olha curioso.

Cruzo os braços me encostando na cadeira dura. Meu olhar vai ao prato, porém o que eu vejo é um quebra cabeça que estou ignorando peças. Existe algo que não estamos nos atentando, o que existe em comum em todas as aparições da entidade?

- Tenho uma pergunta. – Volto a olhar para meu guardião – Nas vezes que enfrentou a entidade, ele demonstrou alguma capacidade diferente?

- Não, nas poucas vezes que o enfrentei, ele só veio para cima. As vezes se tornava intangível por alguns segundos, ou era bem resistente... – Brian ergue os olhos, ficando em silêncio. Acho que está tentando se lembrar de mais algo – Mas só, ele nunca demonstrou uso de energia ou algum elemento.

- Comigo foi a mesma coisa, ele nunca demonstrou usar mais que força física. Tanto nos meus pesadelos quanto acordada, a entidade não fez algo diferente disso. – Respondo pensativa.

Com Brian ele atacou só fisicamente, não fez mais nada, e comigo foi o mesmo. Em todas as vezes que estive frente a frente com a criatura, ele me atacou diretamente, sem uso de nenhum poder diferente... Então, o que mudou?

Estranho, está faltando alguma coisa.

- Acho que estamos no caminho certo. – Ele diz, pegando um largo pedaço da pizza e comendo, tanto que faço o mesmo – Pense comigo Clara, essa coisa só nos atacou de forma desgovernada. Alguma vez já viu essa coisa dentro de você fazer algo mais do que atacar de qualquer jeito?

Nego balançando a cabeça.

- Antes daquela noite da balada, ele tinha aparecido para você?

- Apareceu uma vez alguns dias antes, em um pesadelo – Digo me lembrando daquela noite, acho que foi a primeira e única vez que consegui sair sem grandes machucados contra a entidade... Ou melhor dizendo, foi a vez que consegui durar sozinha por mais tempo. – E depois que acordei, ele estava lá no meu quarto, mas não fez nada graças ao meu colar.

- Naquela vez, mas notou se alguma coisa estiva diferente nele? – Ele pende o corpo para frente, me olhando nos olhos fixamente – Qualquer coisa que seja, mas haviam mudanças?

- Não... Aparentemente não haviam mudanças. – Digo, puxando aquela noite na memória ao máximo que consigo – Sua aparência era a mesma, os olhos da mesma forma. Também continuava sem os braços no pesadelo.

- Então ele não se regenerou... Ótimo! Confirmamos algo que a entidade não pode fazer. – Ele me diz com um tom de voz calmo, unido a um sorriso de canto. Ele leva a mão ao bolso, sacando uma caneta, logo pegando uma folha cheia de outras coisas anotadas, e escreve algo – É bom anotarmos isso. Lembra-se de mais algo dos encontros que teve com a entidade? Pode nos ser útil nesse momento.

Pego meu refrigerante e dou um último e longo gole na tentativa de me refrescar por inteira, além de conseguir pensar melhor sobre isso. Melhor dizendo, me preparando para voltar minha atenção a cada um desses encontros.

São lembranças desagradáveis, cada um desses vários encontros com a entidade foram difíceis para mim. Passei por maus bocados, não faço nem ideia do tanto que eu apanhei em algumas vezes e o que precisei passar, mas é preciso. Esses encontros podem ser uma chave para entendermos o que está acontecendo. 

Tento relembrar, perceber algo que nunca notei antes. Qual o ponto em comum desses encontros que podem nos trazer maiores repostas. A primeira vez no meu quarto, no banheiro da faculdade, no metrô, o armazém abandonado... Eu penso e penso, mas absolutamente nada me surge em mente.

- Olha, é difícil Brian... Por que em todas as vezes... – Paro de falar, acabo de pensar algo.

- Clara? – Ele me olha. – Algum problema.

Uma ideia me vem em mente logo de imediato, meu colar. De imediato eu o alcanço dentro da minha camiseta e olho fixamente para a joia que carrego. O encaro fixamente, buscando respostas nos tons vermelhos e enegrecidos dentro do cristal, a luz dentro dessas cores como sempre me encanta, mas agora o brilho natural pode trazer as respostas que precisamos.

Espera... Eu acho que começo a entender as coisas agora.

E se as respostas não estiverem nos encontros que eu tive com a entidade, mas sim em momentos onde a entidade não estava presente?

- Me lembrei de algo agora... – Digo quase que em um sussurro. – Meu colar... Ele esteve brilhando sozinho por algumas vezes, mas não existia nada perto de mim.

- O que? Como assim Clara? – Brian franze a testa e aperta os olhos. – De o colar reagiu, então deveria existir algo perto de você.

- Eu sei, é estranho. – Dou de ombros – Mas foi o que aconteceu. Eu estava fazendo qualquer coisa, e de repente... Meu colar começava a reagir, mas não existia nada perto de mim.

O homem a minha frente me olha da mesma maneira, sério e analítico. O mesmo olhar sério que eu vi na primeira vez que olhei para Brian, mas dessa vez é diferente, não vejo sinais de desprezo ou qualquer coisa do tipo para mim. É o contrário, ele parece bem interessado no que eu digo, além de aparentar preocupação nos seus olhos.

- E em todas essas vezes que seu colar reagiu... Você estava com pessoas a sua volta? – Ele questiona, parece estar conseguindo desvendar as coisas e chegar a algo que ainda não sei.

- Não... – Sussurro pensativa. Realmente, eu não estava sozinha em todas as vezes – Algumas vezes eu estava perto de outras pessoas, em outras eu estava sozinha.

Meu guardião se cala, e seu semblante endurece em uma seriedade que só vejo nele. Ele passa uma mão pela barba rala em seu rosto por algumas vezes, não tenho a menor ideia do que está passando pela sua cabeça agora.

- O que foi? – Questiono curiosa.

- É isso. – Ele diz me olhando – Seu colar reagiu por que a entidade estava próxima, mas você não percebeu que estava presente.

- E por que não? – Cerro o olhar.

- Porque talvez, ele já estava possuindo algum objeto próximo. Tão discreto que você não percebeu, mas seu colar sim. – Ele diz, e isso é como uma luz.

Isso faz todo o sentido, explica bem cada um dos momentos que meu colar reagiu mesmo não havendo nada a minha volta. A entidade estava sempre perto de mim, talvez se adaptando para tentar algo novo. Como eu não pensei nisso antes?

- Isso me faz pensar... – Brian volta a falar, seus olhos estão em mim – Precisamos nos apressar para tirar a entidade de você. Se está se tornando mais forte com o passar do tempo, corremos o sério risco de precisar enfrentar uma potencial cria do Abismo em breve.

O que ele me diz me acerta em um baque, unido a um calafrio que atravessa o mais profundo de mim. Uma cria do Abismo?

Um ser que está no mesmo nível de força daquele tal cara do casaco que a Tamires vive falando? O mesmo que deixou Amanda naquele estado que vimos?

A entidade dentro de mim pode atingir esse nível de poder?

Essa possibilidade me assombra apenas de imaginar. Todo o medo que tento ao máximo deixar preso dentro de mim se liberta, e antes que eu perceba, minhas mãos e pernas já estão tremendo de pavor. Se isso acontecer, eu não terei nenhuma chance de sair viva disso.

- Eu sei, isso é problemático. – Ele diz suspirando. Acho que meu silêncio deve ter deixado claro como essa informação acabou me impactando. – Então para garantir sua segurança e bem estar, devemos tentar acabar com tudo isso logo.

Não sei como, mas um sorriso de deboche surge no meu rosto – Achei que eu fosse só um trabalho, e que estava só sendo usada para vocês estudarem o Abismo.

A expressão que Brian faz agora é de total surpresa. Ele não imaginava que eu já tivesse noção disso? Que estão só me usando para aprender mais sobre essa maluquice toda do abismo, ou então... Ele... Não esperava mesmo que eu dissesse isso?

- Garota rancorosa... – Ele diz em um suspiro, mas diferente do que eu esperava, sua voz não foi seca, muito menos agressiva. – Não estamos te usando... Eu não estou te usando.

Meu silêncio é novamente o que Brian recebe, e assim ficamos. Pela sua expressão, eu tenho plena noção que acabei de falar uma besteira muito grande.

- Escute Clara... Nós estamos sim conhecendo mais sobre o Abismo. Graças a você, pudemos ver e aprender muitas coisas importantes. Mas apesar deste aprendizado, nem Ferdinand ou eu estamos com a intenção de te usar. – Ele pega uma das minhas mãos, sem tirar seus olhos dos meus. – Você é meu trabalho e não nego isso, ser seu guardião e te manter viva é meu dever... Mas a muito tempo não a vejo dessa maneira. Te mantenho viva porque é minha vontade, e não minha obrigação. Achei que já havia notado disso.

Por mais uma vez, meu coração bate forte. Tanto pelo seu olhar, seu toque, ou suas palavras. Posso abrir a boca para falar, mas não tenho palavras, todas me abandonaram.

Apoio os braços na mesa e me aproximo devagar, sem tirar meus olhos dos dele – Como saberia disso, se você nunca me falou? – Digo em um sussurro.

Ele me sorri – Alguma vez você me perguntou? – Ele também sussurra.

- Touché! – Digo e Brian ri, me fazendo rir junto dele.

Ele balança negativamente, soltando minhas mãos após dar um discreto carinho. O silêncio volta a imperar entre nós, mas continuamos nessa estranha conexão pelos nossos olhares. Pode ser estranha, me deixar com dúvidas do que está acontecendo aqui, mas eu gosto.

- Então... – Volto a falar após alguns longos instantes de quietude entre nós – O que fará agora?

- Por hora, preciso levar tudo isso ao Ferdinand. – Brian diz, recolhendo quaisquer folhas que ainda estejam espalhadas e guarda no envelope, voltando a me olhar – Ainda estamos reunindo o máximo de informações que podemos, além que iremos estudar tudo que já reunimos até agora. Será útil para te ajudarmos, e também para casos futuros.

Assinto balançando a cabeça por algumas vezes. – Tudo bem, eu entendo...

Ele me olhar por alguns segundos – Vem comigo Clara?

Por algum motivo, essa pergunta me deixa surpresa – Assim de repente?

- Sim, é que... Acredito que a partir de agora será mais seguro que fique comigo. – Ele diz, sem deixar de me olhar. A preocupação retornar ao seu olhar – Vimos que a entidade se tornou um perigo muito maior, não quero que corra riscos.

- Está tudo bem Brian... – Digo em um meio sorriso. – Pode ir, eu ficarei bem.

Ele não me responde, continua me olhar com a mesma expressão. Ele realmente está preocupado comigo, nesse momento o pedido para que eu o acompanhe não vem de sua boca, mas do seu olhar.

- Fique tranquilo, pode ir. Nada vai me acontecer... – Arqueio as sobrancelhas – E se acontecer, tenho as runas comigo, além do meu colar. Darei meu jeito de sair inteira.

- Promete que ficará bem? – Ele questiona em um sussurro.

Eu sei que esse não é o momento de pensar isso, mas Brian fica fofo demais assim todo preocupado comigo. Sei que um sorriso bobo se formou no meu rosto – Sim, eu prometo.

- Tudo bem, então irei me encontrar com Ferdinand para contar todas as descobertas... E depois, eu irei passar na sua casa. – Ele diz, me fazendo erguer uma sobrancelha. – Tenho que ensinar uma certa alguém a usar algumas runas de maneira decente.

Solto uma risada com o que escuto, apoiando meu rosto na mão – Ah, mas então agora, você resolveu que vai me ensinar mesmo... É a segunda vez que fala disso em menos de 24 horas.

Ele da de ombros com um pequeno sorriso – É, vou sim.

- E posso saber o motivo dessa mudança? – Questiono soltando uma risada.

- Você aprendeu a mais difícil sozinha, mostrou como é capaz como eu esperava que fizesse. A partir de agora será mais fácil... – Ele comenta, juntando as mãos bem a sua frente. Por mais que tenha escutado seus motivos ontem, algo me faz querer ouvi-los por mais uma vez – Irei ensinar... Ou melhor, eu irei te treinar Clara.

Ouvir tais palavras me desarmam. A surpresa estampada em meu rosto deve ser impagável. 

Eu havia perdido as esperanças disso acontecer já a muito tempo. Mas com o que Brian acabou de dizer, eu percebi o quanto eu queria isso, apenas estive ignorando todas as minhas vontades.

Finalmente poderei aprender mais, ir muito mais longe com as runas. Poderei conhecer mais, serei mais forte, estarei mais próxima de retornar a minha vida...

E isso com certeza me anima muito.

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