Capítulo 15 - Encontro na lanchonete
8700 palavras
Estou preocupada.
Desde a hora que acordei meu colar está aquecido, emanando um brilho contínuo. Logo quando acordei com meus olhos ofuscados, não entendi o que raios estava acontecendo, mas ao ligar os pontos, dei um pulo da cama com o susto.
Estou com ele há pouco tempo, mas já entendi bem como meu colar funciona. Se ele começa a reagir, é porque existe alguma ameaça próxima. O problema é que não tem nada estranho perto de mim, não importa o quanto eu procure não vejo nado... Mas ele não para de brilhar em nenhum momento, me forçando a olhar para todos os lados e desconfiar de tudo.
E no meio desse "tudo", não existe nada que me faça desconfiar de verdade.
E para completar, justamente no dia que quero encontrar o carro de Brian parado em frente a minha casa, ele não está. Que sorte essa minha.
Precisei vir para a faculdade e ficar agoniada com tudo. Cheguei ao ponto de desconfiar da minha própria sombra.
- Clara? – Volto à realidade, com alguém estalando os dedos em frente aos meus olhos, me fazendo piscar e retornar a realidade – Estou falando com você mulher!
Olho melhor, percebendo Marina me encarando com uma sobrancelha erguida. Penso em responder, mas minhas palavras não saem, ainda estou atordoada por retornar a realidade de maneira tão brusca.
- Você parece estar aérea hoje... Aconteceu algo? – Ela insiste em um olhar preocupado.
- Não, está tudo bem... – Digo, olhando de relance ao meu colar que, por um segundo, parece intensificar seu brilho ainda mais. – Só estou pensativa, mas não é nada. O que precisa?
Recebo um olhar desconfiado da minha melhor amiga, que logo se desfaz – Tinha te perguntado se você viu na página de anúncios da faculdade, anunciaram vagas de estágio.
Dou um pequeno sorriso – Ainda não tive tempo para olhar.
- Mas deixa que te atualizo sobre isso. – Marina diz em uma animação que só ela pode conseguir. Com minha visão periférica consigo perceber o brilho do meu colar diminuindo lentamente até por fim se apagar. Respiro aliviada, voltando minha atenção – ...E pelo papel, são só seis horas de trabalho, com o fim de semana de folga. Não é incrível?
Não devo falar que parei de prestar atenção e não ouvi nem metade do que ela diz, então apenas balanço a cabeça concordando. – Você vai se inscrever?
- Nós vamos minha cara! – Ela diz com um tom convencido. Ergo as sobrancelhas – Nós duas vamos nos inscrever, passar e conseguiremos nossas horas complementares.
- Nós? Sua doida, quem decidiu isso? – Questiono com um sorriso mais leve.
- Eu, quem mais seria? – Ela questiona animada.
- Não sei se estou afim de ver essa sua cara feia em um futuro emprego. – Digo zombando.
- Eu sei, já te vejo demais aqui na faculdade e já saímos muito. Com certeza não te suportaria por mais seis horas, além que você estragaria meus momentos com os rapazes... – Marina da de ombros com um sorriso zombeteiro, e começo a rir – Mas, eu preciso cumprir minhas atividades complementares, e mamãe sempre falou para eu ser legal com minhas amigas mais feias.
- Não queria te desanimar, mas você que é a amiga feia aqui. – Comento em uma sobrancelha erguida, querendo rir da cara que minha amiga faz.
- Tenho certeza absoluta que é você. – Ela faz uma pose de modelo e se mantém estática, fingindo ser uma estátua – Vejo só, sou linda, uma miss, uma verdadeira deusa grega!
- Definitivamente, uma empresa não aguentaria a nós duas juntas por muito tempo. – Digo balançando a cabeça negativamente.
- E é por esse e outros motivos, que devemos e vamos nos inscrever! – Ela termina de falar, se encostando em sua cadeira, me observando em canto de olhos com um sorriso de canto – Nós duas só temos a ganhar.
Dou risadas concordando – Tudo bem. Irei me inscrever também.
- Muito bom, essa é minha amiga sensata... Fazendo tudo por livre e espontânea vontade. – Ela diz com um tom de voz mais mandão.
- Quis dizer livre e espontânea pressão, não é? – Digo para irritar, e pela cara que ela faz, acho que consegui um pouco.
Ela começa a rir e me permito me distrair com qualquer coisa. A aula de agora é daquele tipo de professor que gosta de dar em cima de qualquer coisa que está se mexendo, então aula é a última coisa que temos.
Caminho junto dos meus colegas para fora da faculdade em passos animados. Tiago acabou por vir invadir nossa sala por mais uma vez, e ficou por lá nos acompanhando. Curiosamente, ele ficou bem próximo de Marina.
Acho que o que eu falei antes teve efeito nesse garoto.
Nossa aula acabou mais cedo, e estamos indo comer algo, e depois cada um para seu canto para começarmos a estudar. A temida semana de provas começa na próxima segunda, então é bom pegar firme nas matérias.
Novamente um dia ensolarado. Curiosamente, um dia bem mais quente do que o anterior, mesmo ainda estando tão cedo. Talvez na volta para casa, eu opte por pegar o metrô onde é garantido eu me refrescar, e não um ônibus qualquer com um ar condicionado que pode não ser muito efetivo.
Olho em volta pela saída da faculdade e... Bom, adeus planos de voltar para casa em paz.
Brian está parado bem em frente a faculdade, com mais um livro em mãos, atento a sua leitura.
Marina me acerta de leve com o cotovelo, como se eu não tivesse percebido que alguém tão chamativo está bem a minha frente.
- Acho que você não vai comer com nós Clara – Tiago diz em um tom brincalhão. Eu o encaro de canto de olhos, e o garoto está analisando o meu guardião com certa curiosidade. Tenho a impressão de ele estar um pouco nervoso também.
- Os planos não irão mudar. – Digo firme, e nesse momento meu guardião ergue seus olhos, olhando diretamente para mim. Talvez os planos mudem sim...
Ele permanece estático, apenas me olhando. Sinto que seus olhos percorrem em mim, me analisando em cada mínimo detalhe. Dou um suspiro, avançando em sua direção.
- Olá meu amor! – Alguém entra na minha frente repentinamente. Demoro para entender o que acabou de acontecer.
Olho com mais atenção – Ricardo?
- Surpresa. – Ele diz rindo, me abraçando a ponto de me tirar do chão. Me seguro firme tentando qualquer apoio, até ele finalmente me colocar no chão.
- Mas... O que faz aqui tão cedo? – Questiono, piscando algumas vezes – Ainda nem é meu horário normal de sair da aula.
Ele da um sorriso de canto – Eu tenho minhas formas de saber... Sem contar que eu já estava fora de casa, foi rápido chegar aqui.
Abaixo um pouco meu olhar, ficando levemente pensativa. Como ele poderia realmente saber, alguém contou, só pode ser. Mesmo assim, é estranho meu namorado estar por aqui de forma tão aleatória... Estranho não, só bem inesperado.
Olho bem para ele, levando minhas mãos ao seu rosto, analisando algumas pequenas olheiras. – Você deveria estar dormindo...
- Falando assim, até parece que não me quer aqui Clara. – Ele diz, erguendo uma sobrancelha. Apesar de carregar um sorriso, seu tom mudou um pouco.
Balanço a cabeça negando – Não é isso. É que você trabalha a noite inteira Ricardo, deve estar cansado... Acho que você nem dormiu... Não vai te dar problema estar aqui?
- Nenhum problema, eu aguento... – Ele diz, aparentemente está bem. Mas essas olheiras todas só me dizem que ele não está descansando direito.
Apenas balanço a cabeça novamente, concordando com o que ele diz.
- Alias, quero te fazer uma pergunta Clara... – Ele continua falando, apontando um dedo disfarçadamente para trás – O que ele faz aqui?
Ai droga, esqueci do Brian, e de toda a cisma que meu namorado tem. Olho disfarçadamente em direção ao meu guardião. Ele está imóvel, ainda olhando em minha direção sem nem ao menos ter mudado sua expressão. Não faço ideia do que ele está pensando, ele apenas mantém seus olhos em mim em cada segundo.
- Não sei amor... Ele deve estar trabalhando. – Dou a mesma resposta que provavelmente receberia do meu guardião.
Os olhos do meu namorado se reviram impacientes – Não gosto desse cara.
Desço minhas mãos lentamente, indo aos braços de Ricardo. – Ele só está fazendo o combinado de me manter segura amor... Quando tudo isso acabar, ele vai embora. – Essas palavras me causam uma sensação estranha no peito, mas eu faço meu máximo para ignorar isso.
- Ainda assim... Não gosto dele. Algo nesse cara me incomoda muito. – Ricardo insiste, franzindo a testa e bufando.
Torço a boca – Olha, se acalma. Tudo isso é temporário, ele vai mesmo embora. É só tudo isso acabar e eu ficar livre daquela coisa. – Respiro fundo, sei que o que irei falar agora talvez o irrite ainda mais – Eu preciso falar com ele.
O olhar do meu namorado se endurece ainda mais, e isso me incomoda. Infelizmente, não tem outro jeito. Olho sobre o ombro, percebendo meus colegas ainda presentes, mas a uma certa distância para não se intrometer na conversa. Agradeço a eles por isso.
- Vai lá com eles enquanto me resolvo com o Brian... – Sussurro para ele, que obviamente não reage da melhor maneira. Dou um beijo propositalmente no canto da sua boca. – E por favor amor, se controle.
- Ta, irei tentar. – Ele diz com a voz seca. Ele está mesmo se remoendo de ciúmes.
Ricardo se afasta de mim, indo em passos lentos para meus colegas, enquanto o acompanho com o olhar. Meu namorado não entendeu como está tornando tudo mais difícil para mim ao agir com tanto ciúme.
Me viro para o causador de todo esse problema, que continua mantendo seu olhar fixo em mim. Avanço em passos largos, pensando se devo ou não comunicar a ele o problema que sua simples presença causou.
- Descobri mais coisas... – Ele diz sem cerimonias assim que estou próxima o bastante.
Cerro o olhar – O que?
- Sobre a entidade... Descobri mais algumas coisas. – Ele fecha o livro e cruza seus braços, encostando-se no carro. – A Amanda conseguiu encontrar um registro com mais algumas coisas e me informou na hora. Deseja saber agora, ou melhor uma outra hora?
- Agora se possível! – Meu tom de voz deixa nítida minha impaciência.
Brian não diz nada, o que acontece é diferente do esperado. Seu olhar passa de um lado ao outro, focando em algo, ou melhor, alguém atrás de mim. Acabou de ficar claro que, se já não bastasse meu namorado, agora meus colegas estão bem atrás de mim.
Não sei de quem foi à ideia de virem mais perto, mas com certeza vai tomar uma bela bronca minha depois... Esse povo precisa aprender o que "privacidade" significa.
- Tem certeza? – Ele diz, erguendo uma sobrancelha – Pelo jeito, eles estão te esperando para alguma coisa. Se for melhor, posso te informar uma outra hora.
- Não é mais fácil você vir junto e contar o que precisa? – Ouço a voz de Ricardo, e me viro de imediato em sua direção.
Ele não vai com a cara de Brian, e do nada fala isso? O que ele está pensando?
Se essa ideia viesse de Marina seria mais fácil mandar ela calar a boca, mas meu namorado propondo isso? É tão inesperado que me deixa sem ação. Isso não faz sentido nenhum.
- Se minha presença não for um incômodo a vocês... – Brian diz de forma neutra.
- Com certeza não será... – Ricardo da um sorriso de canto. Seu tom de voz foi estranho, e unido a um sorriso tão falso, ele chegou ao ponto de me assustar. Neste momento, sinto meu colar se aquecendo entre meus seios, mas logo parando.
- Que fique claro, irei falar de trabalho e assim que terminar os deixarei livres. – Meu guardião diz na mesma neutralidade. – Onde vocês planejam ir?
- Bem... – Letícia acaba se pronunciando em uma voz contida – Tem um restaurante fast food aqui perto... Podemos ir lá comer alguns lanches?
Brian balança a cabeça concordando – Certo, me parece um bom lugar.
- Vocês, vão com ele... – Meu namorado diz, sem desviar o olhar de Brian. – Eu vou com a Clara no meu carro, nos encontramos lá.
Meu guardião da de ombros, dando a volta e parando ao lado da porta do condutor – Então, Marina, Letícia e... Rapaz de nome desconhecido, vamos antes que eu tome uma multa. Vocês vão me guiando.
Todos passam por nós, com Marina dizendo animada que iria na frente, e os demais a seguem com animação. Animação que eu não sinto nem metade. Acompanho meu namorado até o carro, sem dizer uma única palavra, e ele faz o mesmo.
O caminho que farei com Ricardo será em total silêncio, ou então em uma discussão bem acalorada... Independente de como for, será uma longa viagem.
Foi como imaginei, um longo caminho que Ricardo fez a maior questão de tornar muito mais longo do que deveria. Ele entrou em uma rua diferente e estacionou, onde pudemos discutir a vontade sobre toda sua cisma com Brian.
Não sei quanto tempo ficamos discutindo, mas pra variar, não chegamos a ponto nenhum.
Satisfeito com o impasse e repetindo mil vezes não gostar de Brian, meu namorado ligou novamente o carro, e somente agora estamos em frente ao restaurante. Saio do carro com a cara mais fechada do mundo, andando apressada sem nem esperar Ricardo e toda sua birra.
Entro no lugar, recebida pelo ar condicionado gélido que se destaca pelo calor que eu estive até poucos segundos atrás, mas logo que avanço sou abraçada pelo ambiente abafado do restaurante. Ouço a barulheira causada pela fala simultânea de várias pessoas.
Olho em volta, observando as paredes brancas e recheadas de decorações da franquia que esse restaurante pertence, as placas com anúncios de lanches, um letreiro digital com um número de uma senha, e os funcionários trabalhando com pouca pressa no balcão quase vazio. Também, o restaurante inteiro está quase cheio, eles devem estar aliviados por terem poucas pessoas agora.
Isolados em uma mesa bem no canto do restaurante, vejo todo o grupo aos risos. Respiro fundo, me aproximando da mesa.
- Demorou para chegar... – Brian diz de repente, sem sequer se virar para mim – Achei que tivessem se perdido.
- Tivemos alguns... "Contratempos". – Falo, revirando os olhos. Pego uma cadeira e me sento, cruzando meus braços. Todos aqui estão olhando em minha direção – Mas enfim, do que falavam de bom?
- Nada muito relevante... – Tiago comenta, atraindo meu olhar. Ele abre seu lanche, fazendo uma expressão de estranheza – Eca, picles!
- Se o problema é esse, só tirar o picles. – Marina diz em provocação, o observando de soslaio com o rosto apoiado sobre a mão, pescando algumas batatas.
- É o que farei. Sério, que treco ruim. – Tiago diz, pescando os picles de dentro de seu lanche e deixando de volta na caixinha.
- Ah Tiago, mas picles nem é tão ruim assim. – Marina diz rindo.
Tiago a observa, contendo o riso – Se não é tão ruim, então por que você também tirou todas as fatias de picles do seu lanche?
- Porque... – Marina diz sem jeito – Porque... Porque eu quis, é ruim.
- E depois você fala de mim. – Ele balança a cabeça negativamente.
- Pelo menos vocês dois concordam em algo. – Letícia diz brincalhona, e Tiago concorda rindo.
- Nada relevante? – Questiono diretamente para Brian, escutando passos e uma cadeira sendo puxada ao meu lado. Nem faço questão de olhar para meu namorado.
- Só sua amiga contando piadas. – Brian me responde, pegando um copo e bebendo.
Letícia da de ombros – Eu só contei algumas que acho boas, e pelo jeito gostaram.
Em meu estado normal, eu iria querer saber e até rir junto. Mas irritada como estou, não estou nem ai para piadas. Meus olhos vão a Brian – Acho que tem algo a me mostrar, não é?
- E eu achei que não perguntaria. – Ele diz sem olhar para mim, pegando seu copo e bebericando. Ele alcança o livro sobre a mesa, que percebo ser um com uma capa diferente. Esse tem tons vermelhos.
Ele abre e começa a folhear, seu olhar está atento as páginas, e percebo como todos aqui na mesa se calaram.
Junto as mãos e as apoio em frente ao meu rosto, esperando ele achar seja lá o que for.
- Aqui, nesse trecho existe uma menção... – Ele diz em baixo tom, olhando fixamente para o livro e lendo em voz alta – Os seres que habitam esse espaço, em suma, são pacíficos. Raros são aqueles que são hostis a qualquer tipo de vida. Essas criaturas se dividem em alguns grupos, os primitivos incapazes de raciocínio, evoluídos que demonstram capacidade de raciocínio lógico, e o grupo das criaturas superiores. Esses em especial, além do raciocínio acima da média, são capazes de se comunicar facilmente com outros seres e são dotados de habilidades sobrenaturais acima da média. Acima de todos, existe o último e menor grupo, de longe são os seres mais poderosos, também considerados os regentes da dimensão. Eles são conhecidos como "crias do abismo".
Assinto balançando a cabeça, gesticulando para que continue.
- As criaturas do abismo possuem um corpo físico apenas dentro da própria dimensão, porém eles sofrem de uma condição especial que não está presente em nenhum outro ser. Caso esses abandonem seu espaço de origem, seus corpos se convertem em energia pura que gradualmente se dissipa até desaparecerem, acarretando assim na morte desses seres. – Dito isso, vejo Brian passando uma mão pelo rosto, voltando a ler – Para evitar isso, eles precisam retornar ao abismo para que possam se recuperar, ou então se alojar dentro de um corpo para que sua existência continue. Os seres do abismo não são parasitas, eles sobrevivem sem causar mal algum a seu hospedeiro, passando quase boa parte do tempo adormecidos. Quando despertos, estes não interferem na vida de seus portadores. E na situação do portador ter conhecimento da criatura, estes podem continuar em estado de convívio, com a possibilidade da criatura fornecer habilidades a seu portador. Dos seres do abismo, os únicos que não sofrem dessa deficiência são as crias, por possuírem um corpo completamente físico.
Silêncio na mesa assim que Brian para de falar. Por alguns segundos, todo o restante do ambiente se silenciou. Pisco algumas vezes, tentando absorver tudo que foi dito.
- Muita informação maluca. – Marina diz em um tom pensativo.
- Parece muito com um livro de RPG... – Ricardo diz com desdém.
Passo uma mão pelo queixo, olhando para Brian. Não sei ainda o que dizer a ele – Certo, você achou tudo isso. Mas o que significa mesmo?
- Bem, o primeiro detalhe é que aqui está dizendo muita coisa útil... – Ele comenta em baixo tom, aproximando o livro de mim com a ponta dos dedos. Lentamente o tomo em minhas mãos, sentindo as folhas ásperas que denunciam que esse livro já é bem velho. Observo alguns textos em uma página, e alguns tópicos no outro lado. – Por exemplo, sabemos onde a coisa dentro de você se enquadra. Possui um raciocínio, então é uma criatura superior. Além disso, ele é formado de pura energia caso não esteja dentro de algum corpo. Sabe o que isso significa?
Mantenho o meu silêncio. Minha cabeça está a um passo de explodir com essas primeiras informações, e duvido que sejam só essas que Brian descobriu. – Se ficar fora de um corpo por muito tempo, então ele irá se enfraquecer? – É Letícia quem questiona.
- Exato! – Brian diz e um sorriso surge em seu rosto – Essa criatura sendo formada por pura energia, a melhor coisa para feri-lo de fato é obviamente, com alguma coisa que carregue uma forte carga energética. Só precisamos bolar uma estratégia, e conseguirei lidar com ele com maior facilidade.
Pego o livro, olhando as páginas com cautela. Cada palavra, cada informação aqui é algo que diz mais sobre essa coisa dentro de mim, minha sensação é a de ter um tesouro em minhas mãos. Passo uma página, onde estão algumas imagens. Elas ilustram respectivamente os grupos que Brian mencionou e um tipo de criatura.
Os primitivos se assemelhando a pequenos animais de estimação parecidos com gatos selvagens e outros animais. Os evoluídos parecem os mesmos animais, com leves alterações entre eles e de alguma forma, são visivelmente mais desenvolvidos. A imagem que representa os seres superiores é semelhante ao de um humano e alguns animais bípedes... Mas apenas semelhantes.
Já as crias do abismo sequer possuem um registro em imagens ou dados relevantes. O que existe é a silhueta de uma pessoa e uma interrogação bem no meio.
Olho com curiosidade, passando meus dedos pela folha, sentindo minha curiosidade crescendo dentro de mim a cada segundo. É muita coisa, mas eu quero saber cada vez mais sobre isso.
- Me tranquiliza muito não ser uma cria... – Brian diz pensativo.
- Por que diz isso? – Digo quase em um sussurro, sem desgrudar meus olhos das páginas.
- Temos mais chances de vencer. Segundo esse livro, uma cria é tão forte quanto um anjo comum, por isso são regentes do Abismo... – Percebo o tom de alivio quando Brian diz isso. Passo meus olhos pela mesa, e querendo ou não, todos estão levemente surpresos com o que estamos falando – E para ter uma noção, um anjo é extremamente problemático até para Ferdinand e Amanda.
Suspiro com o que ouvi – Certo... Então você descobriu o tipo, e também uma potencial fraqueza?
- Em resumo, o mais importante é isso. O restante é apenas alguns detalhes que não fazem tanta diferença agora – Ele diz, alcançando o livro em minhas mãos, olhando as páginas atentamente, voltando a ler calmamente – Estive estudando esses livros pelas últimas noites, se tem alguma fraqueza de fato, algum feitiço contra essas coisas, se tem lista de habilidades comuns que essas coisas podem ter... Mas aqui não tem nada disso.
- As informações são poucas... Mas já são melhores do que nada. – Digo em um suspiro.
Brian fecha seu livro, o deixando a sua frente – Irei atrás da Amanda. Baseado nas informações que temos agora, talvez ela conheça algo que possa ser efetivo.
- Me manterá informada? – Questiono, erguendo uma sobrancelha.
- Não tenha dúvidas quanto a isso, afinal isso é do seu interesse, muito mais do que meu. – Ele se levanta, deixando o livro debaixo do braço – Estou indo, cuide-se garota... Pessoal, até uma próxima vez, a conversa com todos foi ótima... E Tiago, foi um prazer conhecê-lo.
Acompanhamos meu guardião se afastando devagar, até ele finalmente sair do estabelecimento. Volto a encarar todos a mesa, que me observam com uma interrogação no rosto.
- Então...? – Tiago começa a falar, claramente desnorteado – Que cara legal né?
- Discordo quanto a isso... – Ricardo reclama bufando.
- Discorda por você ser um chato. – Marina diz, revirando os olhos. – O Brian não é tão ruim, na verdade ele é um cara ótimo.
Dou de ombros, esse é um momento que concordo totalmente com Marina.
- Isso ai que estavam falando... – Tiago comenta, com o olhar cerrado – É alguma peça de teatro? Um joguinho? RPG de mesa? Algum projeto?
Não sei o que dizer. Nessa mesa, Tiago é o único que ainda não sabe o que está acontecendo comigo, e talvez eu prefira deixar assim – É mais complicado do que parece Tiago...
- Olha Clara, não leva a mal não mas isso tudo pareceu com algum ocultismo. – Ele diz, torcendo a boca – Credo... Não vou negar que o Brian parece um cara legal, mas depois disso... Recomendo repensar com quem você está andando Clara... Ele é estranho.
- Sabe que eu penso a mesma coisa...? – Ricardo comenta em baixo tom, mas claramente irritado. Ele vira seus olhos a mim, como se a discussão de antes já não bastasse – Mas não importa o quanto eu fale, ela não me escuta.
- Até onde eu sei Ricardo, você nunca falou algo sobre as pessoas com quem eu ando, nem nunca ficou supervisionando com quem tenho amizade. – Digo irritada.
- Pois comecei agora. – Ele responde, desviando o olhar de mim.
- Como se eu precisasse de alguém me monitorando... Nunca precisei e não é agora que eu vou precisar. – Respondo cruzando os braços. – Eu recomendo que pare com isso, e agora.
- E se eu não quiser? – Ricardo se vira para mim, seu olhar é duro.
Apoio um braço na mesa, o encarando sentindo toda a raiva que eu tenho em mim começando a se elevar cada vez mais. Sinto novamente o calor no meu colar e até imagino que ele começou a emanar seu brilho – Então teremos um problema... Um bem maior do que já temos agora, e pelo visto é isso que você ta querendo. – Digo em voz baixa, mas meu tom é de ameaça.
- Você sabe minha opinião! – Ele retruca.
- E você sabe meus motivos! – Devolvo de imediato, controlando ao máximo minha voz para não chamar atenção de nenhum enxerido. Apesar de praticamente estar sussurrando, estou sendo o mais dura que poderia ser.
- Você vai se afastar dele... – Ele diz, sua voz sai dura. Seus olhos estão queimando de raiva, mas isso simplesmente não me amedronta em nada.
- Eu não vou fazer o que você quer, e sim o que eu quiser... Ou melhor, o que eu preciso pra continuar viva! – Digo firme, não vou mudar de ideia por nada nesse mundo. – Você e nem ninguém vai ditar como irei agir ou com quem vou falar.
Ricardo olha para mim, e então para todos na mesa. Eles estão acuados, sequer estão olhando para nós dois. Por um momento até me esqueci de que tivemos essa mini discussão na frente de todos, mas não estou nem ai.
Volto meu olhar ao meu namorado, querendo dar um fim nessa conversa – Você sabe que preciso dele, então me afastar do Brian não é uma opção, você gostando ou não. Está me entendendo?
Ele não me responde, simplesmente se levanta e sai andando em passos pesados, passando as mãos pelo cabelo impacientemente. Ele sai do estabelecimento, se a porta já não estivesse aberta anteriormente, imagino que ele teria derrubado a mesma.
Inspiro profundamente, soltando o ar pela boca. Percebo meu colar, lentamente deixando de brilhar por dentro da minha roupa.
Junto às mãos e esfrego no rosto, tomada pela impaciência. O que está havendo com ele? Por que meu namorado está agindo assim?
Tudo isso é só ciúme?
Ele é quem eu mais esperava que fosse me dar apoio dentro de todo esse problema, mas ele é quem está tornando tudo muito mais difícil. Será que ele não entende a situação em que estou, e que realmente preciso de Brian para continuar viva?
Ignoro isso, não vale a pena ficar queimando neurônios com algo desse tipo.
- Ah... – Letícia tenta falar, mas de imediato se cala.
Tiago me observa – Desculpe, eu... Se soubesse que daria nisso, teria ficado quieto.
- Não, está tudo bem. – Digo balançando uma mão – O Ricardo só está enciumado e bem irritado... E pelo jeito não sabe lidar com isso.
- Tudo isso é ciúme do Brian? – Letícia questiona, ainda acuada.
- É, acho que sim... O Ricardo não está ajudando nada. Ele não está aceitando que preciso da "amizade" que tenho com o Brian para me manter viva contra aquela coisa. – Digo, apoiando o rosto na mão, olhando para baixo.
- Que coisa? – Tiago questiona em inocência.
- Digamos que a Clara está sendo perseguida e o Brian está tentando ajudar. – Marina diz, pegando uma lata de refrigerante e dando um gole. Ouvimos o som de pneus, e então um carro vermelho passando acelerando ao lado da janela. Todos do restaurante olham em direção da origem do som, até que ele enfim desaparece. – É, parece que não vamos ter carona de volta.
Dou um pequeno sorriso da tentativa de Marina de quebrar o gelo – Isso não é problema, pelo menos voltamos ao plano original de só nós sairmos para comer.
- E depois sair para andar no sol. – Letícia diz com uma risada contida.
- Bem melhor que sair na chuva. – Constato, e ela concorda balançando a cabeça.
- Banho de chuva só se estiver em casa. – Marina comenta com um sorriso brincalhão.
Percebo que Tiago está me observando com uma sobrancelha levemente erguida. E aliás, ele está meio quieto, diferente do que costuma ser – Algum problema?
- Só fiquei pensativo sobre isso tudo que ouvi... – Ele diz, com uma expressão pensativa.
- Não me faça repetir o que eu disse para o Ricardo. – Ameaço com o indicador apontado em sua direção.
- Ei, calma Clara, fica tranquila... Não é isso... – O garoto ergue suas mãos como se tentasse uma defesa – Não tenho o menor poder pra decidir suas amizades... É que fiquei preocupado por você estar sendo perseguida por uma "coisa", ainda mais depois de ouvir tudo isso.
Respiro fundo, pescando um refil de batatas fritas abandonado na mesa – Então Tiago, sabe aquele livro que o Brian estava me mostrando?
- Aquela coisa estranha que parece ter uns cem anos? Sei sim...
- Viu as imagens? – Ele confirma – É uma coisa daquelas atrás de mim.
Ele faz uma cara estranha. – Bizarro.
Pelo seu tom de voz, está obvio que ele não acredita em mim. Mas tudo bem, eu não tiro a razão dele. Na verdade, prefiro que continue assim.
Decido por me manter calada, e todos fazem o mesmo. Acho que para eles, já deu desse assunto. Quem precisa se focar em resolver tudo isso sou eu, e não devo ficar colocando nenhum deles dentro desse problema.
Já é a décima mensagem que mando para Ricardo, mas ele apenas visualiza e não responde nada. Insisti em mandar mensagens porque, apesar de estar agindo igual uma criança, Ricardo ainda é meu namorado e eu prefiro ficar bem com ele.
Se bem que, depois de tantas mensagens apenas visualizadas, tanto faz. Ele que venha atrás de mim, afinal quem está agindo de maneira ridícula é ele.
Tudo que estou tentando é ficar viva. É tão errado fazer isso?
Jogo meu celular sobre o sofá, cruzando os braços e me focando na televisão, tentando me distrair com o filme que deixei passando. Já me inscrevi na vaga que Marina havia me dito, e nesse momento deveria estar estudando, mas estou emburrada demais pra isso.
Ouço a campainha tocando, e preguiçosamente levanto do sofá. Caminho até porta e olho para mim mesma, checando se minhas roupas de ficar em casa estão no mínimo apresentáveis.
É horrível estar em casa com um cabelo sarara, vestindo roupas tão largadas como um shorts jeans muito curto, uma camiseta tão grande quanto um vestido... E do nada chegar alguém para acabar com minha bela mordomia.
Se for o Ricardo, ele vai ouvir muito.
Abro a porta de uma vez e encaro a pessoa. Um homem alto que de cara imagino ser meu namorado, me preparando para disparar mil insultos, mas de imediato me contenho. – Brian?
- Ainda não acabamos o assunto de mais cedo garota. – Ele diz, erguendo o livro em sua mão.
- Você não tinha ido atrás da Amanda? – Questiono logo de cara.
Ele confirma balançando a cabeça, mas não sinto firmeza nele. – Está mais calma?
Cerro o olhar – Por que está perguntando isso?
- Porque você demorou para chegar ao restaurante, e quando apareceu, estava bem na cara como você estava irritada... – Da de ombros, levando uma mão ao bolso de seu terno. – Posso entrar?
- Hoje você quer entrar? – Questiono em um riso.
- Hoje estou apresentável. – Ele ergue as sobrancelhas.
Respiro fundo e dou espaço para que entre – Não tem ninguém que você já não conheça.
Vejo o homem passando por mim, me observando de canto – Os outros também estão aqui?
- Não, só estou eu em casa. Meus pais vão demorar para chegar do trabalho... – Digo dando de ombros, fechando a porta e sinalizando a direção da sala. Como se acabasse de receber uma permissão, ele segue na frente.
Reflito um pouco no que acabei de falar, estou só eu em casa, sozinha com Brian. Isso ecoa nos meus pensamentos, e minha mente começa a imaginar mil coisas.
E dessas mil coisas, quinhentas envolvem sexo... E as outras quinhentas, também.
Acompanho-o em passos um pouco mais lentos, o observando em cada detalhe. Fico imaginando o corpo escondido por debaixo de tantas roupas, corpo esse que já vi uma vez e me causa sensações de calor e desejo.
Brian se senta no sofá e paro de andar a uma certa distância. Meus olhos não desgrudam dele em nenhum segundo, e ele me olhar de volta faz minha respiração enlouquecer. Estou ao máximo contendo minha vontade extrema de correr e me sentar em seu colo e tomar sua boca em beijos, meu corpo pede por isso.
- Você ainda não me respondeu... – Ele diz de repente, me tirando do transe que meus pensamentos me jogaram – Está mais calma?
- Ah... Sim... Sim estou... – Digo com a voz falha, tentando aplacar todos esses pensamentos que causam tantas vontades em meu corpo. – Eu acho pelo menos... – Sussurro.
Não sei se ele consegue ler pensamentos, porque se conseguir, deve saber que não estou nada calma, que meu corpo está ardendo em chamas e desejo, e o responsável por isso é ele mesmo.
Respiro fundo, me aproximando do sofá, tentando ao máximo apenas me sentar ao seu lado e esquecer todos esses pensamentos de quantas formas posso agarrar ele, tomando cuidado para não ficar próxima demais. Vai saber o que acabarei fazendo nesse meu estado atual.
- Quero perguntar algo... – Digo, evitando olhar muito para Brian – Se tinha mais coisas para falar, por que não falou na hora?
- Com você e seu namorado bufando? – Ele questiona em uma risada contida – Preferi deixar para falar o restante diretamente a você em outro momento.
Bato os dedos sobre minha coxa, ele ainda não me respondeu algo – Como foi com a Amanda?
- Eu não encontrei com ela. – Viro meus olhos a ele – Fui até sua loja, mas ela não estava. Liguei para ela, mas seu telefone só chama, e não deu para falar com Ferdinand por ele estar em horário de trabalho.
- Você poderia ter ido até o seu trabalho, e falado com Ferdinand por lá. – Digo, como sendo a coisa mais óbvia.
- Poderia, mas demoraria demais, a gasolina não é barata.... E eu já estava vindo para cá. – Brian da de ombros. – O que pude fazer é deixar um recado com Jeniffer, para que ele me ligue quando puder.
Concordo balançando a cabeça, me encostando no sofá, cruzando meus braços.
Ele abre seu livro, folheando algumas páginas – Bem Ana Clara, temos alguns pontos a tratar.
- Quando me chamam pelo meu nome dessa forma, coisa boa não é... – Digo resmungando desviando meu olhar.
- Claro, afinal minha presença aqui é estritamente profissional... – Ele diz, terminando de folhear seu livro, me olhando com o canto dos olhos e dando um sorriso afrontoso. Já percebi que coisa boa não vai vir dele. – Estou falando com meu trabalho afinal.
Junto as sobrancelhas. Começou a me irritar cedo – "Seu trabalho" vai render pneus furados e uma pintura toda arranhada.
Brian da uma risada debochada – Eu me preocuparia, mas você não costuma acertar o carro.
Me irrito apertando mais os braços e olhando para o lado, acho que estou irritada a ponto de estar fazendo bico como uma criança manhosa. Ele vai me pagar por isso.
Silêncio por alguns segundos, o que atrai minha atenção para ele novamente. Brian está me observando de um jeito um pouco diferente do que faz normalmente. Acho que é com curiosidade, porém logo ele desvia o olhar de volta ao seu livro. – Que foi? – indago.
- Nada. – Ele diz desconcertado. Ergo uma sobrancelha com sua reação – Voltando ao assunto... O que eu queria falar não é exatamente uma coisa ruim, são suspeitas que eu tive.
Ele diz e age como se nada tivesse acontecido. – Relacionadas a...?
- Sobre a criatura, aqui... – Ele aponta uma parte da folha, que eu finjo ler – Aqui diz que essas criaturas não são hostis, nem quando estão hospedadas em alguém.
Fico pensativa com isso, desta vez lendo a parte indicada – Sim... Está dizendo que é raro existir hostilidade, mas não ausenta a possibilidade de uma coisa assim ser agressiva.
- Claro, mas pensei um pouco... – Ele abaixa o olhar, ficando pensativo – Se são seres que normalmente não são violentos... O que pode ter corrompido essa coisa dentro de você?
Junto as mãos em frente ao corpo, refletindo alguns segundos – Ele surgiu de um pesadelo que eu tive, lembra?
- É um palpite, talvez tenha mesmo alguma relação... Mas não, acho que isso ainda não explicaria tudo. – ele diz em um tom sério.
- Qual sua ideia? – Digo, olhando do livro para ele.
- Talvez a possibilidade de quando essa coisa saiu do abismo, a mudança dimensional fez ele enlouquecer. – Brian da de ombros. – Ainda estamos no escuro sobre o que pode ter ocorrido, especular assim é difícil.
- E por qual motivo um bicho desses sairia do Abismo e viria direto para mim? – Questiono.
- Você abriu a porta do Abismo, então sua mente pode ter sido um "ponto de ancoragem" para a entidade. – Ele me olha – Bem, o lado bom é que são descobertas. Poucas, mas qualquer nova informação é bem-vinda.
- E de bônus, aumentando as chances de eu finalmente voltar a minha vida normal. – Suspiro.
Brian da um sorriso de canto, que logo se dissipa – Escuta, serei invasivo demais se perguntar o motivo do seu namorado ser tão cismado comigo?
Ergo as sobrancelhas com essa pergunta, olhando de um lado ao outro. – Não sei...
- Não sabe se serei invasivo, ou o motivo? – Insiste.
- Invasivo acho que não vai ser... – Fico pensativa, por qual motivo ele quer saber disso. E pior ainda, ter perguntado assim tão do nada. – Por que quer saber isso?
- Talvez porque toda vez que eu estou por perto, ele fecha a cara na hora. – Ele fica pensativo, fechando o livro em sua mão. – E isso aconteceu de novo hoje... Fiz algo de errado?
Dou uma risada seca – Nasceu.
- Tão extremo assim? – Ele ri, apoiando o cotovelo sobre a perna, e o rosto na mão.
- É... – Reflito um pouco se devo falar sobre o que está acontecendo, logo com o causador de todo o problema e de desejos tão repentinos. – Não acho que tenha feito algo em específico... Mas o Ricardo está estranho ultimamente, não consigo acreditar que tudo isso é por ciúme.
- Ele não entendeu que tudo que estou fazendo é te proteger? – Ele ri ainda mais.
- Acho que ainda não. – Volto a olhar para ele, com um sorriso no rosto. – Ou se entendeu, não deve ter aceitado.
Ele passa uma mão no rosto – Será que ele vai entender se eu falar que você é só um trabalho?
Fecho a cara com seu comentário – Para de me chamar de trabalho!
Brian da uma risada mais tranquila e um olhar provocante – Para mim, é isso que você é garota.
Tomo o livro de sua mão e acerto um golpe forte em seu braço, mas ele apenas continua rindo sem parar – Do que está rindo tanto?
- De você. – Ele diz com um sorriso, segurando minha mão antes que eu acerte um novo golpe com o livro. – Você se irrita fácil demais Clara.
Abaixo a mão devagar, cerrando meu olhar. Brian solta minha mão lentamente assim que solto o livro no sofá, como se estivesse se certificando que não irei atacar novamente. Ótimo, ele está distraído, é minha chance!
Avanço jogando meu corpo sobre ele, levando minhas mãos ao seu ombro o empurrando, forçando que ele se deite no sofá em um impacto, o fazendo arfar. Aproveito sua distração e aperto meu joelho sobre sua mão. Com toda a força que consigo, o mantenho pressionado contra o sofá.
Vejo como Brian pisca e fica me olhando em surpresa, tentando soltar sua mão sem nenhum sucesso. Aproximo meu rosto do seu, deixando meus cabelos caírem em torno do meu rosto e encontrarem sua pele, e carrego um sorriso de superioridade – Me irrito, e não gosto de deixar quem me irritou sair impune.
- Então, você não gosta? – Ele sussurra e um sorriso surge no canto da sua boca, e para completar ele não desgruda seus olhar do meu.
Esses olhos tão profundos me desconcentra, quero me perder nele e tudo piora quando sinto sua mão livre subindo até minha cintura, tocando minha pele por baixo da camiseta. Os arrepios se espalham e meu coração bate forte, o calor do momento cresce cada vez mais tendo meu desejo como combustível.
- Não gosto... – Digo sem tanta firmeza, tentando o manter contra o sofá.
- Mesmo é? – Ele insiste mantendo o olhar e o sorriso, da mesma forma, cada vez me seduzindo mais. Eu não posso deixar isso adiante, mas não consigo impedir.
Até quero me levantar, mas sentir seu toque na minha pele é o bastante para que eu não me afaste. Brian puxa meu corpo para mais próximo do seu gentilmente, até estar praticamente deitada sobre ele, mas sem pararmos de nos olhar por um instante que seja. Tento falar, mas me faltam palavras e também ar para isso – Mesmo... Não gosto... – Sussurro fraco.
Ele mantém seu sorriso enquanto me encara, seus olhos passeando pelo meu rosto, e lentamente sua mão sobe ao meu cabelo, com seus dedos correndo tímidos pelos fios. Paro de pressionar seu corpo contra o sofá, apenas aceito me deitar sobre ele, podendo sentir um pouco de seu corpo escondido debaixo de todas essas roupas.
De repente ele ergue seu corpo de uma vez me pegando desprevenida. Me vejo sentada sobre suas pernas, abraço seu pescoço com receio de me desequilibrar e cair, mesmo com sua mão ainda em volta da minha cintura. Neste momento eu estou rindo junto dele.
Brian pende meu corpo para trás, e acerto o sofá suavemente, ainda assim perdendo o fôlego e soltando meus braços de seu pescoço. Pisco algumas vezes, me vendo deitada no sofá, com as pernas em volta do meu guardião. Ele por sua vez, está por cima de mim.
Um choque corre pelo meu corpo me causando excitação e desejo imediato, novamente minha mente vai longe, mas tenho que tentar sair disso. Passo as pernas em volta de sua cintura e o puxo para mim. Aperto seu corpo com toda a força, tentando ignorar a estranha e imediata rigidez que estou sentindo entre suas pernas. Um choque percorre minha pela trazendo arrepios, meu corpo treme de imediato pela excitação.
Agora eu entendi... Eu escolhi o movimento mais errado... E ao mesmo tempo, o mais certo!
Tento erguer uma mão para golpeá-lo em uma tentativa de escapar e manter meu controle, mas Brian é bem mais rápido que eu. Ele segura minhas duas mãos e as erguendo acima da minha cabeça, e faz isso com só uma de suas mãos.
Pisco algumas vezes com meu coração batendo enlouquecido pela adrenalina, meu desejo atual e pela situação. Estou rendida, quem sorri em superioridade agora é ele.
- Que pena... Porque eu gosto de ver quando está irritada Clara... – Ele diz, passando os dedos pela minha testa retirando alguns fios de cabelo do meu rosto, e isso me seduz ainda mais – É engraçado, você fica toda emburrada. Eu já te disse isso uma vez...
- Verdade, disse mesmo... Você gosta quando estou irritada? – Digo em um curto riso, que logo me abandona e deixa um sorriso em meu rosto. Eu não consigo parar de olhar para ele, encarar dos seus olhos a sua boca.
- Gostar é o meu motivo de te irritar tanto garota... Não faço isso de graça. – Ele sussurra passando o indicador pela minha bochecha devagar.
- Isso explica tanta coisa... – Digo ironizando todas as vezes que me irritei com ele, sem me importar mais da maneira como ele me deixou. Ter me irritado antes não importa agora. Estou seduzida e desejando que isso continue.
Minhas pernas não obedecem. Continuam firme em volta de sua cintura, fazendo meu corpo explodir em desejo ao sentir tão bem sua ereção contra meu corpo, e tenho uma leve impressão de sentir um leve pulsar.
Então, nem Brian é de ferro.
Apesar de seu olhar calmo e bem tranquilo, ele está me analisando, olhando-me do mesmo jeito que olho para ele. Também está se empolgando com tudo isso... Eu gosto, sorrio em satisfação e prazer... E principalmente, desejando mais.
- Aprendi uma coisa sobre você... – Ele diz de repente – Gosta de estar no controle da situação, mas odeia quando não tem esse controle.
- Quando aprendeu isso? – Questiono com um riso baixo.
- Percebi quando tentou se virar sozinha contra a entidade... – Seu rosto está próximo do meu, meu corpo reage sozinho, ou penso isso para me enganar. Estou movendo a cintura para sentir mais de seu corpo, esperando sentir mais dele, desejando tudo que ele tem entrando em mim por inteiro. A respiração de Brian está diferente, mais profunda. Estou conseguindo causar algo nele, e gosto disso. – E tive mais noção disso agora. Seus olhos diziam como você gosta de estar por cima.
- Interessante, talvez esteja certo... – Sussurro mordendo o lábio, sem saber qual sentido de "estar por cima" que eu me refiro. Já nem estou pensando direito, eu apenas desejo meu guardião cada vez mais – Por que não coloca isso em prática?
- Eu posso? – Ele sussurra, passando seus dedos pelo meu rosto. Posso sentir sua boca próxima a minha, nossas respirações já se descompassam, nossos olhares unidos. – Você... Namora...
Percebi como sua voz foi mais contida, suas palavras fazem com que uma hesitação surja em mim. Ele está certo, eu namoro. O que estou fazendo aqui é errado, por mais que eu ainda não esteja fazendo nada de fato... Ainda.
Sei que estou errada... E se eu continuar, eu estarei ainda mais errada, e dessa vez não terei o álcool como uma desculpa. Estou completamente sã, mas seduzida pelo homem sobre mim, o guardião que eu e meu corpo desejamos.
Brian não avança, ele aguarda a minha resposta. O que ele fará vai depender da minha resposta, novamente sou eu quem decide.
Prosseguir ou não... Me entregar aos meus desejos e finalmente poder beijá-lo sem restrições, sentir mais de seu corpo e sua pele junto a minha e tudo que ele tem a oferecer escondido debaixo dessas roupas... Ou negar o que está bem a minha frente, fingir que nada aconteceu e me controlar.
O que eu faço?
Meu corpo se atrai por ele, meu corpo tem uma resposta, mas minha mente grita outra. Meu corpo deseja Brian, e minha mente em grande parte insiste para afastá-lo.
Aperto mais minhas pernas em torno de seu corpo, sentindo sua ereção escondida pelas roupas se apertando mais em mim. Sorrio e aproximo meu rosto do dele, e ele faz o mesmo.
Fiz minha escolha, eu quero Brian para mim.
Um toque de celular começa de repente, causando um susto em nós dois. O celular toca algumas vezes enquanto nos olhamos. O que existia entre nós acabou de desaparecer, nossos corpos e bocas se afastam como se tamanha proximidade nos ferisse.
Os olhares de desejos que lançávamos um ao outro não existem, nos olhamos como os dois estranhos que de fato somos.
Brian solta minhas mãos e eu afrouxo minhas pernas, o permitindo se afastar de mim. Ele se levanta e pega seu celular do bolso. Me endireito no sofá, com a respiração apressada. Meu coração bate em meu peito com a mesma força de tambores enlouquecidos.
Eu estive perto demais de fazer algo com ele, mas me sinto péssima. A culpa de ter ido tão longe atravessa meu corpo, me causando uma estranheza, repulsa de mim mesma. Eu estava mesmo prestes a fazer isso, me entregar para Brian, e apesar de me sentir mal, não me arrependo nada de ter feito isso...
Na verdade, uma parte de mim se sente mal por não ter conseguido ir adiante com tudo isso.
Esfrego ambas as mãos no meu rosto, tentando afastar cada um dos pensamentos que correm pela minha mente. Ignoro o que Brian fala ao telefone, sua voz parece distante.
- Certo... Não, tudo bem, eu entendo... Irei o quanto antes. Obrigado Jenny... – Jenny? Meu estomago revira de imediato, e parte do meu ar parece ter sido arrancado de repente.
Olho para Brian, que acaba de guardar seu celular no bolso enquanto bufa de leve. Ele vira seu olhar para mim, está atônito.
- Problemas? – Questiono torcendo a boca, tentando não transparecer a minha decepção. Decepção tanto por ter agido como agi, e ainda mais por não termos ido adiante.
Meu guardião está um pouco cabisbaixo nesse momento, mas não sei ao certo qual seu motivo para estar assim. – Não... Mais ou menos. Quem ligou foi a Jeniffer, disse que Ferdinand não conseguiu entrar em contato com a Amanda já a algum tempo. Me pediram para também ir atrás dela assim que pudesse...
Ah sim, claro. A Jeniffer. Me incomodo um pouco por essa intimidade que existe entre eles, mas, eu não deveria me incomodar... Por que estou assim, se não tenho nada com ele?
- Entendi... – Digo simplesmente.
Ele está parado a minha frente, me observando sem se aproximar. – Clara... Sobre o que houve agora, eu...
- Para! – O impeço de falar, e ele ergue suas sobrancelhas. Meus olhos vão ao chão. – Não precisa se justificar e nem se desculpar, por nada...
- Mas... – Ele tenta falar.
- Só esquece isso Brian, finge que não aconteceu nada... – Suspiro – Na verdade não aconteceu nada mesmo, então só deixe tudo para lá.
Silêncio entre nós. Se não fosse pela televisão ligada, seria possível ouvir perfeitamente caso um alfinete caísse no andar de cima.
Imaginei que ele fosse falar mais algo, mas a única coisa que acontece é Brian balançar a cabeça concordando, sentar ao meu lado, abrir seu livro e por fim voltar a ler.
Da mesma forma como foi da primeira vez que o vi, seu olhar está sério, pra não dizer frio. Ele não me olha, sequer desvia os olhos das páginas de seu livro. Tenho certeza que está magoado, tanto por impedir que ele falasse qualquer coisa que fosse, quanto por falar para deixar para lá.
Me sinto horrível, queria continuar com tudo que estávamos fazendo. Ir muito mais longe, estive tão próxima de sentia sua boca, saborear sua boca, descobrir a intensidade de seus beijos. Meu corpo pede para que me entregue a esse homem, mas eu não devo.
Por mais difícil que isso seja, não posso.
Apenas gostaria de não me sentir tão burra por agir pelo certo.
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