Capítulo 11 - Consequências de uma noite
8650 palavras
Desperto sentindo pontadas de dor pelo meu corpo todo, sem conseguir abrir um dos olhos, e ainda uma dor de cabeça terrível por causa da forte ressaca por causa de tantas bebidas. Bem, a realidade é que não consegui dormir quase nada essa noite de tanta dor, mesmo tomando alguns analgésicos bem fortes tempos antes de dormir.
Não tenho ideia de como consegui chegar em casa depois de ter apanhado tanto naquela estação. Eu desmaiei na plataforma, e quando finalmente acordei, imaginei que poderia estar em alguma sala de segurança, mas não foi isso que aconteceu. Eu continuei largada na plataforma da estação e estava sem luz nenhuma.
Permaneci naquele chão frio, sangrando e sentindo muitas dores por sei lá quanto tempo, até finalmente conseguir ter forças para me levantar.
Para completar, ainda tive que voltar andando devagar, mancando na chuva. Por que não, né?
Eu sinceramente esperava encontrar algum funcionário no terminal logo ao lado da estação do metrô, ou pelo menos alguma pessoa saindo do shopping... Mas as ruas estavam desertas. Os poucos carros que passavam sequer paravam para ver como eu estava. A minha única sorte na noite passada foi o fato que minha casa fica a poucas quadras de distância do shopping.
No caminho de volta, e mesmo agora na cama, não tirei meu colar do pescoço. Uma coisa que aprendi do pior jeito na noite anterior, não tirar esse colar de jeito nenhum.
Entre uma pontada e outra que me fazem gemer de dor, fecho os olhos. Faço isso tanto pela minha ressaca, quanto para tentar ouvir qualquer coisa que seja dos meus pais, mas nada. Quando cheguei em casa, o carro não estava na garagem então me livrei de um interrogatório. Eles ainda devem estar dormindo, ou ainda nem chegaram em casa de ontem.
Jogo a coberta de canto devagar, percebendo que nem tirei as roupas dessa noite, só os tênis e meias. Minhas roupas estão piores do que imaginei, sujas, muito manchadas de sangue e rasgadas, fora que nem tentei fazer curativos quando cheguei... Tenho que lembrar de colocar meu lençol para lavar sem meus pais perceberem.
Levanto da cama extremamente devagar por causa da forte dor de cabeça que não sei ser por ressaca ou dos golpes, e sigo ao banheiro sem ligar nenhuma luz, precisando me apoiar na parede para conseguir andar com menos dificuldades, mas até me manter de pé é difícil.
Deve ser assim que o Seiya se sente toda vez que precisa ir atrás da Atena depois de apanhar de alguém igual um condenado... Ai ai, tempos de adolescência assistindo animes.
Paro em frente a pia, olhando meu reflexo no espelho. Estou péssima. Meu olho direito está roxo e bem inchado. Hematomas na lateral do meu rosto, cortes nos lábios e nos supercílios, alguns hematomas maiores pelos meus braços, além de grandes arranhões bem feios.
Ergo a blusa e a tiro, vendo que a situação dos vários machucados se repete, tanto pela barriga e seios, e também pelas minhas costas. Acho que não preciso ver o estado das minhas pernas, mas claro, retiro essa calça e observo a situação, os hematomas se repetem ainda maiores.
Dou um suspiro, abrindo a torneira e lavando meu rosto algumas vezes, pensando em como contornar essa situação quando meus pais me perguntarem de tantos machucados. Falar que tive problemas na balada não é uma ideia muito boa, mas talvez a mais aceitável.
Saio do banheiro e desço para a sala o mais devagar que consigo, aproveitando para olhar pela janela assim que consigo me aproximar. O carro não está na garagem, então meus pais dormiram fora. Ótimo. Uma explicação a menos por agora.
Ligo a televisão e deixo em um volume razoável para evitar mais dores. Está passando um jornal, depois troco para um canal de desenhos animados.
Da cozinha, começo a montar um "pequeno" lanche de café da manhã, com cinco fatias de pão de forma de altura, vários pedaços de queijo e presunto com uma leve passada de maionese em cada pão, preparando a pequena grelha e deixando alguns hamburgueres fritando. Espero uns minutos, preparo meu lanche e coloco o mesmo na sanduicheira para esquenta-lo por inteiro antes de finalmente me servir do melhor jeito. Começo a preparar um café com leite para acompanhar meu café da manhã nada leve, e ouço uma reportagem na televisão.
E durante a noite, ocorreu um sério ato de vandalismo na estação Campo Limpo, linha lilás do metrô. Temos imagens do local e do grande nível de depredação. As câmeras de segurança não registraram o ocorrido devido a uma estranha pane que afetou por todo o sistema elétrico e a operação das linhas em geral tanto no metrô quanto no trem, forçando uma queda de energia total e uma parada de mais de uma hora.
A segurança não pôde identificar os culpados, mas está considerando o uso de armas contundentes e o uso de força extrema para causar tamanho nível de destruição nas grades de ferro, painéis, piso e colunas de sustentação da plataforma.
Devido a depredação ter ocorrido durante a madrugada, não haviam testemunhas no terminal e no shopping. A equipe do metrô está averiguando o prejuízo e manutenção da estação. Os reparos começam essa semana.
Permaneci estática desde o início da reportagem. As memórias da noite anterior ainda estão bem vivas na minha mente, e uma reportagem não ajudou nada em esquecer desse fatídico ocorrido.
Claro, mas é obvio que já iriam ter reportagens sobre todo o ocorrido, e na verdade, fico aliviada que achem que tudo isso seja culpa de vândalos. Seria péssimo se houvessem gravações com a minha cara sendo espancada.
Sinto o aroma do meu lanche já aquecido, me puxando outra vez para a realidade. Desligo a sanduicheira e resgato meu lanche grelhado quase ao ponto de queimado, indo comer na sala e vendo quaisquer outras notícias... Ou trocarei logo para algum desenho animado para descontrair um pouco, e na verdade é isso que faço.
Meu lado criança está brigando bastante comigo sobre o beber tanto na última noite. Se não bastasse tanta dor, minha cabeça está girando e praguejando contra mim mesma sobre minha imprudência.
Começo a comer, agora refletindo sobre algo que me veio em mente... Será que se eu estivesse com Brian ontem, as coisas teriam sido diferentes?
Tudo bem, ele não está me protegendo de nada. A única coisa que ele tem feito é reclamar, desaparecer quando eu preciso dele, ou então ir se divertir por aí. Me proteger de fato ele não está fazendo, mas o acontecimento de ontem me deixa pensativa hoje.
Eu não queria isso, preferia muito mais tentar me virar sozinha do que ter que depender dele para qualquer coisa, mas infelizmente eu não sei se vou conseguir sozinha.
Acho que preciso conversar com Brian.
Por mais uma vez estou fazendo esse caminho até o escritório de Ferdinand. Já desci do ônibus e estou a poucas ruas de distância, seguindo no meu passo lento. Hoje em particular está muito frio e com um vento forte, e claro, um tempo chuvoso.
Isso ajudou muito em escolher roupas mais mais pesadas e que cobrem meu corpo e boa parte dos meus machucados.
Mas não disfarçou nada meus gemidos de dor pelas várias pontadas por algum movimento errado, ou o fato que estou mancando.
Estou bem pensativa sobre o que dizer ao Brian. Depois de mandar ele passear da forma que fiz, vai ser bem difícil trazer o "guardião" de volta.
Paro em frente ao prédio, olhando em volta tentando identificar o carro de Brian, mas não está em nenhum lugar. Deve estar no estacionamento do prédio... Ou talvez nem esteja aqui.
Sei lá, eu ainda nem sei se quero realmente encontrar com ele, ainda mais depois de tudo que eu disse ontem, afinal eu não menti... Mas a possibilidade de encontrá-lo daqui alguns minutos faz com que eu tenha uma sensação estranha, um frio na barriga.
Entro no prédio, seguindo direto aos elevadores. Escolho o andar e aguardo, até enfim o mesmo chegar. Subo até enfim chegar no característico andar que já passei tantas vezes.
Saio e olho em volta, hoje possuem bem mais pessoas que antes. Existe até uma pequena fila na recepção, onde encontro uma Jeniffer séria, conversando em baixo tom com um homem alto e muito bem vestido em um terno bem preto.
Ignoro isso e aguardo. Lentamente a fila anda, e vou me aproximando mais da recepção. Jeniffer me nota quando falta duas pessoas, e me lança um pequeno cumprimento.
Cruzo os braços aguardando, batendo o pé, até finalmente chegar em frente a recepção.
- Estou de volta. – Digo com um pequeno sorriso, disfarçando as dores, que pelo menos estão levemente mais fracas.
- E toda arrebentada... Menina, o que aconteceu com você? – Jeniffer me direciona um olhar bastante preocupado.
Ergo os ombros, pensando em uma desculpa. – Sabe como é... Problemas na balada.
- Sei... "Problemas"... – Ela assente desconfiada, apoiando o rosto na mão. Ela me analisa por mais alguns segundos, e então volta a falar – Você foi atacada por alguma coisa.
Ergo uma sobrancelha – Como sabe?
- Não é difícil descobrir sabe... Quero dizer... Vendo o seu estado, onde, e com quem trabalho... Aprendi algumas coisas, e identificar quando algo assim acontece está incluso nesse "pacote de aprendizado" ... – Jeniffer da um leve sorriso, e acabo concordando com o que ela diz – Irei acreditar quando me falar que uma coisa maluca te atacou, sabe disso não é?
- Agora que estou sabendo... Antes um minuto atrás eu acreditava que você me chamaria de maluca – Digo e olho por cima do ombro, averiguando se não tem mais ninguém esperando na fila. Por sorte não tem, então me sinto mais livre para falar – Queria conversar por mais tempo, mas preciso saber... O Ferdinand ou o Brian estão aí?
- No momento o senhor Ferdinand está ocupado em um "atendimento especial"... – Ela diz, se levantando da sua cadeira e olhando do outro lado do corredor. Ela apoia a mão sobre o balcão e aponta discretamente, me fazendo acompanhar com o olhar – Mas o Brian acabou de sair de pausa, está no refeitório. Daqui a alguns minutos ele estará voltando.
Olho na direção onde a suposta sala fica, e volto a encarar a recepcionista – Teria problema se eu fosse lá? – Sussurro.
- Fingirei demência. – Ela sorri de canto e pisca pra mim – Pode ir.
Dou um sorriso, e do jeito mais discreto que consigo vou na direção indicada. Por sorte, nenhuma das pessoas está olhando na minha direção. Meus passos ecoam pelo lugar, até eu finalmente chegar em uma porta entreaberta.
O ambiente tem algumas geladeiras, micro-ondas e mesas, além de um sofá, pufes e também um totem para carregar celulares. O único som é da televisão, onde a apresentadora está passando uma receita do que parece ser uma panqueca com frango. Como alguém consegue preparar esse tipo de coisa em plenas dez da manhã?
Percebo Brian em uma das mesas, olhando atentamente a televisão com um pacote de cookies a sua frente, acompanhado de um copo de café em sua mão. Ele não me notou, e nem repara eu me aproximando devagar, parando atrás dele.
- Viu as notícias da manhã? – Digo repentinamente, cruzando os braços.
Brian da um pulo na cadeira, derrubando um pouco de café em si mesmo. Isso me faz dar um sorriso, não me atrevo a rir senão as dores irão me atacar.
Ele ergue seus braços e olha de um lado ao outro como se estivesse perdido, deixando o copo de volta a mesa e batendo as mãos na roupa enquanto resmunga algo em sussurros. – Seja mais específica. Qual delas? – Responde sem olhar para mim.
- Qualquer uma... A do vandalismo no metrô por exemplo? – Digo e ele nega com a cabeça. Brian apenas pesca mais um cookie na embalagem e come, ainda batendo uma mão na roupa.
- Vi, por que? Você tem alguma relação com isso garota? – Questiona bem irritado. Acabo engolindo em seco com tanta precisão em seu comentário, já que sou um dos motivos da estação estar daquele jeito.
- Não, imagina. Foi só uma em particular que chamou minha atenção. – Digo erguendo os ombros e mantendo meu olhar sobre ele. Espero uma resposta, mas nada vem de Brian.
Ouço passos vindos do corredor, cada vez mais próximos. Uma leve preocupação corre pelo meu corpo, por supostamente estar em um lugar restrito a funcionários, e assim duas pessoas entram. Amanda e Ferdinand.
- Agora entendi o motivo da Jeniffer me pedir para vir aqui e manter segredo dos outros... – Ferdinand diz, analisando o estado do meu rosto. Nem tentei disfarçar com maquiagem, não daria certo, pelo menos os machucados do meu corpo estão ocultos pelas roupas.
Penso se fico irritada com Jeniffer, mas a realidade é que agradeço a ela por ter feito Ferdinand ter vir até aqui. Isso me poupou muito trabalho.
- O que aconteceu com você Clara? – Ouço a voz de Brian, em um tom de completo deboche. Me viro para ele, encarando um sorriso atrevido em seu rosto – Foi atropelada por um caminhão? Rolou de um barranco?
Encaro ele, e então os recém chegados – As duas coisas.
O psicólogo da um suspiro, olhando para a irmã que já se aproximava de mim, já com as mangas da blusa erguidas e esfregando uma mão na outra – Amanda, pode cuidar disso?
- Nem precisa me pedir isso. – A mulher diz, levando suas mãos ao meu rosto e olhando por alguns poucos segundos – Suponho que não seja só seu rosto que está machucado, não é?
Confirmo sem jeito, pensando no que dizer ao rapaz atrás de mim. Sei que seus olhos estão em mim, com certeza ele deve imaginar que, se estou aqui e nesse estado, é por ter sido atacada de novo... E não duvido nada que ele esteja se divertindo muito com meu estado.
Volto minha atenção a Amanda. Ela toca levemente suas mãos na minha barriga, sussurrando algumas coisas e logo movendo o indicador e apontando na minha direção.
De imediato, pequenas esferas luminosas surgem e correm ao meu redor e vão entrando em meu corpo. Um formigamento pela minha barriga, acompanhada de um calor muito parecido com aqueles sprays de dor muscular, e lentamente essa sensação se espalha pelo meu corpo.
Da cabeça aos pés, essa sensação se espalha, causando um extremo relaxamento, não apenas isso, algo vem de fora do meu corpo, invadindo meu ser e renovando as forças que perdi.
Respiro profundamente, não sentindo quase nenhuma das dores no meu corpo. – Não consegui curar tudo. Ainda restaram alguns poucos hematomas, tipo esse olho roxo... Mas não vão mais incomodar tanto.
Com o que a mulher diz, acabo olhando para mim mesma. Abro a blusa que estou usando e tiro meu braço de uma das mangas, ficando surpresa ao ver que os arranhões estão curados quase por completo, além que muitos dos hematomas desapareceram e restaram bem poucos.
Dou um largo sorriso em agradecimento, sem conter minha empolgação – Não conseguiu? Você fez muito mais do que imagina, estou ótima... Obrigada por isso Amanda, eu não aguentaria ter que ir em um médico e acabar dando mil explicações.
- Não precisa me agradecer... – Ela da um sorriso sereno, olhando para Ferdinand, e volta seus olhos a mim – Mas me diga, o que aconteceu para você acabar nesse estado? O feitiço que deixei no colar não funcionou?
- Bom... Mais ou menos, funcionar até que funcionou e muito bem, o colar tem uma energia e tanto... – Digo um pouco sem jeito, escolhendo as melhores palavras. Olho para Brian, que está com um ar de divertimento. – Mas pense em uma situação hipotética, onde eu teria retirado o colar e usado para bater na criatura...
A mulher ergue as sobrancelhas em uma surpresa, virando seu olhar para o irmão. – Isso ai é novo para mim também. Nunca vi alguém com uma ousadia dessas. – Ferdinand comenta rindo.
- Claro, é só uma hipótese... – Digo rindo sem jeito, e me viro para Brian, que agora cruza seus braços me olhando de canto. – Então sabe, lembra que falei que o seu trabalho estava finalizado Brian? Será que você não poderia... Sei lá... Fazer uma hora extra?
Ele da um sorriso de canto – Como é? Você quer meus serviços de novo? Se me lembro bem, eu não te protejo, vivo reclamando de tudo, fico fazendo outras mil coisas aleatórias, incluindo sair com sua amiga, coisas que te obrigam a se virar sozinha sempre... E você disse que já estava segura... Não é isso?
- É, mas acho que me enganei um pouco. – Dou um riso sem graça, torcendo para que ele aceite o que eu digo.
- Não entendi. Se sou tão ruim assim, por que agora quer minha proteção? – Ele arqueia as sobrancelhas em provocação, segurando seu riso. Ele não pode estar querendo que eu admita com todas as palavras que estou errada, e que preciso da ajuda dele.
Mas infelizmente não posso negar, é horrível admitir isso, mas preciso da ajuda dele. Dou um suspiro e meus olhos vão ao chão – Eu me enganei, não estou segura sozinha...
Percebo Ferdinand chegando mais próximo – Eu não sei o que aconteceu entre vocês dois, mas você tem um serviço a fazer Brian... Quer você queira, ou não.
Brian nos observa por cima do ombro – Como seu assistente, sei que tenho... Mas nesse momento estou de pausa, então só vou trabalhar quando minha pausa acabar daqui alguns minutos.
O homem ao meu lado da uma risada, levando as mãos a cintura – Você entendeu o que eu quis dizer Brian. Você assumiu um compromisso com essa garota, independente dos "problemas" que estão tendo, você deve e irá continuar... Tanto para aprendermos mais sobre tudo isso, como também para manter ela viva até tudo acabar.
Amanda cruza seus braços, se aproximando em passos lentos. Seu olhar é mais duro que o do irmão – Não sei se você tem acompanhado as notícias de ontem garoto, mas tiveram dois acontecimentos. Um deles foi a Clara ter sido atacada no metrô, que foi considerado só um ato de vandalismo... E o outro foi aquele problema naquela casa noturna no centro.
Me mantenho calada assistindo a conversa. Acho que minha passada naquela balada ontem a noite também virou uma notícia.
- Essa ai eu não fiquei sabendo... – Brian diz com um tom neutro.
Amanda olha em minha direção, e então para o meu colar. Fico sem jeito e desvio meu olhar, afinal se for o que estou pensando, então tenho tudo haver com essa tal notícia. Acho que ela já entendeu que tenho alguma relação com isso. – As pessoas relataram que um homem foi arremessado do nada, e depois uma onda de impacto parece ter acertado todo mundo ao redor... Momentos depois, uma briga generalizada começou, tendo como principais envolvidos um homem de vestes claras, e um rapaz de sobretudo negro, que quase colocaram a casa noturna abaixo, e nem pareciam cansados.
Espera... Um rapaz de casaco negro? Aquele que eu vi na balada? E também... Também... Ué, tenho certeza que já o vi antes, mas não consigo me lembrar onde e nem como foi. Tudo que me lembro é que havia muita água...
Seja como for... Aquele cara está em todas...
E Amanda voltou a olhar para mim, está me analisando. Se tinha alguma desconfiança de que eu poderia estar envolvida, pelo rosto dela, agora tem certeza.
- Ta, e o que tem isso mesmo? – Brian questiona, se levantando.
- Começando pelo fato que a presença daqueles dois não era normal. Ambos estavam muito acima do nível de uma pessoa comum, talvez nem mesmo sejam humanos. E de acordo com alguns relatos, parecia que havia luz e escuridão se colidindo. Estamos falando de um confronto entre fotocinese e umbracinese, ambas são habilidades raras de serem encontradas em pessoas normais. – Ferdinand diz, abaixando seu olhar – Amanda veio correndo falar comigo sobre isso. Acreditamos que um deles seja um monstro ou feiticeiro, e talvez tenha relação com o abismo.
O olhar de Brian fica um pouco mais sério, mas Amanda quem toma a frente – Saber disso é algo extremamente útil, podemos ter uma ideia de como agir... Ou tentar localizar um dos dois.
- Espera, explica direito essa ideia de tentar ir atrás dessa coisa do abismo. – Isso foi o que ficou preso na minha cabeça, e o que consegui questionar. Cansei de ficar calada.
A mulher olha para baixo – Na verdade, não temos certeza... Essa parte é só uma especulação nossa pela presença ter uma semelhança muito grande com o Abismo.
- Se vocês não tem certeza, então pra que vão querer se meter com uma coisa dessas? – Ergo uma sobrancelha.
- Porque é um trabalho investigativo que poucas pessoas além de nós costumam assumir, e deixar seres desconhecidos andando por aí dessa forma pode colocar civis em risco... Além disso, entrar em contato com outro ser do Abismo pode ser uma oportunidade de descobrirmos mais sobre a criatura presa em você, e talvez uma maneira de tirá-la do seu corpo. – Amanda abaixa o olhar – É uma incerteza, mas precisamos arriscar para descobrir mais...
Permaneço calada apenas a olhando. É verdade, eles não tem certeza, apenas crenças de que exista alguma relação. Estão lidando com especulações apenas.
Certezas, são minúsculas.
Amanda está pensativa com o olhar baixo – Fotocinese... Quem domina esse tipo de habilidade normalmente são algumas poucas pessoas com certas condições especiais, pessoas e seres sagrados... Porém umbracinese é algo muito mais raro de ser encontrado, mal temos registro de como essa habilidade surge, ou quantas pessoas a possuem. Talvez a pessoa que domine esse poder possa saber algo, e nos ajudar a ter respostas.
- É só um palpite sobre ser ou não uma criatura do abismo... Nada nos leva a ter certeza, mas acredito que vale darmos alguma atenção. – Ferdinand diz em um tom calmo – Tentaremos um contato amigável para conseguirmos respostas.
- Adoraria dizer que estão se preocupando demais... Mas não tem como algo assim – Brian diz num suspiro, olhando cada um de nós.
- Infelizmente precisamos nos preocupar. – Ferdinand comenta em uma risada descontraída, mantendo um sorriso que não sei dizer se é forçado. Ele olha para cada um de nós. Ele está tranquilo, mas seu olhar parece tenso. – Seja lá o que for, do abismo o não, o que apareceu ontem é forte demais. Talvez ao mesmo nível que a dama de preto, e você lembra o nível de ameaça dela... Como estamos agora, não temos como lutar contra uma outra coisa desse nível, mas se for amigável poderá ser de grande ajuda. Tem ideia do que é isso?
Um silêncio se mantem na sala. Ferdinand nos olha, mas nenhum de nós se pronuncia. Mas algo ficou na minha cabeça... A dama de preto... O que ele quer dizer com isso?
- Desculpem, eu tenho que voltar... Hoje está bem movimentado. – Ferdinand da um passo atrás, saindo da sala e nos deixando com sua irmã.
A bruxa nos olha, dando um pequeno sorriso – Muito trabalho... E então Brian, você deve entender que essa garota é mais do que aparenta... Irá voltar ao seu trabalho como guardião?
- Acho que não tenho muita escolha... – Ele diz, se levantando e me observando por alguns segundos. – Pode avisar ao Ferdinand que irei dar uma saída?
- Na verdade não precisa me avisar. – Ferdinand diz do nada, entrando novamente. Ele vem caminhando até nós, com um pequeno sorriso no rosto. Ele estende a palma da sua mão em direção a Brian, que olha sem entender. – Vamos, devolva.
Brian olha para o lado – Não sei do que está falando. Devolver o que?
- Seu trabalho não terminou rapaz. Por isso, devolva meu cheque. – Ele diz rindo, enquanto Brian pega um papel do bolso de seu terno, e entrega ao seu superior, que analisa a folha do cheque. – Obrigado. Quando realmente terminar, te darei isso de novo.
Olho para Brian, que da um suspiro pesaroso – O que é isso? – Questiono.
- O pagamento que eu teria por terminar o trabalho de te manter viva... – Ele da um suspiro e deixando suas mãos na cintura, olhando de Ferdinand a mim.
Ferdinand olha para o papel, e então para Brian – Será seu quando terminar. Agora vá trabalhar meu consagrado, proteja a Clara, ela é importante de muitas formas e está correndo risco de vida, e... Que cheiro de café é esse?
- Essa garota me assustou e... Derrubei café em mim... – Brian diz, torcendo a boca. Amanda e Ferdinand tentam segurar o riso, mas assim que começo a rir, ambos cedem e acabam rindo comigo. Brian nos observa com as sobrancelhas erguidas, e eu o encaro de volta.
- Desculpe meu querido... Foi um acidente – Digo com um rosto inocente.
Ele balança a cabeça – Sei... Vamos garota. Precisamos conversar.
Estou realmente curiosa com o que Brian quer conversar comigo. Ele disse que precisamos ter uma conversa, mas desde aquele refeitório ele não falou mais nada. Já estamos fora do prédio, caminhando pelo estacionamento do mesmo.
Penso em questiona-lo a respeito disso, mas me contenho. Quero deixar que ele fale primeiro, mas se demorar mais do que dez minutos calado, eu vou ter que puxar o assunto. Pelos meus cálculos mentais, ele está mudo a pelo menos quatro minutos.
Ele tem pouco tempo antes de eu começar a dar chilique.
O homem chega próximo de seu carro, encostando-se a parte dianteira, cruzando os braços e me encarando com os lábios curvados para baixo.
Quero saber o que ele quer fazendo toda essa pose de inabalável. Se me lembro bem, ontem mesmo eu quebrei essa pose toda dele, e não foi difícil. Vamos lá, deixe ele falar Ana Clara, não surte. Ele ainda tem alguns minutos.
- Pois bem... – Ele respira fundo – Temos alguns pontos para alinhar aqui garota.
Olha só, ele não me chamou de trabalho. Temos uma evolução por aqui.
Assinto com a cabeça, esperando que ele continue a falar. – Primeiro de tudo, acho que você precisa entender alguns detalhes. Por exemplo, o motivo de eu não estar sendo presente nos últimos tempos, que gerou as suas... "Reclamações"...
Um assunto interessante logo de começo. Estou gostando disso. – Sou toda ouvidos, fale!
Ele torce a boca com o tom de voz que usei agora, mas não estou nem ai. – Não estive só aproveitando momentos sem fazer nada como você acusou... Boa parte desse tempo estive fazendo várias pesquisas, tentando descobrir uma forma de lidar com essa criatura. A fonte de informações que temos é muito escassa e você já sabe disso...
- Então, estava pesquisando... – Digo a mim mesma, abaixando um pouco o olhar enquanto penso se acredito ou não.
- Exato, estou pesquisando muito para tentar encontrar algo que realmente consiga ajudar. Não usei isso como desculpa... – Ele revira os olhos – Tá bom que eu realmente quero ficar longe... Você me aparenta problemas...
Ergo as sobrancelhas. Ele não aguentou muito tempo sem me chamar de "trabalho", mas pelo menos está sendo sincero... – Muito obrigada pela parte que me toca. Próximo ponto?
Seu olhar é o mesmo, até a rigidez de seu corpo parece idêntica. – O próximo ponto é você entender que, eu me tornar seu guardião não significa parar toda a minha vida, as coisas que gosto ou com quem saio, só pra ficar te rondando em cada momento.
- Você não entendeu o que eu estive reclamando... – Digo, chegando perto dele e cerrando meu olhar. Paro bem de frente a ele, levando minhas mãos a cintura – Eu estou reclamando que, em vários momentos em que precisei, você nunca esteve perto de mim. Só apareceu no final do problema, ou nem apareceu.
- E eu tenho culpa de você ser zicada a esse ponto? – Ele ergue as sobrancelhas.
Aqui ele tem um ponto... E acho que não tenho uma resposta decente nesse momento.
- Entenda, a função de um guardião é sim se manter presente o maior tempo possível. – Ele se desencosta do carro, descruzando seus braços – Cuidar e proteger você em todos os momentos, esse é meu trabalho.
Reviro o olhar – Trabalho que não está cumprindo isso muito bem, não acha?
- Como vou cumprir bem meu trabalho, se não tenho quase nenhum conhecimento da criatura que estou enfrentando? Isso é tão novo para mim, quanto é para você.
- Ta bem, o que você diz tem lógica... – Dou de ombros, rendida com o que ele diz.
Ele ergue as sobrancelhas – E aliás, você entende o que "todos os momentos" significa, não é?
Confirmo com a cabeça algumas vezes – É, eu sei, você parado em frente a minha casa.
Ele da um suspiro. – Você não entendeu, mas tudo bem. Acredito que irá entender em breve.
Vejo Brian dando a volta no carro, indo ao lado do condutor. Como um estalo, algo me vem em mente – Espera um pouco... Agora entendi, isso é contraditório!
- Falei que iria entender. Você é esperta garota. – O rapaz confirma com a cabeça, abrindo a porta do carro – Isso mesmo, eu não quero e nem vou parar minha vida, dormir e acordar do seu lado, ou te acompanhar nas saídas com amigos ou idas no banheiro só para ficar te protegendo em cada segundo do seu dia, afinal nós dois temos mais o que fazer... Mas ser seu guardião me obriga a isso...
Apoio as mãos sobre o capô do carro, e vejo como ele me encara primeiro minhas mãos, e então meus olhos, praticamente imóvel. – Então me diga, o que irá fazer?
- Tentarei conciliar ambas as coisas. – Responde suspirando – Portanto não estranhe se eu sumir por estar fazendo algo do meu interesse. – Ele balança a cabeça e entra no carro.
Dou de ombros e apenas concordo. Entro no carro e encosto no banco, refletindo se conseguimos nos acertar em algo aqui. – Tem mais algo a dizer?
- Sei lá, acho que falei o que precisava. – Ele liga o carro, acelerando devagar, olhando para mim com uma expressão de curiosidade – Ah sim, uma última coisa... Uma pergunta na verdade, de onde sua amiga tirou aquilo de "Teoria do pastel"?
Eu tento me segurar, mas não consigo. Fui pega totalmente desprevenida e começo a gargalhar com sua pergunta tão inocente. Acho que o momento de conversa séria já ficou para trás.
A velocidade do carro diminui gradualmente, até eu finalmente parar. Estou trocando mensagens com Ricardo, Letícia e também com meu pai. Se o problema com meu namorado e meu pai é o fato de estar saindo sem avisar nada, decidi que no mínimo devo mandar algumas notícias sobre como estou.
Pelo menos meu namorado está tranquilo e de muito bom humor, mas ele não deve nem imaginar o fato que estou com Brian, senão ele vai enlouquecer, por mais que eu não esteja fazendo nada de errado.
Guardo meu celular no bolso e olho em volta. Estamos em uma rua calma, parados em frente a uma casa com portão bem cuidado, com a visão totalmente barrada.
Brian desliga o carro e abre a porta – Espere aqui, eu já volto.
Ele fecha e sai andando, antes que eu consiga responder. Me encosto no ombro e espero, apoiando o rosto na mão e acompanhando seus passos até o portão. Ele saca uma chave do bolso e entra na casa em passos apressados.
Batuco os dedos na perna. Olho para a rua, vendo uma pessoa ou outra passando, me distraindo apenas com o som da chuva. Agora que percebi, acho que nunca ouvi uma música desde a primeira vez que entrei nesse Mercedes... Claro, só música de piano e por uma vez.
Agora que ele não está por perto, aproveito para soltar um pouco da minha curiosidade. Olho em volta pelos bancos, viro meus olhos para os assentos traseiros.
Desprendo o cinto e curvo meu corpo para frente, abrindo o quebra sol e conhecendo o pequeno espelho para o banco do passageiro. Fecho e vou ao porta luvas, encontrando papeis de restaurantes, alguns serviços de entrega de comida, panfleto de viagens, um pequeno estojo de renda com algumas canetas dentro.
Vejo dois blocos de anotações, um novo e completamente limpo, já o outro com várias anotações, anotações de peças de carro e seus supostos valores logo ao lado. Passo por mais uma folha, com várias datas anotadas, mais valores e informações, e alguns nomes femininos e telefones. Ver isso me incomoda um pouco, mas ignoro... Não tem motivo para me incomodar.
Guardo todas as coisas novamente no porta luvas, e me viro no banco, olhando para trás como se fosse uma criança. Passeio as mãos procurando não sei o que pelos bancos. Talvez uma moeda perdida, uma camisa abandonada, travesseiros, sei lá. Qualquer coisa que indique um pouco mais sobre quem é Brian, mas nada.
Me viro novamente, encarando o porta moedas perto do câmbio, e ali tem uma caixa de óculos preta. Novamente minha curiosidade se atiça, e me sinto tentada em olhar dentro. Abro e ali tem apenas um óculos escuros não muito grande. Acabo colocando no rosto e me vejo no espelho, contemplando meu visual. Fiquei ótima usando ele.
Vejo o que parece um papel no quebra sol do lado do condutor. Olho para o lado, e meu guardião ainda não deu sinais de aparecer. Me sinto livre em pular para o banco do condutor, e olhar mais sobre o que esses papeis podem ser... E em questão de segundos, estou no banco do condutor com as mãos no volante.
Abro e começo a bisbilhotar mais uma vez. Tem um pequeno documento com informações do carro, ano de fabricação, informações que fazem minha cabeça dar um pequeno nó, mas continuo olhando até me dar por satisfeita.
Definitivamente, agindo assim eu pareço com uma criança curiosa.
Me encosto novamente no banco, passeando os dedos pelo volante, voltando a esperar Brian. Não sei quanto tempo estou esperando por ele, mas continuarei por aqui. Pesco novamente meu celular do bolso, respondo mais algumas mensagens do meu namorado, e guardo novamente meu celular.
Essa espera está me incomodando. Acho que já fiquei tempo demais plantada aqui, pelo menos tempo o bastante para vasculhar muitas coisas. Salto para fora do carro, indo apressada em direção ao portão entreaberto.
O primeiro lugar da casa é uma garagem coberta, com piso totalmente branco, e praticamente vazia. Não tem nada além de uma vassoura no canto, e logo à frente a porta da casa igualmente aberta. Me aproximo e tento ouvir, está tudo silencioso.
- Brian? – O chamo, aguardando alguns segundos. Não tenho resposta.
Avanço devagar, me olhando a casa. É um lugar um pouco pequeno, mas muito bem arrumado. Dou alguns passos em direção do que seria a sala, vendo um largo sofá cama, e logo em frente uma estante com algumas decorações, e uma televisão.
Logo ao lado tem uma porta que vejo levar a cozinha. Aqui tem uma mesa com quatro lugares, a vários armários, uma geladeira de duas portas imensa em tons de preto, fogão de pia de cinco bocas, alguns eletrodomésticos deixados sobre o balcão, e muitos panfletos de mercados.
Continuo andando pela casa, vendo uma porta entreaberta, onde tem um quarto com uma cama de solteiro com um colchão sem lençol, um guarda roupa pequeno e uma porta que parece levar a um banheiro... E muitas caixas espalhadas pelo chão. Pelo estado do cômodo, esse lugar não é muito frequentado.
Dou mais alguns passos, entrando no outro quarto. Aqui tem uma larga cama de casal pouco arrumada, um guarda roupa grande com portas de correr, ventilador de teto e cortinas brancas, além de um tapete simples pelo chão.
Além disso, tem mais uma porta fechada bem ao lado do quarto, chego perto e ouço o som de um chuveiro. Bom, imagino que veio tomar banho por causa do café que derrubou em si mesmo na hora do susto. Bem, vou me sentar por aqui mesmo e esperar que ele saia do banho.
Depois de alguns momentos, ouço o chuveiro sendo desligado, e coisa de dez segundos depois a porta é aberta... Não... Não acredito nisso, Brian é daquele tipo de pessoa que não se seca nem se veste no banheiro?
Vejo ele entrando no quarto, com uma toalha larga amarrada em sua cintura, e passando uma toalha de rosto pelo cabelo repetidas vezes. Inevitavelmente, acabo olhando para seu corpo ainda todo molhado, e graças aos óculos escuros que continuo usando, posso olhar muito mais detalhes do que ele pode imaginar.
Brian possui peitoral em trabalhado, o abdômen bem definido e seus braços são fortes sem possuírem um tamanho exagerado, e um par de pernas grossas... Ele possui um físico bem forte, e ao mesmo tempo sensual, atraente, mesmo tendo algumas várias cicatrizes do que parecem cortes espalhados pelo seu corpo, apesar de isso entregar um pouco do que ele já passou, parece torná-lo um pouco mais atraente do que já é... Minha mente já me prega peças fazendo imaginar quanto seu corpo deve aguentar.
As roupas que sempre usa escondem que ele possui um corpo bem definido em todas as partes, e ele está acompanhado de um vapor intenso saindo de cada parte de seu corpo, devido ao banho quente.
Ver ele dessa maneira me faz repensar sobre o que significa ser quente de verdade.
E assim permaneço, olhando para ele por inteiro por algumas vezes, apertando os lençóis da cama, e mordendo os lábios antes de perceber. Um calor cresce em meu peito e se espalha pelo meu corpo, junto a um súbito desejo dentro de mim. Acho até que meu coração errou uma batida por um momento, e minha respiração se descontrolou.
Estou a um passo de agarrar ele, arrancar essa pequena toalha e puxar para essa cama nesse instante para desfrutar tudo que ele tem a oferecer, eu quero ele urgentemente dentro de mim. Estou quase totalmente tomada por meus desejos.
Se eu já tinha alguma atração por ele antes, acabou de aumentar bastante nesse momento.
O homem a minha frente me percebe sentada a sua cama, e somente agora me dou conta de que esse não foi o melhor lugar para esperar por ele.
- O que faz aqui? – Ele me questiona, ficando estático e com um olhar surpreso.
- Bem... – Digo com a voz falha. Caramba, ele me desconcertou a esse ponto? Se acalme mulher, não é a primeira vez que você fica de frente a um homem só de toalha – Você estava demorando...
Ele ergue uma sobrancelha – E por esse motivo, você veio até meu quarto?
- Mais ou menos... – Digo um pouco sem graça, me levantando da cama. Vejo que ele retira a toalha de seu cabelo, deixando sobre o ombro. Estou brigando para encarar seu rosto, mas seu corpo está atraindo meu olhar... Não apenas o olhar, quero tocar ele por inteiro, sentir cada parte do corpo dele o quanto antes, meu próprio corpo anseia e deseja por isso, minha excitação está em níveis que nunca chegaram antes.
Espero que ele diga qualquer coisa, mas não é isso que acontece. Levo as mãos atrás do corpo, tendo certeza que dessa forma eu não farei algo que não devo por causa do desejo. Ele ergue as sobrancelhas, ainda me encarando – Preciso me vestir. Pode me esperar na sala, ou terei que fazer isso na sua frente?
Sou pega de surpresa com isso, não sei bem o que responder a ele. Minha cabeça vira uma bagunça total, e tento encontrar uma resposta que não seja "Faça na minha frente". A realidade é que estou louca de desejo, cada pequena parte de mim está sendo atraída para ele, mas tenho que me conter. – Eu... Eu vou te esperar na sala!
Apesar do que eu disse, minhas pernas não reagem. Continuo parada a sua frente, enquanto ele leva uma mão a barra da toalha, sem parar de me olhar. Eu acompanho seus movimentos. Me sinto hipnotizada com cada ação sua, olhando e esperando que ele pare de me torturar dessa maneira que está fazendo.
Dou um passo a frente sem deixar de olhar para seu corpo por um segundo que seja, e logo volto a realidade. Eu estava pronta para erguer minhas mãos e tocar ele por inteiro, mas isso não aconteceu, por sorte. Avanço em passos apressados, passando por ele. Por mais que eu quisesse olhar para frente, passei mais olhando para o corpo dele do que qualquer coisa.
Saio do quarto. Paro a alguns passos de distância, escutando a porta sendo fechada, e o som de um clic, ficando claro que ele trancou a porta.
Isso me faz refletir sobre como eu agir agora pouco, como esses poucos segundos pareceram uma eternidade para mim por causa de todo esse fogo em mim. Me sinto uma verdadeira idiota por ter agido dessa maneira. Acho que nem adolescentes reagem assim ao ver um cara desses. Eu tenho que me controlar mais.
Respiro fundo e vou me sentar no sofá para esperar por ele.
Abro meus olhos, me encontrando em um local estranho. Estou caída em corredor escuro que parece sem fim. Não lembro como cheguei aqui.
Ergo-me lentamente, sentindo o frio do chão amadeirado. Olho em volta, aproximando em passos lentos das janelas, tocando minhas mãos no vidro gélido. Está bem escuro lá fora, consigo ver pouco mais do que algumas copas de arvores.
Olho de um lado a outro. Não importa para onde eu olhe, está escuro, e parece que não existe um final para nenhuma das direções. Mesmo assim, escolho uma direção e me coloco a andar, a passos curtos.
A medida que caminho, tento me manter atenta em cada pequeno detalhe, todos os sons. Qualquer coisa que denuncie que lugar é esse, mas nada. Não percebo nem decorações por aqui, e a situação continua a mesma conforme eu ando.
Conto os segundos, conto meus passos, e nada surge a minha frente. A cada novo passo, fico mais aflita, o único som que consigo ouvir são dos meus próprios passos. O frio de uma brisa abraça meu corpo, mas nem ela tem um som, apenas o frio contínuo.
Uma única porta em tons brancos aparece por entre a escuridão. Ela não possui quase nenhum detalhe estético, mas claramente é muito nova. Não tenho muitas opções além de entrar nela, continuar nesse corredor e nada é a mesma coisa.
Apesar de relutante, atravesso a porta em passos lentos. Olho o novo cômodo, percebendo se tratar de um quarto. O meu quarto. Me sinto aliviada por um ambiente conhecido, tanto que ignoro totalmente onde estava, apenas corro para minha cama e me deito, enrolando meu corpo por entre as cobertas. Confortável, macia, é de fato minha cama. O espaço que vejo como meu principal refúgio, que posso desfrutar e me esconder sempre que preciso.
Abraço meu travesseiro, fechando meus olhos e relaxando, sentindo algo frio próximo a minha mão. Tateio algumas vezes e pego o objeto, percebendo ser meu celular. Aperto o botão de desbloqueio de tela como normalmente faço, mas o que acontece é diferente do convencional. Ao invés da tela, é a lanterna que acabou de ser ligada.
Estranho isso a primeiro momento, até chacoalho o celular na minha mão, mas nada dele funcionar corretamente. Com minha visão periférica percebo algo, próximo a porta, parece um vulto de uma pessoa.
Viro a luz do celular em direção a essa aparição repentina, mas não existe nada. Mantenho a luz na direção da porta, mas não existe nada. Abaixo meu celular, ao mesmo tempo em que me encolho na cama, abraçando as cobertas. Foi só uma impressão, mas essa aparição repentina me assustou, eu tenho certeza de que havia algo.
Um clarão surge, atravessando minha janela e iluminando boa parte do meu quarto, e por mais uma vez eu tenho a impressão de antes. Existe alguém ali, parado, estático, mas olhando em minha direção. Olho em volta, buscando pelo meu celular, dessa vez como algum tipo de arma de arremesso contra essa coisa, quando finalmente o acho e me viro para encarar o que quer que seja, a coisa está mais próxima.
A entidade está aqui, bem a minha frente, me encarando com um sorriso macabro. Seus dedos cada vez mais afiados direcionados a mim, seu corpo está estático como o de uma estátua. Seu olhar avermelhado junto a um sorriso retorcido focam em mim, e está claro que espera por um único movimento meu para saltar em minha direção. Sua expressão física, a clara tensão nele me denunciam isso. Mantenho a lanterna do celular apontada na entidade, e lentamente sua presença se torna transparente até finalmente desaparecer como uma sombra.
Seguro meu colar, mas ele não reage. Nesse momento, ele se assemelha a apenas uma bijuteria qualquer, isso definitivamente é um problema dos grandes.
Quero me levantar dessa cama, correr daqui, mas minhas pernas não reagem. Elas tremem de medo e não me respondem. Se eu me esconder nas cobertas, essa coisa vai me pegar. Se eu colocar os pés para fora dessa cama, eu sinto que ele também vai me pegar. O que eu faço?
Passo a luz do celular pelo quarto, iluminando qualquer ponto escuro, qualquer canto. Próximo a porta, perto da janela, acima do guarda roupa, atrás de mim. Nada. Apenas silêncio se vê presente no meu quarto. Tudo que esse ambiente consegue é me deixar ainda mais tensa, a escuridão e aparições repentinas fazem o medo se espalhar em cada parte do meu corpo.
Uma risada seca surge, ecoando pelo quarto por longos segundos, até finalmente restar o silêncio novamente. Novos clarões silenciosos passam pela janela do meu quarto, fazendo a entidade ressurgir a minha frente, cada vez mais próxima de mim... Não... Esse peso repentino, o desnível pelo colchão...
Está sobre a minha cama, está me olhando, com seu corpo curvado para frente. Seus olhos abandonaram os tons vermelho e deram lugar a um profundo vazio mórbido. Seus dentes estão direcionados a mim, juntamente a suas mãos. Seu corpo está diferente, mais acinzentado, esguio quase esquelético.
Aponto a luz novamente em sua direção, e por mais uma vez, permanecendo na mesma posição estática, a entidade desaparece.
Lentamente vou para trás, pegado meu travesseiro e deixando a minha frente e uma tentativa ridícula de escudo. Mantenho a luz do celular apontada de forma que ilumine o máximo possível do meu quarto. A luz afasta ele, só preciso manter tudo iluminado.
Em um novo momento, um clarão surge, e todas as luzes do meu quarto se ligam. Pisco algumas vezes, olhando em volta. Meu quarto está totalmente iluminado, me permitindo respirar aliviada. Nenhum som estranho, aparições, nada. Dou um sorriso tranquilo enquanto deixo meu celular de lado, me deitando na cama, ajeitando meu travesseiro embaixo da cabeça, me aconchegando na minha cama.
Repentinamente as luzes piscam, e se apagam novamente. Antes que eu tente alcançar meu celular, a entidade reaparece da escuridão, saltando em minha direção com a escuridão clara em seu rosto. Ele vai me pegar, não tenho como reagir.
Fecho os olhos e aguardo, reprimindo um grito a minha garganta. Ninguém vai me ouvir, não tenho como me proteger.
Meus ombros são agarrados pela criatura, e meu corpo é empurrado contra a cama. Por uma, duas vezes. Sou erguida e empurrada com mais força, ouço o som de algo sendo quebrado, e meu corpo perde o apoio, sendo impactado contra o chão. Perco o fôlego com o impacto, meu corpo quer se debater. Sou erguida e empurrada com mais força contra o chão.
Sinto algo gelado e molhado caindo sobre minha cabeça de repente, fazendo com que parte do grito preso na minha garganta escape. Meu corpo da um salto com o susto, me fazendo olhar desesperada o que está acontecendo, meu corpo luta desesperada por ar como se eu estivesse me afogando sozinha.
Não reconheço o lugar, me dando ainda mais desespero, minha respiração se acelera, meu coração quer saltar para fora do meu peito de tão forte que ele bate, o temor me mantém presa onde estou por mais que eu deseje levantar e correr. Minhas mãos apertam algo macio, um sofá. Pisco algumas vezes, olhando tudo que posso em pânico, mas sem reconhecer nada.
Olho para mim mesma, me tocando sentindo meu rosto, corpo e minhas roupas molhadas, trazendo um desconforto imediato. Alguém está parado a minha frente, me fazendo secar os olhos e encarar quem quer que seja.
Brian está parado a minha frente, me olhando de maneira seca, com o braço esticado sobre minha cabeça, e em sua mão, ele mantém uma jarra virada sobre mim.
- Ao que parece, água é capaz de te acordar. – Ele diz, sacudindo a jarra sobre minha cabeça derrubando uma gota sobre meu rosto, se afastando e deixando a jarra sobre a estante.
- O que aconteceu?! – Digo com minha voz aflita.
- Você dormiu... – Ouço sua voz calma, enquanto ele se vira para mim. Percebo que ele leva uma toalha sobre o ombro, e solta a mesma suavemente sobre a minha cabeça – Tentei te acordar já faz algum tempo, ainda mais quando você começou a se debater, mas nada... Acho que já deve imaginar qual foi meu "plano B".
Respiro fundo algumas vezes, levando as duas mãos ao rosto, ignorando totalmente as roupas grudando no corpo ou meu cabelo pingando. Tudo foi um pesadelo, eu estou de volta, isso que importa. – Obrigada...
Ele não me responde, apenas caminha para a cozinha. Seguro a toalha e me seco devagar, reconhecendo todo o ambiente a minha volta, buscando a certeza que estou desperta.
Após alguns segundos, sinto um aroma forte se espalhando, e Brian retorna da cozinha com xícaras em mãos. – Espero que goste de café, te manterá acordada... Acabei de preparar.
Pego uma e beberico o liquido quente. Não está muito forte, me ajudando a relaxar. Curioso que seja logo café me ajudando a relaxar. Deixo a toalha sobre meus ombros, encostando no sofá. Ergo a cabeça, encarando o teto – Nem dormir eu consigo direito... Aquela coisa continua aparecendo nos meus pesadelos...
- Imaginei, a entidade não vai te deixar em paz... – Ele diz, se sentando ao meu lado. Eu não percebo, mas ele tem um livro debaixo do braço. Esse pesadelo me deixou desligada com tudo. Brian se encosta no sofá, abrindo o livro e começando a folheá-lo. Olho para ele, estranhando toda a calma que ele demonstra. – Ainda darei um jeito nisso.
Ergo uma sobrancelha. Espero por mais alguma nova explicação dele, mas nada. Esse lado quieto dele consegue me incomodar muito. – Como posso confiar nisso?
- Como disse antes, estou pesquisando a respeito e por sorte, venho tendo progresso. Aprendi mais como essas criaturas funcionam... – Ele diz do mesmo tom calmo, sem retirar os olhos de seu livro. Mesmo assim, me permito me animar com o que acabei de ouvir. – Só confie em mim, eu te tirarei disso.
Ainda fico relutante sobre como Brian irá agir. Até agora, ele fez poucas coisas que realmente sejam dignas da minha confiança. Independente de desejar ele e cada parte de seu corpo, não sei se gosto dele, nem se confio nele. Mas quero confiar, quero tentar. É isso que farei.
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