Capítulo 18
Repreendida.
Meu pai chegou em casa um pouco depois do toque de recolher. A garota que havia desaparecido foi encontrada em outra cidade, ela havia fugido com o namorado e seu desaparecimento não tinha nada a ver com a onda de assassinatos acontecendo aqui.
Quando eu entrei em seu escritório, David estava sentado com um semblante cansado em sua cadeira atrás da mesa de madeira avermelhada. Ele mal parou em casa nos últimos dias, estava exausto, e por isso, eu me sentia ainda pior em ter que contar tudo. Ele surtaria! A expressão cansada rapidamente se desfez quando ele viu a minha. Eu estava tensa, uma pilha de nervos, e agora, ele estava preocupado.
— Aconteceu alguma coisa? — Ele perguntou, enquanto eu sentava na poltrona de frente para ele.
— Sim... eu estou pronta para ter aquela conversa. Estou pronta para contar tudo.
Não foi nada fácil ver as mudanças de expressões no rosto dele enquanto eu contava tudo o que eu vivi ultimamente, desde o começo lá na festa de Noah, com Harry e suas mãos ensanguentadas, até algumas horas atrás no quarto de motel de Jace e sua arma escondida. E acredite, meu pai não ficou nem um pouco feliz. Feliz não entrava nem na equação.
— Eu não consigo acreditar que você escondeu tudo isso de mim, da polícia... Olivia, o que caralhos você estava pensando? Você poderia ter morrido! — Ele me olhou completamente abismado. — Como você acha que eu ficaria sabendo que tudo isso aconteceu bem debaixo do meu nariz e eu não percebi ou fiz nada? Como você acha que sua mãe ficaria sem você?
Meus olhos encheram de água enquanto eu o via passar a mão direita pelo cabelo minimamente grisalho, em um misto de preocupação e incredulidade. Eu estava tão obcecada em conseguir uma prova e descobri tudo sozinha que eu nem considerei o que isso causaria nas pessoas a minha volta. E minha família era tudo para mim. Eles ficariam devastados...
— Eu te disse para ir do colégio para casa, e você vai seguir alguém? Vai cometer um crime ao invadir quartos? O que você estava pensando? Eu te criei melhor que isso! — Continuou, irritado. — Aliás, eu te disse para se manter longe daquele Jace, e você vai e faz o total oposto? Eu tenho cara de palhaço?
— É claro que não... — Choraminguei, sentindo minhas bochechas molharem.
Ele estava tão irritado. Eu nunca o havia visto desse jeito antes. David nunca me bateu. Nunca encostou um dedo sequer em nenhum dos seus filhos, mas agora, ele parecia realmente arrependido dessa decisão.
— Eu estou totalmente sobrecarregado. Você não tem ideia da merda que acontece diariamente naquele departamento de polícia! Eu tento diariamente proteger pessoas, proteger você! Aí quando chego em casa querendo descansar e recobrar minhas energias, descubro que o único lugar que eu pensava ser seguro não é, e em cima disso, você está mundo afora pondo a sua vida em risco?
— Me desculpa...
Ele não me ouviu. E para falar a verdade, nem mesmo eu me ouvi, já que minha voz estava sendo intercalada por vários soluços.
— Eu sabia que esse tal de Jace não era boa coisa. Falei para ficar longe dele! E agora tem esse tal de Harry? Você deveria ter me contado tudo assim que eu cheguei em casa na madrugada daquela festa! Porra, até mesmo depois do que houve na biblioteca! Se soubéssemos dessas informações antes, poderíamos ter feito algo a mais sobre isso. Esse tal de Harry te trouxe para casa desacordada pelo amor de Deus! Deveríamos ter levado você a um hospital naquela mesma manhã! Seu banheiro foi invadido, um fugitivo está cercando a sua irmã... — Ele começou a rir de desespero. — Mas que merda, Olivia? Não acha que eu deveria estar sabendo dessas coisas?!
— Eu sinto muito mesmo, pai.
Limpei algumas lágrimas com a mão, apenas para que outras caíssem no lugar. Eu tentava parar de chorar, mas era mais forte que eu, as lágrimas apenas viam.
— Você está de castigo. Seis meses, porra, um ano se for preciso! Não quero você longe dessa casa! — Disse seriamente.
Então, ele suspirou alto, acho que finalmente se dando conta do meu estado. Por isso, se levantou e deu a volta na mesa até chegar ao meu lado. Me levantei da cadeira imediatamente e o abracei, sem conseguir aguentar a sensação de ser repreendida por ele. David passou seus braços em volta de mim e começou a fazer um carinho no meu cabelo, enquanto eu molhava completamente o ombro da sua camisa.
— Me desculpa, pai... me desculpa!
— O que você fez foi errado, você sabe disso, não sabe? — Eu apenas assenti com a cabeça, sem conseguir falar por causa dos soluços. — É o meu trabalho investigar tudo isso, e não o seu. Essa cidade está um perigo e eu não quero você saindo da minha vista em momento algum! Principalmente agora que... — Ele se auto interrompeu e usou aquela longa pausa para tentar me acalmar em seu abraço. — Querida, você se enquadra no padrão das vítimas, não pode ficar saindo por aí quando bem entender.
— Eu sei...
Ele me afastou e enxugou as minhas lágrimas com os seus dedos.
— Graças a Deus nada aconteceu com você. Mas a partir de agora, por favor, faça o que eu digo. Sem surpresas. Sem loucuras.
— Eu prometo, pai... eu não vou fazer mais nada!
Ele ficou me olhando por alguns segundos, como se estivesse analisando se eu estava mentindo ou não, e só depois de confirmar que eu estava mesmo falando a verdade foi que ele me abraçou novamente, fazendo um carinho nas minhas costas com a sua mão e finalizando o abraço com um beijo na minha testa.
— Espero que sim..., no entanto, você está de castigo por tempo indeterminado.
— Não era um ano? — Funguei o nariz ao falar, tentando me recompor.
— Exatamente. Era. Não é mais. — Afirmou. — E eu não vou tomar o seu celular, mas também não quero você fora dessa casa.
— Mas eu ainda posso ir para o colégio?
— Não. Amanhã eu ligo e converso com o diretor. Dada a sua aparência, tenho certeza de que ele vai entender.
Seria uma droga não poder sair de casa, mas ao mesmo tempo, eu entendia que isso seria para o meu bem. Pelo menos não estávamos mudando de colégio ou cidade... ainda.
— Pai... por qual motivo as aulas não foram paralisadas? Depois de tantas essas mortes, seria compreensível.
— Eu tive uma reunião com o prefeito e o diretor do colégio para conversar sobre isso, já que todas as vítimas pareciam estar sendo escolhidas lá, mas então veio a Valerie e tudo se complicou. Ir à escola é um direito dos alunos, então, cortar o acesso de todos por causa de algo que não afeta a todos, é uma área cinzenta de se abordar. Há muitas regras e leis que devem ser seguidas. — Ele revirou os olhos, aparentemente nada feliz com a continuidade das aulas também. — Mas eu tenho uma reunião marcada com o governador em alguns dias, e vou tentar resolver isso.
— E sobre o Jace? Por que você não gosta dele?
— Ele roubou um banco, Olivia. Isso já é motivo suficiente. Mas se quer mesmo saber... ele apenas não me passa confiança. Além de toda a investigação em volta do assalto que ele e Zach fizeram ter sido bem estranha também... ele é estranho. Ou como vocês jovens falam, ele não me passa uma "vibe" boa. — Ele fez aspas com a mão ao falar a palavra "vibe", e eu apenas sorri, já que as aspas não faziam sentido algum ali. — Eu vou mandar dois detetives ao tal motel para investigar o que você me falou agora mesmo, e espero que essa seja a última vez que tenhamos que conversar sobre esse garoto.
Eu assenti rapidamente. Agradecendo mentalmente por já ter "terminado" tudo com o Jace hoje mais cedo.
— Tudo bem por mim, pai.
Ele sorriu, um tanto aliviado, e voltou a se sentar em sua poltrona.
— E quanto a esse tal de Harry Campbell, não se preocupe que eu irei investigar pessoalmente. Assim como essa história do papel no carro da Patrícia, aliás, sua mão está bem? Não quer ir a um hospital?
— Está. Não precisa, nem doí muito. Carter fez um ótimo trabalho nos pontos. Diga "obrigado" a ele por mim quando o ver.
— Eu vou dizer poucas e boas, isso sim! Ele deveria ter me ligado ou a levado ao hospital!
— Pai, não! Foi eu que insisti. Não foi culpa dele.
— É... eu sei. Você e essa sua cabecinha impulsiva e teimosa. — Ele suspirou, balançando levemente a cabeça. — Mas resolvido isso, você está dispensada para ir para o seu quarto... Boa noite, filha.
— Boa noite, pai.
David pegou o telefone fixo que havia na mesa e apertou um botão de discagem fixa que conectaria ele ao departamento de polícia, mas pareceu se lembrar de algo e cobriu o telefone com a mão, voltando a falar comigo antes que eu alcançasse a porta.
— Ah, e quando subir, passa no quarto da sua irmã e diga que eu quero falar com ela agora. — Disse sério, e eu assenti.
— Zach?
— Zach. No que ela estava pensando ao namorar um fugi... Sim, aqui é o Xerife Thornhill falando...
Ele voltou toda a sua atenção para a ligação e eu deixei o escritório. Subi as escadas e bati na porta do quarto da Taylor.
— Taylor?
— O que? — Ela perguntou lá de dentro.
— Papai quer falar contigo. — Informei, e já estava abrindo a porta do meu próprio quarto quando a porta dela foi aberta.
— Sobre o que? — Ela cerrou os olhos, desconfiada.
— Como eu vou saber? — Fiz a sonsa e continuei o meu caminho.
Eu precisava de um longo banho e de uma noite de sono mais longa ainda. Entrei no meu quarto, pronta para fazer essas duas coisas, e me assustei ao ver Elijah deitado na minha cama mexendo em seu celular.
— Eli! — Exclamei, surpresa.
— Surpresa! — Ele sorriu.
— Você não iria vir só amanhã à tarde, pois iria virar a noite bebendo com os seus amigos?
— Quando você fala assim eu pareço um cachaceiro. — Ele riu. — Landon e Luke tiveram que cancelar, então, decidi vir hoje mesmo... o que houve com a sua mão? — Ele perguntou de repente, pulando da cama para segurar a minha mão e a olhar de perto.
— Nada demais, eu me cortei com uma faca.
— Que azar. — Ele disse apenas, soltando a minha mão e me encarando. — Você está estranha... foi só isso mesmo?
— Não... — Revelei. Eu estava cansada demais para falar toda a história de novo, então, decidi que falaria apenas os pontos mais importantes. — Lembra que eu fui até o campus para falar com você?
— Sim. Mas quando eu cheguei lá, Harry disse que a sua amiga apareceu e você precisou ir embora.
Revirei os olhos mentalmente. É claro que ele falaria isso.
— Não foi nada disso. Eu fui embora pois ele apareceu.
— Do que você está... espera, o Harry te fez alguma coisa? — perguntou de forma protetora.
— Não diretamente comigo, mas... você lembra da festa que aconteceu um tempo atrás onde encontraram a Lana morta?
— Na casa dos ricaços, eu lembro.
— Eu estava lá. E Harry estava lá. Eu a ouvi gritando por socorro e quando cheguei... ele estava perto do corpo com as mãos cheias de sangue.
— Mas que porra é essa, Olivia? — Ele me olhou completamente assustado. — Por que você não me contou essa merda antes? A polícia sabe?
— Sabe. Eu contei para o papai hoje... e honestamente? Eu não sei por que eu não contei antes. Só não contei.
— Ele fez isso com a sua mão?
— Não... eu acho. Talvez? Isso foi meio que um acidente.
Quando eu contei sobre o corte para David ele ficou bem preocupado, mas também comentou que poderia ser um copiador ou alguém tentando me zoar, só que ainda assim, ele iria investigar melhor e rever tudo o que foi coletado de evidências naquela área.
— Eu não sei o que eu faço se eu o encontrar pessoalmente na terça... — Ameaçou, o que me fez aleatoriamente lembrar que segunda-feira seria feriado, dia do trabalhador.
— Você não vai fazer nada! O nosso pai falou que vai investigar ele e temos que esperar isso. Harry me disse que encontrou a garota já esfaqueada, e foi daí que ele sujou as mãos, e isso pode ser verdade... pode não ser ele! — Falar isso em voz alta era assustador, pois se fosse mesmo verdade, eu havia passado os últimos dias da minha vida praticamente assediando e stalkeando um cara completamente inocente. Ele com toda certeza deveria achar que eu era maluca. — Temos que confiar no papai.
— Tudo bem... — Ele respirou fundo para se acalmar. — Eu não vou fazer ou falar nada por enquanto.
— Ótimo. — Eu suspirei aliviada, já que se Elijah fizesse alguma merda, eu, com certeza levaria outra bronca do nosso pai por ter aberto a boca. — Eu estou cansada e preciso tomar um banho agora, tudo bem se conversarmos depois?
— É claro. Sem problemas.
Ele tocou levemente o meu ombro no caminho para fora do quarto, e ao me encontrar sozinha, eu segui para o banheiro.
Na manhã seguinte, eu acordei com um som estranho vindo do lado de fora da minha janela. Saí da cama e abri a janela para conferir, e encontrei o papai e o Elijah cortando todas as plantas trepadeiras que haviam na parede exterior do meu quarto. É... acho que nada de fugir por elas novamente..., mas não foquei nisso, e sim, no fato de que ninguém as usaria para entrar no meu quarto novamente, era isso o que importava.
No café da manhã, eu recebi a notícia de que não encontraram absolutamente nada no quarto de motel que Patty e eu havíamos entrado. Os detetives vasculharam não apenas aquele quarto, como o motel todo, e o máximo que encontraram foram algumas gramas de cocaína e maconha, mas isso já no quarto de outra pessoa, nada relacionado a Jace ou Zach, e era tão pouco, que só poderia ser para uso próprio e não para venda. Sobre Jace e Zach, realmente não encontraram nada. Era como se eles tivessem limpado tudo e saído de lá assim que Patty e eu fomos embora.
Jace não me ligou. Apesar de ter dito que conversaríamos depois, eu ter contado tudo para a polícia talvez o tivesse desmotivado de me contatar novamente, então, esse realmente foi o nosso fim. O sábado inteiro se passou e eu não tive notícia dele. E isso era para o melhor. Até mesmo bloqueei o seu número quando me deitei para dormir a noite. Eu havia prometido para o meu pai que ficaria longe de problemas e iria cumprir isso.
Já sobre o David, ele saiu para trabalhar depois do café da manhã no sábado e não voltou para casa desde então, nunca o vi tão envolvido e focado em algo como ele estava agora com esse caso. Ele não me disse mais nada além das coisas sobre Jace, Zach e o motel. Eu queria saber se ele havia descoberto algo sobre o Harry, mas ele apenas disse que estava investigando e teria algo em breve. Eu precisava esperar, e esperar era incrivelmente entediante.
Ainda no sábado, trancada em casa, eu terminei de assistir a quarta temporada inteira de The Vampire Diaries, li alguns livros, mas não cheguei a terminar nenhum, e escutei muita música. Fiz de tudo para me distrair e agora, no domingo, eu estava exausta de não fazer nada e descia a linha do tempo das minhas redes sociais totalmente desinteressada.
Londville não era uma cidade animada como as cidades grandes, mas costumávamos ter o nosso charme. No entanto, desde que toda essa merda começou a acontecer aqui, nada mais acontecia. E agora que os estabelecimentos estavam fechando as nove horas da noite e havia um toque de recolher para as dez horas, nada realmente passou a acontecer. As redes sociais de todos estavam paradas. Era isso, ou postar selfie em enterros e velórios, o que seria de total desrespeito e ninguém nessa cidade era tão baixo assim.
Joguei o celular na cama e apaguei o abajur na mesinha de cabeceira ao lado, pronta para ir dormir pelo resto daquela manhã chuvosa de domingo e só acordar na hora do almoço..., no entanto, recebi uma notificação. Alcancei o celular novamente e acessei o link que Patty havia me enviado junto com a mensagem "amg, olha isso".
Era de um site de notícias locais, e anunciava o desaparecimento de mais uma garota. Lívia Nelson.
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