Atravessei o mar de espíritos dançantes com dificuldade, resistir à música fantasmagórica era fatigante, como se eu tentasse prender a respiração mesmo que meus pulmões gritassem por ar. Cascalho escorregadio no chão, o odor doce e pútrido do ar, os brinquedos destruídos, tudo aquilo foi desaparecendo como uma cortina de uma janela que é aberta lentamente para que o sol entre.

Eu não percebi quando deixei o festejo dos espectros e entrei no meu mundo, o mundo real e tangível de atrações multicoloridas, luzes estroboscópicas, gritos de excitação e risadas alegres.... e vivas. Era um parque de diversões comum e bem lotado pra dizer a verdade, mas, mesmo que eu já não estivesse entre os mortos, fiz o que a mulher me dizia e continuei andando em direção a roda gigante que se elevava acima de tudo e todos. 

Sorri para o homem que cuidava do brinquedo, ainda estava bastante abalada e não me importaria em curtir a calma que vinha de se estar "no topo do mundo". Dentro da roda tocava uma música diferente da do resto do parque, baixinha como uma trilha sonora, que parecia bastante com uma caixa de música. Eu não sei quanto tempo passei ali, quantas voltas eu dei. Na verdade, eu não me importava se fosse muito tempo, gostava da vista e da calma.

— Quando nós vamos pra casa, Mabel? — fui chamada e por um segundo jurava que meu coração ia sair pela boca.

Eu não havia notado que havia mais alguém comigo ali dentro, mas, sentada à minha frente estava ela, a Duda de verdade (meu coração traidor comprovava isso) com uma saia de tule horrorosa e amarela que ficava linda nela e uma maquiagem bonita em tons de rosa e laranja. Mas eu podia muito bem estar ainda em um sonho, a Duda de verdade não sabia quem eu era.

— Você disse que a gente ia comer pizza na sua casa depois do parque — Ela reclamou levantando e me puxando pra fora quando chegamos ao chão.

— Você lembra de mim....?

— O que deu em você hoje? — ela perguntou rindo — É claro que eu sempre vou lembrar de você sua boba, foi uma promessa, não foi? Não devemos quebrar as promessas feitas em nome das estrelas — Ela sorriu me beijando delicadamente.

Se aquele era o pagamento que eu recebi pela dança, não me importava em dançar com os mortos sempre que eles desejassem. Eu não queria estar em negação, se aquilo era um sonho eu o agarraria e viveria eternamente no melhor sonho da minha vida.

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450 palavras.