CAPÍTULO XL
Manuela o encarou por alguns segundos sem entender, os lábios entreabertos pela resposta surpreendente, não conseguia compreender como alguém se arriscava a ser expulso do céu por algo que aos seus olhos não parecia tão grandioso, na verdade lhe apresentava bem corriqueiro.
- Vocês nem fazem ideia do bem precioso que lhes foi entregue. – Chris falou ao perceber a confusão na expressão feminina. – Para vocês é tão natural fazerem o que quiserem, decidirem por si mesmos e mudarem de opinião quando acharem conveniente tendo que lidar apenas com trivialidades humanas que quando muito apenas afetam suas rotinas diárias, nem mesmo arranham seu direito de ascensão ao céu. – Sorriu melancólico ao completar. - Vocês não percebem o valor que isso tem.
- Mas vocês tinham o céu, era a casa de vocês! – Declarou impressionada. – Para que arriscar tanto?
Chris fechou os olhos por um segundo e suspirou antes de dizer.
- Também é a casa de vocês, mas diferente de nós, vocês são livres para decidir quando e como voltar, ainda que essa escolha não seja consciente, seus atos terrenos não os impedem de alcançar os céus, no máximo prolonga a necessidade de um maior ciclo de retornos à Terra para que haja a evolução espiritual esperada. – Relatou com evidente encanto por tal regalia aos humanos. – Os celestiais mesmo os de alta hierarquia, repletos de dons e estando próximos do criador jamais tiveram esse poder ou privilégio.
Manuela o encarou espantada, o que Chris dizia não combinava em nada com o que ouvira a vida inteira, nem com os ideais que tinha criado sobre as prerrogativas angélicas com base nos ensinamentos religiosos que recebera, tão pouco condiziam com a visão humana sobre o livre arbítrio, pois nunca antes ele tivera tamanha valorização.
-O que há de tão importante no livre arbítrio? – Indagou desnorteada. – Ele apenas nos coloca em confusão! – Afirmou pensando em quantas decisões erradas havia tomado e que só a colocaram em maus lençóis. – É como deixar crianças por conta própria e torcer para que não destruam tudo.
Chris riu suavemente, em seu olhar um brilho condescendente por sua insipiência.
- Faz ideia do que é ver um dia suceder o outro se preparando para intervir em conflitos que você nem sabe como começaram? Seguir princípios e regras que foram criados antes mesmo de você? Obedecer sem questionar porque não foi dado a você esse direito? – A fitou diretamente em seus olhos como se estivesse mergulhando em sua alma enquanto desnudava a própria essência diante dela. – Tem noção do que é não se sentir digno o bastante para a função que ocupa porque não vê sentido no que faz? Lutamos guerras que não eram nossas, cumprimos desígnios maiores que nós mesmos quando nossas mentes queriam contestar a ordem recebida, chegamos a duvidar de nós nos julgando como as Sete hierarquias julgavam os desertores, temendo cair em desgraça como eles, porque nós sabíamos o que era reservado a aqueles que haviam sido expurgados do céu. Dia após dia víamos outros como nós caindo em desgraça, perdendo tudo, descendo o mais baixo que seres como nós podem descer. – Sorriu pesaroso. – Nós os acompanhávamos ao seu destino final...E quer saber, não desejaríamos aquela sorte nem mesmo ao nosso pior inimigo porque não era algo bonito de ver.
- Vocês os escoltavam para fora do céu? – O encarou em dúvida se tinha entendido corretamente o que ele havia lhe dito.
- Nós os levávamos até o inferno e garantíamos que não saíssem de lá. – Contou sério, o brilho de seus olhos desaparecendo por um instante pouco antes de completar. – Esse foi o nosso trabalho por um bom tempo.
Por um instante Manuela ficou em silêncio enquanto as lembranças de Leon repreendendo-a por mencionar essa palavra surgiam em sua mente com clareza absurda, a expressão masculina deixando claro que aquele era um lugar que não deveria ser citado. Sempre se perguntou a razão disso, agora uma luz começava a ser lançada sobre o assunto, a fazendo perceber que havia muito mais do que sequer tinha desconfiado.
- Então você e o Leon foram mesmo para o inferno? – Murmurou estarrecida.
- Moramos lá. – Sorriu envergonhado ao concluir. – Que fique claro que não foi por nossa vontade, nem por alguma punição, fez parte do trabalho que nos foi designado.
- Não vejo razão para isso. – Comentou dividida entre o espanto e fascínio que aquelas revelações lhe causavam. – Só acompanhar os desertores não bastava, tinham que morar lá?
-Está preparada para um pouco de história celestial e da criação dos eternos? – Inquiriu encarando-a em dúvida, um meio sorriso descrente distendendo seus lábios. – Está pronta apar rever tudo o que lhe ensinaram até aqui?
- Acho que sim. – Respondeu apreensiva após um minuto de silêncio.
Estaria mesmo? Perguntou-se mentalmente olhando para Chris que vigiava atentamente suas reações. A história dos eternos era confusa, misteriosa e porque não dizer, assustadora, o desconhecimento dos fatos às vezes pode ser uma forma de proteção, cogitou mordendo os lábios em dúvida, estaria mesmo pronta a jogar por terra todas as crenças que nortearam sua vida desde sempre? Notou que Chris observou o movimento involuntário em seus lábios com especial atenção desviando o olhar em seguida parecendo repentinamente desconfortável enquanto colocava uma distância maior entre eles, indo se refugiar do outro lado da sala.
- O que foi? – Questionou encarando-o preocupada.
- Nada. – Respondeu ele com voz rouca, colocando as mãos nos bolsos e se remexendo inquieto.
- Tem algo mais que eu não sei além claro da história e mitologia dos eternos? – Instigou levantando-se e parando ao lado dele. – Sinto que você não está me contando tudo, que está selecionando que partes contar. – Comentou estudando atentamente o rosto de Christopher.
- Há mais do que você pode imaginar. – Murmurou ele encarando-a intensamente e desviando o olhar em seguida. – Há tantas coisas que inclusive nós estamos descobrindo agora.
- Como o que? – Questionou curiosa.
- Como porque agora você está tão perigosamente atraente para todos nós. – Sussurrou por entre os dentes cerrados pela pressão do maxilar tenso.
- Atraente em que sentido? – Indagou inocentemente. – Isso é uma tentativa de desviar minha atenção sobre os assuntos que você está evitando me falar?
- Quem me dera. – Mordeu o próprio lábio com força enquanto cruzava os braços nas costas, uma mão segurando o punho do braço oposto em uma tentativa de contenção. – Poderíamos conversar mais tarde? – Murmurou com voz rouca em uma espécie de apelo.
- Está tudo bem com você? – O fitou preocupada.
- Sim! – Apressou-se em afirmar. – Eu só... – Pigarreou para então continuar. – Eu só preciso de alguns minutos sozinho para colocar as ideias em ordem. – Falou colocando-se em movimento indo apressado em direção à imensa porta pivotante de madeira avermelhada na entrada da sala.
Manuela observou espantada ele abrir a porta e sair para praia que ficava em frente a casa, seus passos apressados como se estivesse fugindo de algo horrível, sem pensar foi atrás dele, tendo que correr para alcança-lo.
- Chris, espere! – Pediu ofegante por estar correndo na areia.
- Agora não Manuela! – Respondeu ele de costas caminhando ainda mais rápido.
Manuela parou sua corrida colocou as mãos na cintura enquanto olhava fixamente para as costas largas do homem a sua frente.
- Qual é o problema com você?! – Gritou aborrecida. – Estávamos conversando e de repente você me sai com essa? Onde está sua educação? – O viu parar há alguns metros à frente quando as últimas palavras deixaram sua boca.
Chris voltou-se lentamente em sua direção e com passadas largas eliminou em instantes a maior parte do espaço entre eles, tomando o cuidado de permanecer a uma distância considerável dela.
- Adoraria saber que loucura é essa, mas enquanto eu não souber é melhor não ficarmos muito tempo juntos. – Disparou a fazendo mira-lo com obvia incompreensão.
- Do que está falando?
- Nem eu sei. – Disse baixando os olhos envergonhado. – Eu amo a minha mulher... Leon é meu melhor amigo, é como um irmão para mim... Isso é um grande absurdo! – Comentou como se repreendesse a si mesmo.
Os fragmentos de frases ditos por ele não faziam o menor sentido para Manuela que acompanhava sem de fato entender nada aquela estranha conversa que mais lembrava o monologo de um bêbado, como alguém que estava conversando sobre a queda dos anjos de repente enveredava para aquele diálogo sem sentido?
- Certo, calma. – Pediu se aproximando dele e segurando-lhe a mão que ele imediatamente puxou como se fosse algo obsceno. – Quer parar de agir feito louco?! – O olhou brava. – Já tenho lidado com esquisitices demais para ter que aturar mais isso!
- Desculpe. – Murmurou constrangido. – Por isso pedi que conversássemos depois, eu preciso... Esfriar minha cabeça.
- Você precisa parar de chilique! – Falou desaprovadora. – Eu é que sou nova nesse mundo... Estranho e incoerente dos eternos, se alguém aqui tem que surtar, sou eu!
Houve um instante de silêncio que foi quebrado pela risada divertida de Christopher, que pareceu finalmente relaxar.
- Você está certa. – Concedeu ainda rindo. – Isso tudo é novidade para você, imagino como deve parecer confuso tudo o que te dissemos até agora, assim como as coisas que você viu. – Comentou compreensivo. – Mas, esse desejo também é novo para mim e não é certo sentir isso por você...
- Opa! Opa! Opa! – Entoou aturdida interrompendo-o. – Está falando de que agora?
Chris respirou fundo, olhando para o mar ao responder embaraçado.
- Eu estou sentindo por você coisas que nunca senti antes e que jamais imaginei sentir. – Apertou os lábios vexado. – E que se pudesse escolher, jamais sentiria.
- Coisas tipo... – O fitava insistentemente torcendo para que suas suspeitas estivessem incorretas.
- Desejo. – Deixou escapar como se a palavra pesasse uma tonelada. – Uma conexão como se estivesse apaixonado, uma necessidade...
Calou-se ao ver o olhar horrorizado dela e o movimento involuntário de recuo em uma obvia rejeição.
- Não é algo intencional. – Apressou-se a explicar. – Mas, se mantivermos distância quando esses arroubos se manifestarem vai ficar tudo bem. – Garantiu, mesmo sendo acometido por dúvidas internas que a muito custo escondeu.
- Quer saber? – Manuela deu um passo atrás e mais outro até ficar a uma distância ainda maior de Chris. – Você tinha razão, devemos conversar em outro momento, de preferência quando Leon estiver por perto, por falar nisso, quando ele vai chegar? – Questionou, ao ver a expressão de Chris se tornar tempestuosa, tagarelou nervosamente. – Não importa, deixa para lá, eu descubro quando ele chegar.
Manuela percebeu que Chris ficou ainda mais tenso, suas mãos apertadas em punhos, a expressão ainda mais sisuda, os olhos azuis carregados com sentimentos que não conseguiu compreender, engoliu em seco ao cogitar a possibilidade de que o secretário de seu marido a tivesse levado para aquele lugar sem o conhecimento e o consentimento de Leon.
- Ele vai chegar... Não é? – Indagou incerta o fitando em expectativa.
- Ele está aqui. – Respondeu em voz baixa.
- Está? – Olhou ao redor acreditando que Leon estivesse em algum lugar na faixa de areia ou mesmo no mar. – Onde?
Christopher a mirou por um ínfimo instante, mas foi suficiente para que ela pudesse ver culpa e tristeza em seu olhar, seu coração falhou uma batida e sua garganta travou ao lembrar que Leon não tinha ido ao seu encontro no restaurante e em seu lugar havia aparecido o assustadoramente insano Theodoro.
- O que aconteceu? – Murmurou com voz embargada. – Leon saiu de casa para uma reunião, marcou um encontro comigo em um restaurante e não apareceu, veio um homem esquisito que disse que se chamava Theodoro e que eu era a mulher feita para ele... – Balançou a cabeça em negativa ao recordar essa parte que havia ficada relegada em algum canto de sua memória diante do fato chocante de ser perseguida por um monstro abominável. – Ele disse que o Leon não voltaria. – Relatou com voz trêmula. – O que está acontecendo? Leon está mesmo aqui?
- É melhor voltarmos para casa. – Disse Chris começando a fazer o caminho de volta.
- Não! – Manuela permaneceu fincada no lugar. – Não enquanto você não me disser o que está acontecendo! – Exigiu. – Chega de meias verdades, de revelações fracionadas, eu quero saber o que aconteceu com o Leon e você vai me contar agora!
- Não se preocupe, eu vou lhe mostrar.
O arrepio que percorreu a coluna feminina diante das palavras sinistras causou um tremor em suas pernas e uma contração em seu estômago. Sentia em seu interior o prenuncio de algo ruim, torcia para estar enganada, que tudo fosse apenas paranoia da sua cabeça despertada pelos acontecimentos chocantes dos últimos dias, queria crer que todo o poder que Leon tinha garantiria que nenhum mal acontecesse a ele, mas o olhar de Chris lhe dizia que até mesmo alguém com dons tão incríveis era de alguma forma vulnerável.
Boa tarde meus queridos (as)!
Como prometi no aviso publicado a pouco lhes trouxe hoje mais uma capítulo de Em suas mãos. Aproveito esse momento em que estamos em contato para esclarecer algumas situações, a primeira delas é a demora nas postagens de novos capítulos e a quantidade reduzida dos mesmos. Entendo que para os leitores que acompanham fielmente essa obra e já leram todos os capítulos disponíveis é frustrante a demora nas publicações e o fato de apenas um capítulo estar sendo publicado por vezes pode ser desestimulante, a vocês venho dar essa satisfação, pois sou grata por apreciarem o meu trabalho e lerem vorazmente cada capítulo que disponibilizo.
A demora para as novas postagens não é algo intencional ou planejado, é uma consequência de dois fatores que tem influenciado diretamente na produção de novos capítulos, falta de tempo e problemas técnicos. Talvez vocês não saibam, mas não sou uma escritora profissional, não vivo da publicação de livros, meu sustento vem do meu trabalho como secretária em uma repartição pública e devido a demanda de trabalho o meu tempo livre tem se tornado muito escasso, eu escrevia com frequência em casa no meu notebook, mas infelizmente ele queimou a placa mãe e tive que esperar a loja que faz o conserto pedir a peça para só então iniciarem os reparos, ainda não recebi o notebook de volta, o que me deixa sem computador. Sei que algumas pessoas escrevem diretamente no celular, é o que eu tenho feito, mas minha produtividade não é a mesma, por isso tenho publicado com menos frequência e apenas um capítulo por vez. Espero que entendam a situação e continuem lendo a história de Leon e Manuela com o mesmo amor, carinho e atenção que os uniu até aqui, tenho me esforçado para não deixar a obra parada, mas as dificuldades atrapalham sua evolução.
Agradeço de coração a todos vocês que leem, votam, comentam, adicionam as obras em suas bibliotecas e seguem o meu perfil aqui no Wattpad, isso faz de vocês pessoas muito especiais para mim e mostra que vocês de fato apreciam as narrativas que eu produzo, espero poder contar sempre com a compreensão, o carinho e a paciência de vocês. Que a nossa amizade seja sempre forte!
Beijitos!
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