Capítulo III.
Eu e Charlie já estávamos andando pelas ruas de Londres há uns 20 minutos. Eu realmente ficava impressionada com algumas mulheres que passavam com uns 20 pedaços de pano em um só vestido e os homens com ternos totalmente apertados. Era tão estranho ver aquilo. Me dava uma enorme vontade de rir.
Naquele trajeto, estava comprovado que Charlie não era uma das melhores pessoas em puxar assunto, assim como eu não era. Mas ele era extremamente tímido e só falava algo quando eu abria a minha boca. Era cansativo mas ao mesmo tempo irônico. Normalmente, quem tende a falar mais são os homens, não as mulheres. Eu acho que isso está começando a mudar.
— Charlie, porque vocês homens na-
Enquanto eu estava falando, parei por um momento ao sentir algo me impedindo de passar, o que me fez cair no chão.
— Mas o que…
Olhei para a minha frente e me deparei com uma garota morena de cabelos cacheados com sua cesta de frutas espalhadas ao redor. Ela aparentava ter poucos anos a mais que eu e parecia constrangida.
— Me desculpe, senhorita! — Ela disse desesperada enquanto se levantava. — Deixe-me te ajudar.
— Eu a ajudo. — Charlie estendeu a mão para mim, o que eu tratei de segurar e me levantar enquanto limpava algumas partes do vestido que ficaram sujas com a queda.
— A-ah! Charlie! Que bom te ver. — Ela disse dando um sorriso fraco para ele. A garota parecia um pimentão de tão vermelha que estava.
— Igualmente, Teresa. — Ele sorriu.
— Vocês... Se conhecem? — Perguntei confusa.
— Claro! Eu sou professora de Marlin. — Ela me olhou. — A propósito, o meu nome é Teresa, prazer.
— Rose Parker.
Ela fez uma reverência para mim e eu também fiz, mesmo não entendendo tanta formalidade a ponto de se curvar.
— A senhorita Rose está passando alguns dias na minha casa.
— Uh… Entendo. — Teresa olhou para baixo. — Desculpe-me a indelicadeza, mas, por quanto tempo exatamente?
— Quando eu recuperar a minha memória. — Respondi.
— Memória? Você não se lembra de nada? — Eu concordei. — Céus! Isso é terrível.
— Sim. Nós a encontramos desmaiada pela floresta Epping nessa manhã. E como Octavia gosta sempre de mais alguém na sua casa, lhe deixou ficar por um tempo indeterminado.
— Octavia é uma pessoa adorável. — Ela sorriu. — Bem, se me derem licença, eu vou ter que juntar essas frutas espalhadas.
— Eu posso te ajudar. E o Charlie também, certo? — Dei um olhar positivo para ele.
— Claro.
Então, nós começamos a juntar aquelas diferentes frutas que estavam no chão. Estávamos quase terminando de colocar todas na cesta, mas um homem em torno dos 45 anos chegou e interrompeu Charlie e eu.
— Eh… Com licença, senhor e senhorita, mas vocês estão bem?
— Sim, estamos. — Falei confusa olhando para o homem. — Por quê?
— É que... Bem, é que vocês estão acompanhados com esse "tipo" de gente, então… Eu achei que estava acontecendo algo e vim conferir.
Não. Aquilo não estava acontecendo.
— Por acaso o senhor não está sendo racista, está? — Eu cruzei os braços.
— Não é questão de racismo, senhorita. Mas não é normal ver pessoas como vocês dois andando com "essa".
Eu iria explodir de tamanha raiva.
— Olha aqui, senhor bunda-mole, a "essa" que você chamou tem nome, e é Teresa. Em que séculos nós estamos que não podemos andar com uma pessoa negra em ruas públicas que já pensam que ela vai fazer algo de errado? — Disse em um tom alto. — Todo ódio que você transborda, um dia voltará para você.
— Rose, vamos para casa… — Falou Charlie em um sussurro.
— Ir embora? — Eu olhei para ele. — Porquê? Quem está sendo o errado aqui é esse velho.
— Ora! Me respeite, senhorita!
— Você ainda quer respeito depois de dizer todas essas coisas? Que tipo de ser humano é você?
— Vamos embora, Rose.
Charlie me pegou levemente no meu punho sem me machucar e me tirou dali, enquanto Teresa observava tudo com uma expressão surpresa no rosto. Se eu tivesse ficado mais tempo ali, com certeza eu daria um tapa na cara daquele bunda-mole.
No caminho de volta para casa foi silencioso. Charlie estava centrado no caminho e eu, apenas olhava para o chão, sem nenhum arrependimento do que tinha falado. Mas estava nítido no rosto do garoto que ele não se encontrava feliz com a minha atitude.
— Vocês demoraram muito! — Falou Octavia em frente a porta nos observando se aproximar da sua casa.
— Rose irá lhe explicar o porquê de termos nos atrasarmos. — Charlie cruzou os braços.
— Ei! Não é culpa minha se aquele homem estava sendo racista!
— Racista? O quê? Eu não estou entendendo o que vocês estão falando.
— A senhorita Rose fez uma confusão com o senhor William com todas as pessoas olhando.
— O quê? — Octavia arregalou os olhos. — Você brigou com senhor William?
— Ele estava sendo racista! — Expliquei pela última vez.
— Não importa! Você não deve falar mal do senhor William.
— Por quê não? Afinal, quem é ele mesmo?
— Ele é um dos homens mais ricos e poderosos de Londres. — Respondeu Charlie. — William pode fazer tudo que quiser em um piscar de olhos.
— Não me importo se ele é poderoso. O que ele fez foi intolerável.
— Não vamos mais falar sobre esse assunto! — Interrompeu a mulher. — Venham, entrem, o jantar já está na mesa.
Octavia não falou nenhuma palavra durante o jantar. O clima estava tenso novamente.
O jantar foram ervilhas e um grande frango. Não é uma das comidas que eu costumo comer na minha casa — normalmente eu como pizzas —, mas pela fome que eu estava eu comeria qualquer coisa naquele momento.
Depois de comermos, nós fomos para a sala. A única que estava sentindo-se confortável ali era Marlin, que lia o seu livro pouco se importando para o que acontecia ao redor.
— Marlin, largue esse livro e vá para cama. — Disse Octavia.
— Mãe, ainda são 20:38! — Explicou a menina.
— Não importa. Teresa irá vir pela amanhã e eu quero te ver acordada no horário. Vá. — Ela disse seriamente.
Marlin bufou largando o seu livro no chão e subiu as escadas rapidamente indo para o seu quarto.
— Octavia, eu…
— Eu sei o que você vai dizer, querida. Mas está tudo bem, o.k? Você ainda não conhece o local e as pessoas.
Parece que ela já sabia o que eu iria dizer. Claro, eu não estava arrependida de ter falado todas aquelas coisas, mas não gosto de ver as pessoas chateadas de alguma forma comigo.
— Venha comigo, querida. Irei lhe dar algumas roupas antes de dormir.
Eu subi as escadas junto com a Octavia e ela me levou até o seu quarto. Abriu o seu imenso guarda-roupa, tirou de lá uns 15 vestidos e colocou em minhas mãos.
— Esses vestidos são um pouco antigos. Eu usava antes de Charlie e Marlin nascer, então, acho que irá servir em você. — Ela sorriu.
— Obrigada, senhorita Octavia.
— Não precisa me agradecer. Agora, vá para o quarto e tente descansar um pouco. Esse dia foi corrido.
Eu concordei e me despedi dela. Andei pelo longo corredor e entrei na última porta do mesmo, onde ficava o quarto que eu estava antes. Ele era grande, eu poderia dizer que daria para pôr mais uma cama naquele espaço. O guarda-roupa tinha um tamanho bom para mim, afinal, eu não tinha tantas roupas assim.
Após guardar os vestidos de Octavia, pude escutar um barulho familiar ecoar pelos meus ouvidos.
Pling, pling! Pling, pling!
Meu celular!
Corri até onde eu tinha deixado pela última vez e sem nem ver quem era, atendi de imediato rezando mentalmente para que fosse o meu pai ou a Eadlyn.
— Alô? — Falei em um tom desesperado.
— Ah! Vejo que você está se acostumando com a família Lawford, Rose.
Ah não. Essa mulher estranha não.
— Quando você vai me tirar daqui?
— Bem… Ainda vai demorar um pouquinho. Tenho que ver como as coisas estão indo.
— Você não pode simplesmente me levar até aquele lago e me tirar daqui?
— Não. — Ela riu. — Eu sigo ordens.
— Então por quê me ligou?
— Eu queria te avisar para não se meter em problemas. Apenas fique com os Lawford e pronto.
— Eu não estou me metendo em problemas.
— Você brigou com o senhor William e todo mundo viu!
— Eu não iria deixar ele falar aquelas coisas estúpidas!
— Não importa. Apenas não seja tão grosseira, sim?
— Tá, tá.
— Eu vou desligar agora.
– Antes de você desligar, você poderia dar uma passada na casa do meu pai? Para pelo menos ver se ele está bem?
– Ei, não se preocupe tanto com isso. Ele vai estar bem quando você voltar. — Eu tinha a impressão de que ela tinha dado um pequeno sorriso. — Até logo, querida. Durma bem.
Após a ligação ser encerrada, eu guardei o celular novamente dentro do guarda-roupa. Tantas coisas aconteceram hoje que eu até tinha me esquecido que estava no século 19.
Dei um suspiro baixo e tiro os meus sapatos apertados antes de me deitar naquela cama enorme e confortável.
Eu não sabia quanto tempo eu iria ficar naquele lugar, muito menos o que iria acontecer no decorrer, mas uma coisa eu tinha certeza: A minha vida nunca seria como antes.
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