6
Após o almoço, sentaram-se num banco da praça central, para tomar um sorvete. Lia, cuja fome não permitira compreender muito do que dissera Onofre, saciada, resolveu dar uns palpites:
— Se o crime já aconteceu, talvez a nossa missão — bonito, hem? A nossa missão! — talvez a nossa missão não seja evitar o crime, mas sim descobrir o assassino.
Os olhos de Nancy brilharam:
— Puxa, pode ser! A mulher foi assassinada pelo marido e ninguém descobriu. Estamos aqui justamente pra isso: desvendar o crime!
Lia empolgou-se com a aceitação de sua ideia:
— Então é fácil. Vamos até a delegacia e lá devem saber se teve esse crime ou não.
Onofre tinha os pés no chão:
— Esperem lá, mocinhas. Devagar com o andor! Se formos à polícia, de duas, uma: ou vão achar que estamos malucos — e acho que estamos mesmo, ou acabamos nos envolvendo nesse suposto crime de graça. O que íamos dizer? "Sabe o que é, seu delegado, essa moça aqui andou tendo uns sonhos, onde uma mulher é esfaqueada. Daí ela viu na parede da cozinha um calendário, com o nome de uma loja. Sabe informar"?
As duas riram. Onofre seguiu:
— Percebem a fria? É aquela história da música do Ney Matogrosso: "Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come". Ah, mas vocês nem devem conhecer essa música.
Continuaram a rir.
Lia:
— Nunca ouvi essa música.
Nancy:
— Eu já — falou, rindo. — E o que o senhor sugere? Qual o próximo passo?
Onofre:
— Repararam que todas as pessoas a quem perguntamos eram jovens ou de meia idade? Se realmente a loja existiu e já fechou, isso pode ter ocorrido há muito tempo, talvez não seja da época delas. Por isso precisamos de alguém bem velho. Alguém que conheça a história da cidade.
— Um professor de História? — indagou Lia.
— Não. Como professor de História, não me preocuparia com uma loja de autopeças, a menos que ela tivesse sido de fundamental importância para um determinado processo histórico, o que não parece ser o caso, pois ninguém sabe dela.
Onofre, buscando alguma pessoa idosa, virou-se para trás e viu, do outro lado da praça, um homem de uns setenta anos ou mais. Era alto e magro, cabeleira completamente branca. Andava vagarosamente com a ajuda de uma bengala. Estava bem vestido. Usava calça e paletó cinza, camisa branca, sem gravata. Onofre levantou-se e pediu que as duas esperassem ali. Quando ele se aproximou do idoso, elas logo entenderam qual era a intenção dele. Lia, de repente, ficou preocupada:
— Nancy...
Ela estava distraída, olhando para Onofre e o velhinho:
— O que é?
— Já pensou se aquela minha ideia estiver certa? Se o crime já aconteceu e estamos aqui para descobrir o assassino?
— Sim, e daí?
— Daí que podemos topar com ele a qualquer momento. E aí, o que será que ele faria com a gente?
Nancy voltou-se para Lia:
— Você tem razão!
Corriam perigo, sem dúvida. Podia ser qualquer um, talvez até algum daqueles a quem tinham feito perguntas. Podia, inclusive, ser aquele velho!
— Meu Deus, o seu Onofre... Vamos lá, temos que evitar que o pior aconteça.
Atravessaram a praça rapidamente. Não tinham ideia sobre o conteúdo da conversa deles até ali. Cinco minutos! Esse era o tempo do diálogo travado entre os dois, o suficiente para que o velhinho já soubesse o porquê de estarem na cidade. O suficiente para saber que os três não podiam continuar vivos. Já devia estar planejando como colocar seus capangas atrás deles, a fim de dar-lhes um sumiço. Quando elas finalmente chegaram junto a Onofre, ouviram ele perguntar sobre a loja de autopeças Pindamonhangaba. Tarde demais! Fora nítida a mudança de fisionomia no rosto já cansado. Antes alegre, feliz em poder ajudar, ao ouvir o nome da loja, seu rosto mudou. Tornou-se carrancudo e amargurado. A resposta que deu os fez estremecer:
— Conheço. Aliás, conheci. Ela já não existe mais, faz quase trinta anos. Preferia que nunca tivesse existido. Por causa dela, houve um assassinato!
Onofre percebeu a amargura nas palavras do homem e, para espanto das garotas, perguntou:
— Trinta anos? Esse assassinato... Tem a ver com um homem que matou uma mulher com uma faca, mãe de gêmeos?
O velho definitivamente arregalou os olhos. Seu rosto ficou vermelho. Nancy e Lia começaram a tremer. Um carro parou na rua, bem ao lado deles. O chofer ao volante perguntou:
— O senhor já quer ir para a fazenda?
— Já. E tenho um convidado. Você está de carro?
Nancy, quase gaguejando, adiantou-se:
— Ele está comigo. Meu nome é Nancy e essa é a filha dele, Lia.
O velho, a mão trêmula, as cumprimentou:
— Não percebi que Onofre estava acompanhado... E de belas moças, por sinal. É um prazer. Meu nome é Lilo Mendonça. Peguem o carro de vocês e sigam a gente. Vamos ter muito que conversar. Preciso saber qual o interesse de vocês num crime de quase trinta anos atrás!
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