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As duas costumavam andar de mãos dadas, para escândalo dos vizinhos:

— Onde já se viu? — dizia dona Marieta para a irmã.

— É um absurdo mesmo.

O neto de dona Marieta, que tinha apenas 16 anos, comentou:

— Vocês estão ultrapassadas. Já estamos no terceiro milênio.

Dona Marieta irritou-se:

— Olha lá como fala, menino! E depois, essa pouca vergonha não tem nada a ver com primeiro, segundo ou terceiro milênio. Ela sempre existiu e as pessoas de bem nunca concordaram com isso.

Lia e Nancy passaram incólumes, sem olhar a reacionária Marieta, mesmo sabendo da maledicência da qual eram alvo. Mais à frente, dois rapazes fizeram comentários bem mais devassadores e, com certeza, machistas:

— Quem será que é o homem na história?

— Tá na cara, né? É claro que é a Nancy. Ela até parece homem.

— E será que não é mesmo?

— Com seios?

— Silicone!

— Ah, não acredito, não. Ela é mulher sim. Pra que ia colocar silicone?

— E a tal de Lia, hem? Muito gostosa. Será que ela também não curte homem? Eu era doido pra dar uns beijos nela.

— Um desperdício mesmo. Mulherão.

— Como é que será as duas na cama?

— Ora, você nunca viu filme de sacanagem, não?

— Claro que já! Só que eu só vi de homem com mulher.

— Eu já vi! É um barato. Pelo menos é melhor que dois homens juntos.

— E desse tipo, você já viu também? Gostou?

— Ei, qual é? Tá me estranhando? Sou "espada", meu chapa!

— Só que espada corta dos dois lados, sabia?

— "Facão", então! Tá melhor assim?

E entre fuxicos e mexericos, as duas chegaram à feira. Ali também todos já sabiam e elas nem faziam questão de esconder, embora nunca tivessem sido vistas beijando-se em público. Não eram de todo discretas, mas também não gostavam de exposição gratuita. Achavam que certas coisas, mesmo para um casal heterossexual, dito "normal", só deveriam acontecer entre quatro paredes.

A maioria dos feirantes, que as via juntas quase toda semana, não dava a mínima importância para o fato, salvo raras exceções. Quase todos as achavam muito simpáticas e divertidas. E não faltava quem não lançasse um olhar mais malicioso para Lia, o que deixava Nancy às vezes furiosa:

— São uns caras-de-pau! Mexer com a mulher dos outros!

Mas ela não era do tipo desbocada, nem tampouco gostava de confusões. Na maioria das vezes preferia silenciar, a menos que alguém viesse com zombarias. Aí virava uma fera.

— E as duas moças, o que vão querer hoje? Vai uma dúzia de bananas? É só escolher.

Lia lançou um olhar para Nancy, como se pedisse sua aprovação:

— Vamos levar, Nancy?

— Estão boas, né? Pega uma dúzia, vai.

O feirante continuou:

— E maçãs? Essas são do jeito que o diabo gosta.

Ela riu:

— Está me chamando de diabo, é? Mas, realmente, estão ótimas. Essas azedinhas, então, hum... Vou levar, sim. Meia dúzia de cada, por favor.

Lia pagou o rapaz e as duas se afastaram, ao som do refrão:

— Olha, freguesia! Olha a banana direto do vale do Ribeira. Olha a banana! Vai, freguesa?

¤

Havia quem se perguntasse quem pagava o aluguel da casa onde moravam. "As duas trabalham fora, mas será que ganham o suficiente para tanto?", questionavam as línguas ferinas. Era uma casa térrea, independente, com dois quartos e vaga para carro. O aluguel devia valer algo entre um a dois salários mínimos.

Dona Marieta não se conformava:

— Elas são tão novas e já moram sozinhas? E ainda como marido e mulher? Como é que pode? Onde é que estão os pais dessas criaturas? E será possível que ganhem o bastante para manter essa casa?

Não havia quem não fizesse esta e outra série interminável de perguntas, quase todas sem resposta. Só o que sabiam é que elas haviam se mudado para o número 56, da Rua Ernesto Nazareth, fazia pouco mais de um ano. Saíam de manhã, geralmente juntas, voltando à noite. Lia sempre chegava mais cedo, pois trabalhava numa loja não muito longe dali. Ia e voltava de ônibus, enquanto Nancy locomovia-se em carro popular, com cinco ou seis anos de uso, bem conservado. À noite, ou mesmo nos fins de semana, quando não saíam, ficavam em casa, vendo filmes. Relacionavam-se pouco — ou quase nada, com os vizinhos. Sempre cordiais, mesmo com aqueles que as olhavam de forma atravessada, embora quase sempre pelas costas.

O que, no entanto, deixava irritados alguns dos moradores da pequena rua sem saída, era que elas não davam motivo para queixas. Dona Marieta, por exemplo, era uma das que não esperava a hora de ter um motivo para expulsá-las dali.

Uma senhora sempre as visitava, mas ninguém sabia quem era, provavelmente a mãe de uma delas. Noutras ocasiões recebiam visitas de amigos, tanto homens, quanto mulheres, mas sempre em horários considerados convenientes. Nunca se ouviram quaisquer barulhos ou sinais de algazarra — para os mais maledicentes, orgia.

— E o que vocês esperavam? Só porque são lésbicas não podem ser decentes e ter uma vida como a de qualquer outro? Por que vocês acham que o fato de terem uma orientação sexual diferente da maioria, indica que devam ser necessariamente imorais e devassas? Vocês precisam ainda aprender muito sobre moral, conduta e abandonarem estes conceitos retrógrados, sobre moralidade e imoralidade.

Seu Onofre, um homem culto, aposentado, morava com a esposa e era vizinho das meninas em paredes geminadas. Ele e a mulher, apesar da idade, eram o que se podia dizer "liberais", mas Onofre preferia a expressão "livre pensador, sem amarras e algemas, livre de preconceitos". Ele e a esposa sempre saíam em defesa de Nancy e Lia, quando alguém fazia qualquer comentário que as desabonasse.

— Seu Onofre — retrucava dona Marieta —, pelo amor de Deus, só o fato de viverem como vivem já é imoral. Está certo, não fazem barulho, não dão festas, não dão motivos pra que ninguém reclame delas. Sempre sorridentes, cumprimentam todo mundo. Mas vivem juntas, como marido e mulher. Isso já é o suficiente! São umas desclassificadas, só por isso. Que exemplo não vão dar para as nossas crianças?

Seu Onofre era quase sempre impassível:

— Melhor exemplo que muitos políticos e religiosos dão, eu lhes garanto.

Noutras ocasiões, no entanto, ele se deixava irritar ainda mais:

— Deixem as meninas em paz! Vão cuidar das suas vidas, que vocês ganham mais!

Debalde era o esforço de seu Onofre em defendê-las, afinal, tratava-se de uma voz solitária no deserto. E as perguntas continuavam a martelar a cabeça de todos, inclusive, às vezes, até a dele: "De onde elas vieram e quem são seus familiares"?

A verdade é que tanto Lia quanto Nancy nada tinham a esconder. E, se seus vizinhos nada sabiam sobre a vida delas, é porque simplesmente não perguntavam. Elas teriam o maior prazer em responder. Faltava aos vizinhos, porém, a coragem, onde sobrava a maledicência.

¤

Alguma coisa, no entanto, estava para mudar na tranquila vida das duas garotas. E tudo começou numa alvorada chuvosa, de sábado para domingo, quando um grito se fez ouvir pela casa no silêncio gélido da madrugada.

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