Capítulo 28.
— O que faremos com eles? — perguntou Mariana, olhando de braços cruzados para os dois homens que Hector recém amarrara.
— Sei que é idiotice deixá-los vivos, principalmente sabendo que Klaus estará de volta em breve e eles poderão vir atrás de nós, mas — busquei as palavras certas — seria uma execução. O garoto e o outro homem morreram em uma troca de tiros, mas não sei se Hector teria o sangue frio para matá-los presos e desarmados. Eu com certeza não teria.
— Sintam-se à vontade, de qualquer forma — Hector murmurou. Seu tom parecia normal, mas ele não conseguia esconder de mim a forma como suas mãos tremiam, visivelmente perturbado.
Agora que a adrenalina já havia parado de bombear nossos sangues, só restava a fria realização do que fizemos. Dois corpos baleados jaziam mortos, sinal da guerra que estávamos declarando ao fugir e levar aquelas meninas. Aquilo era maior do que tudo que havíamos imaginado, mas não havia outro jeito. Precisaríamos voltar, garantir a segurança de todos e, principalmente, pedir ajuda.
Talvez fossemos mesmo novos demais.
— Kleber e Antônio... Não são tão ruins. Não como Enrico, ou Marcelo — Joana disse, a voz fraca e hesitante. — Nunca... Tocaram em nós.
— Por favor — o homem mais novo, Antônio, implorou pela quinta vez, com lágrimas descendo pelas bochechas — não contaremos nada para Klaus.
— Cala a boca, Antônio — murmurou Kleber, cujo machucado enfaixado na coxa voltara a sangrar — Quando Klaus chegar...
Encarei-o, mas não parecia uma ameaça, embora o homem se recusasse a me olhar de volta. Hector jogou na mesa os dois walkie-talkie que tirara dos cadáveres, garantindo que estivessem longe do alcance dos que restaram.
— Vamos, não temos mais tempo a perder — dei de ombros, virando para Mariana, quem parecia responder pelas outras meninas — Não sei se estão blefando quando dizem que Klaus já está chegando, mas não quero ficar para descobrir.
Haviam 7 mulheres reféns no grupo de Klaus: Mariana, a irmã do Celso; Bruna, que ajudou Hector na fuga; Joana, quem soltou as minhas amarras no primeiro dia; Darlene e Sheila, as duas mais velhas entre todas; Yasmim e Aline, irmãs. Nenhuma delas aparentava mais de trinta e poucos anos e todas eram muito bonitas. Não podia deixar de pensar que não era por acaso.
Aline, a menina de 15 anos, voltou correndo para a sala. Trazia consigo uma pistola e duas chaves de carros, conforme combinamos. Não era a única que se relacionava com Klaus, mas ia com frequência até o quarto reservado só a ele, por isso sabia onde procurar.
No total tínhamos quatro pistolas e um fuzil, que nenhum de nós sabia ao certo como usar. Também tínhamos alguns facões de caça e barras de ferro distribuídas entre as mulheres. Haviam se passado apenas cinco minutos desde que subjugam os homens, mas cada segundo que se arrastava era de uma agonia indescritível.
— Ei, Rebeca, né? — Aline olhou para mim, colocando os fios loiros tão claros quanto trigo atrás da orelha. Só então percebi o conjunto de faca e canivete holográficos que ela carregava — Acho que são seus. Obrigada pelo que estão fazendo.
Sorri para a garota, respirando fundo para tentar esconder a tremedeira ou a instabilidade em meu coração. Era assustador olhar para aquela menina de quinze anos e pensar no que sofrera como refém daqueles homens, mas se ajudasse de alguma forma, atreveria-me a tentar lhe passar confiança.
Agradeci, recolhendo minhas facas e me preparando para dar a ordem de partir, quando o conhecido chiado cortou os murmúrios da sala, congelando meu sangue no ato.
— Marcelo? — a voz de Klaus saiu do walkie-talkie na mesa. Não era grossa, mas fria e suficientemente assustadora — Tá aí? O imbecil do Enrico não responde.
Então veio o silêncio sepulcral, como se todos nós estivéssemos parados no tempo. Até mesmo Kleber e Antônio nos encaravam atônitos, como se esperando nossos próximos passos.
— Escutem aqui — Mariana empunhou uma das pistolas e pegou o walkie-talkie da mesa, pisando com seu coturno no sofá onde os homens estavam — Vocês dois não tem nada a ganhar me desobedecendo, além de um tiro cada. Estamos de saída, e isso só nos faria perder menos de uma hora, que é o que precisamos para estar bem longe daqui — a mulher então colocou o cano da pistola na frente dos olhos de Antônio, soltando a trava — Responde que tá tudo bem, inventa qualquer merda. Se tu falar algo diferente disso, vou só desligar o rádio e te dar um tiro, ouviu?
— Sim, Mariana — ele respondeu, hesitante. Kleber, ao seu lado, não falou nada, mas seus olhos arregalaram com a proximidade do cano da arma.
— Anda.
Senti um arrepio quando a mulher apertou o botão para falar, fazendo o som característico que indicava que o walkie-talkie estava funcionando.
— Klaus?
— Antônio? — a voz de Klaus veio confusa — Que merda tá acontecendo?!
O homem engoliu em seco, a expressão assustada fixa na arma à frente de seus olhos.
— Nada, Klaus. Marcelo se machucou e Enrico foi ver o que houve, mas não foi nada sério. Estamos bem aqui.
Silêncio.
— Natan foi até o depósito pegar mais armas — o homem continuou. Sua respiração era hesitante.
Senti uma gota de suor escorrer pela minha testa, deixando um caminho gelado por onde passava.
— Entendi — finalmente ouvimos uma resposta de Klaus — Fiquem tranquilos então, voltamos amanhã. Desligo.
— Desligo — respondeu Antônio, mas Mariana já havia tirado o walkie-talkie de sua frente, atirando-o no chão.
A mulher encarou profundamente os homens amarrados, um franzido na sobrancelha que acentuava suas mínimas linhas de expressão. Quando afastou a pistola do rosto de Antônio, o homem respirou aliviado, mas não falou mais nada.
— Anda. Não vamos arriscar que ele ligue de novo — Hector disse, abrindo as portas duplas e fazendo sinal para as outras meninas. O vento frio logo chegou até mim, junto com um pouco de iluminação da rua. Ainda restava sol, seus últimos raios se perdendo no céu que escurecia.
Joana e Bruna terminaram de distribuir as armas e imediatamente as seis mulheres seguiram Hector na direção da rua. Demos apenas os minutos necessários para encontrar algumas armas e as chaves dos carros para que as outras meninas também reunissem o que achassem útil.
Antes de sair acompanhei os movimentos de Mariana, que travava a arma e a colocava na parte de trás da calça. Parecia distraída, pensando.
— Tudo bem? — perguntei, conforme ela se aproximava e seguíamos. Andávamos lado a lado em direção às portas escancaradas que nos permitiam ver o pátio completo. Hector abria o porta-malas de um dos poucos carros que restara para colocar a pouca bagagem que as mulheres reuniram.
— Tudo sim, é só...
Mas ela não terminou a fala, surpresa com a minha parada abrupta. Era como se toda a temperatura do meu corpo houvesse caído, seguida de uma tontura tão forte que tornava difícil entender que o que eu sentia era o mais puro pavor.
O portão que eu deixara entreaberto ao passar estava completamente fechado.
— O portão. Eu deixei aberto — falei, mas quase não havia voz saindo de mim. Olhei desesperadamente ao redor, tentando encontrar algo que pudesse oferecer perigo.
Minha respiração travou na garganta quando eu vi os olhos da mulher de coque se arregalar ao fitar meu rosto.
— Tem algo errado... Ninguém pode ir até o depósito de armas sem... — mas ela não completou a frase, virando o rosto imediatamente na direção da rua e berrando: — Cuidado! Não estamos sozinhas!
Em um curto segundo de delírio pensei que Leonardo ou Gustavo finalmente haviam achado a oficina e se aproximaram discretamente para investigar. Em meu desespero, me atrevi até a pensar que era Tom quem chegara para nos resgatar.
Mas então os tiros estouraram em meus ouvidos e a realidade me atingiu.
A rajada de tiros foi curta, mas de imediato salpicou o chão da entrada de sangue. Duas mulheres caíram na hora, seus corpos perfurados por incontáveis buracos de bala de onde imediatamente começou a escorrer vermelho. Alie berrou quando viu o corpo de sua irmã ir ao chão, mas seu grito foi encerrado por uma bala certeira que estourou seu pescoço, transfigurando seu rosto em uma expressão de pavor.
Meu corpo foi anestesiado pelo choque e em um impulso infundado atirei-me no chão, como se aquele tiroteio fosse somente acidental. Vi a figura de Hector parada em horror, uma de suas mãos ainda segurando o porta-malas do carro aberto. Quis gritar para que ele se escondesse, mas antes que conseguisse seu corpo chacoalhou quando um último estouro ceifou a tarde e na altura de sua barriga começou a escorrer sangue.
Então meu alerta saiu somente como um grito de agonia. O último barulho antes que o silêncio fúnebre devorasse aquele crepúsculo.
De trás do caminhão onde haviam galões de gasolina empilhados saiu primeiro o rosto conhecido de Klaus, empunhando orgulhosamente seu fuzil. Adão se revelou logo depois, seguido por um homem de cada vez, mas meu cérebro não conseguiu processar o número exato. Vi meu pavor mimicado no rosto de Celso, assim como no de alguns outros homens.
— Para dois adolescentes de merda, vocês quase são um problema — o sorriso de Klaus parecia genuinamente divertido, e justamente por isso era tão apavorante. Senti como se meu sangue tivesse paralisado quando seus olhos claros se fixaram em mim: — Adão, amarra ela. Vamos cozinhar essa puta.
✘✘
Nota da autora:
Olá amigos, tudo bem com você?
Eu acho engraçado reler as notas finais que deixo nos capítulos porque é sempre
Capítulo: dor, tristeza, morte
Notas finais: OI GALERA TUDO BEM? :D
Me perdoem...
Eu to amando/odiando escrever toda essa saga; amando porque é incrível poder explorar esse lado de completo pavor e impotência de novo, odiando porque fazer os meus bebês sofrerem é terrível... Às vezes dá vontade de reescrever o livro e cancelar o apocalipse zumbi, para que esses adolescentes possam simplesmente viver vidas normais e ser um pouco felizes.
Ai ai
Quero aproveitar para avisar uma coisa: passarei alguns dias em uma casa de praia nesse final de ano. Do fundo do meu coração, eu não pretendo, mas existe a possibilidade do capítulo da próxima semana atrasar porque posso não ter tanto tempo para escrever — e considerando as circunstâncias da história, acho que vocês entendem que não tem a menor possibilidade de eu publicar um capítulo mais ou menos nessa altura do campeonato. De novo, eu não pretendo e vou me dedicar muito para conseguir manter tudo em dia, mas infelizmente deixo avisado. Caso eu realmente não consiga, vou avisar com antecedência aqui no livro e no grupo do whatsapp. Peço mil desculpas de qualquer jeito, mas espero que entendam qualquer coisa!
Amigos, espero que todos tenham tido um incrível, incrível Natal e possam também desfrutar de um ano novo maravilhoso. Sei que 2020 foi uma péssima experiência, mas assim como esse livro, a vida é sobre permanecer tendo esperança mesmo na pior das situações. E eu tenho esperança de que 2021 seja incrível para todos nós.
Como sempre, obrigada por estarem comigo.
Não sejam mordidos no próximo ano também.
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