Capítulo 47.
— Você não acha que é sua culpa ou coisa assim, né? — Ouvi o garoto ao meu lado quebrar o silêncio.
Desviei os olhos da estrada para encarar Hector, que estava ao meu lado no banco da frente do Fiorino. A Pastor Alemão em cima dele estava com o pescoço esticado para fora da janela.
— Por que a pergunta?
Voltei a olhar para a estrada, sentindo-me tensa. Depois do acidente com Faber, tivermos de partir rápido, temendo atrair muitos zumbis para lá com os tiros de Tom. Sem muito tempo para organizar uma nova divisão, apenas assumi o lugar de Alex como motorista do Fiorino, mesmo que fosse um carro completamente diferente do que eu já havia dirigido e todo o peso do porta-malas tornasse a tarefa ainda mais desafiadora. Limpei o suor da testa, que agora era proveniente do medo que eu tinha de fazer algo de errado com aquele carro, mesmo que a minha tarefa fosse somente seguir a picape lenta em uma rodovia tranquila.
— Você sempre acha que é responsável por todo mundo. Quando esse tipo de coisa acontece, você sempre internaliza de alguma forma. Hoje você parece bem, na medida do possível, claro. Só queria me certificar.
Todos nós acabamos derramando lágrimas depois do que ocorreu. Alguns, como Samuel, tiveram reações piores. Mesmo o baque tendo sido forte, eu realmente não reagi com qualquer descontrole ou sequer me martirizei. Era meio constrangedor aceitar que nem sempre as minhas reações haviam sido maduras até então.
— Mesmo que eu quisesse, não havia nada que eu pudesse fazer naquela situação. Nem Tom teve tempo de dar um tiro... E mesmo assim, estava tão longe que talvez nem conseguisse acertar — respondi, com um suspiro. — Às vezes acabo pensando que nunca deveríamos ter saído de casa, que aquele grupo poderia nunca nos encontrar, mas... Não sei se acredito nisso. Independente de onde estejamos, estamos a um segundo de falta de sorte de tudo acabar.
— Não interessa se você é a pessoa mais forte ou preparada, ainda pode morrer para o menor descuido. — Hector colocou o cotovelo para fora da janela aberta, olhando para a paisagem. — Mas isso você já disse para a gente...
Assenti para Hector, feliz de tê-lo por perto.
— Eu só tenho medo que Tom ache que...
— Não foi uma boa ideia? — Ele completou. — Também pensei nisso, mas vou ser sincero: acho que enquanto nada acontecer com Samuel ou Carol, não precisamos nos preocupar. Você ouviu o homem: ele só não tentaram fazer essa viagem porque tinham medo.
— Hector. — Interrompi seu raciocínio. — Você acha que vai dar certo? Essa ideia do condomínio...
Ouvi um riso fraco escapando de sua boca conforme ele deu tapinhas amigáveis nas costas de Mei, que virou para lamber-lhe a cara antes de colocar o focinho para fora do carro de novo. Já havíamos passado tempo demais quietos, absorvendo a tragédia que acontecera, e agora eu sentia que precisava ouvir algo para me distrair.
— Você sabe, mas eu falo de novo, se te tranquilizar: eu acho que vale a pena arriscar. Já faz mais de um mês que tudo isso começou, sabe? — Ele empurrou Mei um pouco para o lado, desobstruindo a parede de pelos laranja que impedia que nos olhássemos direito. — Metade do tempo passamos tentando não morrer nas ruas; a outra metade ilhados em casas que deveriam nos manter seguros, mas tínhamos que sair todos os dias atrás de algo para não morrer de fome... Eu sei que há mais do que isso. Cada dia que passa, nos tornamos mais fortes, mais unidos. Deixamos de ser um monte de adolescentes idiotas e viramos um time. Tem que existir algo para gente como nós. É isso que eu acho.
— E como você tem tanta crença nisso? — Perguntei, mesmo que fosse óbvio que eu concordava com as palavras dele.
— Para ser sincero, a primeira vez que eu pensei nisso foi quando vi você com o Guilherme. — Senti minhas bochechas esquentando ao ouvir essas palavras, mas tentei seguir olhando para a estrada. — No começo achei vocês meio idiotas, pensando nesse tipo de coisa no meio de um apocalipse de zumbis, mas depois... Vendo como vocês ficavam felizes um com o outro, como mesmo precisando lutar pela vida a cada dia, encontram tempo para se esconder de todo mundo pra fazer, é, sei lá o que vocês fazem. — Cogitei capotar o carro naquele instante para fazer Hector parar de falar, mas achei que Mei não merecia aquele fim. — Guilherme provavelmente recebeu a pior notícia que uma pessoa pode receber nos dias de hoje, e ele realmente ficou péssimo com isso, mas... Ele ainda sorri todas as vezes que olha para você.
"Eu normalmente odeio essa melação toda que estou falando, mas poxa, eu acho que isso acaba inspirando todo mundo, de um jeito ou de outro. Não necessariamente a achar uma pessoa, mas.... Continuar, como você disse. A vida não pode ser só correr de zumbis. Eu sinto muito medo e muita tristeza ultimamente, mas ainda consigo me sentir feliz em alguns momentos. Acho que o que nos mantém vivos é essa vontade de continuar buscando por esses momentos."
— Hector, você vai me fazer chorar... — Falei em um tom exageradamente manhoso, brincando com ele, e recebi uma cotovelada nas costelas. — Mas você tem razão... Eu precisava ouvir isso, obrigada.
Depois de algum tempo em silêncio, Hector novamente quebrou a minha concentração na estrada:
— Sabia que daqui a dois dias é meu aniversário?
Provavelmente, assim como eu, ficar em silêncio não o estava ajudando. A experiência do luto por si só já é difícil (eu que o diga), mas quando ela se repete tantas vezes em pouco tempo... Não fica mais fácil, mas você começa a lidar um pouco melhor.
Por todos os primeiros quilômetros que eu havia dirigido, lágrimas obstruíram minha visão, mas estas já haviam secado. Sabia que naquela noite, em meus pesadelos, eu estaria fadada a reviver a cena macabra daquele dia várias vezes. Mas naquele momento, conversar sobre banalidades com Hector era onde eu encontrava um pouco de força para apaziguar a dor, o medo... E sabia que ele encontrava o mesmo em mim, abrindo-se na minha companhia, conversando sobre coisas que não aguentava mais guardar para si.
A verdade é que as perdas não ficavam mais fáceis, nunca; nós é que nos tornávamos mais fortes.
✘
Aquela mistura de sentimentos era conflitante. Havia a dor do luto, a tristeza... Que era o que tornava tão difícil sentir o alívio e — por mais difícil que fosse admitir — a felicidade que aquela conquista nos trazia. O que era mais difícil era a frustração em perceber que havíamos perdido Faber tão perto do nosso objetivo, como uma constante lembrança de que nunca conseguiríamos ser plenamente felizes naquele mundo.
Boa ou ruim, aquela sensação era indescritível. Enquanto desviamos da estrada principal por uma ruela de paralelepípedos que parecia se estender infinitamente, eu já mal lembrava do motivo que nos levara a chegar até ali, concentrada demais em realizar o percurso difícil com um carro pesado e um Pastor Alemão que volta e meia enterrava o focinho na minha cara.
Depois de alguns minutos, a construção de pedras com o topo coberto por plantas secas apareceu ao longe. A princípio não fiquei impressionada, até realmente nos aproximarmos e eu conseguir ter noção da magnitude dos muros de quase dois metros e meio que isolavam completamente o interior da nossa vista. Um toquezinho da buzina da picape que liderava o comboio nos indicava que aquele era o local.
Quando finalmente girei a chave na ignição, a realização de que meu corpo estava coberto de suor me fez ansiar ainda mais por um banho. Assumir aquela responsabilidade sendo uma motorista amadora (se classificada muito generosamente) havia sido uma experiência terrível que eu não tinha vontade de repetir.
Respirei fundo ao sair do Fiorino, maravilhada com os extensos campos vazios rodeando aquele condomínio, que parecia perdido no meio do nada (não fosse por algumas casas perdidas aqui e ali, e mais uma construção murada a vários quilômetros de distância). De frente para a entrada, uma caminhada de possivelmente meio quilômetro dava acesso a um pequeno aglomerado de árvores.
O portão gradeado altíssimo nos dava boas vindas à nova casa, com uma elegante cobertura de telhas de onde trepadeiras secas derrubavam suas folhas. Por entre as grades, era possível ver jardins enormes repletos de plantas amareladas pela falta de cuidado, que pareciam dar um novo significado ao nome do condomínio, exibido por uma gigantesca placa de madeira pendurada:
Condomínio Bosque Dourado
Tom deu um riso seco:
— Está um pouco diferente de quando viemos passar as férias.
— Parece vazio. — Carol espiou por entre as grades. — Mas tem alguns carros estacionados. Um é do caseiro da esposa, o outro pode ser do segurança... Tom, aquele não é o carro dos donos do casarão?
Tom, que havia colocado outra camisa antes de voltarmos à estrada, aproximou-se para observar.
— Sim, parece a BMW deles, mas não ouço nada, nem as luzes estão ligadas... — murmurou, incerto, enquanto pegava um molho de chaves do bolso de trás, para abrir um portão menor. — Vamos deixar nossos carros aqui por um instante e dar uma olhada.
— Mei, fica! — Censurei minha cachorra, que parecia tentada a invadir o condomínio em alta velocidade. — Peguem suas armas e fiquem atentos. Vocês acham que vamos encontrar gente lá dentro? O quão grande é?
— Tem doze terrenos, mais uma área de recreação. Quando viemos no verão, só quatro casas estavam prontas, incluindo a nossa, e outras duas em construção. — Tom informou.
— Os donos do condomínio se mudaram permanentemente para cá, eles ficam na casa maior. — Carol completou. — Além deles, os operários da construção estavam aqui nas férias. Haviam caseiros e dois seguranças que revezavam a guarita e o jardineiro vinha toda a semana. Parece deserto, mas...
Adentramos no condomínio, em alerta. Mei estava grudada em minha perna, olhando para os lados com as orelhas erguidas. Senti saudades do meu bastão de baseball naquele momento, incapaz de me acostumar a usar somente um facão como proteção. Já havíamos matado zumbis com armas de curto alcance antes, mas era sempre preferível fazer de outro modo.
O condomínio não era grande, com três ilhas de lotes divididas por amplos caminhos asfaltados e muito espaço amplo e verde. Logo na entrada havia um estacionamento para visitas, uma casa menor para os empregados e um pequeno jardim arborizado, com uma fonte desativada no centro.
No lote à esquerda ficava o "casarão" ao qual Carol se referia, uma construção de três andares, um dele com a parede frontal completamente envidraçada. A outra casa ficava a dois terrenos amplos e ainda vazios de distância e era uma construção um pouco menor em comparação, mas ainda espaçosa, com seus dois andares.
Na quadra central, apenas uma casa de aparência semelhante estava erguida, com outras duas em construção. No último lote, à direita, a construção mais próxima ao portão era a guarita e edifício dos funcionários e, no espaço mais distante da entrada, ficava a última casa, ao lado de um terreno em construção. Todas as residências tinham tons terrosos como cores predominantes.
Nossos olhos correram para os objetos de maior cobiça daquele local: o enorme sistema de painéis solares que abastecia todo o condomínio, posicionados próximos à guarita. Somente ver suas superfícies refletindo a luz do sol fazia meu corpo se arrepiar, tal como se fossem Oásis num deserto. Ainda assim, nem sequer me permiti pensar na possibilidade de tomar um banho quente no final daquele dia, enquanto não tivéssemos certeza de que era seguro ficar lá.
Infelizmente não foi preciso que andássemos muito para encontrar o primeiro mau presságio, que por si só já foi o suficiente para convencer Carol a esperar com o filho na entrada do condomínio. Não muito longe do estacionamento central, dois corpos jaziam no chão. Corpos pequenos, amontoados.
— Que merda... São os filhos dos donos. — Tom disse, sinalizando para que a mulher se afastasse e não visse aquela cena.
Poderia ter sido mais melancólico, se o cheiro nefasto de corpos apodrecidos há muito não tornasse o ar difícil de respirar. Escondi o nariz na manga do casaco, querendo desviar os olhos. Dois garotos, pré-adolescentes vestindo roupas com estampas de jogos, estavam atirados um sobre o outro. Um deles tinha um braço quase completamente devorado, com os ossos à mostra.
— Depois procuramos algo para esconder o corpo, podemos lidar com eles aman... — Carlos começou, mas foi interrompido.
— Pera, olha! O de cima! — Hector apontou para os corpos no chão e, relutante, tirei a cabeça do braço para olhar. — A cabeça!
Estremeci vendo que entre a carne decomposta havia um buraco de bala na testa da criança de cima. Entramos todos em alerta, percebendo que o garoto de baixo também havia recebido um tiro, este talvez à queima-roupa, pois uma parte do couro cabeludo havia sido deslocada. Agradeci por já ter vomitado aquela manhã e comido pouco no almoço.
— Olha lá! — Melissa apontou mais ao longe, seguindo a rua.
No último lote do lado direito, quase colado ao muro do condomínio, cinco ou seis corpos estavam estirados pelo chão. Para a nossa infelicidade, também haviam zumbis vagando a esmo. Contei rápido e cheguei em 10.
— Pode ter mais alguém vivo aqui. E armado. — Avisei, mantendo a voz baixa.
— Mas mesmo com os tiros, aqueles corpos parecem decompostos há algum tempo... — Observou Melissa, referindo-se às crianças.
Carol e Samuel ficaram na parte da frente, junto com Alex, que ainda estava indisposto, Victória e Alana (que sempre se oferecia para nos acompanhar, mas também sempre era barrada, porque não queríamos colocar a única enfermeira em risco). Guilherme estava perto de mim e segurava uma faca com o braço esquerdo, mas parecia extremamente ansioso.
Caminhamos devagar em direção aos outros corpos, por momentos em que a tensão pareceu interminável. Mesmo com as plantas abandonadas, rastros de sangue e poucas janelas quebradas, a aparência pós-apocalíptica do condomínio era muito melhor do que as ruas da cidade.
Eu e Tom, com sua arma empunhada, fomos os primeiros a nos aproximar e tivemos uma visão melhor dos cadáveres: cinco homens e uma mulher (quatro deles uniformizados com roupas de operários e um casal com roupas comuns, mas de marcas ostensivas), estavam ligeiramente próximos, caídos em posições aleatórias. Todos os seis corpos, sem exceção, contavam com buracos de balas em algum lugar na cabeça (alguns apresentavam tiros de raspão ou no torso, o que fazia parecer que era a primeira vez do atirador).
Apesar disso, todos pareciam ter sido, em algum momento, mortos-vivos, seja pelas lacerações em sua pele ou roupas extremamente desgastadas e cobertas de fluídos como vômito e sangue seco. A rua estava parcialmente suja de sangue, mas este não parecia atender ao espetáculo macabro que originara os corpos. Tom e Hector, em uma discussão rápida, pareciam convencidos de que aquela chacina deveria ter acontecido antes dos últimos dias de chuva que tivemos.
A situação era estranha, mas não pudemos tentar descobrir porque alguns zumbis estavam mortos e outros não, porque logo eles perceberam nossa presença. Eu ainda estava estarrecida por aquela espécie de zumbi que matara Faber, então me atrevi a achar quase reconfortante ver zumbis normais, lentos e cambaleantes.
Como se quisesse estrear seus braços recuperados, Carlos enterrava a sua barra enferrujada na cabeça das criaturas com empolgação, não parecendo particularmente incomodado pelo banho de sangue que caía no asfalto. Quando me vi defronte a uma mulher idosa de roupas simples, esperei até que ela se aproximasse o suficiente e tentasse dar um bote, atirando-se para mim com as mãos esticadas. Aproveitei o impulso para cravar a faca por baixo de seu pescoço, cruzando sua cabeça. Senti a resistência do seu crânio sendo atravessado pelo facão e, felizmente, aquele golpe foi o suficiente. Logo depois, o peso da mulher indo ao chão me impediu de conseguir recuperar o facão.
Minhas mãos estavam tremendo e cobertas de sangue e sujeira. Vi-me sem arma, mas não precisei falar nada para que Melissa me desse cobertura. Eu realmente precisaria encontrar uma opção melhor.
Quando o perigo inicial dos zumbis foi resolvido, seguimos na mesma formação, ansiosos para descobrir onde estava o atirador. Àquela altura, eu não sabia se preferia encontrar uma chacina completa ou se torcia para ainda haver alguém vivo lá.
Certamente, encontrar mais quatro zumbis que vagavam a esmo entre a última casa e a área de recreação (com um parque infantil e uma piscina de água esverdeada) não eram exatamente aquilo que qualquer um de nós ansiava ou esperava. Dois deles estavam completamente parados, os olhares perdidos no vazio, enquanto os outros dois caminhavam lentamente pelo quintal abandonado. Só então conseguimos ver um quinto, que já tinha a maior parte da perna esquerda comida, e se arrastava pelo quintal.
Enquanto finalizamos os andarilhos, procuramos por alguma arma, mas curiosamente não havia nenhuma à vista que assumisse autoria do massacre anterior. Era impossível saber se aqueles zumbis já estavam dentro do condomínio antes do vírus se espalhar, por isso, mesmo depois de nos livrarmos deles, não baixamos a guarda.
— Mei, pega! — Aproveitando que não havia sinal mais nenhuma criatura, liberei minha cachorra para se afastar, incitando-a a buscar por qualquer coisa que lhe soasse interessante (e, convenientemente, varrendo o terreno). Ainda assim, sua postura tranquila já denunciava que não restavam mais problemas.
Aquela estranha investigação só teve seu fim ao adentrarmos na última casa, a que estava cercada por zumbis. O final da história estava escrito com o sangue do autor dos tiros, pontuado pela última bala do pente, em um ato de provável desesperança após esvaziar quase todo o cartucho nos zumbis, sem nunca ter conseguido acabar com todos antes de se ver encurralado. Vendo o seu uniforme, Tom concluiu que ele era um dos guardas que ficava na guarita.
O cheiro dentro da casa onde ele acabara com sua própria vida e apodrecera na escuridão era com o das próprias fossas do inferno, embora nem mesmo isso fosse novidade para mim.
— Bom, essa é a casa que eu e Carol ficávamos. — Tom suspirou, colocando as mãos na cintura e olhando ao redor. — Vou tirar o corpo e abrir as janelas para o cheiro sair. Por favor, falem que era só mais um zumbi baleado. Não sei se ela gostaria de ficar aqui sabendo que foi um suicídio e eu só quero que aquela mulher tenha um pouco de paz...
Dei de ombros. Mesmo com outras três residências para verificar, não parecia que encontraríamos mais ninguém por lá. Talvez finalmente pudéssemos nos sentir em casa, para variar.
— Vamos ficar em casas diferentes?! — Melissa perguntou, parecendo um pouco exaltada por tomar conhecimento daquilo.
— Acho que não tem mais razão para ficarmos todos juntos. — Hector deu de ombros. — Sem falar que essa casa não é espaçosa que nem a outra do Tom.
— Mas a casa maior... — Minha amiga argumentou, levando o polegar à boca e mordendo a ponta da unha. Ergui a sobrancelha, questionando aquela hesitação, mas ela só sorriu para mim em resposta.
— Vocês podem ficar lá, Melissa, mas acho que é melhor para mim e Carol ficarmos aqui com Samuel. Talvez Alex até prefira ficar uns dias aqui, pelo menos até... — A frase morreu no ar. — Não quero que você entenda errado, é apenas por questão de privacidade, não uma divisão de grupos. Vamos continuar vivendo juntos, fazendo refeições em conjunto. Merecemos um descanso, claro, mas em breve precisaremos pensar em grupos de busca de mantimentos, e eu começarei a montar uma horta assim que possível, e vou aceitar ajuda...
Melissa assentiu, um pouco desanimada, mas eu não conseguia entender seus motivos.
— Tudo bem, eu acho que só acabei me acostumando com bastante gente...
Carlos e Hector se ofereceram, mesmo que não particularmente animados, para ajudar Tom a se livrar do corpo de dentro da casa, enquanto eu e Mei, junto com Melissa e Guilherme, nos direcionamos para as casas que restavam a fim de conferir seus interiores.
— Ei, se você não se sentir confortável, eu e você podemos dividir um quarto. — Falei para ela, oferecendo minha mão. Diferente de mim, todas as expressões de carinho de Melissa envolviam contato físico.
Ela segurou minha mão com um sorriso agradecido, e rimos juntas quando Guilherme fingiu acender uma vela imaginária.
— Eu to brincando, só pra deixar claro. — Ele adicionou, soprando o ar para apagar sua vela invisível.
— Obrigada, Rebeca, Gui. — Ela sorriu, e percebi que ficou um pouco mais confortável conforme nos afastamos. — Eu não sei, era para eu me sentir bem e feliz por estar aqui, e eu me sinto, mas... Eu sei que é idiota, eu acho que só tenho medo de ficar sozinha, como se...
— Ninguém vai a lugar nenhum. — Guilherme foi surpreendentemente incisivo. — Não precisa se preocupar com isso. A gente é um grupo, independente de qualquer coisa.
— Estamos em casa agora, Melissa, todos nós. Não precisa se preocupar nunca mais em ficar sozinha. — Sorri para ela, erguendo nossas mãos entrelaçadas para dar ênfase às minhas palavras.
Percebi quando os olhos de Melissa ficaram mais brilhantes e a observei limpando as lágrimas com a mão livre, que estava trêmula. Senti um pouco de remorso por nunca antes ter reparado como a ideia de solidão podia ser aterrorizante para a minha amiga.
— Sim, você tem razão. — Ela abaixou a mão, permitindo-me ver um sorriso hesitante. — Estamos em casa e isso que importa.
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