XXXIV - Cartas na Mesa
CASSIE
– Oh, olá – cumprimentou a mulher, com um sorriso muito largo no rosto. – Precisam de ajuda, crianças?
– Hã... ah... – abri e fechei a boca algumas vezes, não sabendo o que responder ("Claro! Uma tesoura forte o bastante para podar uma loba romana, por favor!".) E, apesar de eu ter detestado ser chamada de criança – alguns dias para eu fazer quinze anos, qual é –, apenas neguei com a cabeça.
– Certo – a mulher concordou, nem um pouco desapontada. – Podem me chamar de Ana, estarei no balcão, podem me chamar se precisarem!
E saiu apressadamente.
– Certo – falei lentamente. Encarei minhas roupas maltrapilhas, e as de Dylan que não estavam lá muito boas, também. – Alguém acabou de nos tratar bem... Novidade.
– Algumas pessoas possuem o que chamamos de educação e conveniência – Dylan informou. – Alguém já te apresentou certains d'entre eux? – "alguma delas".
– Já! – respondi, e senti meu rosto ficar vermelho de raiva. – Só que eu não perco meu tempo usando nem uma coisa nem outra com quem não vale a pena!
– Estou realmente tentado a responder à altura, mas tenho a impressão de que devo ficar brouillon – ("calado") Dylan falou calma e pensativamente. – Certo, então. Acho que vi tesouras de poda de arbustos ali adiante. Ih, pela apparition devem valer um olho da cara.
Bufando, segui ele pelos corredores. Procuramos em silêncio, mas não achamos nada dentro do nosso orçamento nem que desse conta da pelagem de Lupa. Falando a verdade, enrolamos um pouco, porque o ar dentro daquele lugar, aquecido e com cheiro de coisa nova, era relaxante.
– Então... – comecei, estudando alguns quadros que retratavam cavalos e paisagens, mas me dirigindo à Dylan. – Como da última vez fui interrompida, queria recomeçar. Ainda posso te fazer aquelas perguntas?
– Bien sûr – ele concordou serenamente. – Exploda uma bomba em cima de mim e é claro que ainda pode me perguntar.
– Certo, eu mereci isso. E posso ser um pouco explosiva às vezes...
– Sempre – Dylan corrigiu.
– O.k., noventa por cento do dia. Mas você não ajuda – rosnei a última palavra.
– Você não tem do que reclamar. Livrei sua barra com aqueles lobos, no Everglades. Depois lutei com aqueles des fantômes malditos e ainda levei todos os seus amiguinhos para cima daquele edifício. E depois ainda tomei conta de Clarisse e Lupa no musée. Ainda desconfia de mim?
– Pelo amor de Deus, eu tenho tudo para desconfiar!
– Exemple?
– Ah! – rosnei de frustração. Não sabia se podia falar para ele sobre o que ouvi... Talvez não fosse a hora... Mas eu não teria outra oportunidade. Respirei fundo e parei de andar de um lado para o outro, e encarei Dylan nos olhos; ele sustentou o olhar. – Certo – cruzei os braços, e falei da maneira mais resumida possível sobre o que ouvi no terraço. A expressão dele não mudou, embora sua postura agora fosse tensa. No final, suspirei e soltei os braços, que estavam cruzados há dois minutos e já estavam doendo. – "Tudo menos a verdade" – relembrei. – Como posso confiar em você? Como posso saber se tudo o que fez e falou até agora não foi apenas... encenação?
– Ah, Cassie, você não faz idéia... – agora quem andava de um lado para o outro era Dylan, passando as mãos no cabelo. – Foi só isso que ouviu?
– Peguei a conversa pela metade, sim. Mas entendi o suficiente.
– Não, não, você não entendeu absolutamente rien. Meu Deus...
– Então me explique! Todos estamos nessa, e se vou ao Hades com alguém, quero poder confiar. Como posso confiar em você se não me fala nada? Como posso saber se não vai nos trair na última hora?
– Trahir? – agora ele parecia ofendido. – Não acha que eu já teria feito isso faz tempo? Por que eu esperaria até estar no Monde Inférieur? Ah, por favor...
– Nada disso explica o que eu ouvi. Nem porque Melinoe te quer com tanta convicção.
Dylan parou abruptamente, me encarando.
– Faça um favor a todos nós, e não fale o nome dela. Já estava nos procurando avant que, e agora que sabe onde estamos até mencionar esse nome pode acabar com a gente.
– O que ela queria dizer quando falou que você era a única coisa que atrapalhava os planos dela? O que significa?
– Por favor, Cassie, não fale mais sobre isso – ele pediu, segurando meus ombros. Eu tinha que olhar para cima para encará-lo. – Vai só piorar as coisas. Já sou poursuivi demais, e estou fazendo tudo o que posso para esconder vocês Dela, e quanto menos tocarmos nesse assunto mais seguros estamos.
– Você não entende – falei, tirando as mãos dele dos meus ombros, embora minha voz estivesse surpreendentemente calma. – Aquelas pessoas, aquelas que nós deixamos lá naquele beco, são as coisas mais importantes para mim, você entende? Não posso, não vou, colocar nenhum deles em perigo. São o mais perto de uma família de verdade que já tive, e vou fazer o que for preciso para mantê-los seguros. E se isso significar eu ter que descer ao Tártaro, eu vou fazer. Entende agora porque não posso depositar toda a minha confiança em você, não sem saber quem você é?
Um esboço de um sorriso surgiu no rosto de Dylan.
– Não vai ser preciso uma medida tão drastique quanto o Tártaro. Quanto a mim... Tem minha palavra: depois que fecharmos as Portas, et je vais aider, eu sumo do mapa.
– Não precisa sumir – falei, num tom que dizia que a conversa estava acabada. – Precisa apenas falar a verdade. Se no momento não pode, certo, apenas mantenha sua palavra que não vai dar uma de vira-casaca. Fora isso, peço apenas que me diga de quem, afinal de contas, você estava falando lá no terraço, se não era eu?
– Estava falando Dela – respondeu, referindo-se a Melinoe.
– Oh... – sussurrei. O tom de voz de Dylan sugeria que a conversa estava decididamente acabada, mas perguntei baixinho, o mais delicadamente que sou capaz: – Desde quando M... Ela está te perseguindo?
– Há mais ou menos dezesseis anos – ele falou pensativamente, como se ponderasse. Era a frase mais sem sotaque que ele havia falado – É, mais ou menos essa média.
– Ah... Então você sempre soube sobre esse... mundo de deuses e monstros...?
– Não tive muita escolha, se quer saber. Desde que morava na França Ela não me deixava em paz... – ele encolheu os ombros, como se fosse algo qualquer, como discutir sobre beisebol.
– Seus pais... Digo, creio que eles... Quero dizer, devem ter tentado te esconder de alguma maneira...
– Olhe, vou deixar claro que tenho uma doença incurável chamada PLD.
– PLD?
– Pais Lamentavelmente Desinteressados.
Tive que morder os lábios para não rir. Eu estava ouvindo errado ou Dylan acabara de fazer... alguma espécie de piada?
– Entendo – falei, finalmente, com sinceridade. – Eu entendo muito. Se importaria se eu...
– Perguntasse? – havia uma nota de divertimento na voz dele. Suspirou. – Pergunte.
– Sua mãe...
– Ah, você não deveria ter perguntado. Sinceramente, esse é um assunto particularmente... hum, delicado.
– Bem-vindo ao clube! – resmunguei. – Então, isso quer dizer que seu pai...
– Ele está a sete palmos abaixo da terra – Dylan cortou-me no meio da frase. – Se está assim tão curiosa, certo: cresci num orfanato, na França, e quando decidiram que eu causava problemas demais, me mandaram para Massachusetts. Foi ali que eu conheci Noah, se quer saber.
– Oh... Me desculpe, eu não sabia...
Para meu espanto, ele sorriu.
– Por que está me pedindo desculpa? Nunca falei nada para você, e ficaria um tanto assustado se soubesse. Agora, por favor, devolva a Cassie mal-humorada e sarcástica. Essa sua versão é estranha.
– Ah, certo. Prefere que eu fique respondendo a cada frase sua?
– Não, não! A Cassie calma é melhor.
– Hum, concordo. Descobri a pouco tempo que essa versão existe, e acho que gosto dela. De qualquer modo, me desculpe pelas perguntas constrangedoras.
– Sabe de uma coisa? Você fez exatamente as mesmas perguntas que Clarisse, quando estávamos no Everglades, naquele caminhão fedorento.
– Ah, ela tagarelou, é?
– Basicamente.
– Ela faz isso sempre. Eu gosto.
– Nunca falei que não gostava.
Ri e sorri, radiante.
– Vamos, senão tenho a impressão de que um olimpiano vai querer me rogar uma praga ou sei lá se nós demorarmos aqui – Dylan comentou. – Acredito que il ne goste do fato de você estar aqui comigo – dessa vez foi a vez dele dar um sorriso malicioso para mim.
– Ah, vai se catar – resmunguei.
A expressão de Dylan era divertida, mas ele não falou nada. Seguiu até o próximo corredor, e demorei um segundo para segui-lo. Eu realmente tive... uma conversa civilizada com a pessoa cujo interrogatório eu planejara desde que a vi. O mundo dá voltas... e eu estava particularmente tonta.
Antes mesmo de chegarmos finalmente às tesouras, Ana apareceu do nada, quase como se tivesse brotado do chão, com um sorriso largo demais no rosto. Me ocorreu se ela ouvira nossa conversa... e talvez pensasse que fossemos loucos.
– Procurando algo especial? – perguntou Ana. – Posso ajudar?
Eu e Dylan nos entreolhamos.
– Hum... não – respondi. – Não, obrigada, nós nos arranjamos.
– Claro, claro – ela respondeu alegremente. – Vocês são daqui?
– Non – Dylan disparou, e acabou enrolando o inglês com o francês, criando uma mistura no mínimo interessante de sotaques.
– Entendo. Las Vegas é um ótimo lugar, não acham? – assentimos, calados. – Muito, muitíssimo movimentado, mas é um ótimo lugar.
– Ah... Ah, certo. Sim – respondi, depois de abrir a boca e fechar várias vezes, pensando no que eu deveria falar. – Nós já vamos... Não queremos tomar demais o seu tempo...
– Oh, não se preocupem! Há anos essa loja não recebe clientes decentes! É bom ter jovens por aqui, sabem?
– O que quer dizer com "clientes decentes"? – Dylan perguntou, pensando rápido.
– Oh, nada, querido. O de sempre. Licantropes, Ceres, servos Daquela-Que-Guarda-As-Portas, monstros que saíram do Tártaro... Vocês sabem. Mas é tão bom receber semideuses...
GENTEEEEEE
É isso mesmo?! Acabamos de ter um momento civilizado entre a Cass e o Dylan!!!
E, gente, a história dele também é triste! A mãe não ligava para ele e, pelo modo que falou do pai, ele era igual.
Dylan cresceu num orfanato. Aposto que isso pegou muitos de surpresa, né?!
E essa Ana... Ela é mais suspeita que o Dylan!
E esse último comentário dela não ajudou!
Vamos esperar e ver no que vai dar!!!
Deixem seus comentários e estrelinhas!
Beijos e uivos,
Lana
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