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08

Dentro do carro tinha um garoto, que parecia ter mais ou menos a minha idade. Ele era pardo, de olhos verdes e cabelos castanhos. Estava usando uma camisa azul e uma calça jeans rasgada e meio gasta.

Assim que entrei no carro ele se virou para me olhar. Depois de ter me analisado dos pés à cabeça. Ele se virou para a janela e ficou olhando a paisagem que parecia um borrão, de tão rápido que estávamos indo e logo minha casa saio do meu campo de visão, logo depois a cidade.

-Oi. - ele disse por fim.

-Oi. Você deve ser Henrico, certo?

-Sim. E você quem é? - ele disse sem tirar os olhos da paisagem.

-Sophia. Você veio por vontade própria ou obrigado? - digo, e ele se vira tão rapidamente para mim, que chega a me assustar.

-Se vontade própria, quer dizer chantagem, sim eu vim por vontade própria. E você?

-Também. - Assim que digo isso ele baixa o olhar para suas mãos e um longo silêncio se abate sobre nós.

-Você sabe para onde estão nos levando? - ele diz para quebra o silêncio.

-Não faço idéia. E você?

-Se soubesse não teria perguntado.

-Ai! Doeu - digo e ele ri.

-Desculpa. É que eu estou com...com...

-Com medo? - completo a frase e ele assentio - Não se preocupe eu também estou, mas olha se precisar eu vou está aqui. Se você aceitar ser meu amigo. Então aceita?

-Sim. E obrigado Sophia. E você também pode contar comigo.

-Pode deixar. É...ahn...Henrico você...

-Eu...

-...você sabe se nós vamos poder estudar?

-Olha não me leve a mal, mas...a gente está sendo levado para trabalhar como escravos, e você tá preocupada se a gente vai estudar? - ele me olha incrédulo - Mas respondendo a sua pergunta. Não, eu não sei se vamos estudar.

-Nossa ajudou muito, só que não. - assim que falo isso ele desanda a rir, e eu também e nós rimos até a barriga doer.

Quando nos controlamos mais da crise de risos, o motorista olha para trás pra ver se está tudo bem. Como o carro em que estávamos era de "gente rica" ele levantou de novo a janela que nos dava a vista do motorista.

-Sophia...

-Ahn...oi.

-Você vai tentar fugir de lá? - Tá essa pergunta me pegou de surpresa.

-Sim. Eu vou tentar ser livre de novo - digo sussurrando pro motorista não ouvir - E você?

-Também. Nunca vou desistir da minha liberdade - assim que ele diz isso, um enorme sorriso se forma em minha boca. Eu não sou a única que vai tentar fugir. Penso, e meu sorriso se alarga ainda mais, se é que isso é possível.

-O que foi? - diz Henrico.

-O que foi o quê?

-Porque você tá rindo como se não estivesse perdendo a sua, liberdade e sim ganhando ela?

-Há! É que... digamos que o seu pensamento me alegra.

-Que pensamento?

-O de tentar ser livre.

-Mas ainda nem fomos presos.

-Desde o momento em que entramos nesse carro, já é como se eu estivesse em cativeiro - digo vendo o sorriso dele passar de feliz para pena - Desculpa. Não queria acabar com a sua felicidade.

-Não tem problema. Você trouxe felicidade para mim e tem todo o direito de tira-lá.

-Mas eu não queria. Desculpa. Eu sou uma idiota, só pode.

Henrico não diz nada, ao invés disso ele me abraça. Foi estranho no começo, porque nos conhecemos a vinte minutos. Mas por incrível que pareça eu me senti bem. Então retribui o abraço.

Quando nos desvencilhamos do abraço vejo ele corar de leve. Então ele vira o rosto na direção da janela ao seu lado.
Eu ao invés disso, bato na janela que o motorista tem o controle para levantar e abaixar. Assim que ele abaixa a janela eu já pergunto.

-O que vamos comer? Eu estou com fome. O senhor não está? - a palavra senhor quase sai cuspida de minha boca.

-Vamos parar daqui a dez minutos, em um restaurante que tem logo ali.

-Ótimo! Desculpe atrapalhar.

Ele levanta a janela novamente, e eu fico contando os segundos para "comer".

-Você vai tentar fugir? - diz Henrico, admirando a paisagem.

-Sim. E essa é a oportunidade perfeita. Não acha?

-Sim. E pode contar comigo. Só temos que tomar cuidado com os arranha-céus ambulantes, que estão no outro carro.

-Relaxa. Eu tenho um plano!


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