Capítulo Onze
Levi Prescott:
A raposa dourada parou diante de nós, suas nove caudas se movendo graciosamente. Notei que ela era cega, o que aumentava ainda mais meu fascínio por sua presença.
Mas além disso, eu me sentia como se estivesse vendo alguém que desejava rever depois de muito tempo. Balancei a cabeça com força, tentando afastar essa sensação.
— Olá — falei, me recuperando.
— Olá, pequenos. Vejo que têm preocupações em seus corações. — A raposa disse, sua voz suave e encantadora, como se soubesse exatamente o que estávamos pensando. — Espero que não esteja incomodando nessa situação. Faz um bom tempo que não falo com ninguém, apenas os observando.
Ciel, ainda com os olhos marejados, olhou para a raposa com surpresa antes de seus olhos se arregalarem e começar a fazer uma reverência. Eu permaneci em silêncio, observando a cena se desenrolar diante de mim.
— Eu saúdo sua majestade Lilal — Ciel disse, fazendo uma reverência, e suas orelhas de raposa mexeram nervosas. — É uma honra estar sobre sua presença.
Engoli em seco, ela era ainda mais glamorosa e majestosa do que eu havia visto em meus sonhos nas últimas noites, chegando a me fazer assobiar de admiração.
A raposa dourada, Lilal, olhou para mim com seus olhos cegos, como se pudesse sentir minha admiração. Seu pelo brilhava sob a luz da lua, e eu me sentia completamente envolvido por sua presença.
— Parece que há pessoas que já ouviram falar do meu nome — A voz dela era suave e calorosa, mesmo sem expressões visíveis em seu rosto. — Até aprecio a forma como me recebeu, meu rapaz. Agradeço por isso, jovem.
Ciel permanecia em reverência.
— Se me permite, o que faz aqui na vila dos dracos? — perguntei.
— Estas cavernas foram onde me escondi do mundo, buscando paz depois do que meus irmãos fizeram — Lilal disse com um suspiro, baixando suas orelhas. — Isso não importa mais; eu só vim porque achei que tivesse sentido o cheiro do filhote por alguns segundos e fiquei animada.
— Filhote? — falei confuso.
— Meu irmão mais novo, eu o chamava de filhote — Lilal disse, sua voz envolta em melancolia. — Entre Natsuls, Kagome e a mim, o Drwes, mesmo crescendo, parecia um filhote. — Lilal afirmou, suas palavras carregadas de ternura. — Lembro-me de quando ele me viu ferido, chorou tanto que até os espíritos ao meu redor ficaram instáveis por segundos — soltou um risinho. — Tive que acalmá-lo... — Uma imagem surgiu em minha cabeça, acompanhada por uma melodia suave, acalmando meus nervos.
Então, um sentimento me inundou: saudades e uma mistura de tristeza.
— Cantando uma das suas melodias, antes de fugir enquanto sua melodia o acalmou — falei, incapaz de controlar minha boca que se abriu lotada de raiva, e Lilal ficou surpresa.
Lilal permaneceu em silêncio por um momento, seus olhos cegos pareciam procurar algo no espaço. A atmosfera ficou carregada com a emoção que pairava entre nós.
— Levi... — Ciel começou, olhando-me com desespero. — Isso é uma péssima hora.
— Você cantou a canção que era para ele dormir e fugiu, quando ele acordou estava sozinho e sem ninguém, e estava novamente com Natsuls, só os dois — falei, encarando-a com raiva, as lágrimas surgindo.
— Você sente a dor da partida, meu jovem — Lilal finalmente disse, sua voz carregada de compreensão. — Às vezes, as melodias que acalmam também carregam o peso da despedida. Você se conectou com a tristeza de Drwes, mesmo sem perceber.
Meu coração pesou, e eu senti um nó na garganta. As palavras de Lilal ecoaram como uma canção melancólica em meus ouvidos.
— Drwes não entendeu por que eu parti... — ela continuou, sua voz agora tingida de arrependimento. — Ele era o elo mais puro e inocente da nossa família. A melodia que ele compartilhou contigo, mesmo inconscientemente, era um presente que eu deveria dar a ele.
Lilal olhou para mim, e percebi que o entendimento se espalhava entre nós, como as notas de uma melodia quebrando o silêncio.
— Isso é uma idiotice, você o abandonou... — Continuei, e alguma coisa se rompeu em minha cabeça. — Você me abandonou.
Foi como se alguma coisa estivesse sendo rasgada dentro da minha cabeça. Tombei de joelhos, apertando as têmporas. Abaixei a cabeça, consciente de que havia magia voando ao meu redor, com uma pressão e a dor em minha cabeça surgindo.
Era como se algo estivesse inundando meu cérebro com imagens. Tinha consciência de Ciel fazendo um barulho terrível, uma espécie de ganido enquanto saltava para longe de mim, encolhendo-se, e o chão ao redor tremendo forte.
Uma força brotou dentro de mim, brutal e aterrorizante. Me colocou de pé, ao mesmo tempo em que tudo ao redor parecia se mexer e oscilar — outras lembranças se sobrepunham a esse lugar, de florestas de árvores antigas e densas, de caminhos escuros serpenteando, cheios de ferozes monstros e em cima de mim, três raposas.
O pavor que eu tinha da de pêlos negros, o carrinho da de pêlos dourados e por último a que tinha pelos prateados e que me protegia.
E, através de tudo isso, enxergava algo que nunca tinha visto. O mundo espiritual, suas linhas de magia correndo pelo mundo. Era por isso que sentia tanto poder nesse instante, a magia espiritual fazia parte de tudo, de cada pedra, árvore e nuvem; estava dentro e em volta de todas as coisas desse lugar.
Estendi as mãos como se desejasse pegar algo simples como um copo ou uma pedra. Alcancei as espirais dessa energia e puxei todas ao mesmo tempo, tecendo uma enorme chama e quebrei as correntes que estavam surgindo ao redor do meu corpo. Alguém gritava meu nome, mas não importava. Em algum lugar da minha mente, com força, só queria ter o que era meu por direito que perdi.
— Drwes! — gritou Lilal. — Drwes, continue!
Mas não me importava. Tudo que via e ouvia eram as minhas lembranças sendo queimadas. Na verdade, as lembranças jorravam em minha mente num maremoto incontrolável. Enquanto rolava para dentro da escuridão, percebi que eu mesmo gritava.
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Estava em frente a uma casa, havia prometido que não voltaria aqui, como havia feito nas últimas cem vezes. O frio era intenso o suficiente para fazer minha respiração cristalizar no ar.
Podia senti-lo, mesmo através da capa pesada, mesmo através da minha magia. Sentia uma dor terrível no peito e todo o pavor dele descobrir a verdade. Saber o que fiz séculos atrás.
Me escondi no topo de uma árvore para me certificar de que ninguém me seguia. Monitorava os limites do território há uma hora, e meu ponto de vantagem na concavidade de um galho de árvore perdera a utilidade para os inimigos, então resolvi mudar de lugar. O vento forte soprava montes espessos de neve que varriam minhas pegadas, mas enterravam com elas qualquer sinal de possíveis seguidores. A luz da casa se acendeu quando vi duas crianças surgindo para o quintal e os pais cuidando de participar da brincadeira na neve.
Meus olhos pararam na mulher que riu da diversão do filho mais novo e depois para o marido que caiu de bunda na neve, enquanto a filha jogava algumas bolas de neve. Estavam se divertindo, e sabia quem eram aquelas pessoas – os descendentes da minha irmã.
Venho cuidando deles desde sempre, descendentes da criança que minha irmã Kagome teve com um mundano ao se apaixonar e dar à luz a uma criança mestiça.
Fechei os olhos, e a imagem dos meus irmãos brigando séculos atrás, minha irmã Lilal sendo ferida e me abandonando, e Kagome sendo aprisionada e selada, tomou conta de minha mente. Ainda me perguntei porque salvei aquela criança e sempre que tenho a possibilidade, me afasto do meu irmão e venho ver os descendentes daquela criança.
Ao olhar para a direção oposta, percebi um movimento nas sombras, e uma sensação de desespero tomou conta de mim ao ver o cabelo prateado atrás de mim e a expressão de raiva do meu irmão.
— Então isso é o que estava escondendo todos esses séculos — Ele disse sem emoção, e meu corpo congelou.
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Acordei com um grito e continuei gritando. Alguém me amarrou a uma cama, e havia marcas de queimadura na parede, marcas que não me lembrava de ter feito. Também não me lembrava das paredes nem do quarto.
— Levi? — Spike disse aliviado ao me olhar, me abraçando. — Fiquei tão preocupado com você quando ouvi seu grito do lado de fora de casa.
Spike soltou as amarras que me prendiam, e eu sentei-me na cama, tentando entender o que havia acontecido. Olhei ao redor do quarto, tentando reconhecer o ambiente, mas tudo parecia estranho e fora de lugar.
— O que aconteceu? — perguntei, minha voz ainda trêmula.
Spike suspirou, preocupado, enquanto eu tentava juntar os fragmentos de memória. A lembrança das chamas, das paredes desconhecidas e da sensação avassaladora de poder ainda ecoava em minha mente.
— Você estava em algum tipo de transe, gritando e manifestando magia de uma forma que nunca vi antes. — Spike explicou, preocupado. — Parecia que algo dentro de você estava fora de controle.
Eu senti um calafrio percorrer minha espinha, tentando assimilar a ideia de que algo dentro de mim estava se manifestando de uma maneira desconhecida e perigosa.
Engoli em seco ao ver Ciel atrás dele, que me olhou com uma expressão culpada.
— Spike, pode me trazer um copo d'água — pedi, e vi ele levantar para ir pegar o copo. — Ciel, eu sei agora.
Ciel voou na minha direção e começou a se desculpar imensamente.
— Eu juro que eu queria contar, mas ele me fez jurar em meu nome — Ciel disse com os olhos brilhantes pelas lágrimas.
Spike retornou com o copo d'água, entregando-me com cautela enquanto eu encarava Ciel. Respirei fundo, tentando conter as emoções conflitantes que surgiam dentro de mim.
— Ciel, entendo que fez um juramento, mas precisamos lidar com isso juntos agora. — Falei, buscando uma forma de compreensão quando Spike disse que iria avisar os outros e saiu do quarto. — O que está acontecendo comigo?
Ciel, ainda visivelmente abalado, começou a explicar sobre que o bloqueio e selo que Natsuls colocou em mim e transferiu toda a minha essência e alma para o corpo de uma criança que iria morrer. Enquanto ele falava, senti a complexidade dessa nova realidade se desdobrar diante de mim.
— Vamos deixar isso para depois, me prometa que não vai contar nada ao Natsuls. — Concluí, olhando para ele com cautela. — Pelo menos até voltaremos para a cidade.
— Eu...prometo — Ciel respondeu.
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Gostaram?
Até a próxima 😘
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