Capítulo 65 - Reuniões em todos os lugares.
Ao chegarem ao Império Central os Imperadores e Imperatrizes não deixaram de receber as boas vindas calorosas do Povo do Sol. Uma grande festa com muita comida aguardava cada um deles, não importava que cada um chegasse em um dia e que o intervalo entre eles fosse de três dias ou mais, a festa aconteceria initerruptamente até que todos estivessem recebidos muito de tudo. Florence encontrou o quarto com tudo o que precisava para cuidar de seu bebê recém-nascido, além de um enxoval completo mais duas babás e até uma amã de leite estavam a sua disposição. Ela estava irritadíssima por ter que fazer uma viagem cansativa dessas com seu precioso bebê, mas não poderia negar que tudo estava muito bem organizado. Evidente que quando Zahra questionou se as coisas estavam de seu agrado ela torceu a boca e arqueou a sobrancelha.
— Está aceitável.
A filha de Idris conhecia muito bem aquele tipo de olhar irritante de Florence.
— Entendo. – Zahra manteve a postura e o sorriso no rosto. — Caso precise de alguma coisa peça a uma das colaboradoras que estão a sua disposição. – As quatro moças estavam atras de Zahra com seus uniformes coloridos e finos, assim que foram mencionadas elas curvaram-se frente as duas e passaram para as costas de Florence.
Zahra não queria ficar muito mais tempo na presença da Imperatriz do Norte, outras pessoas mais interessantes e menos reclamonas estavam para chegar e tudo deveria estar perfeitamente organizado, sendo assim, com toda educação de que dispunha, a filha de Idris retirou-se da presença da Imperatriz.
As ruas de Vale do Ouro estavam repletas de cidadãos alegres, estava previsto para Estevão chegar no final da tarde e a boa música soava para todos que tivessem o bom hábito de a apreciar. No Palácio Central, Idris conversava com a Primeira Conselheira Priscila sobre os assuntos que seriam discutidos durante a Reunião da Cúpula, ela sabia que o assunto das sereias não era o único que deveria ser tratado e esperava ouvir a opinião de todos sobre os infortúnios de cada Império. Além disso Zahra havia proposto um novo projeto para acabar com o casamento forçado mencionando inclusive relacionamentos incongruentes com meninas e meninos menores de quinze anos. Idris não se opôs a esse projeto da filha, eles haviam falado sobre isso antes, mesmo que o projeto fosse apresentado com surpresa até para ele, ainda assim era algo que ele não poderia discordar e sabia que sua amada falecida esposa teria apoiado a filha com todas as suas forças. Zahra escolheu exatamente o momento de discussão sobre as sereias, um caso mais sério que o outro, a atenção seria dividida e ela poderia receber mais aliados estando do lado deles contra as sereias e trazendo eles para a votação de seu próprio projeto de lei.
Na manhã do dia seguinte A Imperatriz de Sunacai – Aurora, aportaria no Império Central e até o meio-dia do próximo dia Priyanka e Hathor deveriam chegar também e a festa nas ruas só aumentava e o povo sorria cada vez mais.
No final de seis dias todos os Imperadores e Imperatrizes estavam juntos no Palácio Central, assim como o Capitão Bragança e o Capitão Mitchell. Todas as firulas e comoções foram feitas para que o público pudesse ver, mesmo que as pessoas soubessem que os assuntos das reuniões eram sérios e decisivos as festas davam o tom de comemoração e ninguém pensava muito no que estava no por vir. Claro que depois falariam sobre aquilo durante semanas e até meses, mas no momento em que acontecia as pessoas só queriam saber de comemorar e que pensassem nas consequências e nos problemas para resolver depois. Havia quem dissesse que isso era errado e quem dissesse que isso era o certo e dos dois lados haviam pontos válidos, então cada pessoa podia optar pelo que bem entendesse fazer.
Na noite anterior a Reunião Oficial da Cúpula um jantar em homenagens aos Imperadores foi servido, todos estavam incrivelmente bem vestidos e sorridentes, com exceção de Florence que fazia questão de dizer a todo momento que para uma mulher na situação dela aquilo era praticamente um ultraje. O que Priyanka também concordou, era necessário que toda pessoa que parisse tivesse descanso e bom tratamento depois do parto, ao menos durante quarenta dias essa pessoa deveria ser poupada de estresse e de esforço físico e emocional. Florence ficou satisfeita por ter alguém que concordasse com seus argumentos, até mesmo quando a Imperatriz Aurora foi a seu favor ela ficou alegre.
Idris mantinha o rosto solene e deixava que ela falasse e falasse, não iria mudar o fato de que ela já estava ali.
— Devemos iniciar os assuntos importantes agora. – Foi Priscilla quem chamou a atenção de todos para si.
— Isso quer dizer que a minha saúde e de meu bebê não são importantes? – Florence disse para a pessoa ao seu lado, mas Hathor não quis ouvir.
— Os piratas são o principal problema de todos os Impérios, não há quem discorde disso. Muitos ataques aconteceram depois do ocorrido com aquele tal navio Alma Negra, os piratas encontraram coragem e todos que são pegos disseram que estavam sob o comando da capitã Jane, alguns mais fanáticos diziam que ela tinha voltado da morte e ordenava que eles atacassem em nome dela e todo esse tipo de baboseira. Os números de saques a navios de transporte e a cargueiros estão altíssimos. Até mesmo aconteceram diversos ataques aos nossos navios, não há mais o respeito em nossas rotas! – Nesse momento ela direcionou seu olhar felino para o capitão Mitchell. — O que houve com o medo que o Capitão do Rainha do Mar impunha aos piratas? Será que eles esqueceram o que acontece com quem se mete com a Marinha?
Os punhos de Johnn Mitchell estavam cerrados e se não fossem suas unhas estarem perfeitamente cortadas elas teriam perfurado a carne de sua mão. Ele não disse nada, tão pouco abaixou a cabeça, manteve firme seu olhar e Priscilla entendeu que ele tomaria as devidas providências.
— Nós da Ordem Imperial já estamos fartos de tamanha idiotice sob os nossos pés, estamos deixando a cargo de cada Império lidar da maneira como quiser com os piratas em suas águas, nós iremos apoia-los e supri-los com o que precisarem. Não deixem que eles cresçam mais e façam fama nos domínios de vocês.
— E sobre essa tal pirata? Essa Jane Sanches? – Foi Hathor quem perguntou.
— Já temos informações sobre o paradeiro dela. – Nesse momento os olhos de Priyanka se arregalaram, apesar de terem conversado um pouco antes, Priscilla não havia dito nada sobre isso à amiga. — O Alma Negra foi visto por um navio de pesca indo rumo ao nordeste, logo teremos detalhes da localização dele e...
— O Leste deve se responsabilizar. – Priyanka disse com voz firme. — O ataque ao navio na noite da festa foi feito em águas do Leste, a morte de uma dama da nobreza e minha amiga íntima – Nessa última palavra ela precisou forçar um pouco. — A morte de Anne Maud também foi feita no Leste e o pai dessa pirata também foi enforcado pelos oficiais do Leste, portanto quando a pirata Jane Sanches for capturada, assim como seu navio e tripulação, eu exijo que sejam todos levados ao Leste para que eu tome as providencias sobre o assunto.
Ninguém se opôs e ficou decidido que fariam isso. O importante era tirar do mar uma pirata que estava causando tanto barulho por ai.
— E sobre os meus assuntos? – Hathor levantou a mão direita. — O Exército Imperial precisa ir até o Oeste com mais pessoal. Há muito borburinho pelas cidades do Oeste, temo que eles estejam planejando algo contra mim.
— Que motivo eles têm para reclamar? – Priscilla tinha uma das sobrancelhas arqueadas. Pelos ouvidos de todos o Império Oeste era tão bom para se viver quanto o Império Leste. Mal sabiam eles que Hathor omitia a maior parte das confusões. O que na verdade todos ficavam sabendo, claro.
— Baboseiras sem fundamentos. – Ele bufou. — Estão inventando sobre eu não ser um bom Imperador, sobre fome e doenças que não existem e sobre eu não ser a favor dos estudos e essas coisas cientificas.
Alguns se entreolharam, não parecia serem baboseiras, na verdade.
— Entendo. – Priscilla disse. — E qual o fundamento que eles têm? Já houve alguma formalização?
— Sim! – Ele bateu com ambas as palmas na mesa. — Estão montando algum tipo de conselho secreto, aqueles bárbaros estão se unindo contra mim debaixo do meu nariz e eu não consigo encontra-los! Preciso de mais homens para caça-los pra mim.
— Entendo. – Priscilla fez algumas anotações. — Mandaremos pessoas para averiguar sobre isso. Se houver algum atentado contra um dos Imperadores será motivo para outros acharem que podem também.
E se os nobres e importantes homens e mulheres se encontravam com muito luxo no Império Central, o mesmo podia-se dizer do outro lado da moeda no Império Sul. Com igual importância no meio do tráfico, crime e dinheiro sujo Samuel recebia na Mansão de Markus, que agora era sua, um grupo ilustre de convidados. O mais interessante é que ele mesmo não havia convidado nenhum deles, mas aquela que fez o convite e marcou a hora e data não seria contrariada por este humilde servo de seus desejos. Madame Falcão seria última a chegar e quando o fizesse tudo deveria estar perfeito a altura de seus gostos.
— Seja bem-vindo, Seu Lucque. – Samuel estendeu a mão para cumprimentar o homem que faria negocios no lugar de Benjair.
Lucque Carneiro apertou a mão dele com força, ambos pareavam a idade com pouco anos de diferença e como novatos nos assuntos obscuros deveriam se apoiar.
— Sua casa é muito bonita - Lucque disse querendo agradar.
Samuel apenas concordou passando o olho pelo lugar. Não havia escolhido nenhuma flor que estava ali, o que não era de Markus foi mandado colocar pela Madame e se a casa fosse sua mesmo, metade daquilo tudo estaria pegando fogo no pátio da fazenda e a outra metade teria sido vendida e o dinheiro seria usado em coisas mais uteis do que anéis de guardanapos.
De modo a fazer o convidado se sentir mais à vontade, Samuel destinou a ele um dos melhores quartos e pediu aos colaboradores que lhe servissem porções generosas de comida enquanto ele quisesse comer. Evidente era que Samuel não entendia muita coisa da hospitalidade dos grã-finos e tentava a todo custo compensar a falta de modos chiques com a comida de excelente qualidade da fazenda, Lucque não acho de todo ruim, as vezes estranhava o modo bruto com o que o outro levava as coisas e até estranhou o porco assado com cabeça e tudo por cima da mesa, mas também não era alguém que se queixasse desse tipo de coisa e sabia que com o tempo tudo aquilo seria trivialidade.
Os dois passaram três dias com o tempo sendo ocupado em serem agradáveis um com o outro, o pessoal da fazenda foi todo instruído a se dar bem com o pessoal de Lucque e pouca coisa saiu errado. Talvez os dias pudessem ser calmos assim afinal, mas ninguém sabe o que o amanhã pode oferecer realmente. Formalidades atrás de formalidades, palavras educadas, bebidas e charutos, assim foi passado o tempo desses dois homens. Não havia nada o que eles pudessem decidir ou debater ou fazer qualquer coisa por eles mesmos. Tudo que era palavra e ponto final viria daquela mulher e ela ainda não havia chegado. No final do terceiro dia Samuel já não aguentava mais sorrir, queria ir pra roça e dar uma olhada no seu pessoal mais de perto, dar uns gritos, andar a cavalo e relar numas moças bonitas por ai, mas tinha que ficar ali pajeando aquele engomadinho. Lucque não pensava diferente, sentia falta dos banhos quentes com aromas de baunilha, das sopas menos encorpadas e do vento limpo sem cheiro de bosta de vaca ou capim molhado, isso sem contar os mosquitos que o picavam sem piedade, já não tinha nenhuma parte de seu corpo livre daquelas picadas horríveis.
Quando o sol do quarto dia da visita chegou ao meio do céu, os dois ainda não haviam se visto. De modo discreto, mas perceptível, negaram o desjejum juntos e cada um por sua vez deram motivos para não comparecerem ao mesmo ambiente até a hora do almoço.
— Desculpe a ausência na parte da manhã, meu senhor, eu estive ocupado com muitos papeis. - Lucque tentou fazer sua melhor expressão de mentiroso.
— Não tem problema nenhum Seu Lucque, eu também tive que resolver uns pobremas por aí. Tá tudo certo.
Lucque torceu o nariz, o modo como Samuel dizia o seu nome já o havia irritado, era como se ele chamasse um cachorro com o nome Luke ou coisa assim e aquele jeito de falar tão caipira e arrastado já fazia seu ouvido doer.
— A carne está muito boa. - Lucque disse tentando ser agradável.
— Mirian e muito boa na cozinha.
Silêncio...
O que os unia ali não era afeição um pelo outro e isso já havia ficado evidente. Tudo até aqui não servia de nada de ELA não estivesse presente para tomar as decisões. Por sorte, após as dezesseis horas, foi anunciado para toda a fazenda que Madame Falcão havia alcançado a estrada e já passava o limite do portão.
— Ela está aqui! - Disse Samuel levantando da cadeira do escritório num rompante.
— Finalmente! - Lucque estava igualmente animado.
Ambos foram até a entrada principal da casa onde duas fileiras dos bem vestidos empregados ladeavam o caminho que ligava a estrada e a escada casa. O sol estava poente e ainda estava quente, mas o suor não era apenas pelo calor.
A porta foi aberta devagar e o condutor altivo pegou uma mão enluvada de tecido preto que foi estendida para frente. Qual o tamanho daqueles diamantes? Sabe-se lá! Havia pelo menos dois anéis enormes naquela mão e as pedras brilhavam em contato com o sol. Antes de ver o rosto, ela jogou graciosamente os pés com sapatos de bicos finíssimos incrustrados com pedrarias vermelhas e verdes e o salto faria qualquer modelo da época recear andar. Os homens tinham seus pomos de adão subindo e descendo e as mulheres apertavam as mãos frente ao corpo. Finalmente apareceram seus cabelos, diferente do que as próprias moças que trabalhavam para ela, Madame Falcão tinha os cabelos presos num coque alto e fino, castanhos amendoados, a nuca era esguia e não havia nenhuma mancha sob seu colo bastante aparente. O rosto era coberto por maquilagem, mas não era pesado ou feio de se ver, ao contrário, mãos de artista deviam ter contornado seus lábios com aquele batom carmim e as mesmas mãos deviam ter delicadamente depositado o pó compacto e o rouge em seu rosto, da pele dela o cheiro da essência chegava às narinas mais próximas e era forte e impactante, como entrar em um luxuoso bordel.
Madame Falcão deu um passo a frente e só então o seu rosto pode ser devidamente apreciado. E que belo rosto! Traços marcantes, olhos afiados que faziam os corações baterem forte, de medo, seus lábios nem tão grossos e nem tão finos estavam precisamente colados um no outro e talvez a sua voz fosse parecida com o soar de uma víbora, mas ela não disse nada. Foi recebida pelos dois homens que a aguardavam, os empregados tinham a boca fechada e os olhos virados para baixo, vez ou outra deixavam a curiosidade levanta-los para ver a mulher passar. Até seu jeito de andar era imponente e durante as conversas na cozinha todos falariam da estranha força que aquele olhar tinha fazendo-as se recolher a sua própria insignificância quando vistos pela Madame Falcão.
Ela passou por todos sem olhar para nenhum dos empregados e sabendo onde ficava cada coisa foi em direção ao escritório principal da casa. Obviamente que ela não precisava de nenhum convite. Os dois homens caminharam atrás dela dizendo o quanto ela estava maravilhosa e o quanto eles estavam felizes em vê-la e alguns empregados iam atras e outros deixaram os ares saírem finalmente das bocas e tonaram suas posições pela casa. No escritório Madame Facão respirou fundo antes de ir em direção a mesa principal, passou a mão pela poltrona que era de Markus e aspirou a lembrança do cheiro dele olhando para o assento. Lembranças deliciosas em sua mente. Ela sentou-se ali, cruzou as pernas para frente e ficou olhando entediada para os dois parados feitos sacos de estopa.
— Falem. - A voz daquela mulher era de arrepiar todos os pelos do corpo. Realmente como uma víbora!
— Si-Sim, senhora! - Lucque e Samuel responderam juntos.
A partir os dois revezaram para contar a ela sobre o que tinham feito até aquele momento, o que a deixou ainda mais entediada. No entanto, como uma mulher de negócios, era preciso que ouvisse tudo atentamente e que apontasse todos os erros que aqueles dois haviam cometido. Orçamentos, planos para a rede de tráfico de ilícitos, compra de novas terras e estabelecimentos.
— Eu devo dominar toda essa área logo, soube que o Barão de Banduque teve intenção de comprar as terras mais ao leste daqui, Samuel, você deve intercepta-lo e comprar essas terras em meu nome. Deixem-no saber que você está sob meu comando. - Ela falava olhando para eles enquanto eles olhavam para o chão. — Dois navios de cana de açúcar sairão amanha do porto Central para o Norte, mande cinco navios piratas sob seus comandos.
— Sim, senhora!
— Há um novo bordel recrutando moças por estas bandas, mande queimar e leve as meninas mais jovens para o meu na Cidade Principal. As feias você pode vender como Benjair fazia. Você tem a lista de compradores que te passei, certo?
— Sim, senhora! - Foi Lucque que respondeu.
Madame Falcão queria bocejar e esticar as pernas, mas manteve os olhos em todas as linhas dos contratos que estavam sob sua mesa e sua postura nunca mudou para menos do que perfeita. As horas no escritório foram árduas para colocar tudo dentro dos conformes e os dois homens respondiam apenas o que ela os perguntava.
— E por último, - Ela disse a certa altura da noite. — Onde está a mulher que matou Markus?
Os dois homens arregalaram os olhos "Mas o que?" estava estampado na cara de um "Por que isso agora, tão de repente?" engasgaram e sem ter uma resposta a mulher retomou a pergunta.
— Não me digam que a mataram sem a minha permissão? - A sobrancelha dela se moveu um pouco e isso já causou arrepios em Lucque que ouvira muitas histórias sobre o que a mulher fazia com quem a desobedecia.
— Na...na verdade, senhora, - Lucque foi quem criou coragem para falar primeiro. - Nós... a gente não sabe onde ela está.
Madame Falcão que até o momento tinha os olhos sob os papeis deixou-os sob a mesa e juntando as mãos passou a olhar para os dois homens a sua frente. Puxou o ar como se ele fosse feito de ferro.
— Entendo que ela não deve ser fácil de pegar, afinal conseguiu acabar com a vida de um dos maiores nomes no nosso meio. - Uma pausa. — Mandarei uma frota inteira para pegá-la se for necessário. Bem, já que ela não esta em uma cela nesta fazenda aguardando que eu a esfole, onde ela está então?
Os dois continuavam ombro a ombro sem dizer nada. Lucque deu um leve cutucão em Samuel, ele já havia falado antes, agora que o outro dissesse alguma coisa.
— Não sabemos. - Samuel não iria fazer rodeios.
Para quem já esteve à beira de um precipício, ou na beirada de uma montanha muito alta sabe como é a sensação do medo de cair lá de cima, assim que os dois se sentiram naquele momento, na expectativa do empurrão lá para baixo.
Madame demorou o olhar sob ele durante não mais que três segundos.
— Vocês dois estão onde estão por indicações de pessoas que eu confiei. Não as façam pagar pela incompetência de vocês.
Eles tiveram o ar preso em seus pulmões.
— Em três dias eu quero saber onde essa maldita Jane Sanches está.
— Sim, senhora. - Eles disseram com a pergunta "Como vamos fazer isso?" presa na garganta.
— Se a Marinha Imperial a tiver antes de mim, bem, não vai ser nada agradável. - Ela voltou o olhar para o papel a sua frente. - Saiam.
E eles saíram sem dar as costas a ela.
Uma mecha do cabelo havia se desprendido de seu coque sem que ela percebesse e caiu sob seus olhos, os dedos longos a colocaram para trás e a ajeitaram de volta. Memórias dela junto de Markus por todo aquele lugar, ela não relaxou na poltrona mesmo estando sozinha, havia uma caneta em sua mão e ela assinava alguns papeis.
Silêncio.
— Aaahhh! - Papeis e tinta espalhados pelo chão, cabelos bagunçados e a respiração ofegante. — Maldita pirata filha do inferno!
As mãos foram levadas ao rosto, unhas longas pintadas de vermelho, olhos borrados e batom fora do lugar.
— Eu vou arrancar as suas tripas com as minhas próprias mãos!
Num quadro pendurado na parede Markus a encarava, os passos foram arrastados até lá e ela se jogou na parede ansiando abraçar o homem na tela.
— Eu prometo a você que a matarei sem dó nem piedade, meu querido Markus, não restara nada dela para trás.
Enquanto Madame lamentava alguém bateu aa porta e entrou sem esperar que ela atendesse. Ela direcionou um olhar de fúria para quem ousava interromper seu momento de desabafo, mas sua expressão mudou quando viu quem era.
— Olá, minha queria Diana. - A voz feminina fez cócegas em seus ouvidos.
Madame Falcão, não, Diana correu para os braços abertos da mulher próximo a porta e agarrou seu corpo num abraço apertado.
— Quando chegou?
— Agora mesmo. - Ela acariciava seus cabelos colocando alguns fios no lugar.
Diana queria dizer mais alguma coisa, mas um nó veio em sua garganta e lágrimas caíram de seus olhos.
— Eliza, eu senti tanto a sua falta!
— Eu também, minha Diana, mas agora estou aqui e não vou a lugar nenhum.
Eliza deixou que ela chorasse um instante e depois passou a mão em seu rosto separando fios de cabelos das lágrimas.
— Aqueles imbecis não sabem onde ela esta, aquela maldita que arruinou com a vida de meu Markus.
Eliza suspirou.
— Já te disse que eu cuidaria desse assunto para você, não disse? - Eliza segurou o rosto dela em suas mãos. - Não se preocupe mais com isso.
Os olhos de Diana estavam marejados e avermelhados, mas ainda assim contentes.
— Onde ela está, Eliza?
— Já tenho um navio em seu percalço, logo ela estará aqui.
— Eliza. - Diana aconchegou-se no abraço dela mais uma vez.
Em alto mar o Alma Negra navegava em águas tranquilas, já era manhã e em menos de meio dia iriam alcançar as águas da Ilha Esmeralda.
— NAVIO A VISTA! - Gritou o homem da gávea.
— O QUE? - Theodora foi a primeira a averiguar.
Com a luneta na mão ela buscou no mar onde estava o navio e seus olhos não poderiam estar mais abertos.
— PUTA QUE PARIU! - Ela saiu gritando e arrebentando com tudo pela frente. - JANE! CAPITÃ!
— O que foi? - Jane surgiu da parte inferior do navio com Simon e Victhor ao seu lado.
— Jane! - Theodora a segurou pelos ombros. — É A PORRA DO RAINHA DO MAR!
Com a luneta em mãos, na amurada do navio, Jane viu o enorme navio branco com a bandeira da coroa arqueada no mastro. Na movimentação que ele estava, ainda que houvessem muitos homens correndo de um lado para o outro, ela viu o homem de pé. Seu uniforme impecável, seu rosto rígido, apático.
— A que velocidade estamos? - Ela perguntou.
— Seis nós. - Victhor quem respondeu. Havia verificado há pouco tempo atras.
Jane abaixou a cabeça num pensamento rápido.
— PYRA, DIRECIONE O NAVIO! - Simon gritou para a mulher ao leme. — TIRE ESSA DROGA DA ROTA DA ILHA, AGORA!
— Abram todas as velas auxiliares, não importa para onde, vamos sair daqui. Ele não pode saber da Ilha.
Will e Lantis chegaram juntos próximos deles.
— O que está acontecendo? - Foi Will quem perguntou, Lantis apenas encarava Jane que olhava fixamente para o mar.
— Nos encontraram. - Victhor respondeu.
— Merda! - Will encaixou a mão na amurada forçando os olhos para ver algo no mar. — Vamos conseguir escapar deles, certo? Esse navio é muito rápido, não é?
Jane respirou fundo e olhou para Will.
— Não mais do que o Rainha do mar.
Não havia ninguém no Alma Negra que não conhecia as histórias do Rainha do mar, até mesmo Darren que era novato por ali teve o suor gelado escorrendo pelas costas quando soube quem estava no percalço do navio.
— O que podemos fazer agora é tira-los da rota da Ilha.
Will abriu a boca para dizer alguma coisa, mas teve o braço segurado por Victhor que balançou a cabeça em negação.
Simon tinha Jane ao seu lado, ele olhava para a Ilha ficando para trás. Uma correria doida no navio, velas abrindo, cordas sendo puxadas e amarradas, homens tirando barris do navio e jogando-os ao mar.
Jane segurou a mão de Simon e a apertou.
— Eu sinto muito, Grandão.
A Ilha Esmeralda ia ficando para trás devagar, dali onde estavam era quase possível ver a praia da Ilha, com olhos bem treinados podia-se ver a pequena trilha mata adentro, que depois de meio dia caminhando dava numa bifurcação, e se seguindo pelo caminho certo daria num campo de alfazema. Um campo vasto e cheiroso cuidado por mãos habilidosas, onde crianças pequenas corriam segurando seus chapéus e donde Ana tirava flores para a mesa de café todos os dias pela manhã.
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