Capítulo 57 - Aconteceu por ai.
Olá Pessoal!
Mais um capítulo aqui :D
Falta pouco para o Alma Negra voltar a aparecer. Espero que aguardem mais um pouco. Bem, vamos lá!
Obrigada, votem e comentem por favor <3
As pessoas no Império Oeste estavam insatisfeitas fazia algum tempo. Já era de conhecimento do Imperador e do Conselho do Oeste a situação inflamada das ruas desde a Cidade da Areia Branca, capital do Império, até as ruelas mais pobres. O arranjado alvoroço acontecia em segredo e mais ao fim do dia quando os mercantes fechavam seus estabelecimentos e dirigiam-se furtivamente para as casas onde reuniões importantes aconteciam para discutir quais mudanças pontuais gostariam de imprimir dentro do Império Oeste e o que fariam para isso. Cada reunião tinha o dia e o local certo para acontecer e ninguém deveria comentar sobre as pautas com outra pessoa de fora desse motim, dessa forma o Imperador não ficaria sabendo e os guardas seriam evitados de entrar quebrando tudo e prendendo a todos, como já aconteceu antes.
Para encobrir um pouco os acontecimentos, diziam que as reuniões eram clubes de leituras, de estudo, de receitas, de crochê, a maioria das pessoas comuns sabiam que aquilo era balela, mas ninguém dizia nada já que daquelas reuniões saiam muitos benefícios para eles mesmos.
Nas reuniões, além de discutirem sobre os prejuízos de um Imperador tão débil – segundo eles, também falavam sobre as famílias que mais precisavam de ajuda e o que poderiam fazer para suprir um pouco da necessidade que cada uma passava e que àquele no poder ignorava acreditando que tudo em debaixo das suas asas estava às mil maravilhas. Não havia nenhum tipo de empréstimo ou cobranças entre eles, eram feitas trocas de mercadorias para conseguirem doar pão, cereais e alguns pedaços de tecidos para confecção de roupas. Era assim que funcionava: um grupo de mulheres em sua maioria ficava numa antessala com a mão na massa – as vezes literalmente, enquanto um outro grupo pouco mais discreto fazia as conversações de cunho político.
— Ele não pode nos impedir! – Um dos homens jovens bateu com os punhos sob a mesa. — Ele não pode nos excluir dessa maneira. – Ele recebia olhares atenciosos em sua direção. — Sua Alteza pode ser rico, ter grande influência sobre o Exército, mas nós que somos o Império Oeste, caramba! O que ele tem é apenas um título que poderia ser de qualquer outro. – Ele estreitou os olhos sobre os homens que estavam ali. — É um absurdo ele nos negar o pão sob a mesa enquanto ele se empanturra com todo tipo de coisa. Como ele pode nos negar o progresso e o conhecimento enquanto ele tem estudiosos e cientistas à sua disposição num estalar de dedos? "O que ele ganha com isso?" Vocês podem me perguntar, - Ele pôs a mão em punho frente ao próprio rosto, os nós esbranquiçados pela força. — tenho certeza que ele ganhará alguma coisa com isso!
— Mantenha a calma, Esdras. – Disse um outro homem, aparentando os seus cinquenta e poucos anos, ele tinha os lábios rachados e a pele ressecada. Devia ser um dos homens que trabalhava no deserto. Andou até o mais novo de um jeito cansado. — Eu sei bem o que ele ganha com isso, todos nós sabemos que a sabedoria é luz que nos liberta das trevas, abre nossos olhos e nos mostra caminhos verdejantes e prósperos. Se nós, pobres trabalhadores, tivermos acesso a isso e desejarmos isso, quem fará todo trabalho pesado para o Imperador? – Ele não tinha uma expressão áspera e nem amargura em suas palavras, era como se contasse o óbvio sem grandes emoções. — Para o Imperador somos como bois obedientes trabalhando em seus campos, ele nos dá o mínimo para mastigar, tira de nós os nossos jovens mais fortes para o trabalho no Exército e nos mantém atrás de seus mourões para que não saibamos como é no pasto do vizinho. O Imperador não é tolo, ele sabe como agradar alguns de nós com suas festas de boa comida e vinho a vontade, a diferença é que enquanto nós comemos disso uma vez a cada ano, há aqueles que se desfrutam da fartura todos os dias.
— Nós estamos aqui por isso! - Esdras, ao contrário do outro homem, tinha força na voz e suas palavras resvalavam energia jovem. — Temos de alertar o povo, mostrar a eles que a vida pode ser mais que migalhas em dias de sábado. Eles não têm que se contentar com tão pouco, o Império Oeste tem muito a oferecer para todos.
— Cuidado com o que diz, garoto! – Um dos que ouviam Esdras esbravejar o alertou. Não por maldade, mas por medo.
Esdras deu de ombros.
— É a verdade, Adjo! – Ele ergueu os braços em direção ao mesmo homem de pele preta e lustrosa, as marcas em seu rosto evidenciavam o trabalho duro embaixo do sol. — Ele nos mantém presos envolta de seu palácio, mas quem sabe o que mais tem por ai!
— Ele está falando sobre a Montanha Seca de novo. – Adjo apontou para Esdras enquanto falava aos outros. — Ninguém nunca...
— Não me venham com essa! – Esdras não deixou que ele continuasse. — Que ninguém nunca retornou de lá, sim é verdade, mas quem vai querer voltar para aqui se lá é tão bom quanto dizem que é?
Aquele mesmo homem mais velho e cansado tocou o ombro direito de Esdras e sorriu.
— Antes disso temos de mostrar ao povo que é possível sair das asas do Imperador. Não adianta levar os homens e mulheres deserto a fora sem saberem como viver lá fora.
— As linhas de pesquisas não param, há quem queira financiar as expedições e buscas pelo deserto, mas o valor a ser pago pelos impostos é tão alto que muitos desistem. – Essa era uma voz conhecida, veio de um rapaz de cabelos ruivos que estava ao canto.
— Exatamente, Sr. Kurthler. – Esdras continuava em pé ao redor da mesa, mesmo que todos já estivessem sentados a um tempo. — Eles preferem ganhar dinheiro e dar suas festas enquanto somos nós que carregamos baldes de estrume e partimos pedras. A vida é mais que limpar bosta de gado o tempo todo!
— Eles têm tanto e outros tão pouco. – Adjo puxou uma cadeira e sentou-se ao redor da mesa de madeira puída.
— Mas se o povo não entender que são explorados, ninguém vai se juntar a nossa causa. – Disse Esdras.
Podiam dizer por aí, quem quisesse, que o Império Oeste era rico e próspero, o que de fato não seria mentira se a riqueza não fosse toda concentrada nas mãos de uns poucos enquanto uma grande maioria tinha que se esforçar o triplo para conseguir algum alimento sob à mesa.
— Esse é um dos motivos que eu estou aqui. – Phillip tinha aquele mesmo sorriso entusiasmado, os cabelos recém cortados não caiam mais sob os olhos, ao invés disso, estavam alinhados e cheirosos. — Vocês devem unir-se aos pesquisadores, há dois grupos contra as ideias mesquinhas do Império quanto na verdade deveríamos ser um só. Nós, digo porque faço parte também, queremos mais aprofundamento e investimentos em nossas pesquisas, que liberem os campos para estudos, tem muita coisa naquele deserto que poderia ajudar na sobrevivência do povo mais pobre.
— Não é só isso! – Esdras pareceu um pouco ofendido pela frase simples que foi dirigida aos seus interesses. — Os nobres, os senhores de grandes nomes têm isenções nos impostos pagos ao Imperador e ainda tem o direito de cobrar impostos dos colaboradores que trabalham em suas terras. Você acha isso correto? Nós queremos pão sim, mas também queremos justiça!
— Ninguém deveria pensar que isso é correto. – Aquele mesmo senhor de andar cansado olhou para Phillip esperando sua resposta.
Todos sabiam da ligação de Phillip com a Imperatriz do Leste, podiam até não saber que eram considerados amigos, contudo, sabiam que ele passava mais tempo no Palácio de Cristal do que nos mares do Leste à procura de sereias, ou seja, Phillip não era alguém pobre e sem influência.
— Mas é claro que não acho correto. – Ele sorriu como alguém que chegara ao ponto alto da discussão. — Podemos formar uma aliança. – Phillip Kurthler expos o motivo que o levara àquela reunião.
Quando Esdras abriu a boca para responder alguém bateu à porta. Todos alarmaram-se e preparam para enfrentar se fosse algum inimigo. O senhor mais velho chegou até a porta em passos curtos e silenciosos, os outros mantiveram o olhar pregado na peça de madeira, as armas já em punho – desafortunados, tinham apenas enxadas e pedaços de pau, ele abriu somente uma fresta e viu um jovenzinho magricela com um bilhete em mãos.
— Senhor Khris, tenho uma mensagem para um de seus convidados.
Khris, o velho de palavras monótonas e andar vagaroso, pegou o pedaço de papel da mão do menino e por ele ainda ter ficado esperando algo, Phillip pegou duas moedas do bolso e jogou para o velho que as entregou ao menino. Khris viu a coisinha magra e esfarrapada sumir junto a poeira de areia.
— O que é isso? – Esdras queria saber, já estavam relaxados agora.
Khris leu o nome para quem o bilhete fora endereçado e entregou à Phillip.
— Para mim? – Ele surpreendeu-se, quem saberia que ele estava ali?
Ao desembrulhar o papel viu que não era de fato o bilhete verdadeiro, mas sim a notificação que algo havia sido entregue para ele na hospedaria em que estava.
— Não seria bom que soubessem que o senhor esteve aqui. – Foi Khris quem disse, ainda com a mesma voz pacifica e calma demais.
— Não direi a ninguém, para todos os efeitos, ainda estou numa das Ilhas Flutuantes próximas. Eu vim até aqui sozinho de barco, não se preocupe.
— Sobre essa tal aliança, - Esdras estava interessado. — O que você ganha com isso?
— Liberdade para minhas pesquisas. – Phillip manteve o rosto sério. — Tenho recebido ajuda do Império Leste para os assuntos com as sereias, no entanto, eu preciso do aval do Imperador para avançar os estudos em um certo lugar que é do domínio do Oeste.
Esdras arqueou uma das sobrancelhas e pensou num instante pequeno.
— A Ilha das Bruxas. – Esdras concluiu.
— Exato. Toda vez que chego à ilha e começo a avançar nas coisas por lá chega alguma embarcação e diz que por Ordem do Imperador eu devo parar e eles queimam e jogam tudo fora.
—Aquele lugar é amaldiçoado. – Khris disse olhando para Adjo. — Lembra do que Olivia disse quando passou perto de lá? Aquele lugar não presta.
— Quem é Olivia?
— Filha de Khris. O marido dela era um curioso e uma vez foram nadar perto da Ilha, disseram que ouviram coisas estranhas e desceram na praia. Olivia disse que ficou esperando enquanto o marido ia mais adentro, depois de um tempo ele voltou com os olhos arregalados que não conseguiam se fechar, a beiça estava pálida e ele havia perdido a voz. Demorou uns três meses pra ele se recuperar e contar o que havia visto. – Esdras contou com voz baixa.
— E o que foi? – Phillip estava muito interessado.
— Uma sereia de cabelos e pele negra. – Khris finalmente mostrou algum sentimento em sua voz. Era medo. – Ele disse que a sereia tentou devorar sua alma, mas poupou sua vida sabe-se lá porquê.
—Uma sereia de cabelos e pele negra! – Phillip deixou transparecer seu entusiasmo. – Então é verdade!
— O que? Já ouviu falar dela? – Esdras queria saber.
— Não muito, - o sorriso de Phillip tomava quase todo seu rosto. — De acordo com os meus estudos, - Ele tirou de dentro do bolso da calça um pequeno caderno e um lápis com a ponta quase no final. Ele fez uma linha no meio da folha e começou uma pequena lista. – Sabemos que existem dois tipos de sereias...
— Sabemos? – Foi Esdras.
— Existem? – Foi Khris.
Adjo continuou no mesmo lugar enquanto fazia sinal com a cabeça para outros três homens que estavam ali, ele queria dizer "Prestem atenção."
Phillip fez um sinal do ar, girando os dedos como para prosseguir seu raciocínio.
— Sim, sabemos e sim, existem, ainda que somente tenham duas pessoas que as viram em todo esse tempo. – Ele voltou o lápis ao papel. — Temos as sereias de pele clara, cabelos claros e olhos azuis. – Ele escreveu de um lado. — E temos as de pele clara, cabelos escuros e olhos castanhos.
— Dessas eu nunca ouvi falar. – Esdras cruzou o braço frente ao corpo, Khris assentiu para ele concordando.
— E temos essa terceira sereia, - Ele fez um risco agora na horizontal. — Cabelos pretos, olhos pretos e pele preta.
— Não seria uma Unagui? – Esdras referia-se àquelas criaturas que certa vez atacaram Markus com seus gritos de horror.
— Muito provável que não. As Unaguis apesar de terem sido vistas poucas vezes não são consideradas raras, apenas não saem muito na superfície. Além disso, elas não são sereias, elas são parecidas com enguias.
— Eu já vi uma morta na praia do Norte uma vez.
— Quando isso, Kris?
— Quando eu era jovem, ela pareceu ter sido morta por um arpão, tinha um corte no meio do peito.
— Elas passam pelo Norte duas vezes ao ano, para ter sido pega ela deve ter se perdido do grupo. O Norte é um Império frio, elas não ficam muito tempo por lá. — Explicou o estudioso do grupo.
— Então, essa sereia que o marido de Olivia viu... O que ela está fazendo naquela Ilha?
— Não sei, Esdras. Aquela Ilha tem muitos segredos escondidos que eu quero desvendar, mas pra isso eu preciso que o Imperador concorde com minha expedição, preciso de mais tempo naquele lugar e não somente alguns poucos dias.
Esdras e Khris se olharam como se combinassem algo entre si.
— Não vejo problema nessa aliança. – Khris passou a mão pelo rosto, já estava cansado.
— Também posso concordar com isso, desde que os grupos sejam devidamente apresentados. Não quero ninguém estranho no meio da gente.
— Feito. - Phillip estendeu a mão e Esdras a apertou.
Esdras e Khris continuaram no mesmo lugar com o grupo de homens ainda discutindo sobre os problemas dos menos favorecidos no Império Oeste, Phillip rumou para a hospedaria de onde havia vindo o bilhete e a carta original foi colocada em suas mãos. Era Priyanka lhe convocando às pressas ao Império Leste, ela dizia que Priya estava muito mal e não sabia se a pequena sereia iria sobreviver mais do que alguns dias se Phillip não voltasse logo para vê-la.
Foi logo depois que chegou ao Leste que Phillip encontrou Priya, agora como Ayra e conversaram com os oficiais da Marinha Capitão Henrique e Eric.
Dois dias depois que George foi morto em sua cela, foi anunciado que ele seria enforcado em alto mar. Evidente que uma pessoa não poderia morrer duas vezes, mas os oficiais do Exército não iriam deixar que as pessoas soubessem que um prisioneiro foi morto bem deixo de seus narizes. Sendo assim, o enforcamento aconteceu como uma lição dada aos piratas, já que todos ali sabiam que o homem era pai de Jane Sanches, a capitã do Alma Negra. Encontraram qualquer velho que fosse minimamente parecido com George e depois o corpo foi jogado no mar. Para este feito não foi pedido a concordância da Imperatriz do Leste e quando Priyanka tentou intervir já era tarde demais. Já não haveria o que ela pudesse fazer em todo caso, mas ela poderia ter evitado manchar o nome do Império Leste e deixar o seu próprio fora de atos hediondos que envolvessem assassinar pessoas inocentes. Mas tudo já havia acontecido e as pessoas do Leste já comentavam como a Imperatriz havia mudado depois que Khan havia sido expulso do Palácio de Cristal.
"E aquela tal sereiazinha dela ainda está lá. Acredita?
"Ué, não é ela a Imperatriz que está mandando todo mundo devolver as suas sereias? Ela deveria ser o exemplo primeiro."
"Ela se acha tão boa, mas não passa de umazinha igual todas nós. "
E riam alto, não importando quem ouvisse.
O Festival acontecera magnifico como sempre era, no entanto dessa vez sem que a Imperatriz aparecesse nenhuma vez, o que fez o povo dizer que ela estava envergonhada pelos seus atos. Quando perguntavam "Que atos?" uns e outros faziam questão de enumerar as falhas antigas da Imperatriz e somar a ela a sua própria dose de pontos e vírgulas.
"Ouvi dizer que daquela vez que a Ilha Flutuante do Arco do Leste pegou fogo foi por causa dela"
"Mentira? Jura? Que horror." – Risadinhas debochadas eram dadas por baixo das mãos cobertas de luvas finas brancas.
"Aposto que logo ela aparece grávida daquele tal Sr. Kurthler!"
"Já até pegaram os dois aos beijos nas escadas do Palácio de Cristal!" – As pessoas que falavam tinham maldade em seus corações, ignoravam o fato da Imperatriz não poder engravidar, da dor que isso causava a ela e falavam cada vez mais sobre amantes irreais.
"Não acredito!" – Mas na verdade acreditava.
"É verdade! – Sussurravam alto demais para que não fosse segredo. — Uma das colaboradoras do Palácio é prima de uma conhecida da minha irmã do meio e ela disse que já os flagrou mais de uma vez."
E mesmo que fosse tudo mentira, todos acreditavam.
O Garça Branca rumou do Leste em direção ao Império Central, o Rainha do Mar saia do Norte com o mesmo destino, assim como outros navios da Marinha Imperial. Eles tinham pouco conhecimento da nova missão, mas sabiam que se tratava de uma nova caça aos piratas, afinal se o Rainha do Mar estava envolvido, com toda certeza era esse o motivo principal.
O Rainha do Mar estava no Norte esse tempo todo com o capitão Mitchell auxiliando na adequação dos Sunacas no Império frio. Ele não poderia estar menos satisfeito com isso.
O famoso capitão do Mar era bom em caçar, capturar e enforcar piratas, essas missões diplomáticas não eram seu forte e ele já estava cansado disso. Se ele não fosse tão convicto em seguir ordens, ele já teria saído de lá há muito tempo. Seu navio ansiava pela velocidade da perseguição, seus olhos precisavam alcançar alguma bandeira pirata e mais do que tudo, sua consciência precisava aniquilar piratas para manter-se em paz.
Para sua sorte os piratas resolveram sair de seus esconderijos e ele foi chamado ao Império Central para receber a carta da missão. O que não deixou a Imperatriz do Norte, Florence, muito satisfeita, afinal, ter o honroso capitão Mitchell por sua conta era algo a se gabar. O oficial da marinha não perdia muito de seu tempo no castelo de pedras, ele preferia treinar ao ar livre ou caçar por lá, nesse interim, ele preferia muito mais a companhia dos sunacas do que da Imperatriz.
Ao contrário do que Florence previa, os Sunacas adaptaram-se muito bem ao norte, mesmo com os ventos frios ao pé da montanha eles não pareciam se importar. Não que ela não estivesse satisfeita com o serviço deles, mas a felicidade daquele povo selvagem – em suas palavras, a deixava inquieta.
As casas cinzas e sem graça que os nortenhos construíram para os sunacas logo estavam cobertas de ervas cheirosas, havia sempre boa música e eles davam-se muito bem uns com os outros e até com os próprios nortenhos. Ensinavam suas receitas, seu modo de cozer as carnes e de fazer o próprio couro. Aliás, foi a técnica de alçaria que os ajudou a passar pelo frio e não sofrer como a Imperatriz esperava. Em pouco tempo nortenhos e sunacas estavam misturados e pareciam viverem bem. Os Nortenhos diziam que a alegria daquele povo de pele cor de mel era contagiante e que os espíritos deles trariam novamente boa sorte para aquelas terras.
A vila dos sunacas logo estava mudada, o cinza deu lugar às flores de clima frio que foram cultivadas com a ajuda voluntária dos Nortenhos, os incensos cheiravam ao longe pelos caminhos e davam a quem se aproximasse a sensação de chegar à um lugar agradável e confortante, havia uma carreira de casas comuns ao Império Norte com seus blocos de pedras e madeiras de pinhos e em várias noites os sunacas se reuniam em volta da fogueira para comerem guizados e caldos quentes apimentados, cantavam, dançava, riam e beijavam-se. Eles gostavam muito de se beijar, era uma forma que esse povo tinha de demonstrar seu carinho com o outro e está equivocado quem pensar que eram beijos promíscuos. Pais beijavam os filhos nas bochechas, assim como faziam as mães, as tias e as primas. Eles abraçavam-se e diziam sempre o quanto um era importante para o outro e o quanto a força que tinham para sobreviver se devia a estarem todos juntos. Era assim no Império Sunacai e era assim na Vila dos sunacas, que mais tarde recebeu o nome de Vila Quente pela alegria que se sentia ao chegar lá.
Para Florence, o cúmulo foi quando a Imperatriz Aurora chegou à vila dos sunacas e foi recebida por eles - e alguns nortenhos, com ervas cheirosas, muita comida boa e muita música alegre. Aurora foi escoltada do pequeno porto que decoraram para ela até a vila onde o cheiro da carne cozida alcançava a estrada ao longe, a Imperatriz de olhar altivo dançava junto dos seus envolta da fogueira com seus cabelos ao vento brilhando a luz do fogo, seus pés descalços e um decote nada discreto. Apesar da natural sensualidade que envolvia Aurora, o que mais chamava atenção quando ela estava presença era a força de seu espírito. Algo de poderoso emanava dela e quem a visse não duvidaria de nenhuma palavra que saísse de sua boca. Aurora e seu povo tinham uma ótima ligação, ela não se colocava acima deles e sentava-se a mesa juntos dos seus como membro de suas famílias.
Florence não ficou muito tempo para recebe-la e sentiu-se ofendida quando Aurora negou ficar em seu castelo para dormir em uma das camas da Vila Quente.
Depois que Florence seguiu seu rumo foi que Mitchel finalmente apareceu para a Imperatriz de Sunacai.
Aurora estava ao redor da fogueira com suas duas feras, claro que elas acompanhavam a Imperatriz à todos os lugares. Ao longe uma delas farejou o cheiro do Capitão e quando ele saiu detrás de uma das casas Aurora não pode deixar de rir dele.
— Não é possível que estava escondido aí esse tempo todo.
— Vossa Alteza. – Ele saudou-a com formalidade. — Eu cheguei ha algum tempo, não quis interromper a conversa das duas honrosas senhoras.
Aurora segurou um pouco o riso entre os dentes. Sua aparência estava longe de ser honrosa naquela hora.
Ela deu espaço e John Mitchel sentou ao seu lado, as duas bestas rosnaram um pouco para ele, mas o capitão não se importou muito, devolvendo para elas um olhar firme. Homens e mulheres ainda dançavam e riam alto, bebida e comida eram servidas e a noite fria chegava com pressa, mas apesar do vento sibilar, ninguém se importava muito.
— As coisas estão indo muito bem por aqui. – Ele disse.
— Nós domamos feras e sobrevivemos à uma Ilha selvagem, acha mesmo que seria o Norte que nos derrotaria? – O sorriso de Aurora era algo lindo de se ver, a luz e o calor do fogo só aumentavam sua beleza deixando as maçãs de seu rosto pouco mais corada.
— Creio que não. – O capitão respondeu, deixando pouco a pouco a rigidez de seu rosto diluir entre goles de bebida. — O que é isso?
— Não me pergunte. – Aurora apenas bebia mais e mais. — Meu povo pode fermentar qualquer coisa, se estiver bom apenas beba e deixe os "o quês" de lado.
E assim Capitão Mitchell o fez, e sua língua parou de sentir o gosto pouco amargo da bebida depois da quinta caneca.
A lua não apareceu nessa noite, se estivesse lá veria homens e mulheres se divertirem juntos como irmãos, como amantes, como parceiros. Os sunacas eram uma só família e John Mitchel sentia-se bem ao lado deles.
— Eles me disseram que têm passado muito tempo por aqui. – Aurora cobria os ombros antes expostos com um casaco de pele. Era parecido com pele de urso, mas era bem mais avermelhado, provavelmente de um animal de Sunacai e vale ressaltar que ela mesma o havia caçado.
— Sim, - O capitão não era de sorrir, aquela expressão mais cálida em seu rosto era o máximo que ele poderia demonstrar de satisfação naquele momento, apesar de ser bastante tolerante à bebida, ele sentia seu corpo começar a ficar dormente. — São pessoas muito agradáveis. Não fazem perguntas demais, me deixam treinar no meu canto e permitem que eu sente à sua mesa no final de dia.
Aurora notou o estado quase ébrio do capitão e discretamente foram para uma das casas da vila, na qual Aurora sempre passava os dias enquanto ficava por ali. O espaço era bastante simples e haviam poucos moveis, no entanto o lugar era quente, aconchegante e tinha um cheiro de ervas frescas que inundava o ambiente. O capitão estudou o lugar antes de se sentir à vontade, a imperatriz não esperava menos dele e apenas riu quando percebeu que ele realmente inspecionava as coisas. As duas feras da imperatriz montaram guarda na porta, estavam de barriga cheia e dormiram tranquilas o restante da noite. Aurora não era do tipo que apreciava delongas, levou o capitão pela mão até o quarto, ficaram os dois apenas de roupas íntimas debaixo de um cobertor feito a mão pelos sunacas. O capitão deslizou a ponta dos dedos pelo ombro de Aurora e ela observava seus olhos.
— A senhora nunca me perguntou sobre minha família ou sobre outras mulheres.
— E deveria?
— Não. – Ele disse sem nem passar um minuto.
— Ótimo, eu não estou interessada em perguntar e o senhor, capitão, não está interessado em responder, parece que temos um acordo.
O beijo veio natural como se o fizessem todas as noites, ambos os corpos estavam quentes e desejosos um do outro.
Ao redor da fogueira os sunacas cantavam agradecendo aos bons espíritos pelas oportunidades, as boas e as que serviam a eles de aprendizado, serviam guisados, dançavam e contavam histórias sobre como os primeiros haviam dado lugar ao povo que hoje são os sunacas. Enquanto a lua ainda estava alta, eles ainda riam e pouco a pouco as casas iam se enchendo de gente alegre e de espirito renovado para o próximo dia. Os nortenhos que ficavam juntos por ali diriam aos outros no outro dia e nas outras semanas que viriam sobre como a energia do povo sunaca alimentava o corpo e os deixava revigorados para as batalhas do dia a dia.
Aurora e Mitchell ficariam um tanto mais acordados e iriam dormir bem mais tarde, de manhã ainda estariam abraçados como se fossem recém casados, tomariam café juntos e poucos dias depois viajariam cada um em seu navio para o Império Central onde o Imperador Idris os aguardava para mais uma reunião da Cúpula Imperial.
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