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Capítulo 30 - Império Norte


Enquanto Jane e o Alma Negra zarpavam da Ilha Espetáculo, do outro lado das águas, no porto principal do Império Central na cidade de Vale Dourado navios iam cortando as ondas para chegar e partir do Porto mais rico dentre todos os portos. O Imperador dizia que a primeira impressão sobre o Império Central tinha que ser impactante e como todos chegavam pelo mar os portos eram sempre bem adornados com grandes animais esculpidos em pedras, lamparinas com formatos de peixes para iluminar as ruas e muitos guardas com seus uniformes brancos impecáveis.

Idris dispensava bastante capital nos enfeites de todo Império e ninguém poderia elogiar pouco o bom gosto do Imperador.

Dali do porto principal partiam os navios encarregados do destino de cada um dos Imperadores, levando presentes, um punhado de guardas e marinheiros imperiais eles iam mar a dentro, barcos menores os acompanhavam até certo ponto do trajeto para fazerem escolta, tudo para evitar qualquer confronto com algum navio pirata.

A comitiva de despedida animava o porto já saudosa das festividades que as reuniões da cúpula proporcionavam, muitos fofocavam sobre as interações finais entre os Imperadores, principalmente os mau humores entre alguns e se perguntavam o que teria sido decidido durantes as semanas da reunião. Havia burburinho e especulações e nos próximos meses as notícias caminhariam com suposições sobre tudo.

O que era discutido durante a Cúpula Imperial ficava em sigilo do povo até que cada Imperador repassasse a reunião para os reinos de seu império e acertassem entre si o que fosse melhor a cada povo. Nada podia escapar já que as ideias propostas podiam ser negadas ou modificadas.

A viagem de volta tendia a ser mais cansativa que a da vinda já que a mente estava preenchida de obrigações e o corpo carecia de descanso depois das festas e solenidades sem fim. Desta vez o peso sobre os ombros dos Imperadores e Imperatrizes era um tanto maior, o assunto era unanime em todos os navios: O discurso de Priyanka, a Imperatriz do Leste. De fato, cortar interações com o Leste estava fora de questão para a maioria dos Impérios, já que ele provia a maior parte dos alimentos que eram comercializados. Mas retirar em apenas um ano as sereias das coleiras também era uma atitude arriscada.

O primeiro navio saído do Império Central chegou ao Império Norte, a Imperatriz Florence foi recebida com uma saudação simples por um pequeno grupo de pessoas, as flâmulas com o Dragão Coroado balançavam ao vento e o som das botas batendo na terra áspera ecoava pelo caminho. Haviam poucos cavalos que trotavam ritmados e uma leva de pessoas seguia-os rumo ao destino de Florence. Não que ela não fosse querida por seu povo – talvez ela não fosse mesmo, mas porque a maioria tinha trabalho a fazer e não podiam parar suas atividades. Florence não ficava chateada, o Norte vinha sofrendo terrivelmente com a "Peste Quente" e já não havia mais espaço para túmulos, a própria Imperatriz havia perdido os seus e lhe faltavam lágrimas para coisas tolas.

A Peste surgiu há alguns anos, iniciava com dores nas juntas e articulações, manchas vermelhas pelo corpo e uma febre altíssima. Em menos de quinze dias havia o óbito e ninguém sobrevivia. Phillip Kurtler havia sido chamado para o estudo do caso, mas interessava-se mais pelas sereias e dispensou o convite. Para sua sorte, e azar dos colegas de profissão que atenderam ao pedido do norte, todos morreram em menos de trinta dias.

O mar consumiu boa parte da região que hoje é o Império Norte, seu território é moldado por montanhas, penhascos, rochedos, cânions profundos e minas. Existem alguns vales e rios que contornam as montanhas e desaguam no mar como teias de aranha. O primeiro líder do Norte, antepassado de Florence, investiu arduamente na exploração das minas retirando carvão, pedras preciosas e o metal negro encontrado em abundância, aproveitou o vale e as planícies construindo casas e templos, o Vale do Silêncio abriga a maior parte da população de morada baixa do Império Norte, pode-se dizer que seria a Capital do Império. Há fortalezas em desfiladeiros, torres de vigias esculpidas nas montanhas e pontes de corda firme para a travessia por cima dos rios de água doce que interligam essas montanhas e facilitam a vida dos nortenhos. Os túneis do Império Norte eram muito famosos, assim como templos nas rochas e as esculturas em pedra e mármore. Antes eram ricos em fauna e flora, as montanhas abrigavam as nascentes da maior parte dos rios, porém as montanhas também são vulneráveis. As mudanças climáticas, o desflorestamento e as práticas agrícolas não adequadas, levaram a deslizamentos de terra, erosões e perda de fertilidade dos solos com severas consequências para o povo nortenho. Houve a exploração de forma irresponsável e ambiciosa seguida de chuvas torrenciais e um longo período de seca. O ecossistema das montanhas fora prejudicado e o Norte passou a depender dos outros Impérios para se manter, acumulando dívidas com a Ordem Imperial e favores aos outros Imperadores. O povo vivia do comércio das minas, venda de lãs de ovelhas, leite de cabra, queijos e peles como as de coelhos, lobos e raposas. Além de serem os maiores treinadores de aves de rapina.

Dos navios em alto mar era possível ver as montanhas escarpadas do Império Norte, o lar de centenas de aves marinhas que empoleiravam sobre a luz do sol, abrindo as asas e aquecendo o peito. Elas saltavam e depois de fazerem círculos no ar, mergulhavam nas ondas e passavam minutos dentro do mar, sempre voltavam com algo no bico, as vezes para elas mesmas, as vezes para seus filhotes.

O Império Norte não possuía um palácio, mas sim um castelo, e claro, era numa montanha frente ao mar onde a visão era privilegiada pela beleza e pela estratégia militar. Se algum dos Impérios ousasse atacar o Norte teria que lidar com um cenário inóspito e cheio de armadilhas naturais. As rochas davam sustentação e intransponibilidade, de longe o castelo cinza era quase imperceptível, mas ao aproximar a magnitude da obra deixava qualquer um de queixo caído com a grande muralha e suas torres de vigia bem armadas para que os arqueiros e guerreiros ficassem a postos vigiando, sempre preparados para agir. As seteiras eram quase invisíveis, haviam inúmeros buracos mortais para facilitar o derramamento de líquidos ferventes, com intuito de despejar em cima de possíveis invasores. O problema no castelo era a fonte de água, um lençol abaixo na montanha que apesar de suprir o castelo também o deixava vulnerável pelo poço de abastecimento. Florence temia que um dia pudessem envenena-lo e tinha muitos pesadelos a esse respeito.

A Imperatriz estava cansada e de mau humor, mal havia chegado e já recebera a notícia que mais quinze sereias haviam morrido nos trabalhos das minas. Por mais que a procriação estivesse dando frutos, até que as sereias tivessem a idade e a força para o trabalho, o número de mortes atrasaria as entregas e consequentemente os rendimentos. As "sereias matrizes", como eram chamadas as mães, tinham sangue puro, mas os pais muitas vezes eram homens e a prole das sereias não era tão forte como uma sereia pura. No entanto, sereias machos puros eram difíceis de encontrar e cada vez mais sereias mestiças eram colocadas ao trabalho forçado. O Norte possuía uma pequena frota de navios destinada a caça das sereias para este fim, o da procriação, e desse Império eram exportadas sereias para todos os outros. A maioria capturada eram as fêmeas que depois de serem levadas as bruxas tinham seus destinos decididos entre procriar para o trabalho ou serem vendidas como peças de luxo para os nobres.

No Norte o vento soprava frio, as folhas amarelas e vermelhas caiam das árvores deixando morros e caminhos coloridos. Depois de Azah, o clima havia mudado, o inverno chegava mais cedo e tardava a ir embora. As fontes de água que desciam das minas deixavam uma fina camada de gelo próximo as margens, os animais mantinham-se mais tempo em suas tocas, havia chuva no início das manhãs e no final das tardes. O vapor frio saia das bocas dos nortenhos, o cume das montanhas já estava branco e logo cairia a neve. O Norte era o mais frio dos Impérios, o mais afastado e o que mais diferia em clima. Enquanto no Sul o calor queimava as peles morenas, no Norte o frio do inverno deixava rachaduras nas bocas e bochechas rosadas.

Era a época mais difícil do ano, tanto pelo clima que castigava quanto pela falta de estoque de alimento.

No castelo, a Imperatriz não passou nenhum dia de descanso, logo reuniu-se com os reinos e casas importantes pertencentes ao seu império. As peles de coelhos costuradas como uma manta cobriam as cadeiras da sala de reuniões onde a Aliança do Norte se encontrava, as vestes dos senhores e senhoras também feitas de peles começavam a adornar os corpos e rabos de raposas envolviam seus pescoços. A sala como todo o castelo possuía pouca arte em tela e muitos animais empalhados, haviam ursos, guaxinins, raposas, alces e algumas aves; moveis de madeira escura, bandeiras com as cores verde e vermelha, as cores do norte, e bandejas de prata com iguarias da época. Florence inspirava o aroma amadeirado e frio da sala e sentia-se feliz por estar em casa.

Sentados em suas cadeiras os senhores e senhoras encaravam a Imperatriz, suas expressões sérias e suas bochechas queimadas direcionadas a ponta da mesa. Logo, sem enrolação Florence abriu o jogo em relação ao discurso de Priyanka. É claro que houve grande reboliço, papéis foram aos ares, socos foram dados na mesa e gritos puderam ser ouvidos do corredor. Florence deixou que eles botassem para fora e depois enfatizou o prazo de um ano estabelecido pela Imperatriz do Leste e riu junto com os outros.

— Nós não vamos acatar. – A imperatriz levava a taça de vinho a boca. – Mas dependemos do Leste vocês sabem, meus bons amigos.

É claro que todos sabiam.

— Além disso, aquela imperatrizinha de Sunacai pareceu gostar da ideia. – O desdém ficou claro em seu tom. Era evidente que o pensamento de todos ali era igual no que dizia respeito ao Império de Sunacai e as sereias. — Logo após o inverno deles um navio com o povo selvagem de lá vai chegar em nossas terras. – E ao perceber o desgosto na expressão de seus homens, esclareceu. — Não se preocupem, a ideia é que eles orientem os nossos agricultores sobre as práticas corretas de manejo do solo e diminuam o impacto dos bandidos e infratores nas áreas mais vulneráveis. Logo que possível despachamos o povo de volta para o Impérios deles. Já conversamos sobre isso antes, eu não irei falhar com minha palavra.

— E se eles não quiserem sair? – Um dos homens perguntou.

— Nós também sabemos ser persuasivos. – A Imperatriz sorriu erguendo a taça e eles assentiram com um gole no liquido avermelhado.

Os locais destinados a moradia dos sunacas foi decidido, o mapa do norte exposto sobre a mesa marcava as minas, as plantações, as montanhas e os rios destinados ao povo de Aurora, foi estabelecido o prazo para a construção das casas e a repartição do rebanho para o uso deles. Os sunacas ficariam rodeados pelos nortenhos, uma sugestão do Rei Tibério IV das Montanhas Nevadas do Norte, o povo selvagem deveria receber educação para conviver entre as pessoas civilizadas.

No início da noite Florence estava liberada de suas obrigações como imperatriz, esbanjou o corpo em sua cama grande, tocou o ventre e o acariciou, não via a hora de contar a novidade ao marido, sentia saudade dele. Dali três dias ele e os outros quatro filhos, incluindo uma menina, deveriam chegar da viagem as fontes de águas quentes que haviam do outro lado do império.

O corpo estava cansado e a Imperatriz deixou-se levar pelo sono.

No interior da Montanha Selada, haviam câmaras destinadas a reprodução das sereias. A ventilação era feita por dutos de ar que interligavam o lado de dentro com o lado de fora, as paredes eram de rocha esculpida e o chão era frio, havia pouca iluminação e nenhum local adequado para as necessidades das sereias além de um buraco pouco fundo no chão. A montanha de onde antes retirava-se carvão, agora era o antro onde aconteciam os estupros. Mas claro, que não era visto assim, afinal, eram só sereias, geravam mão de obra barata, peças de luxo, objetos de prazer e não filhos; sequer reclamavam quando seus corpos eram violados, não choravam, não sentiam dores, não falavam nada, eram peças no sistema de troca, não importava considerar seu emocional ou psicológico, aliás, "as sereias não possuíam essas coisas" – eram o que diziam.

Duas vezes na semana um grupo de soldados nortenhos verificavam as câmaras, levavam o básico para que as sereias se mantivessem vivas e viam se os corpos delas continuavam saudáveis para reprodução. Se uma delas apresentasse alguma doença, o que nunca aconteceu, ela era descartada, atirariam-na do alto de alguma montanha ou atravessariam seu coração com uma espada.

Durante essas verificações também era observado o "prazo de validade" do feitiço das bruxas. Não se sabia o motivo, mas depois de algum tempo as sereias pareciam curar-se da magia delas e era necessário leva-las de volta para uma nova seção. Algumas não resistiam, mas estava tudo bem, sempre havia um grupo de sereias grávidas para repor as perdas.

Nas cavernas sempre haviam sereias nascendo, sereias morrendo e sereias entrando na puberdade e nesse momento era feita a escolha: quais seriam vendidas e quais permaneceriam na montanha, o carregamento das sereias acontecia duas vezes ao ano pelo menos. O oficial incubido era um homem alto de fala arrastada conhecido como Barão Vermelho, apelido dado pela cor dos cabelos e barba, era o responsável pelo transporte das sereias até a Ilha das Bruxas e de lá para os respectivos compradores. Era uma viagem longa a bordo do seu navio "Corrente das Águas", mas ele recebia bem pelo serviço e era uma honra dada pela própria Imperatriz Florence, ele jamais resmungaria. Certamente que ele aproveitava das companhias femininas durante a viagem, o tempo no mar não era tão pesaroso afinal.

Cinco dias após a chegada de Florence ao Império Norte o Corrente das Águas já estava carregado para partir de seu porto. O capitão do navio era um homem de idade avançada e experiência no mar, alertou ao Barão sobre uma possível tempestade, as nuvens escuras apontavam no horizonte, dissera que o melhor seria esperar mais dois ou três dias em Porto Redondo, o principal do Norte, até que os ventos acalmassem, no entanto, o Vermelho não aceitou bem a sugestão. Não que ele fosse sujeito muito caprichoso, mas prometera entregar duas sereias no Império Central para duas ricas damas, filhas do Duque de Lima. Elas iriam ao casamento de uma prima dali a quarenta dias e não queriam chegar ao grande acontecimento sem uma sereia de companhia. Precisariam de tempo para os alfaiates preparem os vestidos certos, provar as joias que mais combinariam e ajeitar todo mais fosse necessário. Já que do Norte à Ilha das Bruxas levaria cerca de oito dias de viagem, e das Bruxas até o Império Central mais treze dias, isto porque a querenagem do Corrente das Águas estava em dia, ele não poderia perder um dia sequer esperando uma "chuvinha" passar. A tripulação do navio recusou em primeiro momento, foi preciso persuasão e a promessa de visitar o luxuoso bordel de Madame Falcão para que eles aceitassem levantar a ancora do fundo do mar.

Por fim o navio partiu rumo as nuvens escuras e como o capitão havia previsto, a tempestade foi abrupta e intensa, o mastro principal rachou ao meio e um raio atingiu as velas. Homens abandonaram navio antes da hora e mesmo bons nadadores morreram tentando se livrar do mar. As ondas agitaram-se por baixo do navio e levantaram a popa bem acima do que o navio podia suportar, parecia que o mar fazia de propósito, que sacolejava o navio para ter o que tinha dentro. Quem sabe não era verdade...

As sereias ainda novas não tinham passado pela mão das bruxas e até o momento eram donas dos próprios corações. Olhinhos arregalados, lábios entre abertos e muito medo. Seus corpos não eram marcados, mas elas sabiam o significado de dor e medo, viam o que acontecia com as outras sereias e a ideia de serem submetidas àquilo deixava suas mentes doentes. Sentiram as ondas baterem forte contra a madeira e o ritmo de seus batimentos acelerava a cada balanço mais alto no navio, a porta do compartimento de carga onde eram mantidas estava trancada por fora e foi apenas quando o navio cedeu de vez ao mar e a água salgada ocupou o lugar do ar que elas se deram conta de que estavam sozinhas. A água passou pelas frestas da porta e rapidamente encheu todo lugar. O mar dentro do navio devolveu a elas sua forma nativa, sua força, em suas veias o sangue corria depressa, a sensação de pertencer, de ser, de existir fazia parte delas pela primeira vez e a comoção transbordava em seus olhos. Não em forma de lágrimas, eles refletiam felicidade e numa nova primeira vez o som saiu de suas bocas antes emudecidas. Elas ainda não sabiam cantar, mas a emoção emanava bramidos debaixo do mar. O corpo transformado e renovado das sereias reluzia no compartimento escuro, o formigamento do corte donde saiam suas guelras, o absorção do oxigênio da água fluindo para o interior, as caldas que as deixavam maiores, a experiência que mudaria tudo acabara de acontecer e elas lembrariam desse momento por toda vida.

Junto com o choque do navio no fundo do oceano, as pequenas sereias fizeram força e derrotaram o aço da porta. Não foi mágica ou sorte, foi a vontade de ser livre que as deu coragem para rumar ao até então desconhecido. Eram dezesseis sereias, nadando pelo navio naufragado em direção aos próprios destinos. Ao que iam em direção a saída para o mar passavam pelos corpos inchados dos tripulantes do Corrente das Águas, uma visão grotesca que não as abalava nem um pouco. Avançaram em nado rápido até a superfície e sorveram o ar da liberdade. As ondas altas e a tempestade eram parte de quem elas são agora e não as amedrontavam.

"Estamos vivas."

"Somos livres."

"Nós somos irmãs de água."

Mãos dadas dentro do mar, elas se tocaram pela primeira vez em dezesseis anos. Admiravam uma a outra como sendo iguais e o sentimento de proteção que as unia era algo que vinha do fundo de seus coração.

"Ficaremos sempre juntas."

"Não vamos deixar mais nenhum humano nos machucar."

Embora fossem novas em idade, o que para as sereias não era nada, elas haviam visto coisas terríveis e sentiam-se cumplices para viverem uma nova vida em virtude de serem sereias de verdade e não peças nas mãos das pessoas.

As sereias brincaram um pouco em meio as ondas, mergulhavam fundo e sorviam água salgada pelas guelras. Como golfinhos elas saltitavam e sorriam, o que era uma novidade tão excitante que as fazia querer experimentar cada vez mais. A felicidade era tamanha que algo vinha de dentro de seus coração e pela primeira vez em suas vidas elas ouviram suas próprias risadas. Uma delas tapou a boca depois de ouvir a própria voz. Não eram só bramidos como fazem as baleias, era uma voz que ela não sabia que tinha.

Todas deram as mãos e submergiram juntas, dentro da água abriram a boca e do fundo de suas gargantas surgiu uma força. Seus ouvidos captaram o som que vinha baixinho, de pouco em pouco, com ajustes de timbre surgiu uma melodia de vozes. Dentro da água o som ressoava e elas emergiram mais uma vez ainda cantando. A música ainda não era música, mas era real e transbordava sentimentos de liberdade e alegria.

Uma delas olhou fixo para as outras e pensando um instante abriu a boca mais uma vez.

— Essa – Ela disse com um pouco de dificuldade. — É a língua dos homens. Nós sabemos porque a ouvimos durante toda a vida.

"E esta? Que língua é esta?"

"Eu não sei."

— Deve ser a nossa língua antiga, aquela que vem dentro de nós.

"Por que está falando como eles?"

— Por que não devemos esquecer.

— Eu não irei esquecer. – Outra disse. E todas disseram depois.

— O que será que houve com nossa casa?

— O Império das Águas ainda existe. Eu não vou acreditar nas histórias que eles nos contaram.

— Eu também posso sentir que há algo aqui dentro que me chama.

— Chama todas nós.

— Devemos ouvir o chamado e ir em direção a ele.

— Iremos juntas.

— Estaremos sempre juntas.

— Somos uma como a água é uma só.

Ao longe uma delas viu dois escalares com o que restara da tripulação. Há que entender o que passou pela mente delas, eram jovens maltratadas que viam a oportunidade de vingança como um prato cheio. Em concordância elas aproximaram devagar dos homens, o desespero deles perante o mar agitado divertia as sereias, elas batiam as caldas no casco de madeira e ouviam os gritos dos homens, eles olhavam para baixo, mas a noite era um problema para a visão limitada dos humanos, claro que para as sereias isso não tinha a menor importância, elas enxergavam muito bem.

Umas delas debruçou-se no escaler e enquanto os assustados não a viram, a menina observava o desespero e a fraqueza daqueles seres, por que as sereias temiam os humanos? – ela não encontrou nenhuma resposta.

— Mas que merda é essa? – Um dos homens deparou-se com o sorriso malicioso da pequena loira que o encarava, ele percebeu o reluzir dentro da água, a cauda dançava junto ao movimento das ondas.

Não tardou para que as outras sereias fizessem o mesmo e divididas entre os dois escalares deixavam as caldas soltas dentro da água apoiadas na madeira flutuante. Nuas, sorridentes e deslumbrantemente belas olhavam os homens com interesse. Elas como tigres ante sua presa desfrutavam maravilhadas da nova hierarquia ali estabelecida, enquanto sorriam os lábios rosados os batimentos dos homens aceleravam e o sangue bombeava forte por todo seu corpo. Um deles sentiu os olhos latejarem, outro ficou zonzo e cada um deles sentia a cabeça explodir.

— O que está acontecendo? – O mais novo deles levou a mão até a têmpora. Era um rapaz com feições delicadas e tinha a reputação de ser agradável e generoso.

A sereia mais próxima a ele ergueu a mão como se fosse tocá-lo e afagar seus negros cabelos, o rapaz aproximou-se sem receio, ela deslizou a mão úmida pelo rosto dele e segurando de leve em seu queixo trouxe ele ainda mais para perto dela. Os homens observavam atônitos e calados enquanto a sereia afastava afundando o corpo nu dentro do mar, o rapaz ainda sendo guiado debruçou sobre a madeira do escaler com o rosto a pouca distância da água, as ondas molhavam seus cabelos com gotículas salgadas, a sereia agora submersa olhava para ele com sensualidade, levou o corpo até ele e tocou os lábios dele com os seus, devagar e em movimentos leves afastou-se dessa vez sendo seguida pelo rapaz. O som do corpo dele de encontro a água foi abafado, as sereias afastaram da madeira gelada, os homens debruçaram fazendo o escaler balançar, as águas escuras não mostravam mais o rapaz. As sereias riam misturando suas vozes ao som das ondas. Outra delas, aproximou-se do escaler e sem dizer nada, com a mão em direção a outro homem, convidou-o a juntar-se a ela no mar. E assim, um a um dos tripulantes do Corrente das Águas, incluindo o capitão, foram sucumbidas as águas, e as sereias satisfeitas viam os corpos afogados irem em direção ao fundo do mar.

Livres, as sereias seguiram seus instintos rumo ao Império das Águas, e lá, elas podiam sentir, alguém as aguardava. A partir de agora elas estariam sempre juntas e iriam se proteger. Havia tanta coisas que elas não conheciam, mas iriam descobrir juntas. Uma delas olhou para trás uma única vez, olhou para onde antes havia homens e agora não havia mais nada. Talvez esse fosse o mundo ideal afinal, um lugar onde homens não existissem e apenas as sereias pudessem nadar e viver livres. Mas seus pensamentos foram tirados de si quando uma de suas irmãs tocou sua mão e sorrindo a guiou para junto das outras.

"Talvez eu não precise de um mundo sem humanos, talvez eu precise de um mundo com mais de nós. Mais iguais a mim, mais daquelas com quem eu me sinta bem. Com mais sereias."

Não havia uma rota prescrita para o Império das Águas, mas algo em seus corações dizia que elas estavam no caminho certo.

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