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Capítulo 29 - Circe Gran Mare

Ao sair de Vordonisi o Alma Negra quebrava as ondas e avançava em direção as águas mais quentes, as ordens de Jane foram passadas, Simon estava ao lado da capitã com seu machado na mão, a tensão nos ombros e os olhos assustados ainda estavam presentes no convés, contudo as mãos seguravam firmes as espadas. À medida que o navio avançava os piratas preparavam-se para o embate com as serpentes, os homens em silêncio entreolharam-se mais de uma vez.

Um pouco mais perto da área das serpentes. Um pouco mais.

O suor escorria pelos rostos concentrados.

Nada acontecia.

Ninguém se mexia.

Ninguém gritava... nenhum sangue sob o convés.

— O que está acontecendo aqui? – Um dos piratas sussurrou ao amigo ao lado.

Jane tinha uma ideia, com todos na proa a observa-la, a capitã foi até a ponta mais baixa do navio e olhou para as águas do mar.

Ela sorriu.

— Até que enfim resolveu ajudar.

A sombra movia-se com velocidade abaixo do navio, os piratas curiosos debruçavam-se sobre a amurada na tentativa de verem algo, mas para a decepção de alguns e o alivio de outros eles não viram nada e foi ordenado que voltassem as suas atividades de rotina.

Dessa forma a saída de Vordonisi foi bem mais tranquila do que se esperava, os piratas estavam vivos e sentiam-se sortudos. O mesmo não podia ser dito das serpentes da Ilha, a maioria havia sido devorada.

O navio seguia seu rumo dentro do mar, Pyra ao timão mantinha o navio a favor do vento e o homem na gávea permanecia com os olhos bem aberto, a qualquer sinal de navio branco ou navio pirata e todos estavam preparados para o embate. Jane estava com Simon e Victhor na cabine, averiguavam calendários e rotas antigas utilizadas por outros navios piratas. Sempre que invadiam algum navio Jane fazia questão de pegar o livro de bordo, era sempre muito útil.

— É aquela época do ano. Deveríamos ir lá dessa vez. – Foi Simon quem disse com um papel nas mãos.

— Do que esta falan... – Jane subiu as sobrancelhas. — Ah! Está falando sério? Vai concordar dessa vez?

— Já estamos fodidos mesmo, não vai mudar muita coisa.

— Victhor, ouviu isso? – Jane olhou para o lado, Victhor sorria com o óculos e a flanela na mão. — Você é minha testemunha dessa vez.

— Mas nada de ser imprudente. – Simon manteve a voz firme. — Planeje isso com calma.

— Não tem muito o que planejar, vamos chegar metendo bala naqueles bundas!

—Ta vendo porque nunca concordo com você!

— Vamos comprar uns ingressos. – Victhor disse no meio dos olhares assassinos entre os dois. – Entramos como se fossemos assistir e explodimos tudo de dentro.

— Como foi na Ilha Liberdade. – Jane tinha um sorriso.

— Se chegarmos explodindo tudo sem ver nada, podemos machuca-las.

— Você esta certo. – Jane disse depois de pensar um pouco.

— Quanto tempo até chegar lá? – Simon perguntou.

— Pyra saberá responder melhor. Mas acredito que uns dois dias se os ventos continuarem bons.

— É tempo suficiente para checarmos os canhões.

— Os homens estão alegres após Vordonisi, não foi muito, mas eles têm esperanças de mais.

— Então daremos mais a eles. – Ela sorriu olhando para os dois. — Vamos ao Circo!

E como Victhor havia previsto, demorou dois dias para que o Alma Negra chegasse até a Ilha do Espetáculo. O nome se dava exatamente porque nesta ilha pequena havia um circo clandestino. Os espetáculos provinham das habilidades da própria família, filhos, primos, irmãos e pais trabalhavam juntos no Circe Gran Mare e as notícias das grandes apresentações corriam mar afora. O navios atracavam e da praia já era possível ver a lona colorida do circo. Crianças corriam para todos os lados e luzes e vozes altas faziam parte do cenário. Algodão doce, pipoca e frutas em palitos eram saboreados e um grupo de palhaços indicavam o caminho certo dentro da trilha. O número de pessoas que podiam ir até o circo por noite era limitado, Jane e seu grupo foram os últimos a conseguir comprar.

— Quantos conseguiu? – Victhor tinha os bilhetes em mãos e Jane olhava para eles como se fossem troféus. — Conseguiremos entrar?

— Cinco ingressos.

— Perfeito. – Ela sorriu e pegou os bilhetes da mão dele. — Eu, Simon, Victhor e Lantis.

— Por que vai levar o sereia? – Simon perguntou com a testa junta.

— Não é obvio?

— Vai sobrar um... – Victhor olhou para aquele em sua mão.

— Chame mais um que quiser ir. – Jane sabia a quem ele chamaria.

Algumas horas depois o grupo do Alma Negra andava pela trilha com palhaços risonhos guiando-os trilha a dentro. Simon estava detestando aqueles palhaços ridículos a sua volta, Lantis sentia-se estranho, seu corpo arrepiava-se sem motivo e as roupas que antes lhe cabiam muito bem pareciam encurtar em seu corpo. Jane e ele ainda não haviam conversado.

— Por aqui meus queridos amigos, venham! – Diziam os palhaços.

O grupo do Alma Negra sentou-se no local indicado e ficaram esperando junto aos outros espectadores. Olhos aguçados para todos os lados.

— A segurança parece bem limitada. – Dizia Jane. — Devíamos ter chegado invadindo.

— Paciência, nós não sabemos onde elas estão. Vamos esperar o espetáculo acabar e depois agimos. Tem crianças demais aqui.

Jane estalou a língua e cruzou os braços. Seus olhos foram de Victhor para Lantis que havia se sentado ao lado de Will. O sereia parecia incomodado com alguma coisa e o loiro ao seu lado apontava e ria dos palhaços no picadeiro.

Este Circo era bastante especial, O mais provável é que vários espectadores tenham assistido aos espetáculos mais de uma vez e todos falavam sobre a grandiosidade que acontecia dentro da lona. Durante todo o espetáculo a banda alegrava o público com sonoplastias engraçadas quando os palhaços caiam e intuitivas em cenas de suspenses. As encenações eram de tirar o folego, os trapezistas, malabaristas, mágicos, acrobatas e equilibristas se apresentaram durante toda a noite. Os figurinos muito coloridos ou bastante medonhos, as risadas altas, as maquiagens bem feitas e todo o espetáculo do circo faziam o público ir a loucura. Mas Jane não achava aquilo divertido, ela sabia o que o público realmente queria ver ali. As pessoas eram profundamente atraídas por circos bizarros e shows mórbidos. Quanto mais esquisita e singular fosse a atração, maior era o entretenimento do público. Assim, mulheres barbadas, pessoas fisicamente alteradas e superhumanos eram os queridinhos do espetáculo. Ainda que fossem tratados como aberrações pela sociedade, tais artistas arrecadavam valores exorbitantes todas as noites.

Neste circo o enredo era voltado para a Segunda Guerra do Sangue, aquela em que as sereias perdiam e eram tratadas como escória pela humanidade. Tudo o que era voltado ao ridículo no espetáculo circense era referido as sereias, tudo o que era de horrível e medonho, traiçoeiro e o pior, eram as sereias. Lantis sentia o estomago enjoar vendo a história de seu povo sendo retratada com tanto desrespeito.

— Eu não acredito que tenha acontecido dessa forma. Mesmo que seja assim que as pessoas contem a história, eu não acredito que tenha sido assim. - Jane não era uma estudante assídua de história, mas sabia que o vencedor sempre altera os fatos ao seu favor quando os reconta. Além disso, ela era humana e sabia bem como humanos podem ser quando querem algo.

Ao fim, o homem no centro do picadeiro anunciou a sua atração principal. As luzes foram diminuídas e a atenção estava voltada para ele. O som de rodinhas foi ouvido e um grande tanque foi trazido até o centro. Lantis congelou ao ver o enorme aquário adornado com conchas e pérolas falsas. Ele sentiu sua garganta secar e as memórias faziam sua cabeça doer. Jane observava sua expressão sôfrega, mas apenas observava, sem dizer nada.

— Se alguém sofre de ataques de pânico ou tiver muito medo é melhor sair agora! – Cabaretier, o homem no centro do picadeiro, disse como um bom ator que era.

O homem fez um sinal e outro homem com roupas de rei veio puxando duas correntes pintadas de dourado, na ponta contrária, as sereias com olhos vazios olhavam para baixo. Uma delas de vestido branco e a outra de vestido preto, sendo seguidas por mais três que apenas tinha as genitais tampadas.

— Ellyn e Azah. – Lantis disse.

Todos conheciam a história das sereias, a loucura de Azah e o que aconteceu com Ellyn, ou pelo menos o que todos acreditavam que havia acontecido.

E então o espetáculo teve início. Mulheres vestidas de sereia entraram no palco e cantavam a história da Guerra do Sangue. Soldados matavam as "sereias" e gloriosos exibiam suas espadas cheias de sangue. O público gritava e exaltava a bravura dos homens, a encenação de Ellyn matando a própria irmã era a última, mas não tinha nenhuma emoção já que as sereias reais não tinham nenhuma expressão em seus rostos. Por fim as duas foram guiadas para dentro do aquário e lá foram forçadas a se transformar. O público estava alvoroçado e as outras três sereias reais foram trazidas para dentro do tanque.

Lantis suava frio e sua pele estava pálida, Jane pediu que Will trocasse de lugar com ela e sentando-se ao seu lado segurou suas mãos.

— Eu já passei por isso, ser colocado no centro de algum lugar para ser observado, para que pessoas apontem o quanto errado é a sua existência... Eu me lembro do quanto era terrível e sufocante ficar dentro de um aquário como aquele. Ser observado dessa forma enquanto seu corpo muda, ser julgado e tratado como um monstro.

— E assim termina nossa história, senhores e senhores, hoje as sereias devem permanecer assim, trancadas em aquários para que nunca mais possam se rebelar contra nós.

— É por isso que estamos aqui. – Jane disse enquanto segurava sua mão. – Por que vamos dar a elas a mesma liberdade que você tem hoje. – Ela sorriu. — Vamos mostrar a eles o que é um verdadeiro espetáculo.

As cortinas foram abaixadas, o publico foi direcionado a saída onde vários vendedores aguardavam. A noite estava quente, mas ainda era cedo. As embarcações iam deixando o pequeno porto pouco a pouco e apenas o Alma Negra ficou para trás.

— Vocês devem partir. – Disse um homem na areia. Ninguém reconheceu um dos palhaços sem a maquiagem. — Não permitimos estadia na ilha.

— Sentimos muito. – Will disse do navio. — Estamos com um problema no timão, mas logo vamos arrumá-lo e já saímos daqui.

O palhaço não tinha mais o sorriso bondoso e acendeu um cigarro enquanto voltava para a trilha. As horas passaram e o Alma Negra continuava ali, até que a nevoa do mar veio.

— Chegou a nossa hora. – Jane tinha uma espada em cada mão, ao seu lado Simon empunhava seu machado e Victhor ajeitava o óculos.

— Não se deixem enganar. – Victhor disse. — Eu dei uma volta por aí e eles não são inofensivos.

— Então por isso você sumiu um tempão. – Will com uma espada estava ao se lado.

— Vamos logo acabar com isso.

Sorrateiros, os piratas do Alma Negra andaram pela ilha sem tochas e com as armas, o grupo seguia as ordens da capitã a sua frente que dava sinais com as mãos e alguns assovios. Pelo caminho dois homens foram mortos com suas gargantas cortadas, os corpos arrastados para fora da trilha. De longe eles viam o picadeiro sendo desmontado, as sereias ainda estavam dentro do aquário e ouviam obscenidades de três homens que estavam ali. Não pareciam que eles eram do circo, talvez fossem de fora... Mas não importava.

— Agora! – Jane levantou e o grupo foi atras dela, espadas em punho e pernas com velocidade.

O pessoal do circo ficou assustado com o grupo vindo ao seu encontro, os primeiros a serem derrubados foram mortos em instantes. As espadas atravessavam peitos e cortavam estômagos, poucos socos foram dados e sangue espirrava para todos os lados, gritos eram ouvidos e homens também armados vinham defender o seu sustento. Os piratas tinham mais habilidade e mais experiência em combate, evidente não foi fácil como em outras invasões a Ilhas Flutuantes que mal eles chegavam e mãos já estavam erguidas, mas o Alma Negra tinha um grupo forte que não perdia a oportunidade de erguer espadas.

Mulheres e crianças corriam buscando abrigo, mas foram encurralados por dois homens do Alma Negra.

— Parem agora mesmo! – Ele apontava uma espada para uma das mulheres que tinha uma menina de uns três anos no colo. — Venham comigo sem resistir e ninguém se machuca.

Olhares apavorados foram trocados entre as mulheres e as crianças com ranho escorrendo. As mulheres levantaram as mãos e as crianças imitaram o gesto. Seguiram com os dois homens do Alma Negra para o navio.

— Breener! – Um homem gritou indo em direção ao grupo que seguia. — Deixe meu filho em paz!

Um dos meninos começou a chorar mais alto e a gritar "Papai". O pirata segurou o menino pelo braço e encostou de leve a ponta da espada no pescoço dele.

— Mais um passo e o menino morre.

O homem parou um pouco antes do grupo.

— Nós vamos leva-los ao navio e depois vamos deixar todos em alguma ilha flutuante por ai. Não temos ordens para matar ninguém, então não me faça descumprir o que disse minha capitã.

O homem olhava para o pirata com muita raiva, mas abaixou a espada.

— Me leve com vocês.

Ao que o pirata fez que sim, o homem juntou-se ao grupo e abraçou o filho que foi solto. No pescoço de menino tinha um pequeno arranhão da lâmina, nada demais.

— Não tente nada estranho, - Ele disse já aproximando-se do navio. — Tem muito mais de onde eu vim.

E realmente tinha. O grupo que foi com Jane era o bastante para lidar com o Circo, mas o maior número ainda estava no navio. Como o homem se comportou bem, ele foi içado junto as mulheres e crianças para o navio.

— Vocês ficarão aqui até que a capitã venha falar com vocês. Ela fará uma proposta, pensem nela como uma nova oportunidade, mas até lá fiquem quietinhos aqui.

Depois que todos do Circo já estavam bem amarrados no centro do picadeiro, Jane conversou com quem seria o líder deles. O acordo era que entregassem todo o lucro do circo e suas vidas seriam poupadas. Depois de obter as informações sobre onde estaria os valores, Victhor e Simon acompanharam o grupo para outro lugar e os prenderam em um galpão. Os piratas ficaram chocados com a quantidade de dinheiro que aquele circo havia arrecadado, além de joias e roupas caríssimas, tudo o que tinha de valor foi levado para o navio.

Lantis ficou com Jane a mando dela, enquanto os outros terminavam seus afazeres a capitã foi até o aquário das sereias e as olhou. Elas olhavam de volta com suas cascas vazias, olhos com falta de tudo, de alegria, de tristeza, de rancor ou de qualquer coisa.

— Esta parte é com você. – Ela disse a Lantis que ainda não tinha se aproximado do aquário.

Ele olhou para Jane com um pouco de confusão.

— Leve-as de volta para o mar. Assim como foi com você, o que quer que as bruxas tenham feito um dia vai passar, mas elas precisam sair daqui para que isso aconteça.

Lantis deu alguns passos receosos para frente, a sensação daquele aquário ainda lhe causava mal.

— Elas serão as primeiras da promessa que eu fiz a você.

— Uma promessa?

— Sim, de libertar todas as sereias. Foi o nosso combinado, não foi?

— Sim. – Ele se lembrava. Depois que Jane tivesse todas as pérolas ele também seria livre para escolher seu próprio caminho. Era estranho quando algo que devia te deixar feliz na verdade te deixa confuso e triste.

Lantis olhava para as sereias dentro da água, seus cabelos não tinham brilho, suas peles eram horríveis e seus lábios pálidos. Nada parecido com uma sereia de verdade. Elas o olhavam também, viam um homem a sua frente, até que Lantis tirou a camisa e deixou as marcas das guelras aparecerem. Uma das sereias, de forma um pouco involuntária tocou o vidro. Lantis tocou no mesmo local e ficaram se olhando por um tempo. Dentro do aquário as outras sereias observavam e uma por uma imitaram o gesto tocando o vidro. Seja por um comportamento espelhado ou não, elas estavam fazendo algo a mais do que só esperar uma ordem.

Jane entendeu que aquilo só poderia acontecer porque Lantis estava ali, porque ele já havia retirado de si as amarras colocadas pelas bruxas, - pelo menos a maior parte, e ficou satisfeita com a decisão de levar Lantis ao Circo naquela noite. Com certeza se fosse apenas ela e seus homens não haveria a mesma resposta e sem alguém com quem se identificar essas sereias ficariam tão perdidas no mar quanto em terra e aquele embate com o circo seria quase um desperdício.

— Eu sinto que elas me vêem, mas ainda não percebem que eu realmente estou aqui. – Disse Lantis.

— Elas vão perceber, você precisa criar uma forma de se conectar com elas.

— Como você fez comigo?

Jane quase caiu para trás, mas Lantis falava sério demais e ela ficou um pouco constrangida em perguntar do que ele estava falando.

— Não quero ver você beijando essas sereias. – Foi o que ela disse. — Se for isso que vai fazer eu vou deixá-los a sós.

E como Jane pareceu que ia sair Lantis segurou-a pelo braço.

— Eu não faria isso. – Os olhos azuis de Lantis eram vibrantes e Jane sentiu-se novamente constrangida por pensar em beijos em momentos como esse.

— Tudo bem. – Ela puxou o braço devagar e ele o soltou. — Eu falei uma coisa idiota.

— Quando eu disse aquilo, eu quis dizer sobre sentimentos. Sobre quando você me ajudou a sentir que eu poderia pertencer a este mundo.

— Ah, sim, isso também.

Lantis olhou para Jane que tinha as bochechas um pouquinho coradas, como não era algo que acontecia sempre ele ficou feliz e queria tentar estender um pouco mais aquele momento.

— Claro que beijos também funcionam muito bem. – Ele disse com uma voz baixa deslizando as pontas dos dedos no pescoço a mostra da capitã. — Beijos, abraços e ...

— As sereias. – Jane cortou o que Lantis ia dizer. Ambos sabiam que pensaram na mesma coisa. — Foco nas sereias.

Ele sorriu e Jane deu a volta para subir próximo a abertura do aquário, havia uma plataforma por onde as sereias eram içadas e ela aproveitaria aquilo para tirá-las dali.

— Quando você disser que elas estão prontas, eu já estou.

Lantis respirou fundo para tirar aqueles pensamentos de sua mente. Era preciso que seus esforços voltassem para outras coisas agora. Ele buscou algo dentro de si que pudesse ajudar a acelerar o despertar daquelas sereias, fechou seus olhos e concentrou-se em transmitir seus pensamentos. Algo que as fizesse querer sair dali para que pudessem ser levadas ao mar. Pensou em sua vida semelhante a delas, sendo escravizado pelos humanos, mas mais importante que isso, lembrou-se da primeira vez que teve algum lapso de esperança, quando seu coração pode ansiar por ser livre das coleiras de ouro. Ele pensou no que sentiu quando viu Jane na Ilha Liberdade, nas várias vezes em que um conflito anuviava sua mente e ela estava lá para ajudá-lo a esclarecer. De olhos ainda fechados ele via a imagem de si, o mar a sua volta e como ele sentia-se bem por isso. Embora esse sentimento fosse bom o suficiente, outro ainda maior vinha do fundo de seu coração. O azul do mar invadiu janelas, a água molhou a cama e a lamparina ficou acesa mesmo estando submersa. Lantis reconhecia o lugar em que sua mente estava, a estante de livros, o cheiro e a pessoa sentada a sua frente na mesa.

— Liberdade é poder escolher onde eu quero estar, e agora, eu só quero estar com você. – Ele disse para a moça a sua frente.

Bolhas saíram da boca dela quando ela sorriu e logo sangue misturou-se a água.

— Nós não somos do mesmo lugar. – Ela dizia e seu brilho ia sumindo. — Um dia você terá de ir embora e escolher seu próprio caminho.

— Eu...

— Você é livre. Deve ir viver a sua liberdade.

— Eu escolho como quero vive-la.

— Não, você esta escolhendo este caminho porque ele é o mais fácil para você, não porque ele é o melhor.

Lantis arregalou os olhos.

— Isso é verdade?

— Saia, Lantis. Saia da sua bolha e vá viver o que o mundo pode te oferecer. – Ela sorria com seus lábios rosados ficando cada vez mais pálidos. — Você será livre.

Lantis sentiu algo em seu estomago retorcer.

— Livre... eu seria livre... – Suas sobrancelhas retorceram-se numa expressão incomoda e triste. — Se isso é algo pelo que anseio e que me deixaria satisfeito, por que eu estou tão triste?

— Ah, Lantis... – A moça aproximou-se dele já quase sem vida. Ele havia reconhecido aquele rosto desde o primeiro momento. — Não está claro para você ainda? – Ela tocou seu rosto e sorriu.

— Eu...

Mas ele não teve tempo de concluir a frase, o corpo de Jane flutuou morto nas águas calmas dentro da cabine.

Lantis olhava para ele misturado a água, mãos pálidas que flutuavam, cabelos castanhos que flutuavam. Ele pensou num mundo em que seria livre, em que poderia nadar pelo mar, explorar e fazer tudo o que lhe foi negado durante anos. Era engraçado como em tudo o que ele pensava, ela estava ao seu lado e quando não estava a experiência não fazia sentido, parecia fria e sem graça. Lantis já tinha uma idéia do que aquilo significava e ponderou sobre como se sentia sendo parte do Alma Negra e ficando ao lado de sua capitã. O sentimento era cheio, eufórico e completo. Ele tocou a mão dela de novo e trouxe o corpo para junto do seu num abraço.

— Eu só serei verdadeiramente livre quando você aceitar ser minha, quando você aceitar que meu coração é seu. Por que não entende isso de uma vez?

Aquele corpo desapareceu dentro do seu abraço e Lantis sentiu seu coração se entristecer. A água ao seu redor ficou escura e fria. Um arrepio percorreu seu corpo e ele sentiu duas mãos cobrirem seus olhos.

— Tolo... sereiazinha tola... – A voz feminina era áspera, as unhas eram longas e o aperto em seus olhos o incomodava. Mas aquela voz era conhecida sua e por saber de quem era, ele estava paralisado. — Você acha mesmo que vai se livrar de nós? Está enganado. – Outras mãos desceram pelo seu corpo e ele se viu vestido de seda e joias douradas. Os dedos tocaram abaixo de seu umbigo e mais abaixo. — Tudo em você pertence a nós, não se iluda. – Ele sentiu seu tornozelo queimar e a tornozeleira de ouro ardia como se pegasse fogo. – Esta doendo? É claro que esta e vai doer para sempre...

— Lantis! – A voz veio do lado de fora de seus pensamentos. — Lantis, o que está fazendo? Você está bem?

Ele abriu os olhos devagar, pequenas lágrimas haviam escorrido até seu queixo sem que ele percebesse. Ele olhou para Jane no alto do aquário, seu rosto preocupado procurava nele algum indicio de dor. Ele ainda não tinha coragem para contar a ela.

— Eu estou bem.

— Certo, - Ela olhou para as sereias. — Então diga isso a elas.

As sereias no aquário...

— Elas estão...

— Ficaram assim de repente.

Elas tinham os olhos vidrados em Lantis, os olhos que antes não tinham nada agora brilhavam com seus azuis intensos, suas expressões não eram mais apáticas, mas não pareciam nada felizes.

— Acho que elas puderam sentir um pouco do que eu senti. – Ele aproximou o rosto do vidro e tocou a estrutura gelada com a outra mão também. — Desculpem, eu estou bem. Nós vamos todos ficar bem.

De algum modo as sereias pareceram ficar um pouco mais calmas.

— Precisamos ir.

Jane entendeu aquilo como um sinal e içou a primeira sereia. Lantis a pegou no colo e devagar ela transformou sua cauda em pernas. O mesmo foi feito com as outras.

— Leve-as para o mar. Elas devem sentir-se melhor depois de terem contato com a água, assim como foi com você.

Lantis fez como Jane disse, não foi preciso nenhuma palavra para que as sereias seguissem atras dele.

— Semelhante reconhece semelhante. – Jane disse num sorriso. — Ah, minha cabeça doi. — Ela levou os dedos a têmpora. — O que foram todos aqueles sentimentos estranhos? Ah, deixa pra lá... Vamos ao que interessa.

Tendo certeza que já não havia mais ninguém ali, Jane ateou fogo a toda lona do circo.

— Chega! Aqui sereia nenhuma vai sofrer mais.

Do navio era possível ver a fumaça subir, assim como era possível ver as sereias entrarem na água depois de Lantis.

— Será que ele vai voltar? – Will perguntou a Victhor da amurada do navio.

— O que você acha? Você voltaria?

Will pensou um pouco olhando para Victhor que combinava tão bem com aquele navio.

— Sim, com certeza ele vai voltar.

O Alma Negra deixou a Ilha Espetáculo com seu picadeiro em chamas, quando as pessoas do circo conseguiram sair do galpão já era tarde demais.

— Malditos piratas! Malditos piratas!

Não adiantava reclamar, a verdade era que o Alma Negra havia passado por ali, um navio de loucos que não tem nada a perder.

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