Era madrugada da segunda-feira e Yoongi seguia para Daegu. Ele iria contar para a mãe o que estava acontecendo. Aliás, ele não poderia deixar de contar. Não sabia bem como seria sua reação, a mãe costumava ser uma caixa de surpresa, não ligando pra coisas que ele achava importantes e se entusiasmando por coisas aparentemente simples. Diziam que ele se parecia com ela. Ele sorriu ao lembrar disso. O pai e o irmão apoiariam o que ele tivesse resolvido. Mas a mãe... Ah, a mãe era sempre uma surpresa, para o bem ou para o mal. Dirigindo o carro na rodovia ele tentava imaginar qual seria a reação dela ao contar que seria avó. Ele de verdade não conseguia prever.

O barulho de mensagem no celular o tirou de seus devaneios. Deveriam ser mais informações vindas do Brasil. Quando chegasse na casa da mãe precisava marcar o médico de gravidez, recomendado pela PD Lee, para Thaisi. Obstetra, não médico de gravidez, visualizou a resposta da mulher quando havia solicitado sua ajuda no dia anteiror para marcação da consulta:

-- Essa obstetra é muito boa e dá para contar com a discrição dela também. -- PD Lee disse após passar o telefone, endereço e nome da médica.

-- PD Lee, você é a mulher mais sábia que eu conheço. -- Ele a bajulou.

-- Vou mostrar a gravação dessa conversa para sua mãe. -- Afirmou séria, do outro lado da linha.

-- Não faça isso, por favor. Ela vai me matar! -- Yoongi tentou imprimir um tom de brincadeira a conversa. -- PD Lee noona?

-- Sim?

-- Poderia me ajudar com mais uma coisa? -- Ele conseguiu ouvir um leve suspirar do outro lado do telefone.

-- Pode falar.

-- Você acompanharia Thaisi nas consultas?

-- Ah Yoongi, talvez isso seja pedir demais! --  A voz dela, que até aquele instante estava neutra, subiu uma nota de irritação.

-- Por favor, PD Lee noona! Nos próximos dias vou viajar e não vou poder ir com ela. Além disso, tem a questão da discrição, lembra? Se me virem sair de um consultório de médico de gravidez, vai tudo por água abaixo! -- Yoongi ouviu um suspiro mais profundo ao final do seu apelo.

-- Obstetra. -- Ele deu um pequeno sorriso quando ela o corrigiu novamente. -- Tudo bem. Mas você me deve um favor enorme! E a primeira coisa é parar de dar tanto palpite no meu trabalho!

-- Não são palpites, são sugestões. E... Tudo bem, vou parar de ser tão chato.

-- Sugestões... Humpf!

-- Obrigada noona. Depois te passo os horários das consultas.

-- Ok. Tenho que desligar.

-- Até mais noona! -- Ele ainda teve tempo de dizer antes de ouvir o barulho de ligação cortada.

Ao final da recordação, o carro já tinha entrado na cidade, dali poucos minutos ele já estacionava em frente ao restaurante da mãe. Não havia uma pessoa na rua aquela hora da madrugada. Pegando o celular, verificou as mensagens. Balançou a cabeça, concordando com algo que estava escrito ali. Enfim, olhou para a fachada do prédio que havia ajudado a comprar, cujos fundos davam para uma casa espaçosa. Sabia, entretanto, que para sua família o maior orgulho vindo dele não era aquele prédio e sim o fato de que ele havia conseguido superar a fase ruim.

Pegando as chaves do portão discreto ao lado da entrada do restaurante e a valise saiu do carro. Será que ainda daria tempo de dormir antes de contar a notícia pra família no café da manhã?

****

Já era a terceira vez que Jimin passava em frente a porta do quarto de Suga hyung. O amigo tinha pedido que ele ficasse de olho na moça, ajudasse no que precisasse e se certificasse de que ela comeria algo. Mas ele não sabia bem como fazer tudo isso, já que ela não tinha saído do quarto até agora. Ele deveria bater na porta? E se ela não respondesse? Também tinha a questão da carta. Ele queria realmente saber se tinha sido ela que tinha escrito.

Reunindo a coragem levantou a mão para bater na porta, porém, no mesmo instante a porta abriu e as duas pessoas dos dois lados da porta levaram um susto que os fez meio que pular pra trás.

-- Desculpe, desculpe, desculpe! -- Jimin falou enquanto se curvava muitas vezes. Thaisi, por sua vez, fez uma reverência mais profunda e permaneceu nela durante um tempo, antes de se levantar, mas permaneceu com os olhos baixos sem encarar Jimin. Um silêncio se prolongou entre ambos, até que Jimin enfim o quebrou:

-- Suga hyung teve que sair e pediu para eu te ajudar no que você precisar. No que eu posso ajudar? -- Ele falou muito pausadamente, apesar de saber por Yoongi que ela falava coreano, queria ter certeza de que ela o entenderia.

O estômago de Thaisi respondeu a pergunta dele.

-- Você está com fome? Tem comida na cozinha e...

Thaisi balançou fortemente a cabeça em negativa.

-- Você não quer comer? -- Jimin ficou confuso.

-- Quero. -- Foi a primeira vez que ele escutou a voz dela, que saiu meio rouca. -- Mas queria evitar ir até a cozinha.

Ela finalmente olhou para Jimin quando disse essas coisas. Foi por um breve instante, antes de desviar o olhar, mas ele conseguiu entender o porquê dela não querer ir comer na cozinha. Ela estava com medo e vergonha. Ele podia entender isso muito bem.

-- Entendo. Eu vou buscar alguma coisa pra você comer e já volto. -- Ele começou a se afastar no corredor. -- Suga hyung tem razão, você fala bem o coreano. -- Ele se virou e foi em direção a cozinha então não pode ouvir a resposta de Thaisi:

-- Obrigada.

Na cozinha, Jimin não sabia bem o que pegar para Thaisi comer, então resolveu pegar um pouco de cada coisa. Estava arrumando tudo em uma bandeja, quando Hoseok entrou na cozinha.

-- Você não estava fazendo dieta, Jiminie? -- Hobi perguntou pegando uma garrafa de água na geladeira.

-- Ah, isso não é pra mim. É pra Thaisi. Suga hyung pediu pra eu ajudá-la enquanto está em Daegu. -- Disse terminando de arrumar a bandeja.

-- Não consigo entender como você consegue aceitar tudo isso tão bem. -- Hobi deu um gole de água enquanto balançava a cabeça.

-- Ela não é má, Hobi.

-- Certo. -- Ele terminou de tomar o resto da água. -- Mas não é no mínimo estranho ela ter aceitado vir pra cá, morar com pessoas que ela nem conhece e que, por acaso, são mundialmente famosas? -- Jimin suspirou.

-- Ela deve ter seus motivos. Por que você não pergunta a ela? -- A resposta sincera de Jimin pegou Hoseok de surpresa e ele ficou sem resposta. Jimin pegou a bandeja e saiu da cozinha. Tinha sido bom Thaisi não ter ido para a cozinha afinal.

Levando a bandeja para o quarto, Jimin a apoiou na mesa de cabeceira. Enquanto ia destampando os recipientes explicava:

-- Trouxe arroz, peixe, kimchi... -- Thaisi balançou a cabeça rejeitando.

-- Você não gosta de kimchi? -- Ele tapou novamente o recipiente de kimchi.

-- Gosto, mas não estou gostando do cheiro hoje. -- Ela falou baixinho. -- Desculpe.

Jimin, abriu o kimchi de novo e cheirou, será que tinha estragado? Mas o cheiro estava perfeitamente normal pra ele. Deu de ombros:

-- Tudo bem, eu levo esse de volta. Também tem ensopado de legumes. Enfim, só comida bem coreana. -- Sorriu tímido, fazendo com que os olhos se tornassem pequenas riscas em seu rosto. Thaisi retribuiu com um pequeno sorriso:

-- Obrigada.

-- Ah, por nada. Eu vou deixar você comer a vontade e... -- Jimin coçou a nuca, deveria perguntar?

-- Sim? -- Thaisi o incentivou a continuar.

Tirando um papel dobrado do bolso da calça ele o estendeu com as duas mãos para Thaisi.

-- Por acaso foi você que me escreveu essa carta?

Ela pegou o papel, abrindo-o.

-- Sim, fui eu. -- Ela devolveu a carta a ele.

Jimin, por sua vez, ficou realmente animado.

-- Ah, obrigado! Essa carta fez muito bem pra mim! Quando você escreveu sobre o processo de poda ser uma preparação para a primavera, agora sempre que algo ruim acontece eu penso que dali pode nascer algo muito bonito, como as flores, então não me sinto tão triste. Obrigado, de verdade.

Thaisi pareceu ficar constrangida e baixou os olhos para as próprias mãos. Era como se ela não soubesse o que dizer a ele.

-- Bom, eu vou te deixar comer em paz. -- Ele pareceu perceber o desconforto dela, então se retirou levando consigo o pote de kimchi. Agora que ele tinha certeza que ela era a autora da carta, toda sua desconfiança sobre Thaisi se dissipou. Naquele instante, mesmo sem saber, ela havia ganhado mais um amigo.

****

-- Yeontan? Yeontan? -- Onde ele havia se metido? Taehyung coçava a cabeça enquanto procurava seu pequeno amigo de quatro patas. Chegando perto da porta do quarto de Suga hyung, ele percebeu que a porta estava entreaberta. Ah não! Será que Tanie tinha entrado lá de novo e feito xixi em mais alguma coisa do hyung? Foi então que ele escutou um pequeno latido o que o fez se precipitar para dentro do quarto.

O fato é que Taehyung tinha esquecido momentaneamente que Thaisi estava instalada ali, pois haviam se passado três dias desde a chegada dela na casa e ele não havia tido contato algum com ela. Por isso ele levou um susto, ao ver a moça sentada na cama segurando seu cachorro.

-- Oooooohhh!! Desculpe, desculpe! -- Ele começou a se curvar em noventa graus, várias vezes. Até que o latido alegre de Yeontan chamou sua atenção e ele focou na cena que se desenrolava na sua frente: Tanie lambia o rosto da moça, que sorria pra ele enquanto o acariciava. Ela então se levantou e entregou-o para Taehyung.

-- Obrigada. -- Ele agradeceu meio sem jeito. -- Pensei que ele estaria fazendo xixi em alguma coisa do hyung, de novo.

Thaisi deu uma pequena risada quando ele disse isso.

-- Yeontan é ainda mais bonito pessoalmente que nas fotos.

Taehyung ficou realmente surpreso dela ter dito aquilo em um coreano muito bom. Sorriu quadrado.

-- Ele é mesmo, não é? -- Levantando os olhos, Taehyung acabou encarando sem querer Thaisi, que também olhava pra ele, e o momento acabou ficando estranho entre ambos. Desviando o olhar ele inclinou levemente a cabeça agradecendo:

-- Obrigada de novo. -- Se retirando do quarto e fechando a porta atrás de si, Taehyung se afastou pensativo.

Yeontan havia gostado da moça do Suga hyung e ela havia sido incrivelmente gentil com o seu cachorrinho intrometido. Ela deve ser uma boa pessoa, ele pensou, sorrindo quadrado novamente.

****

Quarta-feira de manhã, os seis rapazes tomavam café da manhã juntos na cozinha. Tinha sido um pedido de Namjoon para resolverem algumas coisas sobre a viagem do dia seguinte.

-- Amanhã saímos bem cedo pro aeroporto de Gimpo, então vocês precisam arrumar hoje suas coisas. Sempre algum de vocês deixa isso pra última hora!

Todos balançaram a cabeça afirmativamente para as palavras do líder do grupo, apesar de parecerem estar mais interessados na comida a frente.

-- Vamos gravar o novo Muster no Japão e participar de alguns programas de televisão, como vocês já sabem, mas foram encaixadas mais duas atividades de dois patrocinadores nossos: um fanmeeting e um fansign, em dias diferentes.

-- Achei que a gente ia ter algum período de descanso por lá, mas pelo visto não -- Jin comentou, com a boca cheia.

-- Queria passear em Osaka, o final do verão lá é sempre muito bonito. -- Jimin fez um muxoxo com a boca.

-- Ah, foi bom você ter falado isso Jiminssi. Não vamos poder passear por lá. Coréia e Japão não estão em um bom momento diplomático e isso pode ser um risco pra gente, infelizmente. -- Namjoon deu a péssima notícia. Houve um gemido geral de desaprovação.

-- Então vamos comemorar nossos aniversários dentro de hotéis, RM hyung? --  A cara de Jungkook era de um pesar enorme.

-- Acho que sim Kookie. -- Namjoon respondeu. -- Desculpe.

-- Você vai precisar passar essas informações pro Yoongi depois. Se bem que ele não vai se importar com a parte de 0 passeios! -- Hoseok riu, quebrando o clima triste da mesa e fazendo todos rirem também. -- Aliás, ele não deveria já ter chegado?

-- Ele me mandou uma mensagem falando que precisava resolver um assunto antes de voltar pra casa e que chegaria mais tarde hoje.

-- Entendi. Como será que foi a conversa com a mãe dele? -- Hoseok confabulou, e todos ficaram sérios de novo, pois sabiam sobre o que ele estava falando.

-- Nem tem como saber isso, a tia é sempre uma caixa de surpresa. Ela pode não gostar, como pode amar. -- Jin deu de ombros, voltando a comer.

-- RM hyung, a moça vai ficar realmente sozinha aqui na nossa casa? -- Jungkook perguntou, abrindo ainda mais seus grandes olhos.

-- Eu estou resolvendo isso com o PDnim, mas ele me disse que quer conversar isso junto com o Yoongi hyung. -- Namjoon explicou. -- Dei a sugestão de um dos empregados da Big Hit ficar aqui com ela. Vamos ver o que vai ser decidido.

-- Vai ser um trabalho fácil pra essa pessoa, porque nem parece que ela está morando aqui. Ela é muito quieta. -- Disse Taehyung.

-- Ela pode ser quieta, mas ela me deu um susto ontem a noite! Tava entrando na cozinha pra fazer um lanche e dei de cara com ela parada lá, no escuro. Parecia um fantasma! -- Jin contou, arregalando os olhos e rindo.

-- Aconteceu uma coisa parecida comigo na segunda de manhã! -- Hoseok disse, rindo também. -- Fui usar o banheiro e de repente a porta abriu e era ela. Eu gritei de susto! Parecia realmente um fantasma!

-- Os dois gritaram, eu ouvi. Vocês são muito medrosos e...

-- Não achei que ela parece um fantasma, ela só parece triste. Muito triste. -- Jungkook interrompeu sem querer o que Jimin estava falando, enquanto olhava para um ponto fixo na parede. No dia anterior ele tinha ido ver o porquê do grito de Jin hyung e a vira saindo da cozinha cabisbaixa. Ela passou por ele e parecia nem ter o visto.

-- Você achou ela triste, Jungkook? -- Namjoon chamou a atenção dele com a pergunta.

-- Hum? -- Jungkook piscou muitas vezes, focando o olhar no amigo mais velho. -- Sim, sim. Definitivamente ela pareceu triste pra mim, hyung.

-- Eu acho ela triste e também com medo.  -- Jimin falou, concordando com Jungkook. -- Acho que estamos tratando ela muito mal, aliás.

-- Já virou amigo dela Jimin? -- Hoseok perguntou, sério.

-- Ela é legal hyung. Sabe que ela me escreveu uma carta que tem me ajudado bastante? -- Jimin respondeu, encarando o amigo, muito sério.

-- Ela é legal mesmo... -- Disse Taehyung, que até o momento estava quieto, só ouvindo.

-- Sério Tae? Por que você acha isso? Falou com ela também? -- Jimin voltou sua atenção para ele surpreso.

-- Falei bem pouco, mas o Yeontan gostou dela, por isso eu sei que ela é gente boa.

-- Ah Taehyung, só porque o Yeontan gostou dela você acha que ela é legal? -- Jin riu dele.

-- Ah hyung, o Tanie tem um ótimo discernimento de quem é legal. Lembra daquele segurança de quem ele não gostava? Pois então, PDnim depois descobriu que ele estava querendo vender informações nossas pra imprensa! -- Taehyung começou a argumentar e os outros também começaram a discutir junto com ele.

Namjoon, porém, ficou calado só observando. Lembrou das palavras de Jungkook e do que Jimin falou sobre estarem tratando a moça mal. Sendo sincero, ele não tinha tido nenhum contato com ela naqueles dias, não tinha sequer a visto na casa. Talvez Jimin tivesse razão, e Namjoon não gostou da imagem de si mesmo que se formou na sua própria cabeça: intransigência e grosseria.

Os meninos, agora discutindo sobre o discernimento dos outros bichos de estimação da casa, começaram a levantar da mesa. Jungkook reclamou que não queria ficar responsável pela louça de novo e sugeriu um pedra, papel e tesoura pra resolver a questão, mas os outros o ignoraram.

Namjoon saiu da cozinha, tentando desanuviar a cabeça. Passando pela sala ele viu Yoongi entrando na casa com muitas sacolas de supermercado.

-- Chegou hyung? Quer ajuda? -- Yoongi olhou pra ele, mas sem focar.

-- Só um minuto. -- Respondeu deixando as sacolas no chão e saindo pela porta novamente.

Namjoon ficou curioso sobre o que era tudo aquilo. Eles iam viajar no outro dia, e a moça não ia conseguir comer tudo aquilo que Hyung havia comprado sozinha.

Yoongi então voltou carregando um tipo de cesto.

-- O que é iss... -- Namjoon não conseguiu terminar a pergunta que iria fazer porque logo atrás dele entrou uma mulher muito alta, carregando um bebê.

-- Bom dia Joonie! -- Yoongi cumprimentou um Namjoon agora assustado. -- Essa aqui é a Luciana, a irmã da Thaisi, ela vai ficar aqui enquanto estivermos em viagem no Japão.