Epílogo
Atualmente
O coração de Melinda sempre estivera no lugar certo, batendo que nem fogo latente, querendo incendiá-la por completo. Ela precisava de abrir asas e voar, de relembrar quem ela fôra outrora, noutras vidas, de sentir o ar sob suas penas, de sentir o fogo que fazia parte de si. A sua aparência, seu aspecto humano não era sua verdadeira essência. Cila tinha razão. A sua verdadeira essência era a fénix. O reino das fadas porporcionava-lhe essa clarividência, por isso uma voz interior, a da irmã de outra vida, a da mula sem cabeça que a atormentara toda a vida a relembrou de duas palavras:
- Filhos do tempo.
Não sabia quem eram, onde estavam ou como chegar até eles, mas eles eram a pista para encontrar Xavier e ela simplesmente não iria desistir por nada.
Filhos do tempo, filhos do tempo, filhos do...
Sentiu uma mão quente e macia pousar em seu ombro. Poderia ser Capitolina, a avó emprestada de outra vida, ela gostava que fosse. Queria agradecer o seu amor, queria abraçá-la. Não sabia porque de repente se lembrara dela e a saudade a assolara. Foi uma sensação tão aleatória. No entanto, tudo se devia ao facto de ela ter finalmente aceite quem ela tinha sido outrora. Amara. Ela foi Amara um dia e depois disso teve muitos nomes, até chegar aos dias atuais. Melinda Torres era o melhor nome que tivera em todas as suas vidas, porque seu corpo era o lar de um turbilhão de segredos e ela gostava tanto de dizer:
Segredos são como torres.
Ela nascera numa torre, de um ovo de dragão fêmea, a última a viver em Portugal. Quando voltasse à sua dimensão terrestre, ela sabia para onde queria ir, Algar da pena. Queria voltar onde outrora estivera uma torre. Saber o que acontecera com aquele lugar, encontrar mais respostas. Melinda estava sedenta de respostas.
A mão em seu ombro era de uma fada com cabelos de madeixas verdes e azuis turquesa. Nunca pensara ver alguém com aquelas cores, nem mesmo as moças do salão de cabeleireio da sua rua que todas as semanas tinham o cabelo de uma cor diferente. Aquela fada maravilhosa batia asas mesmo estando a dois centímetros do chão, como se tivesse preguiça de caminhar.
- Sim? - inquiriu Melinda.
- Melinda Torres, não é? A fénix.
- Quem quer saber?
- Frida, ela mandou chamar-te.
- Quem é essa?
- É a grande profetiza do Fairie.
- Porque eu deveria ir?
- Ela falou que perguntaria isso. Disse-me para eu lhe mostrar este papel.
Tirou o papel de um bolso de seu vestido e entregou a Melinda.
Melinda leu:
Filhos de Tempo.
Eu sei quem são.
Melinda olhou para a fada à sua frente, dizendo apenas com o olhar que a seguiria até à outra fada.
- A propósito, é um prazer conhecê-la. As fénixes são raras e espantosas. Aproveite para usar sua fénix por aqui. Nós estamos protegidas. O único humano neste mundo... bem, você sabe quem é.
- Eu entendi. Eu vou usar sim, com muito gosto.
Subiu alguns degraus e entrou numa casa aconchegante. Um coelho a olhava de cima de uma mesa. A fada à sua frente parecia esperar pela tal Frida, então Melinda experimentou uma aproximação subtil ao coelho que ela pensara que iria fugir, no entanto ele ficou onde estava, esperando uma carícia. Quando a mão de Melinda pousou em seu pelo, deu um pulo com uma voz que pronunciou o seu nome alto demais. Teve a certeza de que se tratava da tal Frida. Olhou a mulher de cabelos com madeixas cinzentas e brancas. Uma interessante escolha de cores. Ou será que aquelas cores extravagantes eram naturais das fadas?
- Melinda Torres, quer um chá de camomila? De girassol talvez?
Girassol? Melinda nunca tinha escutado falar. Seria coisa de fada ou era ela que não conhecia?
- Pode ser de girassol - ela respondeu. Ficara curiosa.
- Sente-se - disse a fada, mostrando o seu sofá revestido de flores.
Melinda sentou-se expectante e impaciente.
- Não quero ser mal educada - disse Melinda - Mas por favor seja directa. O que me quer dizer sobre os filhos do tempo. O que é isso? É um nome de código?
Frida sentou-se e a fada que chamara Melinda serviu-lhes chá.
- Calma. Antes eu tenho que explicar uma coisa sobre as fadas.
Melinda cerrou os punhos com a ansiedade.
- Nós fadas viviamos no mundo humano, porém corríamos bastante perigo, foi então que criamos esse reino, Fairie, Veuna... Eu sou filha de uma fundadora. Nós fadas não somos imortais, porém vivemos muitos anos. Não morremos de doença ou causas naturais.
- Como as ninfas - constatou Melinda, lembrando-se de Emira.
- Sim, exactamente.
- O que isso tem a ver com os filhos do tempo?
- Eu vou lá chegar num instante. Existem várias espécies de fadas, as profetizas como eu, as noturnas como acredito que já saiba, as fadas neutronas... enfim, existem muitas, tantas que eu não poderia mencionar todas. As que nos interessam realmente para esta conversa, são as fadas minerais. Elas são as fadas que criam pedras. Todo o tipo de pedras, inclusive mágicas. Ao criarem este mundo, as fundadoras perderam algumas pedras mágicas pela Terra e tudo bem, segundo se pensava, os humanos não saberiam que eram mágicas e mesmo que soubessem elas não teriam efeito com eles, pensavamos nós. Estavamos enganadas. Descobrimos que alguns humanos, poucos, porém reais conseguiam sentir-se conectados com as pedras mágicas que os faziam viajar no tempo. E foi assim que eles surgiram.
- Os filhos do tempo - disse Melinda, que tinha prendido a respiração e ainda não soltara o ar.
- Filhos do tempo - repetiu Frida - Ou filhos da falta de atenção das fadas. Eles descobriram com o tempo que as pedras escolhem a pessoa. Não basta ter a pedra, é preciso que haja algo no humano para ativar o poder das pedras.
Melinda soltou a respiração.
- E as fadas não estão preocupadas com isso?
- Já estivemos há muito muito tempo, mas não mais. Felizmente a magia das fadas parece não funcionar com quem tem intenções retorcidas, perversas, que nem...
- O meu avô. Pode dizer.
- Eu lamento.
- Eu não. Foi ele quem raptou o meu irmão e a minha irmã de outra vida apareceu na minha morte e falou dos Filhos de tempo, que eles tinham conexão com o Xavier. Como é que você sabia que eu procurava respostas sobre a identidade dos filhos do tempo?
- Eu poderia dizer que és muito transparente, porém eu sou uma profetiza. Não sabia porquê, nem para quê, mas sabia que precisavas desta informação. Agora podes ir para a rua, e voar por Fairie à vontade.
Melinda bebeu seu chá de um trago só. Aquele sabor de girassol era mágico e o chá estava na temperatura perfeita, nem morno, nem a ferver, simplesmente quente.
- Se eu quiser falar consigo outra vez, como faço?
- Ora, eu sou uma fada, basta chamares-me em pensamento. Frida! Frida é o meu nome.
Cila tinha-a chamado atenção para aquilo mesmo. As fada chamam-se pelo pensamento! Ela fez uma nota mental para nunca mais esquecer. Devia ser por isso que o mundo humano ficara perigoso para elas viverem. Parecia um pouco perigoso aparecer a alguém só porque essa pessoa te convocou.
Não sentia que tivesse avançado muito na sua investigação, mas como polícial que era, sabia que cada passo em frente era mais um passo no caminho do sucesso, neste caso de Xavier. Era como se a sua ida ao mundo das fadas tivesse tido um propósito desde o começo. Ela não acreditava em Deus, mas estava começando a acreditar em destino traçado, porque parecia que tudo, sobretudo após conhecer Maurício, a estava encaminhando na boa direção. Ela torcia muito para que no fim desse caminho estivesse Xavier.
O próximo passo era descobrir o que é que Xavier tinha a ver com os Filhos do tempo, essas pessoas que viajavam no tempo com ajuda de pedras mágicas fabricadas por Fadas minerais.
Era que nem Pedro dizia "Cada tiro, cada melro".
Com um sorriso, Melinda abandonou seu corpo de adolescente e transformou-se completamente na fénix. Os habitantes de Fairie olharam para o céu com admiração e entusiasmo.
- Nossa, a fénix encantada - disse uma fada com espanto.
- É - respondeu a fada ao seu lado - A Amara sempre foi maravilhosa, uma força da natureza. Sê tu mesma, pequenina. Voa voa voa...
🔥🔥🔥
Agora sim, eu sinto que cheguei ao fim.
😉
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