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Capítulo 10 - O preço da Mentira

Outubro de 1914, Paris 

A brisa fria que soprava naquela manhã nublada, trazia consigo os primeiros dias de outono em Paris. Da janela do hotel onde estava hospedado, Elliot olhava para a paisagem encantadoramente triste fora dali e pensava sobre os últimos acontecimentos .

Paris continuava linda como sempre. Apesar do dia sombrio, era muito difícil não se apaixonar pela cidade vibrante,  que parecia seduzir a todos que pisavam em seu solo abençoado.

 Não era a primeira vez que vinha até ali. Quando estava na faculdade, em período de férias, ele viajara até a França com alguns amigos e o encantamento por aquela cidade era o mesmo que agora. Só não estava sendo melhor porque seu coração apreensivo não permitia.

Elliot se inclinou um pouco para frente, apoiando seus braços no parapeito, enquanto inspirava e expirava, observando a fumaça de sua respiração flutuar de suas narinas para fora, quase como se desenhasse pelo ar frio. Naquele momento, seus pensamentos se voltaram para a mulher que descansava no quarto ao lado, e o coração dele se apertou de aflição. 

Fazia três dias que Amybeth não saía do quarto e quase não se alimentava. Ela estava apática e toda a energia que a trouxera até Paris parecia ter se extinguido. Elliot nunca a vira daquele jeito, tão calada e tão triste. Era de partir o coração, mas Amybeth não se abria com ele; na verdade, ela parecia se esconder dentro de si mesma e não deixava ninguém entrar.

Não podia ajudá-la daquela maneira. Elliot até pensara em levá-la ao médico, mas quando falara com ela sobre aquele assunto, a ruivinha o encarara com tanta dor no olhar que ele desistira de tentar convencê-la.

O rapaz não entendia o que estava acontecendo e se perguntava se tinha feito algo errado, se a tinha magoado de alguma maneira no dia em que a beijara. Mas nenhuma lembrança passava por sua cabeça. Ela havia bebido muito naquela noite e, depois do beijo, ambos tinham voltado para o hotel e dormiram em seus quartos. No dia seguinte, Amybeth já estava naquele humor terrível e nada do que ele fizera ou falara conseguira arrancar daqueles lábios um sorriso sequer.

Ele queria que ela falasse qualquer coisa, que chorasse em seu ombro, que desabafasse a verdadeira razão daquela súbita melancolia aterrorizante. Elliot não tinha experiência com aquele tipo de problema. Nunca passara por algo assim, ou tivera alguém próximo que tivesse passado. Sua vida, apesar dos altos e baixos, sempre fora uma aventura para ele. 

Elliot brindava a cada amanhecer e agradecia a cada fim do dia, sentindo que fora mais uma oportunidade de fazer aquilo que amava, ou abraçar aquilo que o destino achava que ele merecia. Nunca pensava nas derrotas como um mau presságio, e sim como uma maneira de aperfeiçoar suas qualidades e corrigir seus erros.

Amybeth, porém, parecia estar além disso. Ela tinha um lado distante que Elliot não conseguia alcançar. O rapaz notara que, às vezes, a ruiva parecia não se contentar com quem era ou o que tinha, e mostrava-se insatisfeita e infeliz. Isso não tinha a ver com bens materiais, pois Amybeth não demonstrava muito interesse por roupas, joias e perfumes. Aquilo tinha a ver com a forma como ela se enxergava por dentro e não havia como mudar os sentimentos dela a respeito de si mesma. 

O jornalista saiu do seu quarto e andou pelo corredor silencioso. Eram nove da manhã, mas a maioria dos hóspedes do hotel ainda não tinha se levantado e isso não era surpresa nenhuma, uma vez que muitos deles eram homens de negócios ou de famílias abastadas ou milionárias. 

Eles não precisavam levantar às cinco da manhã para pegar meios de transportes lotados a fim de chegar ao trabalho, onde passariam quase doze horas do dia dedicando o seu tempo e o seu suor.

Elliot era um desses privilegiados, mas não se sentia bem em desfrutar de uma vida ociosa quando havia tanta coisa lá fora para ser conquistada, especialmente se pudesse mudar a vida se alguém. 

Com esse pensamento em mente, o rapaz sorriu. Parecia estar ouvindo a voz de seu pai, que o chamava de idealista desde seus quinze anos. Elliot fora uma criança inquieta e um adolescente incansável. 

Sua luta por justiça começara cedo e, quando fora para a faculdade, ele se envolvera em várias situações que culminaram com sua prisão de uma noite, pois seu pai tinha influência e bons advogados para livrá-lo das possíveis consequências. 

Elliot não carregava esses “ pequenos delitos”, nas palavras de seu pai, como vergonhosos. Na verdade, ele os considerava um troféu, porque tinham acontecido por uma boa causa e não se arrependia por isso.

O rapaz passou pelo saguão do hotel, cumprimentou o atendente que trabalhava ali pela manhã e que lhe entregou seu chapéu e casaco, e caminhou para fora, sentindo o ar frio de Paris a acariciar-lhe o rosto.

Ele andou alguns passos até a banca de jornal mais próxima, comprou o exemplar do dia e foi até a cafeteira do outro lado da rua. Ao se sentar, o garçom se aproximou e Elliot fez o seu pedido de sempre, e logo, ele estava mergulhado nas matérias da primeira página. 

As notícias não eram muito animadoras. A guerra se aproximava cada vez mais da França.  Ninguém estava seguro e o mundo parecia um caos. Elliot pensava no egoísmo do ser humano, de seu pouco amor e empatia pelo seu próximo, criando um tipo de destruição que não favorecia ninguém.

Enquanto tomava café, pensando em tudo aquilo, seu coração começou a ficar pesado, conforme a impotência de não poder fazer nada além de escrever artigos que informassem a realidade do que estava acontecendo chegava em sua consciência. 

Angustiado, Elliot se levantou da mesa, deixou algumas notas sobre a mesa para pagar seu café e saiu dali, caminhando de volta ao hotel. Ela precisava ver Amybeth, pois enquanto estivesse com ela, toda aquela sensação de pesar não conseguiria tocá-lo.

Ele a encontrou deitada na cama, com o semblante sério e olhando para o teto. A princípio, Amybeth não reagiu à presença de Elliot, porque fingir que ele não estava ali tornava tudo mais fácil.

Doía olhar para ele, porque sabia o que encontraria naqueles olhos tão sinceros. Havia certa misericórdia, tristeza pelo seu estado e compreensão. E, por mais que ela soubesse que eram sentimentos bons, sentia que não merecia nenhum deles.

Estava naquele limbo, onde sentia dor por toda parte. Não era um desconforto físico, mas sim espiritual e, por isso, era mais sofrido que uma dor comum, porque não havia um remédio certo para acabar com sua dor.

Preocupado com o silêncio dela, Elliot se aproximou, sentou-se na cama e segurou a mão gelada da garota nas suas, e pediu:

― Amybeth, fala comigo.

Ela balançou a cabeça, continuando a encarar o teto, porque não tinha coragem de olhar para Elliot. Seu coração era um poço tão fundo que temia se perder nele e não conseguir mais voltar. Ao mesmo tempo, Amybeth se perguntava por que toda vida se sentira assim? Desde seu nascimento, ela tinha aqueles sentimentos arraigados em sua alma, sentia-se  perdida, fora do lugar e vazia. E aquela sensação vinha crescendo com o tempo, mesmo que não tivesse motivos ou explicação para aquela dor.

― Amybeth, eu estou aqui. Converse comigo.  Eu quero te ouvir. ― Elliot falou.

― Eu…― Ela começou, sem conseguir prosseguir, pois um soluço inesperado saiu de sua garganta. Amybeth não percebeu que estava em lágrimas, mas elas corriam por seu rosto pálido como uma cascata de um sofrimento atroz.

Elliot sentiu seu coração se partindo, ao ver o rosto lindo da ruiva se desfazer em um choro dolorido.  Ele a puxou para si e a fez deitar em seu colo, acariciando o cabelo dela como se a encorajasse a falar. Assim, o rapaz esperou em silêncio, até que Amybeth se acalmou o suficiente para começar a falar:

― Desculpe-me. ― A voz dela saiu um pouco chorosa.

― Por quê? ― Elliot perguntou, segurando a mão dela e a levando aos lábios.

― Por tudo isso. Eu não queria que  você me visse assim. ― Amybeth respondeu, com um suspiro profundo. 

― Eu não me importo. Só queria saber como te ajudar.  ― Ele afirmou, com a voz em um tom aflito.

― Você não pode. Ninguém pode. ― Amybeth respondeu, fechando os olhos, sentindo a carícia de Elliot em seus cabelos, que era como um bálsamo para sua alma.

 ― O que te deixou assim? Pensei que estivesse feliz por estar em Paris comigo. ― O rapaz disse, tentando entender o comportamento de Amybeth nos últimos três dias.

― E estou feliz, mas eu sou assim por dentro, Elliot, triste e insatisfeita. Eu nasci desse jeito e parece que nada preenche o buraco que tenho na minha alma. ― Ela confessou, aliviada por conseguir abrir um pouco o seu coração. Estava claro que havia mais, porém, não conseguiria de fato deixar que Elliot visse a escuridão que ela carregava desde sempre.

― Desde quando se sente assim? ― Elliot perguntou. Queria ajudá-la, mas para isso precisava que Amybeth lhe contasse a origem de toda aquela tristeza.

― A vida toda. ― Amybeth respondeu, deixando-o perceber o seu cansaço emocional. Às vezes, dormir era a única coisa na qual conseguia pensar quando se sentia assim. 

Na sua casa na Inglaterra, ela sempre fingira bem. Quando tinha essas crises, ela fingia estar doente, assim, ninguém lhe perguntaria o motivo de sua quase inércia total.

Anne era a única que a entendia. Mesmo que Amybeth não contasse, sua irmã inconscientemente sabia, e não lhe fazia perguntas, apenas ficava ao seu lado até que ela voltasse a ficar bem. 

― Nunca procurou ajuda? ― Elliot perguntou, porque a ele lhe parecia que aquele era um caso de melancolia profunda. Amybeth sempre lhe pareceu uma garota feliz. Rebelde, era verdade, mas nunca dera indícios de que tinha este lado infeliz. Tal constatação o fazia amá-la ainda mais, por fazê-lo perceber que ela precisava de carinho e atenção mais do que nunca.

― Eu tinha a Anne. Ela estava lá por mim o tempo todo. Ela me protegia e sabia como cuidar de mim. Engraçado,que meu pai pensava que ela era o elo mais fraco, mas ele não imagina quanta força Anne tem. De certo modo, eu sempre a invejei, porque ela aceita quem é e não se sente deslocada. Eu sempre fui aquela que precisava provar algo para alguém ou para mim mesma, porque tinha medo de olhar para dentro do meu coração e descobrir que não havia nada pelo que lutar. ― Amybeth disse, enxugando as lágrimas com o dorso das mãos, enquanto tentava equilibrar suas próprias emoções.

― Não diga isso. Você tem muito pelo que lutar. É inteligente, linda e consegue realizar qualquer coisa que desejar. Esses sentimentos vão passar, Amybeth, e verá que não existem apenas as cores cinzas e negras. Lá fora, existe um arco-íris inteiro esperando por você e basta apenas que consiga enxergá-lo. ― Elliot a encorajou. 

Ele pensava mesmo daquela maneira, pois seu espírito era livre e sua alma não conhecia nenhum tipo de limite. Elliot fazia o que desejava, mas obviamente entendia que, por ser homem, a vida lhe era muito mais fácil. Amybeth, por sua vez, nunca teria as mesmas oportunidades que ele, por mais que lutasse contra um sistema machista e retrógrado.

― Obrigada, Elliot. Por ser tão bom para mim. ― Amybeth disse, sorrindo de leve e sentindo seu coração disparar quando o rapaz fez o mesmo. Ela se recusava a admitir que aquele rapaz tão bonito, causava-lhe sentimentos inquietantes, dos quais desejava fugir, mas estavam se tornando o centro de tudo.

― Você merece toda a atenção do mundo.Eu sei que tem medo de que as pessoas te abandonem e, por esta razão, se afasta antes que aconteça. Mas não precisa fazer o mesmo comigo, pois nunca vou te abandonar. ― O rapaz disse, beijando-a na testa.

Amybeth quase chorou de novo quando ouviu aquelas palavras. A garota autossuficiente na qual ela tentava fazer as pessoas acreditarem que ela era, não passava de ímã fachada para esconder suas reais fraquezas, mas Elliot a aceitava exatamente assim e Amybeth não precisava mascarar nenhuma de suas emoções.

― Deita aqui comigo. ― Ela disse, apontando para o lado vazio da cama. Amybeth tinha consciência de que aquele pedido não era apropriado, justamente porque ela era uma moça solteira e não devia se envolver em situações assim com um homem. Entretanto, ela não se importava com isso, pois, no momento, tudo o que precisava era de um pouco de consolo, calor humano e companhia.

Elliot arqueou a sobrancelha por conta de um pedido tão incomum. Ele era um homem vivido, mas decente, e não desejava estragar a reputação de uma moça como Amybeth. O rapaz se recordava do que tinha acontecido com outra moça no passado, mas não fora sua culpa. A garota em questão, inventara uma história sobre os dois, depois que ele rejeitara suas atenções, e arcara com as consequências. Porém, isso não impedira dele ser visto como um Dom Juan sem coração.

Todavia, naquele momento, era a mulher que ele amava que lhe fazia aquele pedido e a vulnerabilidade no rosto dela o convenceu. Deste modo, o rapaz jogou a cautela de lado e se deitou ao lado dela na cama, colocando uma das mãos delicadamente na cintura fina, e disse:

  ― Agora, tente dormir.

Amybeth obedeceu, fechando os olhos enquanto sentia a respiração de Elliot bater em seus, causando-lhe uma sensação tão boa de paz interior que ela adormeceu logo em seguida.

Na Cornualha, Anne tinha acabado de se levantar. Se não fosse pela saudade de sua irmã, ela estaria se sentindo nas nuvens com todas as atenções que o Duque vinha lhe cercando. Entretanto, seu coração estava um pouco apertado naquela manhã, pois sentia que havia algo de errado acontecendo com ela.

Elas dividiam aquele sexto sentido que gêmeas geralmente desenvolviam entre si. Em todos os momentos em que Amybeth não estava bem, Anne sabia e a única diferença agora era que não poderia ir até onde sua irmã estava para verificar com os próprios olhos.

Por esse motivo, sua ansiedade a fizera sair da cama quando o sol ainda estava se levantando e, como todos da casa ainda dormiam, ela fixou em seu quarto até que ouviu a movimentação dos criados do lado de fora.

Vestindo-se informalmente, Anne escovou os cabelos, enquanto continuava a pensar na irmã. Precisava enviar uma carta a ela o quanto antes, pois Amybeth tinha lhe escrito apenas uma vez, e Anne não tivera ainda a chance de responder.

Sem paciência para um penteado mais elaborado, ela colocou uma presilha de cada lado do cabelo e se deu por satisfeita. Não sabia o que o Duque pensaria daquela informalidade, pois as garotas adultas daquela época,não usavam os cabelos soltos daquela maneira, mas naquele Instante em que se sentia inquieta por dentro, Anne decidiu que não se importaria com regras sociais. 

Quando abriu a porta, encontrou Gilbert com a mão direita posicionada para bater nela, e a visão inesperada do Duque a fez prender a respiração. 

Ele estava tão bonito que era quase um sacrilégio não olhar para o rapaz. Os cabelos escuros estavam molhados, evidenciando que ele acabara de banhar-se e vestia roupas informais também.

Seu traje costumeiro fora substituído por calças comuns escuras, com suspensório e camisa branca de mangas compridas, abotoadas no punho. E para completar toda aquela produção simples, um sorriso sedutor se desenhou nos lábios masculinos assim que a viu. 

Aqueles mesmos lábios a haviam beijado dois dias atrás e Anne ainda não se acostumara com aquilo. Não sabia se era conveniente deixar que seu futuro marido a beijasse, quando havia ouvido a vida toda que tal intimidade deveria existir depois que os laços do casamento haviam sido firmados. Mas os lábios macios dele nos seus eram tão bons, que se via incapaz de resistir.

― Bom dia. Espero que tenha dormido bem. Vim perguntar se, depois do café da manhã, você gostaria de dar um passeio comigo? Quero que conheça algumas pessoas que são importantes para mim. ― O rapaz revelou, admirando-a também, especialmente por causa dos cabelos ruivos soltos, que era a primeira vez que os via assim.

Eram uma massa brilhante de fios que caiam lisos e encantadores pelas costas dela, fazendo-o desejar ardentemente tocá-los e sentir sua maciez. Amybeth os prenderá de lado, deixando o formato de seu rosto destacado, e quando olhava para ela assim, Gilbert descobriu que seus sentimentos por ela eram bem mais profundos. Se era amor, o rapaz não tinha pressa para descobrir, porque tinham uma vida inteira juntos pela frente. Por hora, queria apenas aproveitar cada momento com ela, pois assim, estavam construindo sua história.

― Eu aceito o convite. Gosto quando me apresenta pessoas da sua vida. Sinto-me mais próxima de você. ― Anne respondeu, sorrindo de leve.

Os olhos de Gilbert brilharam com aquela resposta, assim como  ele sentiu seu peito se enternecer. Era bom saber que ela estava levando a sério as interações que teriam com as pessoas próximas dele, tornando-a realmente parte essencial da família Blythe. Esta ideia o encantava mais do que qualquer coisa. Quase já podia imaginá-la andando pelos cômodos da casa e se sentindo totalmente confortável em seu papel de duquesa 

Apenas se espantava em constatar que Amybeth havia mudado naqueles dias em que se conheciam. Ela não parecia mais se incomodar com a presença dele e não lhe lançava sorrisos forçados, como se o fizesse por obrigação. Talvez, sua noiva tivesse finalmente se convencido de que um casamento com ele era o que a faria feliz, mas um outro pensamento cruzou sua mente e ele fez o possível para afastá-lo dali.

― Eu também quero conhecer as pessoas que fazem parte de sua vida. É importante para mim essa aproximação. Quero que não haja nenhum empecilho ou segredo entre nós. ― Gilbert disse aquilo, sem perceber o desconforto que suas palavras causaram em Anne.

Ela odiava se lembrar do papel que estava representando ali e não sabia lidar com aquela situação. Anne nunca saberia imitar Amybeth com veracidade, pois mudar seu temperamento afável, compreensivo e romântico para outro onde havia tanta acidez e insatisfação pessoal era um passo difícil demais para dar.

Ainda assim, ela tentava ser convincente, pelo menos para Gilbert, mas quando ele a olhava daquele jeito, como se esperasse que ela lhe revelasse cada parte escondida de sua alma, Anne quase tinha vontade de acabar com tudo e dizer a verdade.

Entretanto, era sempre a imagem da irmã implorando-lhe para ajudá-la a escapar daquele casamento que surgia em sua mente naqueles momentos, e também o olhar acusador de seu pai. Ela não podia trair a irmã ou fazer seu pai passar por ridículo dentro de uma sociedade inteira, que não perdoaria a nenhum deles. Anne estava entre a cruz e a espada, e não enxergava nenhuma brecha fora daquela situação.

― Eu só tenho meu pai e minha irmã como pessoas próximas, além de Diana, é claro. ― Ela confessou aquela verdade. Pelo menos, podia ser sincera sobre aquela parte de sua vida, dentro de uma rede de mentiras na qual se meteu.

― Não tem mais amigas? ― Gilbert perguntou, espantado e, sem de fato acreditar, no que Amybeth acabara de lhe dizer.

― Anne e Diana sempre foram as minhas únicas amigas, as outras garotas que conheço são apenas pessoas que encontro em algum evento londrino e está bem para mim assim. ― Anne explicou. Quem a ouvisse dizer aquilo, pensaria que ela era uma pessoa muito solitária. Mas, na verdade, não se sentia assim.

Ela ia em festas porque era obrigada pelo pai, que dizia que precisavam se socializar. Contudo, mal conversava nessas festas, porque não tinha os mesmos gostos ou aspirações que a maioria das garotas tinha na sua idade. Os assuntos principais delas eram a última moda de Londres, bordados ou aquela receita nova que a mãe as ensinara a fazer. 

Anne preferia seus livros, a biblioteca da sua casa, ou mesmo conversar com a irmã sobre qualquer coisa que ela desejasse, porque, apesar de ser popular, Amybeth compartilhava a opinião de Anne sobre os temas explorados nas festas.

― Não gostaria de ter mais amigas? ― Gilbert perguntou, interessado na resposta dela. 

Era espantoso, na verdade, que Amybeth sentisse tão bem em círculos tão reduzidos de amigos. Observando Josie, que vivia cercada de pessoas, era difícil imaginar alguém na idade de Amybeth que não se importasse em ter um milhão de amigas para conversar e se divertir. 

Ele mesmo tinha uma infinidade considerável de amigos, embora pudesse eleger seus favoritos. Amybeth não parecia ser o tipo de pessoa que gostasse de ficar trancada em casa. Pelo menos fora essa a impressão que tivera quando a conhecera.

― Depende do que o senhor considera amizade. Como disse, eu conheço muitas pessoas, mas não a ponto de confiar nelas para chamá-las de amigas. Existe muita rivalidade velada, Duque. Principalmente entre aquelas que querem se destacar e encontrar um marido. Não creio que uma amizade verdadeira possa se desenvolver assim. Portanto, nunca quis fazer parte deste tipo de cenário. ― Anne disse energicamente, o que fez Gilbert comentar:

― Mas acabou encontrando um marido mesmo assim. Não era isso que estava procurando?

― Não foi isso que quis dizer. Eu não esperava encontrar você. ― Anne respondeu, encarando-o com aqueles olhos lindos que o faziam pensar nela mais do que devia.

― E agora que encontrou? ― Ele tornou a perguntar, prendendo a respiração sem perceber. 

― Agora que encontrei, penso diferente. ― Anne respondeu, desviando o olhar, envergonhada demais para continuar a encará-lo, pois aqueles olhos sobre ela eram exigentes demais.

― Acho que deve estar com fome. Perdoe-me por prendê-la nessa conversa. ― Gilbert falou, percebendo que a tinha pressionado demais.

― Estou, sim. ― Ela disse, aliviada por Gilbert, não insistir naquela conversa complicada. Não podia revelar muito de si de uma vez, pois tinha medo de se denunciar. 

― Vou te acompanhar até a mesa do café da manhã, mas temo não poder acompanhá-la. Preciso resolver alguns assuntos antes de levá-la até o lugar que prometi. ― Ele explicou.

― Tudo bem. Estou acostumada a tomar meu café da manhã sozinha. Meu pai nem sempre está em casa nesta hora e Anne costumava se esconder na biblioteca. 

― Prometo que, depois do casamento, vou mudar tudo isso. Vamos tomar café da manhã todos os dias juntos. ― Gilbert falou, fazendo com que Anne se admirasse com aquela declaração. 

Ela já tinha percebido que o rapaz era diferente de seu pai. Ele parecia importar-se com as pessoas ao seu redor, e fazia o possível para fazê-las se sentir bem. De alguma forma, isso a confortava.

Gilbert a guiou até a mesa do café da manhã e, logo em seguida, foi resolver seus assuntos pendentes. Anne ficou em sua própria companhia, apreciando o café farto e o silêncio que a ajudava a pensar.

Quando o rapaz retornou, ela já tinha terminado e saíram juntos para a manhã ensolarada que anunciava um dia muito agradável. Gilbert usava uma boina vermelha, que impressionou Anne, pois era a primeira vez que o via usando algo tão informal. Assim que estavam há uma certa distância da casa, o duque se voltou para ela e disse:

― Onde pretendo te levar não fica longe daqui, por isso, não precisamos de nenhum veículo para chegarmos lá. Podemos ir andando. 

― Tudo bem. ― Anne respondeu, no fundo, sentia-se aliviada por não ter que montar em um cavalo, pois da última vez fora um desastre completo.

― Eu posso segurar a sua mão? Não faria isso publicamente, mas estamos só nós dois aqui e gosto de como sua mão se encaixa na minha. ― Gilbert confessou, fazendo-a corar de novo, mas deu sua permissão com um movimento de cabeça.

Ele segurou na mão dela, entrelaçando seus dedos, e Anne constatou que gostava daquele contato também.  Era íntimo e pessoal, deixando-a consciente da presença dele como nunca estivera com ninguém.

Aquela era a forma de Gilbert tê-la por perto, enquanto não podia tê-la por inteiro como desejava. O casamento se aproximava, e ele poderia esperar, mesmo que desejasse beijá-la e tocá-la todo o tempo. Entrara naquela ideia de casamento com um pensamento prático, que resolveria seu problema de ter um herdeiro . Pensara que ele e sua futura esposa poderiam ser amigos, pois em um casamento arranjado era difícil iniciar-se com amor. Mas ele não estava preparado para Amybeth. Ela entrara em sua vida como um tornado e capturara seu coração com aqueles olhos lindos. Estava apaixonado, isso era um fato, por isso,  esperar pela noite na qual ela seria sua tornava-se ainda mais prazeroso.

Eles caminharam por alguns minutos, até que pararam em frente a uma casa simples, mas adorável. Havia uma varanda, onde a cadeira de balanço era o item mais interessante, enquanto as paredes pintadas de branco, assim como pequenos vasos de flores na janela, mostravam o capricho do dono dela. Mais acima, uma chaminé trabalhava a todo vapor, e podia-se sentir o aroma saboroso de carne assada que exalava da cozinha, cujas janelas estavam abertas naquele momento.

― Quem mora aqui? ― Anne perguntou, encantada com o lugar.

― Você já vai conhecê-los. ― Ele disse, com um sorriso maroto, enquanto se adiantava um passo para subir os degraus da escadinha que havia ali, a fim de bater na porta.

Um senhor de cabelos grisalhos, acompanhado de uma senhora igualmente idosa, apareceram na porta. A expressão de afeto que surgiu no rosto de ambos fez Anne sorrir, e mais ainda quando ela ouviu o homem mais velho dizer:

― Gilbert, quanto tempo não aparece aqui, rapaz.

― Andei ocupado, Sr. Cuthbert. Mas sempre encontro tempo para visitar os amigos. ― Gilbert disse, abraçando o homem com afeição e deixando um beijo na bochecha da mulher que lhe sorria materialmente.

― E essa moça linda? É a sua noiva? ― Ela perguntou, olhando para Anne, que observava a cena calada. Era incrível a informalidade que havia entre eles. Gilbert parecia ser muito amado pelos dois.

― Sim. ― Gilbert disse, indo até Anne e a trazendo para perto do casal. ― Esta é Amybeth.

― Muito prazer, Amybeth. Eu sou Marilla e este meu irmão Matthew. ― A mulher disse, sorrindo para Anne, que respondeu:

― O prazer é todo meu.

― Bem-vinda à família. ― Matthew falou, fazendo Anne olhar para Gilbert interrogativamente.

― Esta é minha segunda família. Os Cuthberts sempre foram amigos de meu pai. Marilla, inclusive, foi pedida em casamento várias vezes por meu pai, mas nunca aceitou. ― Gilbert contou, olhando para Marilla com seus olhos cheios de amor.

― Seu pai precisava conhecer alguém apropriado para ser uma duquesa. Consegue me imaginar vivendo com toda pompa e longe da minha cozinha? ― Marilla disse com um gracejo. Anne percebeu naquele tom que não havia nenhum arrependimento de sua parte.

― A senhora o teria feito feliz. ― Gilbert constatou.

― Sua mãe também o fez feliz. No fim, a vida nos encaminhou para o nosso próprio destino. Sempre valorizei a amizade de John e vou levá-la para o meu túmulo. ―Marília disse, sorrindo abertamente para Gilbert, que retribuiu. 

Para Anne, observá-los conversando era como estar vendo mãe e filho juntos. Marilla poderia não ter se casado com John, mas adotara Gilbert como filho e isso era realmente incrível de presenciar.

― Vamos entrar. Quero conhecer um pouco mais dessa garota que conquistou o coração do nosso menino. ― Matthew disse, carinhosamente, fazendo Anne sorrir. 

Já dentro da casa, sentados à mesa, com uma xícara de café e um pedaço de bolo, depois de alguns minutos de conversa, Anne se sentia completamente conquistada pelos dois. Matthew e Marilla eram os tipos de pessoas que faziam qualquer um se sentir à vontade e em casa, por isso, ela compreendia porque Gilbert os amava tanto.

Algum tempo depois, quando Matthew levou Gilbert para dar uma volta pela propriedade, Anne foi deixada com MMarilla,que lhe disse:

― Fico feliz que Gilbert tenha encontrado uma boa moça como você.  Sempre o vi como um solitário, apesar de ter muitos amigos. Isso piorou muito, quando John morreu. Gilbert é um rapaz muito sensível e inteligente.  Sente mais as coisas que acontecem ao seu redor mais do que deveria. A vida toda temi que ele se casasse com aquela Ruby Gillis. Aquela garota morre de amores por ele, mas é mimada demais e nunca estaria à altura de um Blythe. ― Marilla contou, sem saber que acabara com qualquer dúvida que Anne tinha a respeito dos sentimentos de Ruby por Gilbert. 

― Eles parecem bons amigos. ― Ela arriscou.

― Ele sim, ela não. Gilbert nunca percebeu o interesse dela, pois a enxerga como a uma irmã, mas Ruby nunca me enganou. ― Marilla lhe confidenciou mais uma vez. ― Conte-me sobre você. Tem irmãos?

― Tenho uma irmã gêmea. ― Anne contou.

― É mesmo? Como ela se chama? ― Marilla perguntou, encantada com a ideia de Anne ter uma irmã gêmea. 

― Anne. Ela mora em outro país. ― Ela teve o cuidado de dizer. 

― Que pena! Gostaria muito de conhecê-la e ver se é tão parecida com você. ― A mulher mais velha afirmou.

―Somos gêmeas idênticas. Portanto, somos mais que parecidas. ― Anne falou, entristecendo-se de repente.

―Você ficou triste. Sente falta de sua irmã? ― Marilla perguntou, estudando a expressão de Anne.

― Demais. ― Anne respondeu, e percebendo que aquele assunto a deixava triste, Marilla mudou de assunto e perguntou:

― Como é Londres? É parecida com a Cornualha?

Assim, Anne passou os próximos minutos dizendo tudo o que Marilla queria saber sobre sua vida e sua família. Ela entendeu aquilo como uma necessidade da mulher mais velha saber se Gilbert tinha realmente feito uma boa escolha para casar, embora dividisse que Marilla iria interferir em alguma decisão que o duque quisesse tomar.

Quando o rapaz retornou com Matthew, elas já conversavam como velhas amigas, deixando o rapaz feliz por ver que elas estavam se dando tão bem.

Após se despedirem e prometerem voltar para mais visitas futuras, eles tomaram o caminho de casa e foram conversando sobre o velho casal com quem Anne se simpatizara imensamente.

Ao chegarem nas imediações da casa dos Blythes, Anne viu Diana conversando com Jerry e ficou surpresa por vê-la tão animada. Nunca vira a amiga conversar com um rapaz de forma tão descontraída, e aquilo talvez se devesse ao fato de que Jerry era diferente dos rapazes com os quais ela estava acostumada. 

Anne lançou um olhar para Gilbert, mas não encontrou nenhuma expressão que indicasse que ele também tinha visto os dois. Assim, a ruivinha não disse nada, pois não queria causar problemas para o rapaz, caso Gilbert não julgasse conveniente aquela aproximação.

Antes de entrarem na casa, o rapaz se sentou na varanda e indicou que Anne fizesse o mesmo. Assim, que ela o fez, o duque a ficou observando por alguns segundos, fazendo sua noiva perguntar:

― Por que me olha tanto?

― Eu estava imaginando se um bebê nosso teria essa cor de cabelo magnífica. ― Ele disse, pegando uma mecha dos cabelos dela nas mãos.

― Você gostaria de ter um filho ou filha ruiva? ― Anne perguntou, timidamente, diante de um assunto tão íntimo.

― Bom, para continuar a linhagem da minha família, eu preciso ter um filho homem, mas ficaria imensamente feliz com uma garotinha com cabelos ruivos e olhos azuis como os seus.

― Ele disse entusiasmado, fazendo com que Anne conseguisse imaginar um bebê como ele desejava, mas logo que um sorriso começou a surgir em seu rosto, ele morreu, quando ela se deu conta do que aquilo implicava. Não só estava mentindo para seu futuro marido sobre sua identidade, como também estaria mentindo para um filho ou filha que viesse a ter e aquele pensamento a fez sentir calafrios.

Gilbert não a perdoaria, não haveria redenção para ela e como conseguiria viver com essa culpa? Seu coração doeu ao entender o futuro obscuro que a esperava, porque uma mentira daquele tamanho não duraria para sempre.

― Amybeth? O que foi? ― Gilbert perguntou, ao vê-la tremer visivelmente. 

― Nada. Não se preocupe. ― Ela respondeu, tentando sorrir.

― Eu sempre tenho a impressão de que tem algo para me dizer. Pode confiar em mim. Não importa o que seja. ― Gilbert pediu,  surpreendendo-a. 

― É só mesmo uma impressão. Não é nada. ― Anne insistiu, pois sabia que, se ele descobrisse o que ela estava escondendo, nunca mais a olharia da mesma maneira.

― Vem cá. ― Gilbert disse, trazendo-a para seus braços.

Anne se deixou ficar ali, ouvindo o coração dele bater, e desejando com todo o seu coração que não precisasse sair daqueles braços nunca mais.

Olá, pessoal. Mais um capítulo postado. Obrigada.  Beijos

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