Capítulo Vinte e Três
Vincenzo Alves:
Franzi a testa, sentindo uma dor latejante que parecia torturar minha cabeça, como se estivesse prestes a explodir. Era uma sensação pesada, como se cada batida do meu coração estivesse socando meu cérebro por dentro. Uma pontada atrás dos olhos me fez mantê-los fechados por mais tempo do que eu queria, enquanto tentava controlar a respiração lenta e instável.
Quando finalmente abri os olhos, a escuridão começou a se dissipar, e fui confrontado com uma visão completamente nova. A sala em que eu estava era estranha, um ambiente que eu não reconhecia. Pisquei algumas vezes, tentando ajustar minha visão, e minha mente lutava para processar o que estava ao meu redor.
Este não é o meu quarto... Onde estou?
A pergunta ecoou na minha mente enquanto meus olhos, ainda semicerrados, vagavam lentamente pelo ambiente. As paredes, os móveis, a disposição do espaço... tudo era desconhecido, e meu coração acelerou com a inquietação.
Então, como um soco na cara, a lembrança da noite anterior me atingiu. Eu tinha ido cumprimentar os familiares de Dylan. Sim, claro. Eu me recordava de estar no jantar, com sua mãe insistindo em me oferecer uma bebida... e depois, o desastre. O copo que eu, desajeitado, derrubei. O embaraço. O riso nervoso. E a sensação incontrolável de querer agradar, o que me levou a aceitar a segunda bebida.
Suspirei profundamente, o som ecoando pelo quarto silencioso. Era isso. Eu tinha perdido o controle e aceitado mais álcool do que deveria, tentando não fazer feio na frente da família dele. E, claro, o resultado foi previsível. Vomitei no pátio, arruinando qualquer chance de parecer uma pessoa equilibrada. Eu me lembrava vagamente de abrir meu coração, talvez dizendo mais do que deveria, e depois... o apagão.
Não deveria ter acabado assim. Essa frase continuava a martelar na minha cabeça enquanto eu mexia nervosamente no cabelo, tentando afastar a dor e o desconforto. Mas, de repente, uma sensação tomou conta de mim, uma percepção que me deixou completamente rígido. Como se tivesse sido atingido por um raio, meus músculos congelaram.
Dylan estava ali. Bem ao meu lado, respirando suavemente contra o meu peito. Seus cabelos estavam bagunçados, caindo suavemente sobre a testa, e sua expressão era calma, completamente relaxada no sono. Por um instante, me senti aliviado ao vê-lo tão tranquilo, mas depois... o pânico.
Olhei rapidamente para minhas roupas, o coração disparando ainda mais. E se...? Verifiquei meu corpo com pressa, inspecionando a camisa, os botões, tudo. Para meu alívio, nada estava fora do lugar. As roupas estavam exatamente como antes, nenhum botão desfeito, nenhuma evidência de que algo mais tinha acontecido.
Olhei para Dylan novamente, agora com mais cuidado. Ele também estava totalmente vestido, com as roupas impecáveis, como se nem tivéssemos saído do jantar. A sensação de alívio que tomou conta de mim foi instantânea, mas a confusão ainda pairava no ar.
Eu me recostei um pouco, tentando entender como acabamos assim, juntos. Dylan parecia tão à vontade, tão em paz, e eu... eu estava uma bagunça por dentro.
Suspirei de novo, desta vez mais baixo, quase sem querer incomodá-lo. Enquanto o observava dormir, com sua respiração leve e constante, um sorriso involuntário se formou nos meus lábios. Talvez não tivesse sido uma noite perfeita, mas se ele estava aqui, ao meu lado, talvez as coisas não tivessem saído tão mal quanto eu imaginava.
Eu precisava parar de me preocupar tanto, pelo menos por um momento. Dylan estava ali, e isso, de alguma forma, fazia tudo parecer menos catastrófico.
****************
Soltei um suspiro vago, nem de alívio, nem de arrependimento. Apenas um reflexo do meu estado meio confuso.
— Ah... você está acordado? — disse Dylan, com a voz ainda sonolenta. Ele esfregou os olhos com uma das mãos e se sentou, os cabelos bagunçados e a expressão suave. — Uau, acho que deixei seu braço dormente.
Ele bocejou de leve, como se estivesse lentamente se ajustando à vigília, e eu, ainda preso em minha confusão, só conseguia olhá-lo, tentando entender o que estava acontecendo.
— Por que você está aqui? — perguntei, a testa franzida enquanto olhava para ele, claramente sem lembrar de nada.
Dylan, ao invés de ficar surpreso, pareceu se divertir. Seus olhos brilharam com uma mistura de humor e ternura.
— Vincenzo, acho que você esqueceu o que aconteceu na noite passada — ele disse, com uma leve risada. — Nós nos beijamos, e você me segurou aqui. — Seus olhos desceram para a cama, e eu os segui, notando pela primeira vez que minha mão ainda estava segurando a dele com força, como se fosse uma âncora.
— Eu... — comecei a falar, soltando sua mão de imediato, mas ele não me deixou escapar. Segurou a minha novamente, com firmeza, mas sem pressão.
— Espere, nós nos beijamos? — perguntei, a incredulidade evidente na minha voz.
Dylan soltou uma risada leve, o som suave enchendo o quarto. — Sim, e você achou que era um sonho. — Ele riu de novo, desta vez mais abertamente. — Deveria ter imaginado que você não lembraria. Isso explica o quão forte você estava segurando minha mão. Acho que agora posso sentir o sangue fluindo de novo.
Ele abriu a mão e sacudiu os dedos no ar, como se estivesse tentando voltar a sentir cada um deles. Em seguida, se inclinou e, para meu total espanto, me deu um beijo suave na bochecha. Eu fiquei congelado, sem saber como reagir, ainda processando tudo.
— Vou pegar algo para você beber — disse ele, se levantando tranquilamente e caminhando até a porta.
Eu fiquei ali, parado, ainda absorvendo o fato de que nos beijamos... e eu não me lembrava direito. Mas, ao mesmo tempo, havia uma sensação de calor no meu peito. Algo sobre aquele beijo, mesmo que fugaz, parecia... certo.
Dylan voltou com uma jarra d'água e um copo, o aroma doce de mel logo preenchendo o ar. Ele colocou a bandeja no meu colo, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
— Você vai se sentir mal, mas precisa comer algo — disse ele, com aquela calma típica dele. — Minha irmã deixou isso para você. É uma receita da família para curar ressaca. Água com mel e alguns lanchinhos.
— Obrigado — falei, minha voz saindo baixa e envergonhada. Peguei o copo que ele me oferecia e levei à boca, sentindo o néctar doce escorrer pela garganta. Era revigorante, e aos poucos eu sentia minha mente clarear um pouco.
Ele me observou, certificando-se de que eu estava bebendo. Eu me sentia um pouco mais desperto a cada gole, mas ainda assim, o constrangimento era palpável.
— Já está na hora dos gêmeos terem acordado. Melhor ligar para a Isadora e ver como estão as crianças — Dylan comentou casualmente, enquanto olhava para o celular.
Eu ainda estava atordoado, mas o simples fato de ele mencionar os gêmeos me trouxe de volta à realidade. Claro, os gêmeos. Nossa vida juntos, nossa família.
— Eu ligo para ela daqui a pouco — disse, minha voz ainda um pouco rouca, mas agora mais presente.
Ele sorriu para mim, aquele sorriso tranquilo que sempre me acalmava. Por mais que minha cabeça estivesse um caos, ele estava ali, sendo o mesmo Dylan de sempre, e isso me fazia sentir que tudo ficaria bem.
Olhei para a janela do quarto, observando o céu tingido pelos primeiros raios do sol. A luz suave e dourada parecia bordar o horizonte, preenchendo o quarto com um brilho acolhedor. O cenário me trazia uma sensação de paz, embora minha cabeça ainda estivesse confusa. Por um instante, me perguntei se tudo aquilo era apenas um sonho. Dylan, ao meu lado, a noite anterior... tudo parecia tão bom, tão surreal. Mas não, era real. Eu podia sentir isso.
Os gêmeos provavelmente iriam me perguntar sobre a reunião com a família de Dylan assim que voltássemos para casa. Eles o adoram, sempre correm para ele como se fosse o herói deles. Pensei em como seria bom ter Dylan ao meu lado para sempre, ver o quanto ele se encaixa perfeitamente na nossa vida, como ele se encolhe contra o meu peito, enquanto acaricio suas costas e beijo suavemente suas bochechas.
E, embora eu quisesse evitar o pensamento, a ideia de finalmente poder dizer o que sinto por Dylan de forma tão aberta e livre continuava rondando minha cabeça. Até mesmo as pontas dos meus dedos tremiam levemente, como se meu corpo estivesse tentando me alertar que tudo aquilo podia ser uma brincadeira do meu cérebro, uma peça pregada pela insegurança.
— Dylan — chamei, tentando finalmente recuperar o juízo. Ele estava parado, olhando o nascer do sol, com o celular no ouvido. — Quaisquer erros que eu tenha cometido ontem à noite, pode me dizer o que fiz?
Ele se virou, levantando uma sobrancelha divertida, e soltou uma risada leve.
— Você realmente não se lembra? — ele perguntou, e eu tive que balançar a cabeça com entusiasmo. Me forcei a tentar buscar na minha memória, mas depois de lembrar de ter falado com Tereza sobre Dylan e minhas intenções com ele, tudo desaparecia, como se as lembranças tivessem sido cortadas.
Meu corpo ficou tenso, e uma sensação de desconforto me preencheu. Será que fiz algo de errado?
Dylan, percebendo minha ansiedade, riu de novo.
— Relaxa, você não cometeu nenhum erro — disse ele, ainda com um sorriso, mas agora sua expressão era mais suave. — Mas o seu comportamento bêbado... bem, isso vai ficar gravado na minha memória por um bom tempo.
Meu estômago revirou.
— O que eu fiz?
Dylan olhou para mim com aquele ar de quem está prestes a revelar algo que vai me fazer corar até as orelhas.
— Além de me segurar o tempo todo? — ele começou, tentando não rir. — Você ficou dizendo qual seria o nome do bebê enquanto beijava minha barriga. E tocou minha bochecha, dizendo algo incompreensível, e pediu para que eu te chamasse de "amor". — Ele riu mais. — Eu nem consigo reproduzir as coisas embaraçosas que você falou. E depois, quando eu disse que te amava... você me beijou. Foi inesperado, mas muito doce. E, no fim, você desmaiou na cama.
Senti minhas bochechas queimarem com o calor da vergonha. Eu mal conseguia processar aquilo. *Eu fiz o quê?* Não lembrava de absolutamente nada disso. Como é que eu podia ter feito tudo isso e simplesmente... apagado?
— Eu... eu não queria fazer isso — balbuciei, desejando que a cama me engolisse naquele momento.
Dylan balançou a cabeça, sorrindo com gentileza.
— Você não tem que se desculpar. Na verdade, parecia que você achava que estava sonhando o tempo todo. — Ele deu uma risadinha. — E honestamente, não achei ruim. Foi... doce, na verdade.
Eu ainda estava tentando processar tudo, mas algo em sua voz e no jeito como ele me olhava me fez parar de me preocupar tanto. Havia uma leveza nas suas palavras, algo que sugeria que ele realmente não estava incomodado.
— É verdade mesmo? — perguntei, ainda desconfiado, apesar do tom brincalhão dele.
— Sim, é sério. Você está bem com isso agora? — Dylan deu de ombros, como se dissesse que não era nada demais, mas eu ainda o observava com olhos desconfiados. — Ok, ok. Podia ter sido pior, sabe? Imagina se você tivesse feito isso na frente da minha mãe. Felizmente, estávamos no meu antigo quarto. Acho que esse é o máximo de embaraço que vou tolerar — ele riu, me provocando levemente.
Suspirei, aliviado. Passei as mãos pelo rosto, como se pudesse tirar o peso da ressaca junto com o calor da vergonha que me consumia. Eu estava com medo de ter feito algo realmente estúpido, de complicar ainda mais a relação com a família dele. Mas parece que, no final, as coisas estavam bem.
Dylan se aproximou novamente, desta vez com mais tranquilidade.
— Que tal comer um pouco? Dizem que a ressaca passa mais rápido com uma boa comida. Eu preparei algo, junto com o que minha irmã deixou para você. — Ele sorriu, gesticulando alegremente enquanto me oferecia o prato.
Não pude evitar sorrir de volta, sentindo uma onda de gratidão por ele ser sempre tão atencioso, mesmo depois de eu ter causado todo esse caos na noite anterior. Aceitei a sugestão e o prato que ele me trouxe, finalmente me permitindo relaxar.
— Vamos lá, preciso experimentar essa "cura" milagrosa de ressaca da sua família. — Falei, tentando retribuir o humor leve de Dylan.
Ele riu, satisfeito com minha resposta, e se sentou ao meu lado, pronto para passar o resto da manhã cuidando de mim, enquanto eu, finalmente, começava a relaxar e me permitir sentir o calor e a segurança que só Dylan conseguia me proporcionar.
*****************************
Dylan me serviu um pouco de café, e eu comecei a comer em silêncio, ao lado de Tereza, que também parecia imersa em seus próprios pensamentos. O silêncio entre nós não era desconfortável, mas carregado de uma certa tranquilidade. Dylan havia saído para atender uma ligação, que eu presumi ser da Isadora — provavelmente os gêmeos querendo conversar com ele, como sempre fazem.
— Coma para aliviar a ressaca, e não esqueça da bebida que fizemos — disse Tereza, quebrando o silêncio. — Receita de família. Vai ajudar.
Olhei para ela, e uma pergunta surgiu na minha cabeça sem que eu pudesse evitar.
— Tereza, você bebe tanto assim? — perguntei, levantando uma sobrancelha, curioso.
Ela soltou uma risada baixa, estalando a língua com uma expressão travessa no rosto.
— Em comemorações, eu bebo. Estou velha, mas ainda sei me divertir bastante — respondeu, com um brilho divertido nos olhos. — São meus filhos que se preocupam demais com as coisas. — Apontou para mim com o dedo, de forma brincalhona. — E você... bom, você deve decidir o que fazer com o Dylan agora. Mas, antes de tudo, leve-o para um encontro de verdade.
Dei um sorriso cansado, mas genuíno, enquanto levava mais uma garfada à boca.
— Eu planejo fazer isso assim que essa ressaca maldita passar — falei, meio rindo de mim mesmo.
Mas, por trás do humor leve, minha mente já estava em outro lugar. Tinha o assunto de Lilly, aquela preocupação constante que pairava como uma nuvem. Estava ansioso para saber se Isadora, Demitre e os outros haviam descoberto algo. Não sabia quanto tempo mais poderíamos ficar no escuro sobre o paradeiro dela e o que ela poderia estar planejando.
Continuei comendo em silêncio, enquanto os pensamentos fervilhavam na minha cabeça. Dylan, os gêmeos, Lilly... tudo parecia se entrelaçar em um emaranhado que eu precisava começar a desenrolar. Tereza, percebendo meu estado pensativo, deixou o silêncio prevalecer, e eu agradeci por isso. Às vezes, as palavras não são necessárias; só a presença de alguém ao nosso lado já é o suficiente.
______________________________________
Gostaram?
Até a próxima 😘
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro