26 - Apenas mais uma quarta-feira
Em menos de uma hora eu consegui finalizar a reunião. A equipe não estava muito animada, eu menos ainda, mas o mundo continuava girando e tínhamos que seguir em frente.
Ansioso, voltei ao apartamento do Diego e, quando ele me recebeu, eu apenas o abracei. Ele devolveu o abraço e eu percebi nesse momento que estávamos selando algo. Era como se ele soubesse que eu estava ali para ele, e eu soubesse que ele estava lá para mim.
– Como você está? – perguntei quando nos soltamos.
– Melhor. Agora estou com fome. Pensei em pedir uma pizza.
– E você acha adequado comer pizza depois de... da sua crise? – perguntei, de fato preocupado. Ele estava bem mal pela manhã.
– Não me importo com isso.
– Alguém deveria se importar, então...
Ele me olhou de um jeito enigmático que fez minha barriga tremer. Inferno de sentimento novo que eu não sabia como funcionava, muito menos como controlar!
A pizza chegou, comemos, depois ele me convidou para ver um filme com ele. Assistimos a uma estréia da Netflix e dividimos uma cerveja. Ele me pareceu bem recuperado então não me importei em abrir mais uma. Quando o filme acabou, ele pegou seu notebook para me mostrar que estava dando uma olhada no site da SD Palermo.
– É impressionante o trabalho que vocês fazem... Quero dizer, que faziam... Droga! Me desculpe.
– Não tem problema - eu o acalmei. Eu me segurava para não tocá-lo. Não queria parecer pegajoso mas, acreditava que quando as coisas estivessem claras entre nós, muito provavelmente eu não tiraria as mãos dele.
– O casting do estúdio me pareceu bem interessante... – ele mencionou, e corou. Ele corou!! Eu quase dei um beijo nele quando percebi que ele estava enciumado.
– O que você faz, além de tirar a roupa online?
– O que te faz pensar que eu faço algo além disso? Me dá um bom dinheiro, sabia?
– Claro que dá. E eu não sei?...
Vi que ele ficou envergonhado de novo. Eu não sabia o quanto ele ganhava dos outros clientes e nem queria pensar nisso, mas só de mim, ele tirou uma boa grana.
– Se você acha que eu preciso devolver...
Fiquei surpreso, mas também entusiasmado com a ideia de que tínhamos de fato cruzado aquela linha. Ele me considerava especial e isso me encheu de satisfação.
– Não fala merda. Você valeu cada centavo. Mas não muda de assunto, o que mais você faz?
Ele estava ainda mais vermelho. Imaginava que fosse por algo que eu tenha falado. Daniel havia dito que ele era designer, não sei por que mas, eu estava testando sua honestidade.
– Sou designer gráfico.
Ponto positivo. Ele não era de mentir e isso era um bom sinal. Então me mostrou seu portfólio e eu fiquei impressionado. Ele realmente era muito talentoso e eu vislumbrei uma excelente oportunidade de negócios entre o estúdio e ele no futuro, caso ele estivesse interessado.
– Seu trabalho é excelente, Diego! – exclamei, sendo sincero.
– É lisonjeiro dizer isso sobre meu portfólio. Obrigado.
– Sempre enxerguei em você muito mais do que massa e beleza, Diego. Embora tenho que dizer que você entraria no meu casting sem nenhuma ressalva. É um dos homens mais bonitos que já conheci.
Ele corou de novo e comecei a ter dificuldade de manter as mãos longe dele.
– Eu preciso te contar uma coisa.
Me lembrei da primeira vez que ele lançou essa frase. Apesar de ser em outro momento, eu fiquei apreensivo do mesmo jeito. Já tínhamos falado de muita coisa e eu tinha medo das partes obscuras de sua história. Algo me dizia que eu não iria gostar do que ia ouvir. Tentei não transparecer minha preocupação.
– Pode falar. Não se preocupa, eu não vou te julgar.
– Tenho alguém na minha vida. Há um bom tempo.
Bingo. Engoli o sentimento ácido que me subiu pelo peito e neutralizei minha expressão.
– Certo. Não é de surpreender.
– É uma mulher.
O ácido azedou na minha boca. Suspirei e tentei controlar o mal-estar.
– Surpreende menos ainda.
Eu devia saber. Diego era um homem bonito demais para estar sozinho. O fato de ele ser bissexual não me incomodava tanto, o que doía era saber que havia alguém ocupando o lugar que eu queria para mim. Eu não queria tirar conclusões precipitadas, mas dentro de mim um rebuliço já se formava.
– Bem... amanhã vou ter uma conversa com ela. Vou contar sobre mim... sobre nós. Vou ser honesto, pela primeira vez na minha vida vou ser totalmente honesto com ela.
– E o que vai fazer depois?
– Isso vai depender...
– Do quê?
– De como ela vai reagir.
– Você diz... se ela vai te aceitar como você é e ficar com você mesmo assim?
Porra, eu não sabia nada de como era estar apaixonado. Eu não sabia que apenas imaginar ele com alguém poderia doer. Não pensei que as coisas fossem tão sensíveis assim, como se eu inteiro parecesse um nervo exposto. Eu odiei a sensação e desejei não estar tão envolvido. Eu desejei voltar a ser o cara insensível de antes.
– Quero que você entenda. Ela é minha amiga muito antes de ser minha noiva.
– Ela é sua noiva? – eu acho que gritei. Foi como levar um tapa na cara e reagir de pronto.
– Estamos dando um tempo...
– Diego...
Eu me ergui do sofá e tive vontade de sair correndo. Sério. Eu queria desaparecer e deixar meus sentimentos ali no chão, numa poça que ele poderia jogar no ralo a hora que quisesse.
– Espera, Samuel. Escuta o que tenho a dizer...
– Porra, Diego!
Eu não queria ouvir. Eu estava puto. Principalmente comigo mesmo porque eu tive filas de caras querendo algo sério e quando alguém finalmente conseguiu roer a capa de descaso e quebrar meu coração de gelo, foi só pra foder um pouco mais comigo. Era óbvio que a vida não ia me dar um tempo. Que merda!
– Eu não consigo mais ficar com ela. Não assim. Não depois de tudo... de você.
– Não me coloca nesse lugar, Diego! Não posso ocupar essa prateleira na sua estante! – ralhei com ele. Eu só queria ir embora. Eu queria esquecer toda aquela história e que as coisas voltassem a ser como eram antes. Ao menos no que dizia respeito à minha vida sentimental isenta de sentimentos.
– Eu só preciso entender... se eu e você, se a gente...
Eu parei a caminho da porta. Eu não sabia se queria ouvir o restante, mas esperei.
– Entender o quê, Diego?
– Se existe uma chance de a gente... de nós...
– Fala, porra!
– De tentarmos uma coisa. Eu e você. Se existe uma chance de sermos amigos... ou mais.
Eu olhei para ele e afundei. Eu já tinha visto essa história. Ele ficaria comigo se, e apenas se, houvesse uma forma de a gente continuar se divertindo juntos. Caso contrário, ele ficaria com a noiva. Não havia um lugar para mim ali. Eu seria o estepe, o consolo, uma forma de ele suprir uma necessidade do corpo. Quando quisesse uma rola, viria atrás de mim, mas quando enjoasse, iria atrás de uma boceta confortável de gaveta. Eu não ia entregar meu coração para isso. Eu demorei tempo demais para descobrir que podia sentir alguma coisa, que podia me comprometer, para no fim ocupar um espaço tão medíocre. Se ele significava tanto para mim, eu não ia me contentar com uma parte dele. Já me bastava não ser mais um cara completo, e viver de pedaços não estava nos meus planos.
Então eu não respondi. Eu vi a ansiedade em seus olhos, mas também a confusão e o medo. Eu não era tudo o que ele queria, não da forma como ele era para mim. Não estávamos prontos, nem ele, nem eu, então eu fiz o que era o certo a fazer. Eu não era um destruidor de lares. Ao menos não dos lares que não fossem o meu próprio. Então eu desisti. Eu limpei a barra, saí pelas portas, saí de sua vida e lhe dei a chance de tentar ser feliz com o que ele já tinha.
Era o certo a fazer.
Era o necessário.
Era apenas mais uma quarta-feira quando se tratava da merda da minha vida.
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