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75 - Coda

Coda: é um símbolo usado em partituras para indicar onde começa a passagem final de uma peça.


Depois de uma semana, Rick finalmente iniciou a dieta sólida. Querendo ou não, aquele tempo todo no hospital serviu como campo de nivelamento das emoções, um período importante de adaptação antes que eles pudessem se entender. Aos poucos, livrando-se de mágoas e perspectivas, eles conversaram sobre o que fizeram enquanto estavam separados e concluíram que, de alguma forma, permaneceram conectados além da distância, amadurecendo até que estivessem prontos para um reencontro.

Mais alguns dias depois, Rick recebeu alta do hospital. Júlio e Duda foram buscá-lo. Apesar de estar com quase dez quilos a menos, uma bota ortopédica e muletas, ele saiu sorrindo do hospital. Cicatrizes ele iria levar, teria que manter o acompanhamento médico por um tempo devido à cirurgia e precisaria de fisioterapia, mas a sensação era a de que ele havia nascido de novo.

— Já cuidei do seu equipamento e do que sobrou da sua bagagem. – Júlio o abordou primeiro – Também já resolvi o lance do carro alugado, tinha seguro então foi tranquilo.

— Não sei o que eu faria sem você, amigo. Você disse que arrumou um lugar, mas não me entregou nada. Para onde vai me levar?

Júlio olhou para Duda rapidamente antes de responder.

— Tá resolvido, mas a Duda disse que você não vai querer ir para qualquer outro lugar hoje além da casa dela...

Duda se aproximou e entrelaçou os dedos nos de Rick.

— Hoje você fica comigo, feiticeiro.

— Vamos? Eu deixo vocês lá. Não quero ficar aqui nem mais um minuto! — Júlio interrompeu o diálogo, sempre apressado, então deu a volta e assumiu o volante. Antes de Rick entrar no carro, Duda o puxou e sussurrou no seu ouvido.

— Você ainda não conseguiu chegar na minha casa depois de ter lido a minha mensagem, e eu tô morrendo de curiosidade de saber o que você pretendia fazer quando chegasse lá.

Rick sentiu as entranhas se aquecerem. Não havia o que argumentar.

Logo, eles se dirigiam ao imóvel na Mooca num silêncio acolhedor. Nenhum deles tinha necessidade de falar ou ouvir nada. Júlio e Duda estavam exultantes por Rick ter sobrevivido e estar bem, já Duda e Rick fomentavam uma expectativa crescente de quando finalmente estariam sozinhos, sem enfermeiras, médicos, agulhas ou aventais ridículos.

Júlio manobrou o Porsche e parou em frente ao sobrado, depois ajudou Rick a descer do carro.

— Vou te dar uns dias, mas quando se sentir melhor, quero você no Johnny-John. Não me interessa se você vai mancando, só não vá dar mancada — Júlio riu da própria piada idiota —, ok, cafonices à parte, já avisei a banda que vamos entrar com a produção nos próximos dias, só não falei que você vai estar presente, quero surpreender a moçada.

Rick só gesticulou, e os amigos se despediram com um abraço apertado. Quando Júlio entrou no carro e foi embora, Rick observou a fachada da casa.

— Ficou muito bom isso aqui.

— As ideias de acabamento foram suas?

— Uma coisa ou outra. Confiei nas ideias da empreiteira.

— Achei tudo muito a sua cara.

— É... um pouco, talvez, mas é porque tenho bom gosto, você sabe...

— Sempre arrogante... — ela o cutucou, sorrindo — achei também um exagero considerando o fato de que havíamos nos separado sem intenção de reatar.

— Você se separou de mim — ele desviou os olhos da fachada e a encarou — eu nunca me separei de você.

— Foi você quem foi embora.

— É sério isso?

Ele desfez o sorriso, confuso, e Duda ficou encabulada.

— Ok, eu te mandei embora. Por isso mesmo você não devia ter feito tudo isso aqui.

— Eu daria o mundo a você, mesmo se nunca mais você me perdoasse. Não foi porque eu queria você de volta, foi porque amo você, e você merece tudo. Por que estamos discutindo isso mesmo?

Ela riu, e ele a acompanhou.

— Eu não sei se vou querer lidar com esse seu lado controlador de novo... — ela fingiu um muxoxo.

— Se você disser mais uma vez que não me quer pagando suas contas, eu vou chamar um taxi e ir embora para um hotel.

— Se você ameaçar fazer isso, eu roubo suas muletas e quero ver você chegar lá!

Ele voltou a rir e, de repente, ambos ficaram embaraçados. Depois de tantos meses afastados, do acidente que poderia tê-los separado definitivamente e do tempo que Rick permaneceu tão exposto no hospital, uma névoa de acanhamento os envolveu, como se estivessem num primeiro encontro e não soubessem o que fazer com as mãos. Duda procurou tomar as rédeas da situação.

— Vamos logo, quero que veja como a casa ficou por dentro.

Eles entraram e Gato já os esperava no hall, o rabo erguido se movia animadamente. Primeiro, o felino se enroscou nas pernas de Rick.

— Traíra... — Duda resmungou para o gato.

— Gatos se atraem. — Ela revirou os olhos e ele a beijou de supetão — ainda bem que você tem um coração enorme e adora resgatar gatos abandonados.

— Sorte a sua.

Rick observou o cômodo vazio. Apreciou as cores das paredes e o perfume de maçã e canela que substituía de forma louvável o mau-cheiro anterior. Mais adiante, havia apenas um futon, um tapete que já encontrara as unhas de Gato, uma samambaia e o piano.

— Você ficou com ele... — Rick se aproximou e abriu a tampa que cobria as teclas.

— Tenho um ciúme danado desse piano. Quem vem aqui, primeiro fica babando nele, depois é que presta atenção em mim.

— Quem veio aqui? — Rick se deu conta de que eles passaram meses afastados, conversaram sobre muitas coisas no hospital, mas que Duda não compartilhou nada sobre possíveis pretendentes. Teria estado com alguém, um outro qualquer entre essas paredes? O pensamento o deixou inseguro.

— Só Alex, Júlio e Isadora. E agora você. — Duda percebeu que ele pensava em outra coisa pela forma como a encarava.

— Sei que não é da minha conta, talvez nem devesse perguntar mas... você ficou com outra pessoa durante esse tempo?

— É sério que é isso o que deseja saber, Rick? Bem agora?

Ele baixou os olhos para as teclas do piano, entristecido. A reação dela já respondia tudo.

— Era um direito seu...

— Rick, para de pensar nisso, ok? E você? Ficou com alguém?

— Não. Nem tentei, eu não conseguiria.

— Se quer saber, eu também não consegui.

— Mas tentou...

— Ai, Rick, como você gosta de uma intriga! — aborrecida pelo interrogatório inoportuno, Duda o beijou — às vezes você é muito lerdo. Eu só quero você! Sempre foi você! Não deu pra entender isso ainda?

O beijo se aprofundou. Rick soltou as muletas e se apoiou no piano, puxando-a para mais perto. Ela correu as mãos pelas costas dele até a barra da camiseta, então as enfiou por baixo, tocando a pele com as unhas. Sentiu o arrepio na palma das mãos quando ele arfou e a beijou no pescoço.

— Nem acredito que eu tô aqui, com você ­— ele murmurou enquanto corria os lábios pela extensão do pescoço até o pé da orelha.

— Nem eu acredito... preciso te mostrar uma coisa — então ela se afastou e, lentamente, despiu-se primeiro da camiseta, depois dos jeans, permanecendo apenas de lingerie. Rick prendeu o ar pela visão do corpo seminu, surpreso e excitado.

— Minha fada, isso... — embevecido, Rick posicionou a ponta do dedo num ponto específico acima do quadril, onde antes havia uma cicatriz em forma de meia-lua. Em seu lugar, agora havia a imagem tatuada de um pequeno redemoinho que se expandia e se transformava numa rosa. Ao longo do corpo, inúmeros pequenos botões e outras rosas, folhas e caules com minúsculos espinhos entrelaçados compunham a ilustração de uma roseira emaranhada no corpo de Duda. A arte em realismo se estendia desde o quadril até o ombro, passando pela cintura, abaixo dos seios e início das costas.

Cada cicatriz fora ressignificada como flor, folha ou ramo, promovendo uma nova natureza para as marcas; a deformidade transformada em beleza; a dor transmutada em arte.

— Eu fiz essas tatuagens quando entendi meu processo de cura, e você fez parte disso. Você me ajudou a transformar minha dor em algo lindo. Venha aqui, eu não suporto mais um minuto sem você.

Emocionado, ele a abraçou apertado por um longo tempo, até que as emoções mudaram de natureza e ele a beijou de modo profundo, tão profundo que parecia conter todos os beijos não trocados, todos os beijos almejados e sonhados. A emoção foi tão forte que as lágrimas chegaram aos lábios para participar da festa.

— Eu te quero tanto, Duda — ele sussurrou enquanto beijava uma parte da tatuagem que subia até o ombro — não sei você, mas eu quero muito isso...

— Como você tá? — ela respondeu entre ofegos — tenho medo de complicar seu quadro...

— Já tá complicado... — ele estreitou o abraço fazendo-a sentir a ereção através da calça de moletom, e murmurou em meio a um sorriso e mais beijos no pescoço — a gente dá um jeito, só me ajuda aqui...

Ela o abraçou de lado e o apoiou até o futon, depois o ajudou a se acomodar sentado. Em seguida, despiu-o da camiseta e removeu a lingerie enquanto ele a contemplava, embevecido. Por fim, apoiou-se com os joelhos, um de cada lado dele e o puxou pelos cabelos, como sempre fazia quando se amavam, para beijá-lo.

— Foi insuportável cada minuto sem você... — murmurou contra os lábios famintos enquanto os dedos dele se projetavam entre suas pernas abertas. Ela arqueou o corpo e puxou ainda mais os cabelos escuros, passando a mover-se contra a mão que a acariciava até que seu corpo explodiu no êxtase tão esperado. Durante todos aqueles meses de afastamento, ninguém mais a tocara além dela mesma, e mesmo buscando o prazer solitário, todos os seus orgasmos haviam pertencido a ele.

Ele espelhou o gemido dela quando sentiu-a inchar e pressionar seus dedos, lambuzando sua mão do néctar tão desejado, então desceu o elástico da própria calça libertando o membro rijo, já úmido de pré-gozo.

­— Eu não tenho preservativos, Duda... — avisou, ansioso.

— Tudo bem, não tem risco — tranquilizou-o enquanto o obervava preocupada com a perna dele, o curativo no abdômen e as lesões ainda visíveis no corpo em recuperação. — Será que essa é a melhor forma de fazer isso?

— Vai ter que ser. Eu te aviso se não der.

Então ela flexionou os joelhos e se encaixou nele, tomando o cuidado de não soltar o peso do corpo. Rick fez uma careta e ofegou, e ela se alarmou:

— Você tá sentindo alguma dor?

— Você não tem ideia, mas não é bem nas lesões...

Buscando controlar a onda de excitação que quase o fez terminar tudo antes da hora, ele a segurou pelo quadril com as duas mãos, controlando-lhe os movimentos. Quando sentiu-se confortável, moveu-a sobre si de modo suave porem cadenciado. Logo entraram num ritmo lento, numa dança sem música que refletia de forma delicada e controlada toda a sua urgência. O ritmo contido não impediu a escalada do prazer, visto que estavam ansiosos demais pelo ato, e muito antes do esperado, ele chegou ao ápice, e ela que já transitava pela borda, tocou-se intimamente para acompanhá-lo em seu êxtase.

Depois do momento de prazer, ela acomodou-se ao lado dele e permaneceram abraçados. Rick acariciava os cabelos rubros enquanto ela passeava com a ponta dos dedos pelo corpo dele, contornando cada ferida em cicatrização. Nas pernas, era onde se concentrava a maior parte delas, ela as podia sentir por cima do tecido da calça, e seu polegar acariciou os pontos de uma área bem alongada que ia do joelho até o final da coxa, na perna que não havia sido fraturada.

— Agora nós dois temos cicatrizes e tatuagens — ela murmurou, sonolenta.

— As suas ficaram muito boas...

— As cicatrizes?

— Boba. As tatuagens, mas as cicatrizes também são belas, Duda. Elas passam uma mensagem.

— Que mensagem?

— Que você sobreviveu.

Duda teve vontade de chorar de novo e, para distrair a mente da melancolia, ela brincou:

— As suas dizem: "Eu sobrevivi e agora tenho um monte de marcas para reafirmar meu lado machão!".

— Você não me respeita, sua safada! — Rick a mordeu no ombro, ela se desvencilhou dele, rindo. Ele tentou segurá-la novamente, então uma fisgada de dor abdominal o lembrou de que ainda estava em recuperação.

— Tá tudo bem? — Ela se afastou dele, agora percebendo claramente que ele estava incomodado com a dor.

— Já vai passar. Não pense que terminamos por aqui.

Duda riu, porém, continuou preocupada.

— Acha que devíamos ter feito isso?

— Você ainda pergunta?

— Eu não queria te machucar...

— Você acabou de curar minha pior dor, Duda. Vem, me ajuda a me levantar daqui.

Ela ficou de pé e estendeu a mão e a muleta para ajudá-lo a se levantar.

— Eu queria que você visse como ficou lá em cima, mas acho que não vai conseguir subir as escadas.

— Eu dou um jeito. Só me ajude a me equilibrar.

Mesmo Duda aconselhando-o a não subir, Rick insistiu e com bastante dificuldade, galgou degrau a degrau apoiando-se nela e no corrimão. Quando chegaram ao topo, uma camada de suor cobria-lhe o rosto e escorria por suas costas.

— Como você é teimoso... — Duda lamentou enquanto lhe entregava a muleta.

— Não foi nada! — Rick respondeu, jocoso. Ele jamais assumiria que estava com dor.

Após uns minutos de descanso, eles se dirigiram até o quarto onde só tinha o colchão, os vinis, as caixas e roupas espalhadas. Rick inspecionou tudo com um sorriso, depois seguiu Duda até o banheiro, onde uma toalha e alguns cosméticos davam um pouco de cor ao espaço monocromático e, por fim, acompanhou-a até o quarto menor. Duda se deteve em frente à porta antes de abrir.

— Rick, tá gostando da decoração da casa?

Ele sorriu, divertido. Sabia que ela estava brincando, afinal, apesar do acabamento de muito bom gosto, os espaços estavam vazios de qualquer decoração; salvo uma samambaia, um tapete e uma vela aromatizada no piso inferior, não havia mais nada na casa, nem cama, nem armários ou qualquer outro móvel.

— Achei bem minimalista; pra te falar a verdade, eu gosto.

— Vamos ver o que você vai achar deste quarto.

Então ela abriu a porta. No espaço, estavam enfileirados os instrumentos musicais de Rick, dispostos em estantes fixas na parede, e outros no chão, em pedestais. Um teclado estava apoiado contra o fundo e, ao lado, alguns amplificadores acompanhavam o canto até a porta. Do lado oposto, uma estante desmontável dispunha os raques de efeito, pedais, cabos e outros equipamentos. Uma mesa com uma cadeira giratória sem braços apoiava o MacBook de Rick; ao lado, uma pilha de livros e discos enchia uma parte da mesa, outra pilha estava disposta no chão. No meio do quarto, sobre um tapete escuro e felpudo, uma mala toda rasgada e amassada ainda mantinha as peças de roupas e os itens de uso pessoal que ele transportava consigo na viagem de volta, e que estava no porta-malas do carro no momento do acidente.

— Duda... — as palavras desapareceram e ele tentou sem sucesso engolir o bolo que se formou em sua garganta.

— Gostou?

— Isso tudo... você...?

— Esta casa é quase tanto sua quanto minha, Rick. Você investiu muito dinheiro na reforma, não vou conseguir ressarcir você a não ser que eu venda o imóvel. Então, eu pensei se você não toparia dividirmos o espaço.

— Dividir? — Sem desviar os olhos do quarto, ele tinha um sorriso emocionado no rosto.

— Ah! Tem mais uma coisa. — Ela entrou no quarto e retirou de dentro de uma gaveta da escrivaninha uma corrente com o pingente de palheta, aproximou-se e recolocou o acessório no pescoço dele. — Acho que agora pode pegar isso de volta. Vê se não esquece mais isso por aí, ok?

— Eu não esqueci, Duda; apenas entreguei. Tudo o que sou, entreguei pra você.

Os olhos de Rick agora a encaravam, rasos d'água, mas foi no rosto de Duda que uma lágrima correu, incontida. Ele colheu a lágrima com o polegar. Estava tão emocionado pelo trabalho feito, certamente com a ajuda de Júlio, que não conseguiu dizer mais nada.

— Ok, o negócio é o seguinte: — Duda buscou se recompor — eu quero voltar ao começo, Rick. Não ao começo de tudo, mas quero voltar até a nossa noite de noivado e viver uma nova realidade com você, sem Enzo, sem mão quebrada, sem velório de pai morto, sem meses e meses de dor e sofrimento. Não quero mais nada disso entre nós.

— Mas, Duda... não dá pra fazer isso — argumentou enquanto ela o encarava, confusa. — Todos esses meses fazem parte de quem somos hoje. Não dá pra descartar. O sofrimento me trouxe até aqui, até esse momento e, com ou sem acidente, eu não trocaria isso por nada. Eu não quero voltar a ser o cara ranzinza de antes, e se me perguntarem se eu pegaria um carro num dia de chuva, sabendo que estaria com os reflexos comprometidos pelo cansaço só pra te ver, eu faria isso de novo, porque tudo me levou a me encontrar, te encontrar e encontrar a paz com o meu passado. Acredito que exista alguma força maior que planejou isso tudo, por isso não dá pra mudar o que foi feito, tudo é como deveria ser.

— O Sr. Destino...

— Isso, alguma divindade ou energia, dê o nome que quiser. Estamos aqui agora. Não vamos voltar no tempo, não dá pra fazer isso, e eu não vou renunciar ao sofrimento, porque tudo o que sofri, sofri pra ter você de volta.

Mais lágrimas correram pelo rosto dela, que finalmente o abraçou.

— Por que você sempre fica com as melhores falas? — ela lamentou, emotiva.

— De onde tirou essa ideia, Duda? — Ele riu do comentário — Você quase não abre a boca, mas quando fala, é tão aguda que me estilhaça em pedaços! — Ela riu e depositou um beijo no peito dele, bem onde repousava a palheta. Rick continuou, com voz contida: — não precisamos repetir os erros do passado, porque agora, podemos muito mais, podemos construir e viver uma nova história a partir de hoje. Só não me peça para esquecer o passado, isso não vai acontecer.

— Tudo bem. Se não aceita meus termos, talvez não queira ficar com o quarto.

Ele a afastou e a encarou.

— Que comentário é esse? É claro que quero ficar com o quarto!

— Reservei esse espaço para você, só não consegui providenciar um colchão, talvez você tenha que dormir comigo... — ela sugeriu, travessa.

Ele demorou um tempo a responder. Ponderava sobre tudo o que havia sido feito para sua chegada, o quanto as coisas pareciam perfeitas demais. Por um instante, temeu que tudo não passasse de um delírio, como os que costumava ter enquanto embalado pelos medicamentos pesados do hospital.

— Você tem certeza disso, fada? Eu não quero meter os pés pelas mãos de novo. Sei que minha condição faz parecer que não consigo me virar sozinho, mas não é o caso. Eu posso me arranjar em qualquer lugar, você não tem que fazer nada por mim, não quero que se sinta obrigada a nada...

— Não estou me sentindo obrigada ­— ela o interrompeu, convicta — eu pensei muito sobre isso enquanto você estava internado. Não foi uma decisão precipitada, esteja certo disso, mesmo porque, nossa primeira experiência morando juntos não foi um mar de rosas. Eu acho que dá pra gente unir o útil ao agradável, ajudar um ao outro nessa. Acredito que o fato de você ainda estar em recuperação vai ajudar bastante no seu lado controlador, e eu vou me sentir mais segura porque sei que essa casa me pertence, e você é quem estará ocupando o meu espaço. Com tempo e paciência, a gente pode tornar esse espaço nosso.

— Se você tem certeza...

— Tenho. Eu tenho certeza.

Então ele sorriu. Um sorriso tão lindo e pleno, tal qual o primeiro que ele dirigiu a ela quando se viram na loja de discos. Ela sentiu o coração derreter com a imagem do feiticeiro, não tão fodão como antes, mas tão belo quanto. Foi nesse instante que ela soube que as coisas dariam certo dessa vez.

— Certo. Acho que eu vou ter que dormir com você, a não ser que me deixe trazer aquele futon para cima, porque não quero descer essas escadas tão cedo — ele olhou para a perna imobilizada e ela riu.

— Agora entendi por que você fez tanta questão de subir.

— Agora você entendeu — ele deu uma gargalhada e a abraçou mais uma vez — obrigado, Duda. Obrigado por me mandar aquela mensagem, por ter me acompanhado no hospital, por ter feito tudo isso e, principalmente, por ter me perdoado e me aceitado de volta.

Ficaram abraçados por um longo tempo, até que as emoções fossem se encaixando e se assentando, as diferenças niveladas nas frequências adequadas para produzir um resultado único, um som específico, algo lindo e infinito, exclusivamente deles.

***

É saber se sentir infinito

Num universo tão vasto e bonito, é saber sonhar

Então fazer valer a pena

Cada verso daquele poema sobre acreditar

(Trem Bala - Ana Vilela)

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