3. big three
Leo cantarolava uma música de frente ao espelho com uma toalha amarrada em sua cintura quando ouviu as batidas na porta do quarto, colocando a cabeça para fora do banheiro a tempo de ver Remi entrar no cômodo.
Diferente dele, que já estava se preparando para ir para a cama, ansioso para acabar com o cansaço de começo do semestre que já o atingira com tudo, Remi estava arrumado da cabeça aos pés, que ia desde os seus cabelos claros penteados para cima fixados quase imperceptivelmente por spray modelador aos seus sapatos favoritos.
— Aprendeu a bater na porta nessas férias? — Leo provocou ao voltar à atenção ao barbeador que tinha nas mãos, fitando sua própria imagem no espelho enquanto tirava o creme de barbear do rosto. — Essa, com certeza, é uma novidade. Um avanço, eu diria.
— Idiota — Remi murmurou antes de se apoiar no batente da porta, cruzando os braços enquanto encarava o amigo de longe. — Só passei pra perguntar se você quer sair hoje. Acho que vou no Quartier de Joie com uns caras do time, podemos arranjar um bar ou uma festa qualquer...
— Ainda é quinta-feira, cara — respondeu, mesmo sabendo que os dias da semana não ditavam os dias que eles saiam, jogando água no rosto assim que terminou de tirar sua barba por fazer que antes estava ali. — Passo. Pegarei um turno a mais essa semana no Ivy pra ficar livre na sábado. Nossa festa de boas vindas ainda está de pé?
Remi assentiu enquanto Leo passava por ele, indo em direção ao guarda-roupa para procurar uma roupa para vestir.
— Não existir nunca foi uma possibilidade, Hawkins. Ela existiria até se nós não participássemos.
Noventa e nove porcento das vezes, havia presunção nas falas de Remi Vince. Mas, certamente, aquela era a vez que fugia da curva.
A festa que acontecia na casa que os dois dividiam com Nate era famosa. Não precisavam mandar convites ou mencioná-la para os veteranos, já era praticamente implícito que o primeiro fim de semana de aula era comemorado ali. A primeira, que acontecera dois anos atrás, fora praticamente um acidente, já que uma social com quinze pessoas se tornou um espaço lotado com metade dos estudantes da Oak, barris de cerveja na cozinha e um DJ na sala de estar que ninguém realmente sabia como tinha chegado até ali.
Elas a nomearam de 'open-house' e o termo, que é comumente utilizado quando alguém se muda para uma casa nova e faz uma festa para que os amigos possam conhecê-la, acabou pegando, mesmo que acontecesse todo ano no mesmo lugar. Seria uma tradição até o momento que eles graduassem e outras pessoas herdassem a responsabilidade de continuar aquele evento, talvez até na mesma casa de três quartos que dividiam fora do campus.
Remi estava prestes a contra-argumentar para convencer Hawkins a acompanhá-lo quando notou a mancha escura na lateral do corpo de Leo, que ia do início do seu tórax e desaparecia no limite da toalha amarrada na sua cintura. Perdeu o próprio raciocínio ao se assustar com o machucado, desdobrando os braços e se afastando a porta, indo em direção ao amigo.
— Que merda é essa, Hawkins? — questionou, fazendo Leo levar o olhar para ele e, depois, olhar para seu próprio corpo. — Do jogo de ontem?
— Daquela jogada do terceiro período — Leo explicou, encarando o hematoma escuro por uns instantes antes de vestir uma blusa branca que o cobria, dando de ombros. — Vai levar alguns dias para desaparecer.
Remi arqueou as sobrancelhas em surpresa e podia dizer facilmente que nunca tinha visto um machucado tão feio antes. Hockey era um esporte de contato, sabia disso, e vez ou outra até ele mesmo encontrava alguns roxos pelo seu corpo após um treino intenso ou um jogo, mas o machucado de Leo estava em outro nível. Só podia apostar que devia estar doendo como o inferno.
— Definitivamente — comentou mais para si mesmo, suspirando pesadamente ao arquear as sobrancelhas. — Enfim, eu estou saindo então. Durma bem, bela adormecida, e tranque a porta porque trarei companhia.
Leo rolou os olhos e quase comentou que era Remi que tinha a péssima mania de entrar nos quartos alheios sem bater e que fora ele que, mais de uma vez, viu coisas que não deveria ver graças a isso.
— Já desistiu da alemã? — ao invés disso provocou Vince, recebendo um sorriso malicioso como resposta.
Curiosidade? Talvez.
— Tenho grandes planos de convidá-la para nossa festa — Remi respondeu, dando de ombros. — Mas é o começo do semestre e eu preciso aproveitar isso antes que as aulas acabem com minha sanidade. Tenho o direito de me divertir um pouco, não acha? Você deveria tentar também, eu consigo sentir sua tensão daqui.
— O que eu acho é que você deveria cuidar da sua própria vida, Vince — Leo murmurou em resposta recebendo um dedo do meio de Remi antes que ele saísse do quarto e fizesse barulho enquanto descia as escadas em direção a porta da saída, despedindo-se de Nate antes que pudesse ouvir o som dela se fechando.
Leo só esperou ficar sozinho para levantar a blusa e dar mais uma olhada no machucado que Remi tinha comentado. A maior parte ainda estava roxa, mas a borda já começava a ficar amarelada, mostrando que sumiria em alguns dias. Ele nunca deu muita importância e era acostumado a encontrar aquele tipo de mancha espalhada pelo seu corpo desde que era garoto. Nunca tinha parado para se perguntar se era normal ficar assim após uma pancada de qualquer intensidade que fosse, e daquela vez não foi diferente.
Terminou de se vestir e desceu as escadas, sentando no sofá ao lado de Nate assim que percebeu que o amigo jogava videogame com a concentração de quem estava em final de campeonato. Até pensou em incomodá-lo, mas estava tão cansado de ter passado a manhã toda desfazendo malas e arrumando o seu quarto que apenas esperou em silêncio, assistindo-o ser derrotado na fase que jogava.
— O que há de errado que você não saiu com o Remi? — Nate questionou sem tirar os olhos da televisão, arqueando as sobrancelhas em curiosidade. — Achei que você estaria à procura de alguma diversão depois de passar as férias inteiras trabalhando com seu pai.
Leo sorriu e deu de ombros, assistindo o amigo apertar os botões freneticamente enquanto reiniciava a partida, soltando um muxoxo desanimado e denunciando para Leo que já deveria estar ali há um tempo. Por um momento Hawkins até invejou que Nate estava com o horário praticamente vago naquela semana e não tinha treino até a manhã seguinte, o treinador de futebol americano do time da Oak se parecendo muito mais sensato que o de hóquei, que tinha acabado com ele e Remi nos primeiros quinze minutos de treino.
— Nah, Remi estava atrás de confusão — Hawkins respondeu, esticando suas pernas no sofá, soltando um muxoxo baixinho de dor assim que encostou, descuidadamente, no machucado escondido por baixo da sua camisa. — E ainda é quinta, pelo amor de Deus. Acho que aguento até sábado.
Nate deu risada, mas xingou alto assim que fora vencido novamente ainda mais rápido que antes e a tela da televisão voltou ao menu inicial do jogo que agora Leo já chutava que ele estava jogando desde que tinha chegado de casa, alguns dias antes.
— Compreensível. Mas ei, como foram as férias? Eu mal escutei de você. Ainda odiando economia?
— Com toda a minha vida — Leo foi sincero, suspirando pesadamente antes de colocar as duas mãos atrás do pescoço, apoiando sua cabeça. — Definitivamente curso errado, mas é meio tarde pra isso.
Leo fitava o teto enquanto se recordava dos últimos trinta dias que tivera que acompanhar seu pai, Sean Hawkins, no escritório em que ele trabalhava, preenchendo papéis que pareciam não ter fim. Não conseguia imaginar como seria quando tivesse que fazer isso por sua vida inteira se não conseguisse um contrato com algum time da liga nacional de hóquei naquele semestre.
Odiou cada minuto e cada segundo que passou ajudando-o com as tabelas e frequentando os cursos que seu pai o inscreveu sem aviso prévio. Provavelmente odiaria sua vida se tivesse que fazer isso pelo resto dela.
— Você falou com seu pai? Sabe que vai passar o resto da vida de terno e gravata se não falar, não é?
Para Nate podia ser difícil de entender já que seus pais, dois professores universitários renomados, apoiavam acima de tudo as decisões dos filhos. Ele cursava Matemática, mas seu destino seria a NFL assim que terminasse a graduação. Era questão de tempo para que deixasse de brilhar no time de futebol da Oak para representar um grande dentro da liga.
Mas para Leo e seu pai, o assunto era mais sensível. Toda vez que Leo tentava conversar sobre o futuro, recebia ácidas palavras de Sean que não aceitava outro destino. Ele se formaria em economia, voltaria para Boston e trabalharia com o pai até ter seu próprio nome. Quanto ao hóquei, era só diversão e o responsável por bancar a faculdade dele, mas Leo nunca iria para o profissional. Sem 'mas', 'ou's' ou 'porque's'.
Ele desejava ter sua mãe por perto naquela época. Não sabia como Emma reagiria aos desejos do filho, mas não tinha como ser pior do que Sean. Talvez ela até pudesse convencer seu pai de, ao menos, deixar que Leo tentasse, já que pelos comentários que escutava nas reuniões de família que aconteciam ao menos uma vez no ano, houve uma época que Sean faria qualquer coisa que Emma pedisse.
— Não é assim tão simples, Nate — resumiu todos seus pensamentos a isso, percebendo que se fosse realmente ir fundo sobre seu pai e seu futuro, precisaria ao menos de uma bebida forte para acompanhá-lo. — E eu não estou a fim de falar sobre isso agora. Como foram as suas férias? Sua irmã ainda nos odeia?
Nate Duncan riu e teve que pausar o jogo para encarar Leo, antes de tirar o celular do bolso para mostrá-lo uma conversa recente que tivera com Claire. Ele tinha chegado um ano mais tarde que a irmã na Oak e ela resumia os dois anos que estudavam na mesma universidade a 'pior coisa que acontecera no mundo na última década'.
E nenhum dos três estavam nos melhores termos com ela depois da festa de despedida do semestre anterior. Leo e Remi convenceram Nate a participar de um jogo estúpido de bebida quando já amanhecia, ele aceitou e vomitou tudo o que tinha colocado no estômago da noite no final do terceiro shot.
Mas ele não teve tempo de chegar ao banheiro e tinha feito aquilo nos sapatos da sua irmã mais velha.
Só mais um bloco empilhado em uma montanha enorme de 'motivos para Claire Duncan querer cortar a nossa cabeça e o nosso pau enquanto dá risada' que se acumulava há três anos.
— Leia a conversa — Nate indicou, deixando o controle de lado para estudar a expressão de Leo enquanto ele seguia sua instrução. — Ela me disse que se o open-house rolar esse ano, ela vai chamar a polícia. E ainda ameaçou contar para nossa avó se a tradição dos convites dos calouros permanecer. Até minha avó sabe que isso tudo é meio antiquado de ser fazer e provavelmente vai me xingar até a próxima década. Talvez serei cortado do testamento e, juro por Deus, processo o Remi para ele me sustentar pelo resto da vida se isso acontecer.
Hawkins não conseguiu não dar risada enquanto lia as mensagens de Claire, com ameaças e mais xingamentos do que o recomendado. Não era capaz de assumir em voz alta na presença de Remi, mas também achava a tradição que ele tinha inventado três anos antes sobre 'calouros só podem estar presentes com o convite de um veterano' meio ultrapassada e Claire sabia, assim como eles, que aquilo só acontecia porque o loiro queria enfiar um número muito maior de mulheres que homens dentro da casa. E quando se era calouro era muito mais fácil cair no papo de Remi ou na fama de qualquer um dos outros dois que, apesar de ser menor que a do primeiro, ainda existia.
— Você sabe que ela realmente vai chamar a polícia, certo? — Leo apenas confirmou com Nate, que assentiu antes de dar de ombros. — Remi provavelmente vai lidar com isso. Ele sempre lida.
Era verdade inegável que Remi Vince tinha uma grande lábia e uma carteira cheia para lidar com qualquer problema que surgisse no open-house ou durante o ano letivo. Talvez era por isso que Claire o odiava sem discrição, sempre alfinetando-o ou dizendo 'você sabe que vai chegar um momento onde você não poder se livrar com o dinheiro, certo?' quando eles estavam dividindo o mesmo cômodo.
Era por essa e outras razões que isso quase não acontecia e por isso que Nate foi morar com Leo e Remi assim que entrou na universidade, tomando o lugar de um veterano que se formara.
— E você sabe de uma? Eu nunca recebi tantas mensagens na minha vida — Leo falou assim que devolveu o celular de Nate, voltando a atenção para o seu próprio aparelho. — Aposto cinquenta dólares que o filha da puta do Remi colocou meu número em algum grupo da universidade. Ou das irmandades.
Hawkins deslizava o dedo pela sua tela, ignorando todas as quarenta e duas mensagens novas que mostrava e que não paravam de aumentar, vindas de números que ele não tinha salvo e rostos que ele não conhecia.
Mas o assunto de todas elas eram o mesmo: a festa do fim de semana.
Apesar dos veteranos da Oak não precisarem ser avisados ou relembrados do que aconteceria na república dos meninos, a tradição continuava e calouros ainda precisavam de convites. Isso significava que havia um número exagerado de pessoas do primeiro ano perguntando-o sobre isso para Leo de uma maneira que até responder suas próprias mensagem se tornou inviável de tanto que o celular vibrava em suas mãos.
— Por que infernos eles estão falando com você e não com as pessoas do segundo ano? — Duncan questionou o Leo deu de ombros. — Você ao menos vai convidar alguém? Você é o único que nunca usou essa desculpa para conhecer alguém.
— Porque é estúpida — Leo respondeu como se fosse óbvio, rolando os olhos. — Vou convidar qualquer calouro que me perguntar sobre, como sempre, não quero ser um idiota.
— Remi vai quebrar sua cara se souber disso.
— Bem, Remi vai ter que lidar com um pouco de concorrência — Hawkins deu de ombros enquanto falava, com um sorriso brincalhão no canto dos seus lábios. — Fará bem ao seu ego.
Mais um capítulo para vocês! Fico ansiosa de poder >finalmente< dizer que no próximo já vamos entrar de cara na história. E também de ressaltar que as coisas não serão tão simples como aparentam. Leo, Nina, Remi, Claire, Nate e Liv (que vocês irão conhecer no próximo capítulo) vão dar muito mais trabalho do que parece! Espero que estejam gostando, agora estamos começando a entrar nos meus capítulos favoritos, uma vez que toda a introdução já foi feita (e eu custo muuuuuito a escrever esses primeiros capítulos de uma forma que não se torne monótona). Espero que vocês estejam gostando e ler os comentários está sendo TUDO pra mim ❤ Obrigada pelo carinho!
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