Capítulo X - A flora cresce após a tempestade
Yang Wen está sentado na janela do quarto de Yang Cheng. Ele contempla as infinitas estrelas que reluzem sobre um profundo manto negro, deslumbrantes como um campo florido que é colorido pela chegada da primavera, entretanto após horas sentindo a brisa outonal balançar os seus cabelos castanhos-avermelhados, uma fumaça emerge do horizonte.
Um leve sorriso surge em seu rosto e, sem hesitar, desce da janela. Sua falta de sutileza emite um intenso de seus passos no piso e Yang Cheng abre seus olhos imediatamente. Ainda sem explicar a situação, Yang Wen o segura pelo braço e corre para a base, onde os guerreiros estão se reunindo.
Yang Cheng encosta a cabeça na parede ao seu lado e passa a mão no rosto, tentando despertar. Poucos instantes são o suficiente para todos os militares comparecerem diante do marechal.
— O que está acontecendo? — questiona Yang Cheng, ainda sonolento.
— Os Zhu estão com o exército deles na montanha ao oeste. Iremos nos posicionar nas duas montanhas que os cercam para distanciar o conflito de nosso território. Usaremos caminhos diferentes para o planalto, não acendam tochas e sejam discretos. A cavalaria ficará no clã para auxiliar a defesa e porque o terreno escorregadio não permitiria os cavalos moverem-se livremente, fiquem com o general, ele irá liderá-los.
Os Yang já ocupam os seus devidos lugares no planalto e apontam as suas flechas para os inimigos. Os soldados menos experientes são responsáveis por montar o acampamento, eles mantêm-se cuidadosos para não atrapalharem os seus veteranos, que estão posicionados para atacar e se desajeitam um pouco devido à escuridão. O silêncio é ocasionalmente interrompido pelos soldados tropeçando e se esbarrando porque as tochas estão apagadas para evitar que o inimigo os avistem.
Os arqueiros, protegidos por escudeiros, começam a efetuar seus disparos utilizando arcos compostos¹². As flechas ultrapassam a distância de cento e vinte e cinco metros e, apesar da ferocidade, elas não penetram a defesa inimiga. Os Zhu contra-atacam com seus arqueiros igualmente habilidosos, no entanto, os escudeiros param as velozes flechas e impedem que machuquem seus aliados. O tenente-general suspira, aliviado por não acontecer nenhuma perda crítica, e continua a ordenar mais ataques. A batalha permanece equilibrada, ambos clãs são igualmente habilidosos e, por esse motivo, a guerra se mantém por tantos anos sem nenhum vencedor.
Os primordiais raios solares emergem do horizonte e serenidade do céu, que contrasta com o conflito sangrento que ele observa há décadas, é compartilhada com o clã Yang — a segurança dele ainda é mantida enquanto todos lutam próximo de seu território.
Yang Lian está em pé na torre principal, aguardando, entediado, a sua chance de agir. O vento gélido adentra pelas janelas, entretanto a postura dele permanece estátil como se o frio não existisse. A atenção do general é mantida em seu território, onde os civis prosseguem com suas brincadeiras, vendas, passeios e outras atividades cotidianas. Um pequenino pássaro pousa em uma das mesas rústicas à sua direita e canta majestosamente, cobrindo os ruídos da batalha.
O sol eleva-se e ocupa sua posição entre as nuvens, entretanto essa é a única mudança para Yang Lian por horas. Mais tarde, um alto e denso sinal de fumaça é avistado próximo da região oeste da muralha interna que cerca o clã. Ele reconhece o perigo, esse é o alerta reservado para o mais desastroso dos problemas, que raramente é utilizado. Seus olhos se arregalam levemente e sua mão já está segurando a sua espada, pronta para desembainhá-la.
Ele atravessa a janela e pula para um telhado, que está a dois metros e cinquenta centímetros de seus pés, e desce para o chão. Os civis ao seu redor desviam a atenção de suas atividades e fixam o olhar em Yang Lian, entretanto não há tempo para eles entenderem o que aconteceu, porque logo já não avistam mais o jovem, que corre em direção ao sinal.
A maioria dos militares permanece na posição defensiva, entretanto alguns cavaleiros seguem junto de Yang Lian. Os civis observam confusos, eles não sabem o que significa a fumaça e temem por uma invasão. É raro conflitos envolvendo inocentes desde quando Yang Wen ocupou o cargo de marechal.
Eles entram em suas casas e transportam os móveis para a frente da porta, homens se armam com o que vier à mente, crianças se escondem atrás de suas mães e os idosos sussurram preces enquanto derramam lágrimas, se lembrando dos horrores que testemunharam no passado e alguns deles têm ataque de pânico. Os militares próximos dos civis tentam acalmá-los com doces palavras e gestos carinhosos, entretanto eles são ignorados.
Yang Lian chega, acompanhado dos cavaleiros, à fonte da fumaça. Uma tocha acesa está derrubada na entrada da muralha interna e não há ninguém ali. Nenhum sinal de vida, nenhum sinal de morte, somente o nada.
Ele segura a espada com firmeza, a lâmina afiada brilha suavemente sob a luz do sol, ansiando cortar qualquer um que ousar fazer mal ao clã. Yang Lian concentra-se em sua audição, tentando encontrar algum som debaixo dos ruídos bagunçados da batalha ao lado. Ele ouve encostarem na madeira de uma porta próxima, entretanto é dentro de uma casa civil. Ligeirinhos passos de um passarinho são escutados no telhado e, logo a seguir, um bater de asas. Um choro infantil longínquo ainda é percebido, entretanto esperado em momentos como esse. O vento sopra algumas folhas e se encontra com a muralha, que impede-o de prosseguir. Um estalo fantasmagórico emerge de dentro da muralha, chamando a atenção de Yang Lian.
— Dois cavaleiros investiguem aqui, dois no espaço entre as muralhas e outros dois dentro da muralha externa — ele entra sozinho e em silêncio na muralha interna.
A luz natural invade o túnel a partir das pequenas aberturas para ventilação, e o brilho alaranjado das tochas ilumina o longo corredor estreito. Yang Lian observa com seu olhar afiado, mantendo a espada à sua frente e caminha rápido, entretanto não o suficiente para ter seus passos ouvidos por alguém.
Nenhum novo ruído é percebido, ele segue ocultando sua presença e, em pouco tempo, já não há saídas do túnel que não precisem cruzar com seu caminho. Se um inimigo estiver à frente, esse não terá escapatória. No entanto, nada é encontrado.
Ele não se desaponta com a falta de avanço, seu foco não abre espaço para pensar em nada além das ações em resposta à pergunta "O que faremos adiante para saber o motivo do sinal de fumaça e resolvê-lo?". Somente um pouco de preocupação em relação à segurança de todos é sentida. Yang Lian corre, sai da muralha e sobe algumas escadas para falar com o tenente que comanda as sentinelas.
— Conseguiram encontrar quem enviou o sinal de fumaça ou o motivo? — sua respiração é mais acelerada.
— Não, estamos sem informações. E o que o senhor e os cavaleiros conseguiram?
— Eu não consegui nada, mas ainda não encontrei os cavaleiros — ele desce as escadas, pulando os degraus e logo se reúne com cinco dos cavaleiros onde se separaram — Encontraram algo? — todos negam — E cadê o sexto? Ele estava com você, como ele se perdeu? — diz olhando para um dos cavaleiros que não mantém o contato visual.
— Eu não sei, quando percebi, ele já havia sumido.
— Vamos para onde aconteceu.
O cavaleiro corre para o lado oeste da muralha externa e é seguido pelos outros. Os sons da batalha intensificam-se e são abafados parcialmente quando entram na muralha. Yang Lian é o primeiro a seguir adiante e aponta sua espada para o teto da entrada. Os cavaleiros arregalam seus olhos, pulam para trás e riem ao olhar para cima. O sexto cavaleiro está posicionado no teto, uma sentinela que trabalha acima da muralha o ajudou a subir. Essa estratégia foi utilizada para que a porta pudesse ser vigiada enquanto seu companheiro explorava o interior.
— Já terminaram? — ele desce.
— Não encontramos nada, você possui alguma informação?
— Nada também, não teve nenhuma movimentação além das suas enquanto vigiei.
— Retornem à postura defensiva — e sai da presença deles.
Yang Lian ordena às sentinelas que aumentem a segurança próxima do local que originou o sinal de fumaça e contacta a divisão de inteligência. Quando finaliza a breve conversa sobre o sinal, retorna a sua postura de guarda na torre próxima da fronteira do clã.
A visão ampla concedida pela posição do general o permite observar toda a região oeste da fronteira e partes da batalha. Os sussurros do vento trazem consigo os gritos de furor dos guerreiros e, do outro lado, os civis começam a se sentir seguros. Em lugares mais internos do clã, os vendedores brandam em alta voz, anunciando suas mercadorias e as crianças brincam umas com as outras. Pássaros pousam nas muralhas e não desistem de cantar, essa longínqua sinfonia ainda é ouvida por Yang Lian, que aguarda pelos resultados da investigação.
Outro denso pilar de fumaça cobre as brancas nuvens serenas. Yang Lian pula da janela e passa por alguns telhados até alcançar chão. Ele chega ao local do alerta, na porta oeste da muralha externa e encontra uma sentinela segura a tocha, tremendo.
— O que aconteceu?
— Eu vi Tigre Branco, ele foi para o norte — sua voz é falhada.
Yang Lian e desembainha a espada enquanto se movimenta. Seus olhos não descansam, procurando qualquer vislumbre de algo branco no caminho, entretanto não há nada que aparenta estar fora da normalidade. E quanto mais corre, mais sua respiração acelera junto dos batimentos de seu coração. Em menos de um minuto ele já está distante da sentinela, mas para de maneira abrupta e cai, entretanto se levanta, vira para a direita e volta a correr.
Ele sorri suavemente. Yang Lian não altera seu ritmo e pula, diminuindo a distância entre ele e o Tigre Branco, e desfere seu primeiro ataque, um chute. Ele o derruba, perde seu equilíbrio e cai um pouco à frente. Ambos se levantam. Yang Lian procura aberturas na armadura de seu inimigo que lhe permitirá atacar e desferir um golpe fatal, no entanto, a cabeça está descoberta, ele não entende se é uma provocação para uma armadilha ou não foi possível completar a armadura. Yang Lian tenta golpear o pescoço do Tigre Branco, o inimigo defende e prossegue, chutando a cabeça do general. Yang Lian chuta a perna dele e desfere um corte no ar, próximo do pescoço do Tigre Branco, que escapa correndo e atravessa a fronteira do clã Yang antes que o general o alcance.
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Notas de rodapé:
¹² Um arco melhor que o normal, com o alcance médio de 50 a 150 metros, e o máximo de 300 metros.
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