Capítulo I - O monstro mais aterrorizante não é sobrenatural
O suave reluzir da aurora resplandece atrás das numerosas montanhas que cobrem o horizonte, colorindo o céu em tons rosados. A luz atravessa uma das janelas do Pavilhão do Sol, invadindo uma sala desta construção que ocorre uma reunião. O líder do clã está sentado próximo a uma mesa, acompanhado de seu marechal e seus generais.
Yang Cheng, o líder, termina de beber seu chá e anuncia informações quase míticas, ou talvez míticas. Os sentimentos da maioria dos generais são tumultuados como a destruição deixada nas plantações por uma tempestade inesperada no outono. Um murmúrio contínuo entre os guerreiros é persistente, eles balançam suas pernas, temerosos, não por estarem em perigo, ou talvez realmente exista perigo, todavia, o medo dos implacáveis lutadores provém de fantasias inúteis. E quieto, cercado pelo caos, está Yang Lian, tentando concentrar-se, entretanto os ruídos penetram em sua mente como uma lâmina afiada. O dia mal começou e a cabeça dele já dói.
Yang Lian se levanta e somente o marechal nota os seus passos silenciosos, entretanto os outros presentes ainda não perceberiam se ele fosse desajeitado porque nada além dos recentes acontecimentos “sobrenaturais” é capaz de roubar a atenção deles. Yang Lian aproxima-se do marechal, o seu mestre. Ele coloca a mão sobre o ombro dele e balança suavemente. Não necessitando proferir palavras, o seu mestre compreende que ele deseja dizer que os ruídos demasiadamente altos estão quase o enlouquecendo.
Yang Wen o ordena que saia da reunião, evitando que general de audição sensível, que nunca nem esteve em um campo de batalha, apesar da atual ocorrência de uma guerra, desperdice suas energias em um ambiente caótico em que ele não possui utilidade.
Yang Lian atravessa a janela e se senta no telhado constituído de robustas madeiras escuras. Seus longos cabelos negros como o ébano são soltos e ele retira a máscara de dragão de ferro e couro tingido de púrpura dos generais, revelando um belo rosto inesperadamente jovem, que raramente expressa qualquer emoção, parcialmente coberto por um tapa-olho negro.
Os sussurros da brisa outonal carregam folhas alaranjadas em seus braços, que se desfazem no ar, e balançam o hanfu de tonalidades púrpura do general. Yang Lian suspira, com seu longínquo olhar frio observando-as e, ainda com dor de cabeça, ele pula do telhado após colocar novamente a sua máscara.
Yang Lian entra em um simples escritório organizado, situado no alto de uma torre. Há somente uma mesa de madeira escura cercada por estantes de livros e janelas, onde ele senta somente por um efêmero instante, porque batidas frenéticas na porta estilhaçam o suave silêncio da sala. O coronel persiste com os as batidas desesperadas até abrirem.
— Algum problema? — questiona Yang Lian. Ele possui um tom de voz frio que exala dureza, como uma lâmina de gelo.
— Hoje, o jardineiro Yang Rong denunciou o assassinato de cinco majores, logo após encontrar o corpo deles sentados ao redor de uma mesa no jardim da casa de seu patrão, Yang Guang, que também foi uma das vítimas. Os outros majores eram Yang Xian, Yang Hui, Yang Yong e Yang Fu. Havia muito sangue, entretanto somente um corte no pescoço de cada um deles. A cena do crime foi interditada, deseja visitá-la? O senhor possui interesse no relatório?
— Entregue o assunto para a inteligência e, se eles necessitarem de meu apoio, eu farei o que for preciso. Mais tarde, entregue-me um relatório do caso.
— Entendido. Deseja conversar com o jardineiro? Ele está assustado e dizendo coisas estranhas.
— Estranhas como?
— Ele acredita que o assassino seja um espírito, porque ninguém o viu, nem mesmo as vítimas que permaneceram em seus lugares, sem fugir e sem gritar.
— Como ele deduziu que as vítimas permaneceram no mesmo lugar? Ou foi apenas uma observação simples?
— Um dos militares responsáveis por analisar a cena do crime disse isso ao jardineiro.
— No relatório, também escreva para mim toda a situação do jardineiro.
— Entendido.
Yang Lian despede-se do coronel com um gesto e fecha a porta. No decorrer de todo este dia, focado no bizarramente extraordinário crime acontecido na madrugada anterior, a inteligência do exército não permite que Yang Lian trabalhe em mais nada que seja independente deles e o contacta inúmeras vezes.
Os esforços de todos cooperam para a proteção dos Yang e o decorrer do tempo não é um inimigo. A delicada escuridão da noite envolve o céu em seus braços, colorindo-o com pinceladas de nebulosas adornadas por constelações. A chance de descansar é concedida aos responsáveis militares que trabalham para o seu clã, e Yang Lian retorna para casa.
A brisa gélida balança os seus fios de cabelos enquanto ele se aproxima da varanda, onde um homem excepcionalmente alto, beirando os dois metros de altura, de pele parda e detentor de uma dominante presença, está apoiado em uma coluna de madeira, com os braços cruzados. Seu mestre, apesar de exalar imponência, está com a cabeça baixa e olhos pesados, quase dormindo e ignorando o estado caótico dos cabelos castanhos dele.
— Boa noite, Lian — levanta o seu olhar gentil e abre a porta, para ambos entrarem.
— Oi, Mestre Wen.
— Você sabe o que discutiram na reunião? — diz após fechar a porta.
— Acho que sim, foi sobre a morte dos cinco majores?
— Foi.
— Entendi, eu tive muito trabalho hoje por causa deste assunto, a inteligência me contactava quase todo instante.
— Conseguiram resolver algo?
— Um pouco. Reforçamos a segurança do clã e estão investigando as circunstâncias das mortes.
— Para quantas possibilidades de ataques você se preparou?
— Para todas que imaginei.
— Ótimo, e o clã está seguro para tentar atrair o assassino? É menos trabalhoso do que procurar um fantasma.
— Fantasma?
— Não é literal.
— Ainda não, talvez na semana que vem.
— Quando cuidava da segurança, você percebeu que as mortes talvez sejam uma distração?
— Sim, o assassino executou um trabalho complexo com competência para matar apenas alguns militares qualquer e desesperar todo o clã. Isso pode ser o prenúncio de algo maior ou um crime para encobrir outro pior.
— Exato, sempre posso contar com você, agora apenas descanse, você merece. Hoje, o Yaang Wu e Yang Zhong estarão patrulhando as fronteiras e eu estarei de apoio para eles.
— Obrigado.
Yang Lian senta em um lugar qualquer do chão que nem ao menos foi construído com esta finalidade, fecha os seus olhos e aquieta-se. Ele permanece imóvel, pensando em sabe se lá o que, talvez ele não pense em nada, ou talvez ele já esteja dormindo.
Yang Wen olha para o seu discípulo, sorri e pega um de seus livros em uma estante próxima, para continuar a leitura. Ele deita em cima de uma mesa na sala, também ignorando o propósito da criação dela, e folheia as páginas dele.
O silêncio possui um domínio curto, já sendo estilhaçado pelo estrondoso e indelicado abrir da porta.
— Oi, papai. Oi, maninho — fala uma garotinha, pulando para dentro de casa.
— Oi, a-Ji⁴ — fecha o seu livro e desce da mesa.
— Vocês vão me proteger do Jiang Shi?⁵ — aproxima-se de seu pai.
— Você precisa de proteção? — diz um confiante garotinho de idade semelhante, entrando em casa enquanto o adolescente que acompanha os dois fecha a porta.
— Ele não existe — responde Yang Lian, rapidamente.
— As pessoas estão falando que o Jiang Shi invadiu o clã e matou os majores. É que eu não quero que drenem meu ki⁶.
— Não perca seu tempo temendo lendas, humanos são piores.
— EU NÃO QUERO HUMANOS DRENANDO MEU KI!
Yang Lian assusta-se com a reação da pequena Ji, entretanto não demonstra. A garotinha arregala seus olhos, grita e corre diretamente para o colo de Yang Wen, que a abraça.
— Não se preocupe, eu irei te proteger do Jiang Shi e dos humanos.
— Tá bom, papai. Boa noite, eu vou dormir.
— Boa noite, a-Ji.
— Eu também te protegerei, mana — diz o garotinho Yang Feng, enquanto o irmão mais velho deles. Yang Ming, os leva para o quarto.
— Impressionante sua habilidade de lidar com as pessoas — suspira — Eu também vou dormir, daqui a pouco é a hora do javali⁷.
Horas e horas escorrem como se não possuíssem o menor valor. Yang Lian permanece deitado em sua cama, com os olhos fechados há horas, entretanto ainda desperto. Não há luar, apenas pequeninas estrelas são a esperança que iluminam a noite. Yang Lian se levanta e anda pelo seu quarto, se deita, levanta novamente, se deita, se levanta, caminha e caminha e se deita. Ele fecha seus olhos, repetindo em sua mente que seu mestre é competente o suficiente para não necessitar de seu auxílio durante o seu momento de descanso, e relaxa seus músculos tensionados, se esforçando para dormir e evitar que o cansaço o atrapalhe no trabalho do próximo dia.
Entretanto, somente uma noite acordado não é tão ruim.
Ele levanta de sua cama, ajusta os detalhes marrons de seu hanfu, calça suas botas marrons e pergunta à divisão de inteligência onde poderiam ocorrer os próximos assassinatos. Depois, procura uma boa visão das vítimas deduzidas.
Yang Lian se posiciona sobre um telhado constituído de madeira escura e a brisa gélida balança com delicadeza os fios de seus cabelos. Ocasionalmente, o silêncio das almas adormecidas é interrompido pelo canto de pássaros noturnos, entretanto ele não se distrai.
Horas de vigilância são despendidas e a normalidade permanece, a noite é quieta como um morto. Seus olhos estão pesados, quase se fechando, e as remanescentes forças que ainda sustentam seu corpo se dissipam gradualmente, entretanto uma surpresa quase o faz dar um pulo.
Diante de seus olhos, todos seus planos desmoronam ao reconhecer o inimigo. Ele se esconde, respirando ofegantemente. Yang Lian sabe muito bem que está sozinho e qualquer intervenção apenas resultaria em sua morte, restando-lhe somente testemunhar o assassinato de seus companheiros porque ele não é capaz de lutar contra o assassino e não há tempo de avisar ao exército antes do inimigo fugir devido à distância.
Quando ele possui a certeza de que o assassino foi embora, Yang Lian retorna para casa. Ele abre e fecha a porta em silêncio, desejando evitar que sua família acorde, se abaixa para tirar suas botas, todavia cai, causando um som que ressoa na madeira. Ele tenta continuar na tentativa de chegar escondido ao quarto do marechal para avisá-lo do ocorrido, entretanto percebe que não está sozinho nas densas sombras que residem ao seu redor.
— Mestre Wen?
— Lian? Por que você está chegando em casa a essa hora?
— Eu descobri que o "Jiang Shi" é o Tigre Branco⁸, mas onde vocês estavam? — ele tira suas botas e as deixa ao lado da porta.
— Nós o prendemos horas atrás e os deixei cuidando dele, não imaginei que ele iria fugir dessa vez.
— Eu percebi que havia fumaça na prisão, deve ter sido ele quem a incendiou novamente
— Certamente sim — e suspira — Eu cometi um erro terrível, esqueci de verificar se fizeram as mudanças que ordenei para a prisão. E como você o descobriu?
— Eu perguntei à divisão de inteligência quem iria morrer e os vigiei, porque imaginei que o "Jiang Shi" seria mais fraco que eu. Entretanto, não deu muito certo… pelo menos eu consegui presenciar os assassinatos.
— O que você viu?
— Eu vi o Tigre Branco matando o Yang Xue, Yang Lan e Yang Xing.
— Detalhe.
— Ah, não tinha nada que valha a pena dizer.
— Você tem certeza que era ele mesmo?
— Sim, como eu poderia me esquecer? Seu cabelo branco e estilo de luta são inconfundíveis.
— Entendi — e começa a rir — Imaginei que você não esqueceria facilmente da surra que tomou quando vocês lutaram — Yang Lian suspira.
— Pelo menos não foi uma luta entediante — sua fala apenas provoca mais risos de seu mestre.
— Vamos dormir, depois continuaremos a tratar os assuntos do trabalho.
—
Notas de rodapé:
⁴ Diminutivo carinhoso da língua chinesa, pode se comparar ao "chan" do japonês.
⁵ Ser mitológico chinês, de acordo com as lendas é um morto-vivo.
⁶ Energia vital de acordo com as crenças chinesas.
⁷ 21 a 23 horas da noite.
⁸ Título atribuído ao meu personagem que se refere a lenda chinesa dos quatro animais guardiões dos pontos cardeais, também é um símbolo de força e coragem, além de ser tradicionalmente esculpido em tumbas para proteger os mortos de maus espíritos.
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