Capitulo 8 - Os ventos da madrugada.
As lembranças são sempre tão doloridas, por mais que tenhamos boas lembranças sobre alguém, vem uma recordação que derruba toda a alegria, mesmo hoje após ter passado tanto tempo em psicólogos não consigo mais ter a energia que tinha da primeira vez, não consigo mais ver esse lado bom da vida, não consigo ver o porquê de tanta felicidade, a cada sorriso são duas lagrimas de tristeza.
Os únicos momentos bons são os que tenho com os amigos enquanto jogo games online, ali o mundo para, as dores somem, somos apenas nós seis nos divertindo, não tem amor mal resolvido, não tem problema familiar, não tem dores ou agonias, cobranças ou pessoas más.
Pensando bem, é a única coisa que realmente vai me fazer falta, era o momento favorito do meu dia, onde eu sentava na minha cadeira, colocava os meus fones, ligava o meu monitor e o mundo voltava a ter cores, voltava a ter sons e tudo que era cinza e sem graça voltava a brilhar, sei que era um meio para fazer com que a depressão fosse embora, mas era meu momento de ser feliz e nada muda o quanto eu gostava daquilo, hoje mesmo foi um dia em que fiquei lá.
Começamos mais cedo pois teria jogo de algum time de futebol que algum dos meus amigos era torcedor, após algumas partidas acabei jogando sozinho e foi quando senti um calafrio, olhei para traz e não tinha mais ninguém na sala e a janela estava aberta, fui fechar e foi quando me dei conta de que seria a última vez que olharia por ela, última vez que veria as luzes do bairro acesas, que sentiria o vento gelado batendo no rosto ou que ouviria os cachorros latirem por estar passando alguém tão tarde da noite pelas ruas.
Voltei para a minha cadeira, parei de jogar e abri a gaveta, lá estavam os remédios, os últimos que eu tomaria na vida, me levantei, fiz uma omelete com queijo e petiscos, meu prato favorito e que melhor preparo, queria sentir o melhor gosto antes de fazer o que viria a fazer agora. Ouvi alguém subindo as escadas e fiquei de costas, meus olhos estavam cheios de lagrimas e não queria falar com ninguém, era a minha mãe perguntando se estava tudo bem, balancei a cabeça afirmando positivamente até a garganta secar e poder falar que sim.
Ela foi até o banheiro sem nem desconfiar o que eu estava prestes a fazer, quando voltou ela veio e falou que no dia seguinte iriamos sair para o mercado e queria que eu fosse junto pois iriamos comprar outra TV, falei que tudo bem, só estava terminando as partidas do dia e já iria dormir, ela voltou para o quarto e eu me sentei a mesa e comi a omelete, deixando um chocolate de sobremesa, vamos combinar chocolate é muito bom, terminei de comer e lavei a louça, guardei a mesma e voltei para o computador, onde tenho todas as fotos, vídeos, áudios da família e amigos.
Após ver quase todas e me despedir de todos eles, desliguei o computador e peguei os remédios, fui para o meu quarto, onde desta vez seria a minha última noite vivo, chegando no quarto fecho a porta e ouço um miado, era a minha gatinha que estava presa para fora do quarto, todo canto que ia ela me seguia, sei que é triste, mas não tem outra forma, ela vai ficar bem, deixei comida e agua, amanhã alguém cuidará dela, todos em casa a amam e ninguém lhe fará mal.
Ela para de miar e volta para a sala, agora estou sozinho e posso terminar isso, ouço o vento que faz o exaustor do quarto gira, fazendo com que eu olhe para a sombra que ele produz com a luz da lua, apontando para uma caixa no painel da minha TV, lá eu vejo algo que jurava ter jogado fora, a aliança da última garota que amei, escolhi com tanto carinho, com tanto amor que acredito não ter conseguido jogar fora antes. Peguei e coloquei no meu dedo novamente, para ter pelo menos a sensação de estar com ela uma última vez.
Ao sentir o cheiro que ficou em uma das camisas que ela usou, começo a chorar, não por ela ter partido, mas por eu não ter a coragem de ter lhe dito nessa ligação que nunca a esqueceria e que sempre a amaria. Me levanto para pegar a bebida, respiro fundo e percebo que acabou, não haverá mais nada. Nenhuma emoção, nenhuma dor, nenhum sonho após todos esses anos irei finalmente descansar, sem preocupação com mais nada nem ninguém, deixei dinheiro suficiente para que paguem por tudo que será necessário, e mais um extra para ajudar com o que for preciso.
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