[86] O Motim
Momentos após aceitarem a proposta, a oferta foi concedida também aos betas e logo eles tinham um grande número de pessoas dispostas a sair daquele lugar, com os bolsos cheios de moedas.
Os alfas criaram uma distração para que Jungwon tivesse a oportunidade de escapar do salão, para explorar outros lugares em busca da fortuna.
- Ei, parem com isso! - Um guarda ordenou, mas foi ignorado. Armando-se com um bastão de madeira, virou-se para o parceiro: - Me ajude aqui, Borges!
Os vigilantes deixaram suas posições para interferir na briga no meio do salão. A baderna estava chegando a um nível que os dois guardas não conseguiram conter a massa enfurecida, e mais outros vieram para tentar controlar os residentes.
Alguém cometeu o deslize de deixar a porta destrancada, acreditando que todos estavam envolvidos na confusão, afinal de contas, era muita gente. Jungwon aproveitou o breve descuido e seguiu para a saída do salão. Não havia ninguém guardando o túnel principal. Todos que mantinham a segurança daquela parte estavam tentando conter a briga no salão.
Jungwon lembrava-se do percurso exato que fez desde que foi levado àquele lugar. Ele acreditava que a fortuna de Toralápis era guardada em um dos casarões, visto que o mesmo não colocava seus pés na Fossa. Aquele lugar era como o inferno na Terra, e somente os nobres carniceiros tinham interesse de assistir as atividades daquele lugar desumano.
Depois de percorrer o longo túnel principal, Jungwon se viu na zona onde outras ramificações se encontravam. Ele avançou com bastante cuidado para não fazer barulho, mas não contava que Severino estava no depósito, removendo da lista dos residentes o nome daqueles que morreram no último combate.
- O que faz aqui? - Severino franziu o cenho.
- Me perdi...
Desconfiado, o alfa ponderou em silêncio. Jungwon lentamente entrou no depósito, seguindo em direção a ele.
- Eu lembro de você - Severino arquejou. - É aquele ômega curioso que fez muitas perguntas... Ahá! Você tá procurando a fortuna, não é?
O alfa engasgou ao parar de falar repentinamente, no momento em que Jungwon encostou uma faca em seu pescoço.
- Muito esperto, Severino...
- Ai, meu Deus! Por favor, não me mata.
- Não vou te matar. Pelo menos não agora.
- Espera... "não agora"? Então depois você vai?
- Anda logo. - Jungwon guardou a faca e o guiou para a saída. - Você será meu passe livre por aqui.
- Jesus... eu deveria ter aceitado aquele emprego como tanoeiro. - Severino lamentou.
- Vê se fica quieto.
O alfa cerrou os dentes e grudou os lábios, mantendo-se em silêncio até que ambos chegaram na escotilha de saída para a superfície. De longe eles enxergaram dois guardas que estavam protegendo a entrada para o subterrâneo.
- Deixa que eu cuido disso. - O alfa deliberou. - Só preciso contar uma mentirinha e eles deixam a gente passar.
- Severino... - seu tom foi de advertência.
- Já sei, já sei. Se eu foder com seu plano você vai enfiar essa faca no meu fígado e no meu baço.
- Acho bom você ser convincente.
- Tá brincando! Nasci para o teatro. - Apoiou as mãos no quadril com orgulho. - Como acha que consegui esse trabalho sem ao menos saber atirar?
Jungwon piscou algumas vezes, sem reação, depois riu negando com a cabeça.
- Você é uma criatura bastante peculiar.
Severino sorriu, dando de ombros. Ele já estava acostumado a comentários do tipo, e gostava quando os recebia. Membro de uma família com 25 irmãos, sempre buscou se destacar dos demais. Seu modo de ser perdurou até o presente momento.
Com um esquema em mente, Severino agarrou o braço do ômega e o guiou em direção a saída, mantendo um semblante esnobe e postura rígida.
- Alto lá. - Um dos guardas demandou. - Para onde está levando ele?
- Tem um arbusto frondoso perto da clareira - Severino coçou a região íntima de modo grosseiro. - Tô afim de me aliviar um pouco.
- Com um ômega marcado? - O guarda analisou as marcas de Jungwon.
- Por que? Tá querendo que eu peça permissão pros alfas dele? - Severino rolou os olhos. - É cada uma... abre logo essa disgrama.
- Hum... - o guardou olhou para ele com expressão de nojo, depois indicou ao colega: - Pode abrir.
Desse modo, os dois conseguiram atravessar o alçapão e seguiram um caminho diferente do que pretendiam, até ouvir a passagem anterior ser fechada pelos guardas. Caminharam um pouco mais e quando finalmente sentiu-se seguro, Jungwon mudou o rumo na direção dos casarões, pois acreditava que era nesse local que Toralápis mantinha os bens que lucrava na fossa.
Assim que chegaram perto, os dois tiveram cuidado para não serem detectados, andando sorrateiramente entre as plantas do jardim.
- Quantos guardas têm lá dentro? - O ômega perguntou, analisando ao seu redor.
- Nenhum. Os nobres não gostam deles por perto. - Severino previu que Jungwon o olharia com desconfiança, e adicionou rapidamente: - A segurança de verdade está lá fora, depois dos muros. Há guardas espalhados por cerca de um quilômetro dentro da floresta.
- Então vamos logo.
Sem demora, eles seguiram para dentro do casarão indicado pelo alfa, onde Márcio Toralápis mantém um escritório para tratar de negócios, com seus clientes da Fossa. No interior do imóvel eles podiam ouvir os barulhos que indicavam a presença de hóspedes no andar de cima, e de empregados na cozinha que ficava nos fundos.
A sala de visitas estava desocupada, em função disso, conseguiram avançar sem dificuldade até o escritório. Como era de se esperar, a porta estava trancada e Severino obviamente não tinha a chave.
- Talvez ele deixe alguma reserva... - Jungwon observou a sua volta e começou a procurar.
O alfa também ajudou, cobrindo duas vezes mais rápido a área próxima a porta. A chave de emergência estava dentro de um vaso com plantas, ao lado de um tapete. Jungwon a pegou depressa e após se certificar que ainda estavam a sós, abriu a porta e migrou junto a Severino para dentro do escritório.
Uma vez dentro do cômodo, eles encontraram o recinto perfeitamente organizado. Se havia algum documento eles estavam guardados dentro das gavetas, mas isso não interessava ao ômega. O que Jungwon buscava decerto encontrava-se em um espaço muito maior.
Seguindo a linha de pensamento, o ômega foi até a escada no canto do cômodo e descobriu um compartimento secreto no subsolo. Posto que aquela seção estava muito escura para enxergar alguma coisa, ele acendeu as velas de um castiçal para iluminar a descida.
Severino o acompanhou de perto e quando chegaram no final da escada, descobriram que o cômodo secreto se tratava de um depósito, onde os pagamentos eram armazenados. Muitas arcas estavam empilhadas, contendo brasões que supostamente representam as famílias de cada nobre.
O alfa abriu uma das arcas, o brilho das moedas de ouro refletiram a luz das velas. Os olhos de Severino brilharam ao ver tamanha riqueza, sem contar que tinha muito mais nos outros baús. Jungwon sorriu satisfeito. Só aquela quantidade possivelmente já garantia que sua aposta com o pai estava ganha.
- O que você vai fazer agora? - Severino apoiou as mãos na cintura.
O ômega apoiou o castiçal em cima de um baú e segurou a faca de modo ameaçador quando respondeu muito tranquilamente:
- Agora eu vou ter que te matar.
- Não tá falando sério, né? - Sorriu nervoso.
- Você sabe demais, Severino.
- M-m-mas você precisa de mim, pra voltar...
- Vai ser mais complicado, mas eu dou um jeito.
- Por favor! - Severino juntou as mãos e implorou de joelhos: - Eu nunca vi tanto ouro na minha vida. Só com uma arca dessas eu não vou precisar trabalhar nunca mais.
- Céus, alfa, levanta daí.
- Lá fora tá cheio de guardas, a gente pega dois baús, você se esconde na carruagem e eu te levo pra cidade!
- Eu não vou levar somente dois. Acha que cheguei até aqui pra isso?
- Você tá parecendo aqueles piratas impiedosos que matam só pra atingir seus objetivos por pura ambição... - Severino fez uma pausa quando notou no semblante do ômega que ele era exatamente aquilo. - Catapimbas! Agora tudo faz sentido... Escuta, não precisa me matar. Eu posso te ajudar muito mais.
- Por que eu deveria acreditar?
- Eu não gosto daqui. Só trabalho porque foi o melhor que consegui. Eu posso limpar o chão desse lugar com a língua se você não me matar e me deixar ficar com um baú desse.
Jungwon o analisou. Considerando o comportamento do alfa desde que chegou a este lugar, ele acreditou que provavelmente Severino estava dizendo a verdade.
- Tudo bem - o ômega guardou a faca. - Você vai fazer uma coisa pra mim.
- Tudo o que você quiser! - Severino ficou de pé em um salto.
Jungwon pegou uma certa quantidade de moedas e deixou o local junto a Severino, levando a chave reserva consigo. Eles não tiveram muitas dificuldades para retornar a fossa, embora os guardas que protegem a entrada para o subterrâneo tenham feito mais perguntas.
Ao longo dos túneis, a atividade dos guardas voltou ao normal. Isso significava que a baderna causada no salão já tinha sido controlada, e a desculpa que o alfa criou não poderia ser usada por muito tempo. Os dois estavam no depósito onde o ômega tinha encontrado-o, e este revelou a função que tinha para Severino:
- Busque o Luna ancorado no porto e você encontrará os meus alfas. Diga para levarem o navio a uma enseada a trinta e sete milhas ao Norte. No sábado pela manhã deixem os botes na praia, prontos para o transporte.
- Como sabe que estamos ao Norte da cidade.
- A posição que o Sol estava nos dois dias de combate me deu uma estimativa de onde ele se põe, através disso eu pude me localizar.
- E a distância? - O alfa piscou perplexo. - Você estava impossibilitado de ver qualquer coisa quando foi trazido pra Fossa.
- É só calcular o tempo desde que fui apagado até o momento em que desci da carruagem. É claro, contando com possíveis contratempos pelo caminho.
Severino permaneceu alguns segundos boquiaberto, admirado e também estremecido com aquelas confissões. Qualquer um que foi parar na Fossa não tinha ideia de qual lugar estava, apenas acreditavam, metaforicamente, que aquele era o inferno.
Somente o seu desempenho na arena era suficiente para tornar o ômega intimidante. Ele despertava temor e fascínio. Seu intelecto e a forma que tinha o domínio da situação ampliava o sentimento. Severino nunca tinha conhecido alguém assim, nem mesmo o pavoroso Toralápis.
- E se eles não acreditarem em mim? - Estava se referindo aos alfas de Jungwon.
O ômega ponderou por um momento, buscando em seu íntimo uma informação que prove que a mensagem realmente tinha vindo dele. Precisava ser algo que apenas eles sabiam, e que não desse margem para qualquer dúvida de que o recado de fato veio de Jungwon.
Um lampejo súbito em sua mente o fez encontrar a evidência perfeita. Embora Jay e Lian não entendam o sentido daquelas palavras, seus lobos com certeza sentirão o significado.
Severino ficou confuso e cético quanto ao plano do ômega funcionar, afinal, se os alfas desconfiassem de algo, na melhor das hipóteses, ele vai levar uma bela surra dos dois. Contudo, ele concordou em transmitir o recado.
Depois que acertaram o objetivo, Jungwon foi escoltado de volta às moradias. Assim que chegou, encontrou o salão sem ninguém, ainda que fosse permitido circular naquele horário. Na certa, os residentes foram punidos pelo tumulto que causaram. Ele buscou os ômegas, que logo confirmaram a suspeita:
- Todos foram punidos, menos a gente. - Alice explicou. - Não participamos da confusão.
- Falando nisso, onde você tava? - Joaquim perguntou.
- Procurando isso aqui. - Jungwon sorriu abrindo o saco de moedas que pegou no casarão, exibindo aos ômegas uma amostra do tesouro que logo vão colocar as mãos.
Os olhos de todos brilharam ao encarar a quantidade de moedas. Todas de ouro. Nenhum deles sequer viu uma na vida antes desse momento. Jungwon explicou que havia muito mais, e que eles teriam cada um a sua parte. Os ômegas ouviram atentamente quando e como seria realizado o motim, levando a fuga em massa.
Depois disso, seguiu para a residência dos alfas, a fim de instruir demais residentes sobre o esquema. Quando Jungwon mostrou as moedas de ouro, eles sorriram de forma traiçoeira, visando obter a maior parte daquela fortuna.
- Setenta por cento nosso, dez pros betas e o restante é seu. - Moacir determinou.
- E os outros ômegas? - Jungwon franziu o cenho, fingindo que estava aceitando aquilo.
Seu objetivo desde que resolveu permanecer no Brasil era roubar a fortuna de Toralápis para si. Após conhecer aqueles sobreviventes, pretendia conceder uma parte para eles, visto que foram usados para gerar toda aquela riqueza. Contudo, os alfas faziam parte do grotesco esquema que abusava dos ômegas, e isso Jungwon não perdoaria.
- Eles não merecem. Você pode ser um ômega durão, mas aqueles alí só servem pra uma coisa... - Gilberto fez um gesto obsceno com a mão, próximo a boca.
Todos os alfas riram. Jungwon não deixou transparecer, mas a fúria que sentia naquele momento quase o fez perder o controle. Mas ele permaneceu impassível, com a frieza necessária para manter o foco em sua estratégia.
- Mas eles também virão conosco. - O pirata deliberou.
- Foda-se. Tanto faz. - Moacir deu de ombros. - Eu é que não vou carregar aqueles parasitas.
Outros concordaram e começaram a resmungar, adicionando adjetivos considerados depreciativos para a época em questão. Jungwon não tinha mais nada a tratar com eles e já tinha ouvido idiotices o suficiente, por isso, os deixou para divulgar aos betas e juntá-los ao motim.
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Ainda que tivesse a intenção de procurar Jay e Lian no dia em que combinou com o ômega, Severino não quis levantar suspeitas ao deixar a Fossa sem qualquer motivo aparente. Ele esperou chegar uma ordem para buscar mantimentos na cidade, que sempre acontecia nas quartas-feiras.
Assim sendo, três dias após a aventura que teve com Jungwon, o alfa aproveitou a oportunidade e seguiu até a cidade político-administrativa da região. Antes de resolver a questão dos suprimentos, dirigiu-se ao porto e através da bandeira identificou o Luna.
Era o maior navio ancorado naquele momento. Severino ficou tão impressionado com sua magnitude, que ficou alguns segundos olhando embasbacado para o mastro e suas armações.
Assim que voltou a si, quase deu um pulo para trás quando se deparou com um alfa moreno, mantendo seus olhos verdes observando-o atentamente.
- Olá, meu nome é Severino. Será que poderia chamar o contramestre?
- Você está diante dele.
- Oh! Neste caso, eu trago uma mensagem do seu ômega.
O semblante neutro do pirata fechou-se de modo que Severino engoliu em seco. Jay desconfiou do alfa no momento em que o mesmo revelou o motivo de sua presença. Desde que foi levado, Jungwon nunca entrou em contato com seus alfas por meio de outra pessoa. Na vez que se comunicou recorreu ao Kraken.
- Me acompanhe. - Jay o chamou.
Aquela história era no mínimo muito estranha. Pelo bem ou pelo mal, o alfa saberia se Severino realmente estava falando a verdade.
Assim que deslocaram-se para dentro da cabine, Jay foi ligeiro em manifestar sua descrença, virando-se para o outro alfa de braços cruzados:
- Fale a verdade e eu te pouparei. Quem te mandou aqui?
- Por favor, não atire em mim mas, como eu disse, foi o seu ômega.
- E o que supostamente ele disse?
- Pra levarem o Luna a uma enseada a trinta e sete milhas ao Norte.
- Ah, ele disse pra levar o navio pra longe do porto? - Jay riu, depois voltou a ficar sério: - Você nem mesmo se esforça pra tentar me convencer.
- Eu imaginei que vocês não acreditariam, por isso ele me contou outra coisa.
- Uau, ele te contou um monte de coisas. - A incredulidade do pirata só aumentava.
- Pode parecer estranho, mas ele disse que aceita se casar com você em todas as vidas que se encontrarem, mesmo que em todas elas você seja um oficial da Marinha.
Jay ficou parado encarando o outro alfa. Por mais que sua mente quisesse responder, naquele segundo ele era incapaz. Seu lobo agitou-se de modo estranho e ele não entendia o porquê, mas soube que era algo íntimo no momento que ouviu.
A falta de resposta do alfa fez Severino considerar se ficava, ou se aproveitava a ligeira distração e saia correndo até a porta. Mas quando os lábios do pirata se transformaram em um pequeno sorriso, decidiu esperar. Por mais que fosse confuso, algo mudou e Jay finalmente se expressou, manifestando que havia acreditado:
- Trinta e sete milhas?
- Isso - Severino continuou a explicação: -, precisam deixar os botes para transporte na praia e o navio pronto para ir embora.
- Tudo bem. Espere aqui, eu já volto.
O contramestre deixou a cabine expressando claramente que confiava nele. Severino respirou aliviado. Jungwon tinha razão, seus alfas acreditariam naquelas palavras mesmo que não fizessem sentido algum.
Quando retornou, Jay trouxe consigo um outro alfa. Ele tinha os olhos negros e o cabelo da mesma cor. Ao entrar na cabine, demonstrou a mesma reação de desconfiança que o primeiro.
- É ele. Seu nome é Severino. - O contramestre apresentou. - Como você conheceu o Jungwon?
- Calma aí, Jay. Você realmente tá acreditando nessa mentira?
- Lian, não sei como te explicar mas é verdade. O Jun realmente o mandou aqui.
- Lian? - Severino lembrou do nome citado por Jungwon. O de cabelo preto olhou para ele, confirmando que este era seu nome. O alfa então relatou: - Certo... pra você o Jungwon disse que sente falta do perfume das tulipas.
O olhar de descrença rapidamente deu lugar a uma expressão de surpresa. Assim como aconteceu com o contramestre, algo dentro do alfa despertou após ouvir aquela menção. Seu lobo remexeu-se por dentro.
- Sentiu, né? - Jay percebeu a mudança. - Eu disse que era real.
- Como...? Você acha que tem relação com aquilo?
- Não sei. A gente pode perguntar quando o Jungwon voltar, mas agora precisamos fazer o que ele disse.
- Tem mais... - Severino entrou na conversa. - Ele não pediu pra dizer mas eu achei que fosse importante contar... há muitos guardas ao redor da Fossa e eu não sei como vamos lidar com isso. Se quiser eu posso mostrar a localização.
- Sabemos onde ele está. - Jay revelou. - E quanto a esses guardas, daremos um jeito.
- Ah, certo. Era só isso mesmo. Obrigado pela atenção, agora preciso ir.
- Espere - Lian foi até a mesa do Capitão, onde recolheu de um vaso a flor citada pelo ômega, e a deu a Severino. - Por favor, entregue isso a ele.
O alfa se comprometeu a fazer o que foi pedido, e em seguida deixou o navio para cuidar de demais assuntos que o trouxe à cidade.
Quando se viram a sós, Jay não perdeu tempo e virou-se para seu alfa, quando comentou:
- Leva o navio pra enseada e faz como ele disse. Vou convocar a tripulação e explicar como será feito. Você os lidera por enquanto.
- Mas e você?
- Vou deixar o caminho livre pro Jungwon. Levarei alguns comigo.
Dito isso, o contramestre dirigiu-se ao mercado com a finalidade de abastecer o Luna para um novo curso.
Por outro lado, assim que retornou a Fossa, Severino cuidou de seus serviços, para não levantar suspeitas e no dia seguinte procurou a residência dos ômegas, a fim de atualizar Jungwon que sua parte foi cumprida e entregar a ele a flor enviada por Lian.
- Eles só acreditaram depois que falei aquelas coisas.
- O importante é que funcionou.
- Tem outra coisa também - Severino lembrou. - Quando voltei, tinham dois alfas guardando as portas lá fora.
- Eu dou conta. - Jungwon garantiu. Severino assentiu, depois ficou quieto, encarando o ômega de modo desconfiado. - Há mais alguma coisa que eu deva saber?
- Nada não. É só que... - Ele guardou a mecha de cabelo atrás da orelha. - Seus alfas são tão grandes e fortes, né?
Jungwon ergueu as sobrancelhas e piscou chocado.
- Tá querendo morrer, Severino?!
- Não! Foi só um comentário com o máximo de respeito possível.
- Outro comentário como esse e tu vai perder a língua.
O alfa assentiu algumas vezes, com as mãos juntas, jurando que não faria novamente. Quando deixou a moradia, demais ômegas se juntaram a Jungwon para saber das novidades, além de se programarem para a data do motim.
- Você realmente pretende deixar os alfas levarem a maior parte daquela fortuna? - Morgana perguntou.
- Não! - Jungwon respondeu como se aquela pergunta fosse bastante estúpida. - Nem uma única moeda.
- Mas eles acham que vão. - Alice arquejou.
- Eu sei. Agora vamos ao que interessa - Tranquilamente, Jungwon mudou o assunto para algo mais importante, o plano de fuga.
Algum tempo depois, o ômega seguiu até cada moradia dos betas e combinou a participação de cada um. Ficaram satisfeitos em saber que vão receber uma parte justa no valor. Assim como os alfas, que acreditavam que estavam saindo por cima com o falso acordo.
Nos dias que antecederam o combate do sábado, os residentes evitaram demonstrar ansiedade enquanto transitavam pelo salão. Em seus corações havia um frenesi ardente, como nunca experimentaram antes. Ir embora daquele lugar nunca foi uma possibilidade, mas agora estava se tornando real.
A semente que Jungwon tinha plantado cresceu, revelando o propósito de fuga que foi oculto com o passar dos anos. Tudo era questão de tempo. Não havia mais nada entre os residentes e a liberdade, apenas os muros daquele lugar que logo ficariam para trás.
O sábado era o único dia da semana onde os residentes podiam andar armados pelo salão, para se preparar para o combate. Logo, na manhã do dia em questão, todos estavam munidos com suas armas, mas que seriam usadas com outro propósito.
Os únicos guardas que trabalhavam na Fossa estavam organizando os residentes para o espetáculo. Severino deixou todas as saídas destrancadas, e também removeu a munição de todas as armas de fogo que conseguiu. Se os guardas reagissem, não teriam pólvora suficiente para os disparos.
A mesma fila de sempre foi construída diante da passagem para a arena, mas assim que as portas foram abertas, os residentes não deram um passo em sua direção, ao invés, pularam contra os guardas e iniciaram a revolta. Os capangas de Toralápis tentaram retomar o controle da situação, mas eram muitos e não conseguiram conter.
Todas as cadeiras ao redor da arena estavam ocupadas, com os nobres ansiosos para assistir ao banho de sangue. Mas o sino foi tocado e os sobreviventes não apareceram, eles começaram a cochichar uns com os outros, perguntando-se o que estava acontecendo.
Os dois guardas que abriram a escotilha seguiram pelo túnel para verificar, mas eles não voltaram para dar uma resposta ao público. Ao contrário disso, os nobres viram os residentes surgindo, e a medida que cada um ocupava seu lugar na arena, eles batiam palmas satisfeitos, imaginando que logo os combates teriam início.
- Bom dia a todos - Jungwon os cumprimentou com um grande sorriso simpático. - Houve uma mudança na programação.
- Como assim? - Silva Saulo levantou-se. - Ninguém me avisou nada.
- Todos descendo pra arena - o ômega ordenou, ignorando o protesto do apresentador. O público permaneceu sentado, ninguém teve coragem de descer até o local onde presenciaram tantos assassinatos violentos. Mas Jungwon sabia como incentivá-los: - Se é assim que preferem, eu vou aí buscar vocês...
Todos se levantaram instantaneamente, descendo com pressa quase a ponto de derrubar uns aos outros. Assim que os nobres e os guardas foram todos reunidos na arena, alguns solicitaram tirar a vida de todos eles, mas Jungwon não permitiu.
- Eles precisam continuar mantendo a economia com seus navios e mercadorias, para que eu possa saqueá-los no futuro - explicou simplesmente. - Enfim, o ciclo da vida.
- Eu não estou nada de acordo com isso. - Moacir revelou.
- Problema seu. - Jungwon seguiu em direção a passagem que o público utilizava. - Tranquem todas as saídas.
- É, vamos deixar esse otário aí - Elizama referiu-se a Moacir. - Vamos logo pegar a fortuna e cair fora.
Ninguém estava de acordo com o que o alfa queria. Havia uma quantidade de moedas de ouro esperando por eles. A vida esperava por eles. Não queriam desperdiçar nem mais um minuto naquele lugar abominável.
Assim sendo, após todas as saídas serem trancadas, os residentes deixaram a Fossa pela primeira vez desde que foram trazidos para aquele buraco. Durante muitos anos, os únicos cenários que eles contemplavam eram as paredes úmidas e frias do subterrâneo onde residiam, e a arena com o enorme público assistindo sua luta pela sobrevivência.
- Tinha esquecido como as árvores são bonitas - Carlos comentou.
- E esse céu, cara... - Morgana contemplou o firmamento enquanto caminhavam. - É mais azul aqui do que lá na arena.
- Esperem só até ver o céu que emerge sobre o oceano - Jungwon sorriu com a empolgação deles. - É mais lindo do que qualquer outro.
Os ômegas, Severino e alguns betas trocaram olhares ansiosos, animados para uma nova perspectiva. Diferente dos alfas, que só esperavam uma oportunidade para roubar os baús e até quem sabe o navio que aguardava ancorado na enseada.
Continua...
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