[65] Longe de Casa - Parte 2
Jungkook estava parado diante de sua mesa, na cabine, enquanto esperava Jimin terminar de ler o recado deixado por Jungwon. O Ômega suspirou fechando os olhos, apoiando a cabeça no encosto da cadeira.
— Eu não devia ter aceito aquele Alfa na tripulação. Está levando o Jungwon para o mal caminho e ainda arrastou o Jay junto.
— Não… — Jimin passou a mão no rosto e abriu os olhos, encarando o pergaminho deixado sobre a mesa. — Eles tem idade para saber o que estão fazendo, não coloque toda a culpa sobre o pobre rapaz.
— Isso nunca aconteceu antes até ele se juntar a nós.
— Não? Estava até se tornando comum.
— É claro que você defenderia — o Alfa riu irônico. — Tal pai, tal filho.
— O que está querendo dizer com isso? — Jimin apoiou as mãos na mesa quando se levantou.
— Ele é igualzinho a você, sempre largando a segurança pra se meter em confusão.
O Ômega poderia contestar, mas sabia que ele tinha sua razão. Sua vida inteira Jimin colocou-se em perigo, muitas vezes tentando ajudar outras pessoas.
— Ele é corajoso.
— Não muda o fato de que agir sem a autorização dos capitães é contra as regras.
Jimin olhou para ele tentando disfarçar o riso. Ele mesmo viveu quebrando todas as regras possíveis a cada dia, desde que pisou na embarcação.
— Ainda não sabemos o que aconteceu.
— Está bem aí o que aconteceu — O Alfa apontou para o recado em cima da mesa. — Mas como eles já possuem idade para saber o que estão fazendo, já podem ser responsabilizados por isso e lidar com as consequências.
— Só não esqueça de que, como membro desta tripulação, o Jungwon é de minha responsabilidade. — Jungkook o olhou perplexo. Jimin explicou: — Quero saber seus motivos antes de qualquer coisa. Ele não faria isso se não tivesse uma razão muito forte por trás.
— Independentemente do que os levou a fazer isso, da minha parte, os Alfas serão punidos. Não importa os motivos.
— Você não está levando isso para o lado pessoal, certo?
— É claro que não… eu sou profissional. — Jungkook pegou o bilhete e dirigiu-se à porta. — Jackson saberá rastreá-los.
O Capitão esperou seu Ômega para finalmente deixarem a cabine juntos. O Alfa especialista em rastrear coisas e encontrar pessoas analisou o conteúdo do pergaminho. Jungwon deixou claro que não saberia quando iria voltar, obviamente ele já não estava em Nabuco.
Jackson devolveu o recado a Jungkook e rumou em direção à Ilha. Sabia exatamente onde procurar as pistas para encontrá-los. O Alfa era tão bom em seu ofício, que poderia fazê-lo de olhos fechados.
— Capitão, ouvi dos mercadores que há um navio com açúcar vindo de Cabuga. — Namjoon informou. — Parece que estão indo entregar a carga para os reinos do Norte.
— Deixe o Black Swan pronto para zarpar, decidirei a rota assim que Jackson retornar.
— E pra onde ele foi?
— Resolver isso aqui — respondeu irritado, entregando o recado ao contramestre.
— Parece que voltei no tempo e estou vendo o Capitão Jimin desaparecendo atrás de confusão — Namjoon riu, quando entregou o pergaminho ao lúpus, mudou suas expressões risonhas devido ao semblante severo do líder. Ele limpou a garganta, voltando para os bucaneiros: — Deixem de preguiça e preparem o paiol…
Claro que cedo ou tarde todos iriam perceber, mas Jimin priorizou contar o que havia acontecido apenas para Scott e Sungjae. O Ômega estava fazendo seu trabalho na enfermaria, quando ele o encontrou.
— Você não sabe de nada, Taetae? — Scott perguntou ao filho mais novo. — Mesmo?
— Não, pai. Quando acordei hoje de manhã eles não estavam no quarto.
— Não gosto da ideia de que estão sozinhos sabe-se lá por onde — Sungjae lamentou. — Será que o Kraken os acompanhou, pelo menos?
— Tenho certeza que sim — Jimin o tranquilizou. — A criatura segue o Jungwon para todos os lados.
Aquilo não isentava-os de preocupação, porém, aliviava um pouco a aflição que é não saber por onde seus filhos estavam. Principalmente no momento delicado entre conflitos e incertezas.
Ninguém desaparecia sem deixar rastros, pelo menos não para Jackson. O Alfa não precisou ir tão longe para encontrar as informações que buscava. Soube em uma pousada que Alfas com as mesmas características físicas que Lian e Jay, alugaram um quarto onde posteriormente retornaram com um Ômega e mudaram suas roupas para trajes mais sofisticados.
Roupas elegantes significam que não viajaram escondidos, mas como nobres passageiros. A partir disso, o Alfa buscou o local onde comprava-se autorizações para conseguir embarcar em navios mercantes.
Aquilo foi tão fácil que ele retornou ao Black Swan, antes mesmo que o navio estivesse pronto para partir.
— China. — Jackson informou. Estava na cabine com os capitães e Namjoon.
— Por que diabos?!
— Se o Alfa possui algum parente lá, provavelmente foram salvar. Família de traidores sofre nas mãos do governo.
— Levantem a âncora — Jimin decidiu. — Vamos ao Norte emboscar o navio que vem de Cabuga, e ficaremos próximos a costa chinesa.
Namjoon assentiu e deixou a cabine junto com Jackson.
Jungkook estava surpreendentemente quieto, mexendo nos anéis em seus dedos. Aparentava estar calmo, mas seria capaz de matar o primeiro que dirigir a palavra a ele. Exceto Jimin, é claro.
— No que está pensando? — O Ômega se aproximou por trás, abraçando e encostando a bochecha no braço dele, para também ver o mesmo girando o anel no dedo.
— No castigo que os dois receberão. — Disse, em relação aos Alfas.
— Por que você é tão rigoroso? — Jimin foi beijando carinhosamente o pescoço do Alfa, enquanto conversava com o mesmo: — Não pode ser menos severo?
— Não. — Jungkook suspirou, fingindo não dar importância. — Sei o que está tentando fazer. Não vai funcionar dessa vez.
— Não mesmo? — Continuou beijando, a mão acariciando as costas. — Nem um pouquinho?
Não havia voz de Alfa que fosse mais eficaz que a manipulação de um Ômega, quando este sabia o poder que tinha. Jungkook nem mesmo percebeu quando fechou os olhos, distraído com o afago recebido somado ao intenso e doce aroma de jasmim.
— Você é um perigo, coração… — Jungkook abriu os olhos, completamente entregue, virando-se de frente para ele. — Posso levar em consideração um castigo leve. Pensarei a respeito.
Jimin sorriu para ele, satisfeito. É claro que não compactuava com quem quebrava as regras, mas ele possuía grande confiança em seu filho. Se Jungwon realmente fez isso para salvar alguém inocente, com efeito, o Capitão Jimin sentia-se muito orgulhoso, pois era exatamente o que ele faria.
🏴☠️
— Será que não posso fingir que estou passando mal? — Jungwon sugeriu.
— O comandante mandaria um médico — Jay assegurou.
O Ômega estava sentado na cama, desfrutando dos poucos minutos em que poderia ficar à vontade. Lian também estava no cômodo, ajudando o Alfa mais novo com os babados de renda no punho da camisa que vestia por baixo do casaco abotoado.
— Como meu pai aguentou tanto tempo vivendo assim, sendo obrigado a estar em lugares que não queria?
A verdade era que Jimin e Jisung passaram por diversas situações terríveis, e se livraram de coisas ainda piores. O casamento arranjado e a obrigação de gerar filhos a Alfas que nunca desejaram era um grande exemplo disso. O que Jungwon estava experimentando não chegava nem perto da violência que os Ômegas sofriam e ainda sofrem.
— Deixa eu ver — Lian deu um passo atrás e analisou a roupa do Alfa mais novo. — Impecável.
— Sim, somos excelentes, três múmias impecáveis — o Ômega disse, fazendo os outros dois rirem.
— Vamos terminar logo com isso. — Lian ofereceu o braço para que o Ômega segurasse.
Do mesmo jeito, Jay ficou do outro lado, posicionando o braço de modo que Jungwon tivesse dois acompanhantes. Ele não sabia exatamente como proceder, por isso tentava fazer o mesmo que Lian.
Os três subiram juntos, caminhando de forma retilínea e sem olhar para o chão. O jantar foi oferecido na cabine do comandante, onde eles descobriram que não foram os únicos convidados. Além do trio e obviamente o comandante, também estavam a Alfa mais rica do navio, um Beta e seus respectivos Ômegas.
Os Alfas sentaram à esquerda, os Ômegas à direita e comandante ocupou a cadeira na ponta da mesa. Ele agradeceu a presença dos convidados e ordenou que o jantar fosse servido.
Os dois Ômegas sentados ao lado de Jungwon abriram a boca apenas para comer. Sempre que o lúpus tentava incluí-los na conversa, eles simulavam sorrisos e respondiam superficialmente. Como se fosse uma grande novidade para eles, terem voz em uma conversa.
O jantar foi um verdadeiro tédio, com a Alfa o tempo todo exibindo os bens que possuía e o quanto estava expandindo seus negócios. Jay quase cochilou com a conversa, Lian se virou para responder todas as perguntas sobre como gerenciava a mina de carvão de sua família. As aulas cansativas de matemática que teve durante a infância nunca foram tão necessárias. Além de que só precisava soar arrogante para convencê-los, e isso ele aprendeu muito bem com o pai.
Jungwon tentou se distrair com as facas em cima da mesa, tomando nota de todos os seus detalhes. Eram finas e de prata, caberiam perfeitamente escondidas no cós de sua calça, ninguém iria notar. Estava tentado a roubá-las pois sentia-se completamente exposto sem as adagas, embora soubesse lutar muito bem sem elas.
— Mais vinho — o comandante ordenou a Beta que estava servindo.
A moça prontamente fez como ele disse e encheu seu cálice. Além do comandante havia mais sete pessoas ocupando lugares à mesa, mas a Beta preocupou-se em manter apenas um deles satisfeito, e este não era o seu superior.
— O senhor deseja mais um pouco? — Curvou-se sorridente para o lado de Lian.
— Sim, por favor.
— Com licença — ela manteve a atenção nele enquanto adicionava a bebida no cálice. — Posso servi-lo com algo mais?
O Alfa negou educadamente. Do outro lado da mesa, Jungwon observava toda a cena sem perder um único detalhe. Era evidente a todos que estavam alí, o interesse da Beta no jovem Chen Yuan, ela sequer disfarçava
— Eu gostaria, por favor — o lúpus sinalizou. — A minha garganta está seca.
A Beta assentiu dando a volta na mesa para atender Jungwon. Assim que ela curvou-se para servir a bebida, ele se inclinou um pouco para o lado e sussurrou próximo do ouvido dela:
— Tire os olhos do meu Alfa, ou eu mesmo os arrancarei da sua cara. — Ela reparou que Jungwon segurava a faca sobre a mesa e quase derrubou a garrafa. Ele voltou para o lugar e sorriu, sinalizando que parasse. — Já está ótimo, obrigado.
Durante o tempo em que permaneceu na cabine, a Beta não arriscou olhar na direção do Alfa uma única vez.
— Você é um rapaz muito afortunado — o comandante de repente falou com Jay. — Não são todas as famílias que possuem esse mesmo tipo de convívio com seus empregados.
— Eu mesmo não permito — a Alfa comentou. — Você dá as mãos e eles querem os braços.
— Com licença — Jungwon se levantou, nauseado com a conversa. Se continuasse na cabine poderia não se controlar. — Preciso de um pouco de ar.
O comandante ficou sem participar da conversa por algum tempo, e quando sua presença já não era tão observada, pediu licença e também se retirou.
Lian estava preso nas perguntas sinuosas dos outros convidados, mas o olhar que trocou com Jay foi suficiente para entender que pensou o mesmo que ele, quando o mais novo deixou a cabine logo depois.
Jungwon estava próximo ao fundo da embarcação, transmitindo toda sua insatisfação para o kraken, quando foi abordado pelo comandante:
— Podemos conversar, Minjee?
O Ômega estava de costas, e rolou os olhos antes de virar-se de frente para ele.
— Não acha inapropriado ter uma conversa sozinho com um Ômega comprometido, na traseira escura de um galeão?
— Não mais do que correr pelado pelo navio — o Alfa riu. — Não se apegue a essas coisas, eu sou o comandante. Ninguém aqui está acima das minhas vontades.
— Meu Alfa está me esperando.
Tentou passar por ele, mas o Alfa deu um passo ao lado, barrando seu caminho. Jungwon o encarou sentindo imensa vontade de cortar sua garganta vagarosamente, mas precisava se conter. Por Lian.
— Algum problema por aqui? — O Comandante saiu da frente quando Jay se aproximou.
— Estamos em uma conversa particular — o Alfa mais velho respondeu. — Por que você não volta pra cabine?
— Com licença, comandante. Eu estou falando com o Minjee.
— Oh, entendo… — Yamashita engoliu um rosnado. — Neste caso, aproveite e peça para que ele devolva as facas que acabou de roubar.
O coração do Ômega quase saltou pela garganta. O comandante não tirou os olhos dele durante todo o jantar, ele não percebeu porque estava com ciúme da Beta se jogando para Lian.
— O quê? — Jungwon franziu as sobrancelhas.
— Por favor, não me faça revistá-lo.
— Não vai tocar nele. — Jay avisou. — Nem você, nem qualquer outro aqui.
— Você sabe com quem está falando, meu jovem?
— Pouco me importa quem você é. Toque nele e vai descobrir quem eu sou.
— Eu conheço pessoas com grande influência na China — Yamashita sorriu. — Você nunca mais vai pisar em um navio.
Jungwon gostaria de deixar aquela conversa seguir adiante, até o mais novo realmente fazer o que estava prometendo. O comandante não teria a menor chance, e com ajuda do Kraken poderiam dominar o galeão, mas quando chegassem na China, quem pagaria a conta seria Yue.
— Tá tudo bem… — Jungwon tocou no braço do mais novo, a ameaça do comandante não valia nada, mas não podiam deixar ele soar um alarme. — Eu realmente…
— Estou esperando. — Yamashita sorriu todo prepotente.
— Eu só estava entediado — o Ômega retirou as facas que estavam escondidas no cós da calça. — Me desculpe, isso não vai se repetir.
O comandante recebeu os objetos e ponderou por alguns segundos, antes de decidir:
— Eu irei relevar. Mas faço isso por você, Minjee. Não entrarei em contato com meus conhecidos.
— Obrigado.
— Por que você me parece tão familiar…? — Jungwon desviou o olhar, abaixando a cabeça. Claro que ele era familiar, era bastante parecido com o Capitão Jeon, que por sua vez, era o terror daqueles que comandavam navios mercantes. — Seu Alfa deve estar se perguntando onde você está. Melhor voltarmos.
Jungwon assentiu, esperando o Alfa se retirar para voltar a erguer a cabeça novamente, dessa vez, com o olhar cheio de fúria e tão escuro quanto aquela noite.
— Eu quero saber quais são as rotas dele. — Ditou para o mais novo.
Jay compreendeu sua intenção, e sabia exatamente o que fazer para conseguir sem levantar qualquer suspeita. Instantes após o comandante retornar à cabine, os dois também chegaram logo depois.
Lian buscou em Jungwon algum sinal do que poderia ter acontecido, quando o próprio Jay cochichou em seu ouvido rapidamente o que o Ômega queria. Lian deixou de lado sua sua curiosidade para fazer o que ele pediu:
— Comandante, após o fim desta viagem, ainda possui mais contratos a cumprir?
— Graças a Deus, sim! — O Alfa sorriu com bom humor. — Tenho muitos negócios por toda a costa asiática. Seda no Japão, porcelana para levar até Nabuco…
Na parte em que citou Nabuco, Jungwon conteve um sorriso quando olhou para Jay. O mais novo podia ver em seus olhos, Yamashita Sota iria lamentar muito.
— Quero agradecer a cada Alfa e Beta por terem aceito o meu humilde convite — o comandante se levantou —, e aos Ômegas por terem nos agraciado com sua presença magnífica.
Após uma série de bajulações artificiais que foram dirigidas entre eles, Yamashita acompanhou todos até a saída. No final, não se conteve e soltou uma indireta dissimulada:
— Descanse, Minjee. Sua noite foi agitada demais para alguém como você.
Em "alguém como você”, o comandante quis diminuí-lo em sua classe. Jungwon apenas o observou enquanto ele fechava a porta da cabine com um sorriso vitorioso.
Em seu silêncio, o Ômega refletia as consequências de jogar tudo pro alto e matar o Alfa ali mesmo. O que o fez mudar de ideia foi a voz que o chamou no momento seguinte:
— Jungwon? — Lian mirava-o preocupado, pois o mesmo encarava a porta com bastante raiva. — Você está bem?
O Ômega olhou para ele vagarosamente, assentiu e logo em seguida desceu as escadas rumo ao seu camarote. Jay e Lian seguiram-no posteriormente.
No quarto, Jungwon foi até sua mala apenas para remover uma das adagas. Nenhum dos Alfas tentou impedir quando o menor subiu na cama e passou a golpear um dos travesseiros. Eles somente trocaram olhares e continuaram assistindo até que o Ômega, cansado, parou com a investida.
Diversas penas de ganso estavam espalhadas sobre o colchão. Jungwon fechou os olhos e inspirou profundamente, agora mais calmo.
— Eu vou tomar banho. — Ele simplesmente se levantou da cama e seguiu para o lavabo.
Os outros dois permaneceram parados até que o Ômega sumiu de suas vistas no cômodo seguinte. Jay sentou na cama e passou a remover o casaco, enquanto Lian recolhia as penas.
— O que aconteceu? — Perguntou para o mais novo.
— O comandante tava tentando conversar com ele, mas o Jun não estava gostando, então eu cheguei perto… — contou tudo o que havia acontecido até voltarem para a cabine. — Eu quase perdi o controle, me desculpa. Sei que estamos aqui por um motivo.
— Tudo bem, ele é um idiota. Provavelmente eu também teria feito o mesmo.
Após juntar todas as penas dentro de uma fronha vazia, ele jogou a que estava cheia de rasgos no lixo, jogou o novo travesseiro na cama e se sentou para continuar removendo as botas. Jay calculou a distância entre eles e franziu as sobrancelhas quando brincou:
— Não vai sentar mais perto?
— Como assim? — Lian continuou o que estava fazendo.
— Você sempre invade meu espaço pessoal, mas agora está sentado longe.
O mais velho levantou a cabeça apenas para notar o espaço entre eles, depois voltou a retirar os calçados.
— Só há um metro de distância entre nós. Nem é muita coisa.
— Não pra você, que tá sempre tão perto…
Lian removeu uma bota e depois a outra, antes de encará-lo nos olhos, com um semblante risonho.
— Você quer que eu chegue mais perto de você, é isso?
— Não... — Desviou o olhar para também se livrar dos calçados. — Foi apenas uma observação.
Lian passou a observar o Alfa conforme removia seu traje, permanecendo apenas com a roupa íntima. Talvez fosse apenas impressão sua, mas sentiu que Jay parecia um pouco decepcionado. Como prometeu a Jungwon que não forçaria nada, guardou suas observações para si mesmo.
Quando o Ômega deixou o banheiro e viu que o espaço que restou para ele ficava no centro da cama, entre os dois, olhou para o sofá analisando se não seria uma boa ideia dormir nele…
— Vai ficar aí parado? — Lian perguntou, batendo no colchão. — Tem lugar aqui pra você.
— Eu sei… — descartou a ideia do sofá e se aproximou da cama. Ele esperou Lian sair do caminho, mas o Alfa continuou deitado.
Sendo assim, Jungwon tomou cuidado quando passou por cima dele ao subir no colchão. Olhou para ele enquanto se deslocava, Lian manteve um sorriso que poderia significar muitas coisas das quais o Ômega evitou pensar a respeito.
Estava deitado entre os dois, encarando o teto. Lian estava na beira da cama, na mesma posição, enquanto Jay estava no cantinho virado para o Ômega.
Jungwon olhou para seu lado esquerdo, onde Lian estava. O Alfa também olhou para ele e sorriu. O olhar dele não dizia exatamente o que queria, mas de certa forma o mais novo podia sentir. Buscou sua calmaria cortando o contato visual quando mudou sua posição, dando as costas para Lian e ficando de frente para Jay.
— Como você acha que está a tripulação?
— Meu pai deve tá tentando impedir que o outro destrua a cabine — Jungwon riu. — Consegue diferenciar quem é quem?
— Só de pensar nisso me dá arrepios. Quando a gente voltar, vai ter uma prancha de cada lado do Black Swan, uma pra mim e adivinha pra quem será a outra, Lian?
— Pro Jungwon?
— O jeito que você ignora a realidade é um absurdo. — Jay riu.
— Eu não tenho medo dele.
— Acho que não estamos falando da mesma pessoa.
— Não, veja bem, eu o respeito muito. Na verdade, eu temo o quão poderoso ele é. Só não tenho medo. Entendeu?
— Não.
Lian riu pela sinceridade do Alfa. Ele apoiou as mãos na nuca e refletiu encarando o teto, enquanto os mais novos continuaram conversando:
— Imaginei isso todos os dias — Jay revelou. — Dormir com você, lá no Black Swan.
— Eu também — Jungwon segurou firme na mão dele. — Estou feliz que esteja aqui.
— Já pensou se o Capitão Jeon aparece debaixo da cama agora?
— Você quer estar com o meu pai?
— Não!
— Então para de pensar nele, Jay! Estamos aqui e eu só quero aproveitar o momen-... — foi interrompido quando o mais novo encostou os lábios nos seus. — Bem melhor.
— Posso fazer isso a noite toda se você quiser…
— Hmmm, a noite toda… — Jungwon sorriu encarando os lábios dele antes de beijá-lo algumas vezes. — Eu tive demais do comandante por hoje, preciso descansar. Vocês dois também.
— Você tem razão, e amanhã o dia vai ser longo…
— Uma semana nunca demorou tanto. Que lástima.
Jay acariciou o rosto dele e o beijou nos lábios uma última vez. Ficaram se encarando em silêncio, aproveitando o momento, até as pálpebras do Alfa pesarem e ele ser o primeiro a adormecer.
Parece algo muito simples mas, aos olhos do Ômega, foi como estar em um sonho muito consciente. Era real e palpável, ele podia senti-lo e o fez, quando tocou suavemente em seu rosto enquanto dormia sereno.
Não era como se os dois Alfas fossem duas metades, que se completavam no coração de Jungwon. Ambos eram completos. Cada um com a sua particularidade. Duas partes inteiras que se encaixavam no que se pode chamar de amor trilateral.
Jungwon olhou para trás e encontrou Lian ainda acordado. O Alfa notou através da visão periférica que ele estava lhe encarando, e fez o mesmo, virando o rosto na direção dele. O Ômega sorriu para ele como se estivesse desejando uma boa noite de sono, e virou-se novamente.
Fechou os olhos tentando dormir, mas algo ainda o incomodava. Ele abriu os olhos e virou para trás uma segunda vez, Lian ainda estava observando-o. Jungwon estava tão perto do mais novo que podia encostar sua testa na dele, com isso, restou um espaço significativo entre eles e Lian. Era isso que o deixou incomodado, aquele espaço que não deveria existir.
O Alfa sentia a mesma perturbação, mas não tinha certeza se deveria se aproximar. A última conversa séria que teve com Jungwon o fez entender e levar em conta os sentimentos do Alfa mais novo. Aquilo já não se tratava de sua diversão, mas algo puro que ele pretendia respeitar.
Disposto a encurtar aquela distância, o Ômega virou-se definitivamente para Jay, mas abriu a mão livre como um convite, indicando que ainda havia alguém para se juntar ali. O sorriso cresceu quando sentiu o Alfa se movendo na cama logo atrás, até sentir o peito dele tocando em suas costas, a mão encaixando na sua até entrelaçar os dedos e a respiração quente batendo suavemente atrás do pescoço.
Jungwon fechou os olhos, sentindo-se conectado com ambos. Se havia um jeito melhor para dormir ele desconhecia.
🏴☠️
Passaram-se três dias desde que Jungwon, Lian e Jay embarcaram no galeão. Suportar a inconveniência do comandante era um desafio diário, que eles conseguiam superar quando mantinham em mente a prioridade de estarem fazendo aquilo.
O Ômega nunca desejou tanto uma tempestade na vida. Não estava tentando boicotar a si mesmo, poderia muito bem sobreviver a um temporal, ele só queria manter o comandante ocupado por algumas horas, já que o mesmo demonstrava muitas vezes que parecia não ter o que fazer.
Seu pedido foi atendido de uma maneira diferente. Não foi uma tempestade que os alcançou no meio da viagem, mas um navio pirata capitaneado por ninguém menos que o Capitão Bartholomew.
Assim que sua tripulação atacou e invadiu o navio mercante, o pânico se abateu sobre os tripulantes. Jungwon se armou com um pedaço de madeira, mas se desfez da arma quando se lembrou que não era um pirata ali, e tentou esconder seu rosto para não ser reconhecido.
— Nós podemos negociar, capitão — o comandante bancou o corajoso.
— Vocês ouviram alguma coisa? — Bartholomew fingiu não tê-lo visto. — Parece que os vermes estão rastejando alto demais por aqui.
A tripulação dele riu, fazendo o comandante recolher sua insignificância. Seus Alfas e Betas se renderam antes mesmo de tentar lutar. Não havia sentido em arriscar suas vidas por um líder, que portava uma espada apenas como um adorno para se exibir.
— Estão indo para a China — o contramestre entregou ao líder pirata os registros do galeão.
— Estavam… — o capitão corrigiu dando uma gargalhada. Bartholomew passou os olhos por todos os passageiros rendidos, em busca de algum que pudesse lhe garantir algum divertimento, enquanto seus marujos recolhiam as cargas. Os olhos pararam em Jungwon e na Ômega que estava encolhida ao seu lado. — Mudem o curso para Folsom, há uns aqui que posso negociar por lá…
A Ômega quase perdeu a consciência, quando o pavor de ser entregue para um dono de bordel anuviou a sua mente. Jungwon, por outro lado, engoliu um rosnado porque o capitão estava querendo atrapalhar seus planos.
— A gente precisa fazer alguma coisa-... — sussurrou para Lian e Jay momentos antes de ser puxado pelos cabelos.
— Tire suas patas imundas dele! — Lian se levantou, mas Jay o puxou de volta, fazendo-o sentar no chão junto aos rendidos novamente.
— Acalme-se, rapaz — o Capitão riu. — Não vou danificar a minha mercadoria. Ele vai gostar do que vamos fazer ali dentro…
Em vista disso, Bartholomew rumou para a cabine do comandante levando o Ômega consigo. Sua diversão foi interrompida assim que trancou-se com ele dentro do cômodo. Era tudo o que Jungwon precisava, sem platéia, sem testemunhas.
O Alfa foi pego de surpresa no momento em que ele o golpeou nas costelas. Não teve tempo para se recuperar, sendo atingido no rosto duas vezes, da segunda teve o nariz quebrado. Ele grunhiu levando as mãos ao rosto, mas caiu de joelhos quando recebeu um chute no meio das pernas.
— Como se atreve a dificultar os meus planos?! — Jungwon o chutou no rosto, fazendo-o cair para o lado. — Levanta!
Bartholomew ergueu a cabeça quando também teve o cabelo puxado, onde só então reparou no rosto do Ômega. Antes disso, estava mais preocupado em observar seu corpo.
— V-você é o filho deles… — gaguejou assim que o reconheceu.
— É. Sou eu… e você não sabe onde se meteu, cretino! — Bartholomew foi obrigado a se levantar quando foi puxado pelo Ômega. Jungwon o levou até a janela lateral, onde bateu com força o rosto do Alfa contra o vidro. — Abre os olhos!
O Alfa obedeceu. Daquela janela era possível enxergar seu próprio navio ao lado do galeão, e alguns tentáculos subindo pelo casco. O corpo de Bartholomew estremeceu inteiramente.
— Não faça isso… — Começou a implorar. — Deixarei o galeão intacto. Ele será apenas seu! Não destrua meu navio.
— Quer sair desse ataque incólume, capitão? — O Ômega murmurou. — Então faça exatamente o que eu mandar...
Bartholomew assentiu mais vezes do que poderia contar. Ele ouviu atentamente cada palavra dita por Jungwon, ficando muito satisfeito por ter recebido a oportunidade de saquear todas as cargas, com a condição de não levar nenhum Ômega e muito menos revelar sua verdadeira identidade.
Quando a porta da cabine foi aberta, Bartholomew surgiu segurando o braço do Ômega, com seu cabelo jogado para frente, deixando-o com uma aparência tenebrosa. Porém, aquilo era para esconder a surra que levou no interior da cabine.
— Mudei de ideia! — O Capitão rugiu para seus bucaneiros. — Levem todas as cargas e preparem o itinerário para Nabuco. Este aqui possui algumas riquezas que agora me pertencem!
Bartholomew desceu as escadas arrastando Jungwon consigo, abriu a porta do quarto indicado pelo menor e entrou com o mesmo. Assim que se viram sozinhos outra vez, o Ômega puxou seu braço.
— Se ficar alguma marca no meu braço eu te caço no inferno.
— Você disse que eu devia ser convincente. — O Alfa deu de ombros, mas estava claramente se aproveitando da situação.
Jungwon lhe deu ignorou, para buscar entre suas anotações algumas que fossem descartáveis. Encontrou folhas contendo rabiscos de observações que faziam dos navios inimigos, e entregou ao capitão.
— O que eu tenho que fazer com isso? — Bartholomew franziu o cenho.
— Eu preciso desenhar? — O Alfa sorriu nervoso, Jungwon revirou os olhos. — Diga aos seus Alfas e Betas que são documentos que permitem recolher certa quantia de moedas em Nabuco.
— Eu realmente posso fazer isso?! — Os olhos do capitão brilharam, mas ele murchou após o olhar duro do Ômega. — Não está mais aqui quem perguntou…
Após isso, os dois subiram novamente, onde o capitão jogou o Ômega no chão com bastante exagero.
— Ai! Filho da… — Jungwon não terminou porque a Ômega assustada estava assistindo a cena.
Ao invés, engatinhou para perto de Lian e se encolheu quando este lhe abraçou.
— Ele te fez alguma coisa? — Perguntou bastante preocupado. No entanto, o Ômega não parecia estar assustado. — Você não está com medo...
— Segue o roteiro, Lian… — Jungwon sussurrou.
— Eu te disse que não precisava ficar preocupado — Jay olhou para ele, sorrindo com tranquilidade.
No momento em que todos os bens foram levados para o navio pirata, o Capitão Bartholomew fez como havia combinado com o Ômega, deixando o galeão com todos os tripulantes e passageiros sem qualquer tipo de dano físico.
— O que aconteceu lá dentro? — O Alfa mais novo perguntou, assim que os três se encontraram sozinhos na popa do galeão.
— Eu o ameacei com o Krazinho. — Disse simples. — Então ele aceitou cooperar.
— Esperto.
— Não foi minha intenção te subestimar… — Lian revelou, sentindo-se mal por ter se preocupado.
— Não precisa se explicar — Jungwon sorriu para ele. — Eu entendo. Está tudo bem.
— Algum de vocês já pensaram no que vamos fazer assim que chegarmos em nosso destino? — Jay perguntou, observando o horizonte se tornando mais distante à medida que avançavam em direção à China.
— Eu posso ser a distração — Lian se ofereceu. — Ai vocês salvam a minha mãe e-...
— Isso sequer é uma opção. Ninguém será deixado para trás — Jungwon o cortou. — Vamos estudar o ambiente e criar um plano racional e estratégico, para que possamos deixar a China sem o perigo de sermos perseguidos pela Marinha.
— Isso não vai ser nada fácil… — Jay refletiu.
— Sem falar que vamos estar no território deles — Lian se referiu a Marinha. — Sem ajuda do Kraken.
— Não é algo impossível. Nós vamos conseguir — Jungwon sorriu para eles. — É para isso que estamos aqui.
Foi para aquela convicção que os Alfas depositaram toda sua confiança. Pelas palavras do Ômega, eles podiam sentir, de certo modo, que teriam êxito em seu objetivo.
Continua…
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