[64] Longe de Casa - Parte 1
Após o ataque à Ilha de Nabuco, a Marinha chinesa junto a coreana, buscavam o apoio do Japão para finalmente começarem a oferecer o perdão real a todos os piratas.
Os oficiais finalmente tiveram alguns dias de folga, mas não o Almirante. O líder supremo da Marinha era sempre cheio de atribuições, ainda assim, conseguia tempo para visitar Yue, com quem se tornou bastante íntimo durante os últimos anos.
A Beta não revelou a ele, mas já sabia que seu filho iria largar a Marinha para se juntar aos piratas. Fingiu surpresa quanto a isso, mas a saudade e o temor pela nova vida que o filho escolheu, eram verdadeiros.
Yue estava sentada próxima a janela, com uma carta em mãos. Estava acostumada a esconder o choro quando seu falecido Alfa brigava consigo, por isso, os guardas que vigiavam a sua casa dia e noite a mando do Imperador, não perceberam a dor em suas expressões. Em resumo, na carta, Lian contou que estava muito bem e, preocupado, perguntava também como estavam as coisas com sua mãe, o Almirante e o Imperador. No final, ele a convidou para viver em Nabuco, assim, poderia vê-la com mais frequência.
Yue ficou genuinamente feliz em saber do próprio filho que ele estava bem, tinha a liberdade de contar a verdade para ele, visto que todas as cartas destinadas a casa passava primeiramente pelas mãos do Almirante, e este, entregava nas mãos da Beta sem consultar o conteúdo, mesmo se tratando de uma correspondência enviada por Lian.
Do mesmo modo, ela poderia responder sem que ninguém soubesse do conteúdo, graças ao Almirante Wo. Contudo, a Beta estava decidida a deixar que o filho seguisse com sua vida, já que estava feliz. Não seria ela a responsável por trazer preocupações ao mais novo. Por isso, em resposta, Yue contou que estava muito bem, ocultando as ameaças que havia recebido do Imperador.
Quanto ao convite para viver em Nabuco, Yue inventou uma desculpa qualquer, visto que estava proibida de deixar a China, sob pena de morte. A dor nos olhos da Beta refletia o fato de que jamais poderia ver seu filho novamente. Pelo menos, era o que ela acreditava.
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Nas três semanas seguintes, com ajuda de outros bucaneiros, todos os compartimentos do Luna estavam inteiramente livres de corais. O navio não estava nem perto de poder navegar, havia muita coisa a ser feita. Consertos que custam centenas de moedas, e que Jungwon ainda não possuía tal riqueza.
— Precisamos de madeira, certo? — Lian ponderou.
— Muita madeira — Jay adicionou.
— Por que não invadimos a madeireira e roubamos? — Lian sugeriu. — Somos piratas, certo? A gente vai lá e rouba, simples assim.
— Simples assim, ele disse — o Alfa mais novo riu. — Não somos um bando de loucos como a Marinha prega. Há regras em nosso estilo de vida. Códigos de conduta que seguimos, e que podem variar a cada tripulação. Mas não atacamos Nabuco, é nossa República.
— Quando assumiu o Black Swan, meu pai tinha a mesma idade que eu tenho hoje — Jungwon contou. — Não estava como o Luna, mas era um navio bastante acabado. Não tinham forças para atacar navios mercantes, então meu pai invadiu vilarejos.
— É o que faremos, então? — Lian estava ansioso para colocar em prática sua nova vida como pirata.
— Não. — O Ômega cortou o entusiasmo dele. — O meu pai tinha uma tripulação para fazer isso, nós somos apenas três.
— Então a gente vai continuar no Black Swan — Jay presumiu. — E a nossa parte dos saques será destinada ao conserto do Luna.
— Sim. — Jungwon confirmou. — E quando ele puder navegar novamente, o Luna pode acompanhar o Black Swan. O Luna é enorme, pode armazenar muito mais provisões e tesouros que o Black Swan. Sabem o que isso significa?
— Mais tempo no mar — Lian disse.
— Todos nós sabemos que tempo significa ouro. — O Ômega olhou para ele e sorriu. — Todo mundo vai sair ganhando, tanto a gente quanto a tripulação dos meus pais.
— Sabia que você já tinha pensado em tudo — Jay afirmou, orgulhoso.
— Desde que entrei no Luna pela primeira vez, para remover os corais, foi como se eu já soubesse do que ele é capaz. — Jungwon suspirou encarando o navio na enseada. Os três estavam sentados na torre do Forte. — Posso ver como ele é, na minha mente. Nas mãos do capitão certo, ele pode voltar a ser tão imponente quanto foi um dia.
— Sorte a nossa que já temos esse capitão. — Lian comentou, simples e objetivo.
— Vocês fazem parecer como se eu fosse tão grande…
Antes que os Alfas pudessem respondê-lo, os três olharam para trás quando ouviram Hyun correndo, subindo a escadaria de concreto. O Ômega levava consigo uma correspondência destinada a Lian. Era a resposta de sua mãe, enviada há pouco mais de uma semana.
O Alfa abriu o envelope e segurou a carta em uma altura que fosse suficiente para que os outros dois pudessem ler também. Jay sorriu a cada linha onde a Beta deixava claro que estava muito bem, já o Ômega prestou mais atenção no semblante de Lian, do que no conteúdo da carta.
— Sua mãe está bem! — O Alfa mais novo proferiu.
Contudo, Lian parecia não ter ouvido a comemoração. Ficou concentrado no papel, encarando as linhas com uma expressão tensa e preocupada. Jungwon tocou no ombro dele e o chamou:
— Lian? — Assim que o Alfa lhe deu atenção, ele perguntou: — O que essas palavras significam?
— Ela está mentindo.
O sorriso que Jay expressava murchou no mesmo instante. Estava tão empolgado pelo que tinha lido, que só agora percebeu o semblante do mais velho. Seu coração apertou. Era angustiante vê-lo com aquele olhar. Logo ele, que estava sempre com um sorriso provocador.
— A carta diz o que eu gostaria de ler — Lian explicou —, mas soa como se fosse na época em que meu pai estava vivo. As palavras que ela usou… — parou de falar, lembrando-se do comportamento da Beta em sua infância.
Durante o tempo em que vivia sob os comandos do falecido Almirante Zhang, Yue costumava se expressar utilizando palavras formais, por influência do marido. O medo a levava a fazer isso.
Após sua morte, conforme o luto passava, a Beta tornou-se mais alegre e espontânea, diferente da forma que escreveu aquela carta. Isso só poderia significar que ela estava com medo, para Lian, o motivo era bastante óbvio.
— Você acha que ela está sendo coagida? — Jungwon supôs.
— Sim, e não quer que eu saiba.
— Ela tá tentando te proteger… — Jay suspirou, triste.
Lian fechou os olhos e segurou a carta com bastante força, fazendo o papel amassar entre seus dedos. Não era preciso ser um gênio para saber que ele estava pensando em se entregar e livrar a mãe de tal perseguição.
Jungwon e o mais novo, ao invés, tinham uma ideia diferente do que poderia ser feito. Ambos trocaram olhares, como se soubessem exatamente qual era o pensamento do outro, e assentiram.
— Lian — Jay o chamou. Ele abriu os olhos e o encarou. — Sabe o que um pirata faz quando algo de precioso é tirado dele?
Lian franziu o cenho, negando com a cabeça. Em seu lugar, Jungwon respondeu:
— Ele o pega de volta.
— Se estão querendo fazer o que estou pensando… — Lian negou com a cabeça. — É loucura.
— Mais loucura do que o que você fez? — Jay se referiu à traição do Alfa à Marinha.
— Está decidido — Jungwon determinou. — Vamos resgatar a sua mãe.
— Você disse há alguns minutos que não temos força suficiente para invadir pequenos vilarejos… — Lian o lembrou. — A China está longe de ser apenas isso.
— O que nos ajuda ainda mais. — O Ômega refletiu. — Em um reino tão imenso, quem vai notar a presença de três jovens viajantes?
— Seus pais nunca vão permitir isso — Lian disse, e apontou para Jay: — Os seus também não.
— E quem disse que eles precisam saber?
“Eu já ouvi isso antes”. — O Kraken soou na mente do Ômega.
Jungwon mirou o oceano quando exigiu:
— Fique na sua, seu enxerido.
— Não fala assim com o Lian — Jay pediu.
— Eu?! — O Alfa apoiou a mão no peito, com as sobrancelhas erguidas.
— Estou falando com o Kraken — Jungwon esclareceu.
Lian estreitou os olhos para o outro Alfa, transmitindo para ele sua inocência, querendo dizer que não era um enxerido, Jay o encarou de volta expressando toda a certeza que tinha, de que sim, ele era um grande enxerido.
— Meu pai mantém algumas moedas de ouro na cabine — Jungwon revelou após a breve discussão que teve com o Kraken, através da telepatia. — Eu vou roub… pegar emprestado. Assim, podemos pagar as passagens de um navio mercante até a China.
— Digamos que eu esteja de acordo com isso… — Lian ponderou. — Vamos precisar de mais do que apenas passagens. Com essas roupas, sequer teremos permissão para embarcar.
— Ele tem razão — Jay expressou, olhando para suas vestes. — Desse jeito parece que vamos roubar o navio.
Jungwon e ele começaram a rir. Lian também foi junto. Parecia uma simples piada, se não fosse o fato de que realmente era aquilo que eles faziam da vida, roubar os navios mercantes.
— Então a gente compra roupas também — o Ômega deu de ombros. — Resolvido.
— Eu não quero nem pensar na reação do Capitão Jeon assim que ele descobrir — o mais novo sorriu nervoso. — Posso imaginar a cara dele…
— Será impagável — Lian riu, Jay o olhou chocado.
— Vocês dois esperem no cais, eu vou roubar as moedas.
— A gente vai mesmo fazer isso? — Lian olhou de um para o outro. — Vocês tem certeza? Olha a merda em que estão se metendo…
— Eu faria o mesmo pelos meus pais — Jungwon afirmou.
— É a sua mãe, Lian! Estamos com você.
— Faremos isso juntos. — O Ômega reiterou. — Nós três.
“Nós quatro”. — O Kraken lembrou de que iria para onde quer que ele fosse. Jungwon sorriu, mas não disse nada.
Não havia como impedi-los, desse modo, Lian só tinha a agradecer pelo que os mais novos estavam fazendo por ele. Não restava dúvidas de que seu coração se apaixonou pelos melhores.
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Naquele momento, ninguém estava na cabine quando Jungwon entrou para buscar as moedas. Encheu um saco com algumas de ouro e prata, deixou o cômodo sem ser visto e encontrou os Alfas atrás de algumas caixas empilhadas no embarcadouro.
— Você disse "algumas moedas” — Lian expressou, chocado. — Aqui tem uma fortuna!
— Isso porque você ainda não viu o tesouro que meus pais estão juntando em Arbolgreen. — Disse tranquilamente. — Vamos precisar quando chegarmos na China, aí tem o suficiente.
— Você tem razão — o mais velho ponderou. — Estou feliz que seus pais sejam muito bem sucedidos.
— Quem bom que pensa assim — Jungwon sorriu para ele. — Certo, você e o Jay vão comprar roupas e as passagens. Eu vou tentar aprender com o meu pai como Ômegas devem se comportar. Se vamos nos disfarçar, então preciso fazer isso direito.
— Bem pensado, precisam deixar o comportamento típico de piratas para trás.
— Eu também? — Jay indagou.
— Sim. — Lian confirmou. — Eu te ajudo enquanto fazemos nossas compras.
O mais novo assentiu, e ambos seguiram até o mercado da cidade, enquanto o Ômega retornou para o navio e aguardou até que Jimin entrasse sozinho na cabine. Jungwon esperou um pouco mais, para não levantar suspeitas, e logo depois rumou para o cômodo dos capitães.
Seu pai estava sentado diante da mesa, concentrado enquanto escrevia. Não era o diário de bordo que estava aberto diante de si, mas três pequenos livros.
— O que está fazendo? — O mais novo se aproximou, como quem não quer nada.
— Lições para as crianças.
— Hmm…
Jungwon inclinou o corpo fingindo ler o conteúdo do livro, mas aproveitou para estudar como seu pai estava sentado. Com as costas retas e pernas alinhadas, Jimin escrevia sem inclinar o corpo para frente, mantendo a postura impecável.
— Está com saudades das suas tarefinhas? — O Capitão olhou para ele e sorriu, voltando a escrever novamente.
— Não. Mas há uma outra coisa que eu gostaria de aprender com você.
— Conte-me. — Jimin parou de escrever, oferecendo toda a sua atenção ao filho.
— Então… será que você pode me ensinar essa coisa de como um Ômega nobre deve se comportar?
— Por que está interessado nisso?
— Quero ser como você. — Não foi totalmente mentira.
Jimin suspirou profundamente, era bom ouvir aquilo. Todos diziam o quanto seu filho mais velho era parecido com Jungkook, tanto fisicamente quanto no comportamento, mas ouvir do próprio que queria ser como ele, aquilo foi além. Apenas evidenciava o quanto Jungwon enxergava nele um grande exemplo, embora poucos o comparasse com Jimin, ainda que ambos sejam Ômegas.
— Não queira ser como eu — o loiro molhou a pena no tinteiro e sorriu para ele antes de voltar a escrever: — Seja melhor.
Jungwon ficaria muito feliz com aquela resposta. Feliz e inspirado, se não fosse o fato de que ele realmente precisava de uma resposta menos poética e mais prática.
Não podia insistir naquele pedido, visto que Jimin poderia desconfiar, sendo assim, o moreno deixou a cabine para buscar outro modo de aprender sobre a etiqueta dos Ômegas.
Pensou em perguntar ao tio, mas havia um motivo pelo qual Jisung era contramestre do Capitão Jimin. O Ômega pensava três casas à frente de qualquer outro, mesmo que Jungwon conseguisse passar despercebido, ainda deixaria uma ponta de suspeita no mais velho.
Desse modo, Jungwon limitou-se a observar de longe o jeito que o mais velho falava com outros bucaneiros, tentando imitar exatamente o que ele fazia. Ele não percebeu que Jackson estava assistindo a tudo, com as sobrancelhas franzidas, enquanto o Ômega movia os lábios encenando uma conversa, com o tronco reto, gesticulando suavemente com as mãos.
— Você tomou as bebidas do Taehyung?
O corpo do Ômega gelou por inteiro. Ele girou devagar e sorrindo nervoso, completamente envergonhado por ter sido pego naquela situação embaraçosa.
— Não…
— Que diabos você tava fazendo?
— É que eu… hm, quero ser um capitão muito elegante. Como o meu pai e o tio Ji.
— Apenas seja você mesmo. — O Alfa aconselhou. — Não há nada melhor que isso.
— Você tem razão — Jungwon fingiu refletir. — Vou pensar a respeito.
Jackson assentiu satisfeito, e logo voltou a cuidar de seus próprios interesses. O Ômega divagou pelo convés, esperando por Jay e Lian, até que os Alfas retornaram algum tempo depois.
— Temos novidades — Jay informou, assim que os três rumaram para o fundo da embarcação. — Há um galeão vindo do Sul que vai ancorar no porto depois de amanhã, deixará algumas cargas e seguirá viagem levando os passageiros com destino a China.
— Isso é ótimo!
— Temos as passagens — Lian teve cuidado ao mostrar três folhas contendo autorização para embarcar naquele navio. — Também compramos algumas roupas e as deixamos no quarto de uma pousada.
— O Lian me ensinou um pouco como devo me comportar. Você conseguiu aprender com seu pai?
— Uhum… — Jungwon mudou de assunto: — Que horas o galeão vai partir?
— Logo após deixarem as cargas — O mais velho consultou o papel. — No bilhete diz que a previsão de chegada é pela manhã.
— Devemos estar prontos no cais, para embarcar assim que ele ancorar.
— Isso mesmo — Lian concordou com o outro Alfa. — Há mais uma coisa que precisamos acertar aqui, Ômegas não podem viajar sem autorização de um responsável.
— Eu sou maior de idade.
— Mas não é marcado.
— E o que isso tem a ver?
— É o que a lei diz. Se você não é marcado ou não está acompanhado de um Alfa, precisa da autorização dos seus pais para viajar sozinho.
— E se esse Ômega for bem mais velho? — Jay quis saber. — Se ele não for marcado e seus pais estiverem mortos?
— Nesse caso, ele pode viajar sozinho, mas sem um acompanhante Alfa ainda será visto como um Ômega vulgar.
— Essa é a coisa mais estúpida que já ouvi em minha vida.
— Concordo plenamente — o mais velho expressou. — Mas, se vamos embarcar como nobres, precisamos seguir a lei.
— Tá, que seja — Jungkook revirou os olhos, mas assentiu. — Como vamos fazer isso?
— Você será meu noivo — Lian afirmou.
— Por que não eu? — Jay cruzou os braços.
— Você é muito novo. Até mesmo eu sou, para este papel. Os Alfas costumam se casar quando são bem mais velhos, só depois de passar a vida inteira se divertindo é que eles buscam Ômegas jovens para construir uma família.
— Pare, antes que eu vomite — Jungwon revirou os olhos mais uma vez.
— Eu tenho vinte e dois, me aproximo bem mais da média do que você.
— Mas eu tenho quase dezoito…
— Novo demais. — Lian o cortou suavemente. — Sinto muito, Jay. Continua longe da casa dos trinta.
— E eu vou ser o quê, então? — O mais novo cruzou os braços. — O empregado?
— Então…
— Não! De jeito nenhum! Eu vou ter que ficar longe de vocês e eu não quero ficar sozinho.
— Você não vai ficar sozinho, bebê — o apelido repentino fez o Alfa sentir algo suave em seu estômago, que de certo modo o acalmou. Lian explicou: — Você será um empregado bastante íntimo, por isso vai ficar conosco em nosso camarote.
— Ele não pode ser, sei lá, o seu irmão? — Jungwon sugeriu.
— Olha essa pele bronzeada, esse cabelo castanho e esses lindos olhos verdes — Lian descreveu o Alfa mais novo. — Agora olha pra mim e diz o que temos em comum, fisicamente, que pode fazer qualquer um acreditar que somos irmãos.
— É… e eu sou tão loiro quanto a Eunji… — Jungwon suspirou, mexendo nas unhas. Jay riu.
— Eu só não quero dar espaço a mais perguntas e levantar suspeitas.
— Ele tem razão — Jay concluiu. — Melhor não inventar muita coisa.
— Tudo bem.
— Então eu sou um empregado bastante íntimo da família… Jeon ou Zhang?
— Nenhum dos dois — Lian respondeu. — Quando subirmos a bordo do galeão, não existirão Jungwon, Jay e Lian.
— Muito prazer — Jungwon sorriu para eles —, sou Kim Minjee, futuro Ômega do senhor…?
— Chen Yuan.
— Tá, então eu sou… Ha… Ho… — Jay moveu os lábios buscando um nome. — Hyunsik!
— Parece bom — Lian consentiu, esperando o que o Ômega diria.
Mas Jungwon ficou parado, encarando o Alfa mais novo, como se estivesse enxergando algo além dele.
— Por que escolheu esse nome? — Indagou, após o silêncio.
— Foi o primeiro que eu pensei — Jay deu de ombros. — Não está bom?
— Tá ótimo. Eu gostei — Jungwon sorriu abertamente. — É um bom nome!
Logo após concordarem com a narrativa e suas novas identidades, os três voltaram às suas atividades comuns do dia-a-dia, para evitar levantar qualquer suspeita de que estavam aprontando alguma coisa.
Durante o restante daquele dia e o seguinte, eles se comportaram de maneira habitual, sem tocar no assunto da viagem, nem mesmo quando estavam sozinhos, conseguindo evitar a todo custo que algum bucaneiro descobrisse a verdade.
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No dia da viagem, Jungwon escreveu deixando um recado para seus pais, em sua cama, explicando que iria se ausentar por algum tempo, mas que retornaria assim que possível. Ele não revelou o motivo, pois não queria envolvê-los neste assunto.
Hyun ainda dormia tranquilamente quando Jungwon deixou o quarto, onde encontrou os dois Alfas do outro lado da porta, esperando por ele. Seguiram silenciosamente em direção ao convés. O Alfa que guardava a cesta do mastro já estava no vigésimo sono, quando os garotos passaram descendo a rampa do Black Swan até o deck.
Na pousada, os três vestiram suas roupas deixando para trás a vestimenta pirata. Jungwon demorou um pouco mais, e quando saiu do quarto sentiu receio de estar parecendo um bobo. Ele não costumava usar maquiagem, o tanto que aprendeu com seu pai foi apenas observando o mais velho fazer.
Os Alfas estavam conversando no corredor quando o viram surgir timidamente, ao abrir a porta. O silêncio deles deixou o ambiente ainda mais enigmático, visto que apenas trocaram olhares, depois voltaram a encarar o Ômega outra vez.
— Eu exagerei? — Jungwon perguntou receoso.
— Sim — Lian respondeu imediatamente. — Vai matar todo mundo do coração. Meu Deus, Jungwon. Você tá muito lindo!
— Que susto! — Voltou a respirar normalmente.
— Você tá muito, muito bonito mesmo. — Jay afirmou, admirando o Ômega dos pés à cabeça. — Está perfeito.
— Obrigado. Mas ainda me sinto uma múmia embalsamada.
— Realmente, você não parece muito confortável com essa roupa — o mais novo reparou na postura do Ômega, levemente prostrada para frente.
— Está muito apertado no tronco.
— É assim mesmo. Foi feito para destacar mais o corpo dos Ômegas.
— Por que não usam uma roupa mais confortável? — Jungwon se queixou. — Jamais vou entender esses nobres!
— Será por pouco tempo — Lian disse, em relação às roupas. — Pode aguentar até lá?
— É por um bem maior, então posso fazer isso.
O Alfa sorriu, agradecido.
Uma carruagem aguardava-os na rua ao lado da pousada. Ninguém reparou que o Ômega era o filho dos Capitães do Black Swan, nem desconfiou de que aqueles três eram piratas de tal tripulação.
Assim que o galeão ancorou provisoriamente no Porto de Nabuco, os marujos receberam as passagens das mãos de Lian, e assim os três embarcaram no navio como se fossem simples cidadãos utilizando o transporte mercante. Foram guiados até o camarote destinado a eles, onde finalmente encontraram um pouco de privacidade.
— Acham que alguém percebeu? — Jay perguntou. — Vi dois Betas da tripulação pelo cais.
— Eu acho que não — Lian comentou, observando o quarto. — Mas por via das dúvidas, é melhor ficarmos aqui até o galeão zarpar novamente.
Os outros dois concordaram. Jungwon deitou esparramado na cama, com as costas apoiadas confortavelmente no colchão macio. O cômodo era grande, contendo até mesmo uma unidade onde os hóspedes poderiam banhar-se em tinas de madeira, e um espaço para fazer suas necessidades fisiológicas.
Havia um sofá aveludado e aparentemente confortável no canto da parede, uma mesa de madeira com quatro cadeiras ao redor, baús grandes para acomodar muitas roupas, e também duas cômodas. Além das janelas e muitas lamparinas que deixavam o quarto ventilado e bem iluminado.
Alguns minutos após subiram a bordo, sentiram o navio levantar a âncora para continuar seguindo viagem. Os três suspiraram, sentindo emoções distintas. Jay e Jungwon por estarem se afastando do Black Swan pela primeira vez, em muito tempo, e Lian por estar voltando ao reino que traiu.
— Já devemos estar longe da costa o suficiente — de repente, o mais velho levantou do sofá. — Vou falar com o comandante.
— Por que? — Jungwon continuou deitado, com seus olhos fechados, enquanto Jay balançava um livro tentando ajudá-lo a respirar melhor.
— Quero saber de onde estão vindo exatamente, a quem pertence o navio, essas coisas…
O silêncio imperou por breves momentos após Lian deixar o quarto. Jungwon estava tentando se concentrar, decidido a se acostumar com aquela roupa, mas estava tão difícil quanto impossível.
— Você não quer tentar lá na proa? — O mais novo sugeriu. — O vento deve estar forte lá em cima.
— Mas ainda temos que guardar nossas coisas… — finalmente abriu os olhos. — Parece que todos os meus órgãos estão sendo espremidos em uma peneira.
— Nossa…
— Desculpa, eu vou parar de reclamar.
— Tudo bem — Jay abriu a porta, e assim como Lian ensinou no mercado, deixou o Ômega passar primeiro. — Esses trajes parecem realmente desconfortáveis.
— Você não imagina o quanto…
— Deixa que eu guardo, vai pro convés. A gente se encontra lá em cima.
O interior do galeão era um pouco diferente do Black Swan, mas isso não impediu o Ômega de encontrar o caminho para o pavimento superior. Assim que pisou no convés, Jungwon evitou cruzar com outros hóspedes e seguiu direto para a frente da embarcação.
O Alfa estava certo, o vento soprava forte e isso ajudava um pouco. Apoiado no parapeito, Jungwon conseguiu respirar com mais facilidade, mesmo com a restrição da roupa. Observava as ondas batendo contra a parte dianteira da embarcação, conforme resmungava sozinho:
— Raios partam quem criou esse tipo de roupa! A minha vontade é de rasgar ela inteira e correr nu pelo navio!
— Isso seria bastante incomum.
Jungwon quase pulou caindo no mar, mas arrumou sua postura rapidamente e olhou para trás, onde encontrou um Alfa parado a cerca de três metros de distância. As mãos instintivamente percorreram o cinto, mas não encontrou suas adagas ali. Todas as armas estavam guardadas dentro das malas. Ômegas de “boa família ” não andavam armados por aí…
— Você parece que viu um fantasma. Está tudo bem?
Que droga, o que eu faço!? Jungwon perguntou-se mentalmente. Como devia se comportar? Será que os Ômegas pelo menos tem permissão para falar entre aquele meio? E se ele fizesse algo que estragasse o disfarce?
— Sim. — Jungwon olhou para os lados, em busca de Lian. — É que o navio está muito veloz, e isso me deixa um pouco tonto…
— É a quantidade de velas. — O Alfa sorriu presunçoso. — É perigoso que fique sozinho por aqui, pode se desequilibrar e cair no mar. Ninguém o veria.
Se aquele Alfa soubesse que tinha uma criatura gigantesca debaixo do navio, seguindo-os, cairia para trás.
— Uhum…
— Você está viajando sozinho?
— Não. O meu noivo foi em busca do comandante, e também há uma outra pessoa viajando conosco.
— Ele não vai encontrá-lo na cabine, porque eu estou aqui . — O Alfa riu, indicando que ele era o comandante do galeão.
— Meu amor… — Jungwon relaxou um pouco mais quando ouviu a voz de Lian. O Alfa passou pelo comandante ignorando sua presença, seguindo diretamente para o Ômega. — O que faz aqui sozinho?
— Eu te disse que essas roupas estão quase me partindo ao meio.
— Hmm, verdade, você comentou… — ele acariciou o rosto do menor. — Se você quiser podemos tirá-las mais tarde…
O Ômega corou, o Alfa sorriu e o comandante pigarreou logo atrás:
— Humhum…
— Este é o comandante do galeão — Jungwon disse, e só então o Alfa mostrou interesse em sua presença.
— Yamashita Sota — o comandante ofereceu a mão para cumprimentá-lo.
— Chen Yuan. Este é Minjee, meu noivo.
— Muitos podem se perguntar porque um Alfa se casaria tão cedo, mas olhando para o Minjee sabe-se perfeitamente o motivo. É um moço muito bonito.
— Sim, ele é — Lian sorriu para o Ômega.
— Você queria falar comigo?
— Sim mas… ah, aí está você — Jay sabia que devia se reportar primeiro a Lian, por isso, virou-se para ele quando se aproximou. O mais velho solicitou: — Faz companhia ao Minjee enquanto converso com o comandante?
— Claro. — Jay assentiu.
— Eu volto logo — Lian beijou o Ômega carinhosamente na bochecha, e os deixou para seguir o comandante até a cabine.
— Não gosto desse Alfa — Jungwon expressou em relação a Yamashita, quando o mesmo já estava longe. — Ele é um exibido.
— O que ele fez?
— Além de ficar tentando saber da minha vida? Ficou se gabando com a velocidade do navio… — O Ômega subiu em cima de alguns caixotes empilhados perto do mastro da proa, e sentou confortavelmente, desfrutando da forte brisa. — Se ele soubesse que o Black Swan poderia ultrapassar esse troço lerdo em dois tempos…
Jay riu. Os dois estavam conversando distraídos, alheios a quem passava à sua volta. Porém, quem estava ali, atentou-se ao Ômega sentado todo largado no alto das caixas. A maioria preocupada que ele caísse. Poderia se ferir gravemente.
— Eu estava pensando enquanto arrumava nossas coisas… — o Alfa revelou. — Nós somos três e só temos uma cama. Você fica com ela, o Lian e eu vamos ver como ficamos. Há um sofá também…
— Aquela cama é enorme, dá pra nós três dormir tranquilamente.
— Se o Capitão Jeon souber…
— Não conto se você também não contar.
Conforme passava pelo convés, Lian notou a curiosidade de algumas pessoas em um Ômega que se comportava de maneira peculiar. É claro que se tratava de Jungwon, o mesmo estava sentado em cima de caixas empilhadas, conversando com Jay como se estivesse a bordo do Black Swan.
— O que você tá fazendo aí em cima? — O Alfa murmurou para ele.
— Relaxa, eu só estou sentado.
— Nossa, quem é aquele Ômega? — alguns comentavam.
— Ele é um pouco vulgar — outros diziam.
O Alfa mais velho sentia-se responsável pelos dois, faria o possível para que seus disfarces não fossem descobertos e eles não fossem presos.
— Você tá chamando muita atenção — Lian explicou, mostrando a pessoas interessadas ao redor.
Jungwon respirou fundo e revirou os olhos. Aquelas pessoas eram um bando de hipócritas, que faziam coisas muito piores do que apenas estar sentado à vontade em cima de uma caixa. Queria mandar todos para os infernos.
— Precisam de ajuda? — Uma Ômega se aproximou, com o cenho preocupado.
— Não, eu posso descer sozinho.
— Não pode, não. Você vai cair e se machucar.— Lian negou, apoiando as mãos na cintura dele. — Segura nos meus ombros.
Jungwon fez como ele disse, mas segurou com bastante força. O Alfa disfarçou o aperto intenso nos ombros com um sorriso quando ajudou ele a descer. O Ômega sorriu de volta, sabendo o que provocou.
— Você me assustou — a Ômega suspirou. — Pensei que fosse cair a qualquer momento.
Jungwon abriu a boca para responder, mas o Alfa foi mais rápido:
— É… ele é bastante serelepe — Lian fez sinal para que Jay os acompanhasse, e levou o Ômega consigo.
Logo que o espetáculo chegou ao fim, os passageiros dispersaram-se para finalmente cuidarem de suas próprias vidas. O camarote deles ficava no segundo pavimento do navio, Jay abriu a porta e passou primeiro, fechando-a assim que os outros dois entraram no cômodo.
— Não devia ter deixado ele fazer aquilo — Lian falou com o Alfa mais novo.
— Mas ele só tava sentado.
— Você tá adorando isso, não é? — Jungwon acusou.
— Você sabe que não. Entramos aqui com um um objetivo, você esqueceu?
— Mas que crime eu cometi só porque estava sentado? Eu não fiz nada!
Jay e ele não sabiam nada sobre o comportamento de pessoas “comuns” naquela época, Jungwon estava muito acostumado a fazer o que bem entendesse, nasceu usufruindo uma liberdade que poucos Ômegas conheciam.
Refinar um Ômega que cresceu com piratas, da noite para o dia, não seria uma tarefa relativamente fácil, Lian entendia isso. Contudo, se Jungwon quis participar daquele plano, precisava entender a importância de seguir aquela fachada.
— Eu sei, você não fez nada demais — o Alfa sentou na cama ao lado dele. — Mas para eles sim. O Ômega que você está fingindo ser não pode se comportar assim, você entende?
— Sim, mas não pensei que fosse tão degradante.
— Pensa que só vai durar uma semana — Jay tentou ser positivo. — Se o que estamos fazer der errado, a mãe do Lian também vai sofrer as consequências.
— Tudo bem — Jungwon cedeu, relaxando os ombros. — Mas quando tudo isso acabar o primeiro galeão que eu vou saquear será este aqui.
— Você pode contar a gente — Lian ofereceu. O Ômega assentiu em resposta. — Ah, o comandante nos convidou para jantar com ele, como um pedido de desculpas.
— Pelo quê? — Jay franziu o cenho.
— Ele acha que a velocidade do navio assustou o Jungwon.
O Ômega começou a rir excessivamente. Jay e Lian trocaram olhares divertidos, enquanto o menor se recuperava de sua crise de riso.
— Quando sua mãe estiver em segurança eu mostrarei a ele o que é realmente assustador. — Seus olhos prateados encaravam o teto com intensidade.
Se desejar que aquilo acontecesse o mais cedo possível fosse um crime, Jay e Lian já estariam condenados naquele mesmo instante. Nenhum dos três estavam satisfeitos em ter de passar dias convivendo com aquelas pessoas, era cansativo aturá-los por tanto tempo, só restava esperar que os ventos continuassem fortes.
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No momento que Hyun acordou, ficou um breve momento sentado na cama, ainda despertando de seu sono. Viu que Jungwon já havia saído do quarto e imaginou que o primo já estava na enseada lidando com o navio, mas o pergaminho na cama do mais velho chamou sua atenção antes mesmo de descer da própria.
Assim que leu o conteúdo, o Ômega não sabia se deveria ficar na sua ou contar para seu pai. No fim das contas, ele deixou o recado na cama e subiu para o convés, talvez o primo ainda estivesse no Black Swan.
Os piratas já estavam fazendo suas atividades, mas não havia sinal de Jungwon, Lian ou Jay. Hyun observou ao longo da margem, até onde seus olhos poderiam enxergar, quando ouviu a voz de Eunji:
— Ele não tá no Luna, pai. — Hyun correu e fez sinal para que a Alfa não contasse nada que pudesse prejudicar o irmão. — Quer dizer, sim, ele tá sim.
— Ele está ou não? — Jungkook franziu o cenho.
— Sim…
O Capitão olhou para trás e viu Hyun assentindo para ela, mudando de expressão assim que viu o Alfa olhando para si. Não havia mais o que esconder. Dentro de alguns segundos, Jungkook já estava no quarto dos Ômegas com o pergaminho deixado por Jungwon em suas mãos.
A julgar pela expressão que o lúpus fazia conforme ia lendo, as crianças acharam mais prudente sair do caminho. Há muito tempo que não viam o Capitão Jeon com um semblante tão bravo.
Continua…
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