Sobre Bruxas e Pactos
Edward
Crossroad Valley
Edward explicou todas as desventuras do seu dia para o editor chefe e disse que para conseguir ao menos uma reparação, queria cobrir a matéria da Bruxa da floresta de Crossroad Valley e a resposta foi positiva, até porque ninguém queria cobrir aquilo. Os outros fotógrafos e repórteres lançaram-lhe os mesmos olhares de pena ou de riso de sempre e ele saiu, pegando a sua câmera antiga na gaveta de sua mesa, com ela, as fotos não seriam as melhores, mas eram melhores do que nenhuma foto.
Tinha mais uma caminhada longa para fazer, pois a floresta ficava depois da antiga linha férrea, perto da famosa encruzilhada que deu o nome da cidade. Lembrar da encruzilhada e do nome da cidade, fez passar uns pensamentos engraçados pela sua mente. Antigamente, as pessoas daquele lugar acreditavam que, através de pactos feitos naquela encruzilhada, podiam conseguir riquezas e boa sorte. Duas coisas que ele estava precisando demais naquele momento, mas não tinha cabeça para aquelas superstições, então, apenas seguiu até a cabana da temida bruxa.
— Até que enfim, enviaram o repórter certo desta vez — a mulher disse, ao vê-lo se aproximar.
— Bom dia, senhora Ravencrow, eu sou — ele começou a se apresentar mas foi interrompido.
— Edward Castaway — ela disse, puxando-o para dentro da sua cabana — inclusive estamos atrasados. Se quisermos acertar o timing, precisamos começar a preparação.
— Como assim "timing" e "preparação"? — ele perguntou, enquanto ela colocava algumas velas sobre uma mesa que já tinham algumas coisas, como uma gaiola com um corvo e uma garrafa com um líquido transparente que ele não sabia o que era, mas devia ser alcoólico — Parece até que estava esperando por mim, como sabe o meu nome?
— Não temos tempo para conversar, Pequeno Eddie — a bruxa, que parecia estar em uma espécie de transe, disse, após se sentar. Por um instante, ele jurou ter visto o seu pai na sua frente. Apenas o velho o chamava daquela forma e até a entonação de voz e a expressão facial e corporal o lembravam dele. —, a janela é exata, então sente-se ou perderemos o ciclo lunar ideal para o ritual.
Sem entender direito, mas sem questionar, Eddie sentou-se e seguiu as orientações dela, colocando as duas mãos espalmadas sobre a mesa. Devia estar tirando fotos e fazendo perguntas sobre as crenças dela, mas ao invés disso, não conseguia evitar de obedecer aos comandos. Ele a viu fechar os olhos e começar a movimentar o corpo como se estivesse seguindo uma melodia que ele não podia escutar, e tomou um baita susto quando as velas que estavam sob a mesa acenderam-se espontaneamente.
Observou atemorizado o momento em que a bruxa abriu os olhos. As escleras dos olhos dela eram apenas uma imensidão branca e leitosa, sem as íris verdes que tinha visto quando chegou, e o corpo dela se movia como se estivesse preso às cordas de um titereiro. Com movimentos rápidos, ela abriu a gaiola e retirou o corvo que estava dentro dela, para depois arrancar-lhe a cabeça com os dentes e cuspi-la em uma tigela de barro. A cena macabra continuou e a mulher deixou todo o sangue do pássaro cair no mesmo recipiente e, só depois que a última gota havia sido drenada, ela soltou o cadáver sobre a mesa e olhou novamente na direção de Edward.
— Edward Castaway — ela começou a dizer com uma voz assustadora que tinha vários tons diferentes, enquanto o repórter, mesmo assustado, não conseguiu sequer afastar as mãos da mesa. Era como se estivesse paralisado e, mesmo que em sua mente quisesse sair correndo dali para nunca mais voltar, ele não conseguia. —, os portais do inferno precisam se abrir uma última vez e é chegado o momento. Leve o sangue do sacrifício até a encruzilhada e ofereça o seu próprio sangue também. Se você busca por mudanças em sua vida, essa é a sua chance!
Edward sentiu uma descarga elétrica começar na ponta de seus dedos e percorrer todo o seu corpo. Enquanto seu corpo convulsionava e se contorcia com a descarga, ele viu a bruxa se levantar e, após servir um copo de uma dose generosa do líquido que estava nas garrafa, o bebeu em um gole só. Enchendo novamente o mesmo copo, ela contornou a mesa e se aproximou, segurando o copo em uma das mãos e com a outra, segurou os cabelos da nuca dele, puxando-lhe a cabeça para trás. Por fim, ela levou o copo até a boca dele e despejou todo o líquido direto em sua garganta.
Sentindo o líquido etílico queimar-lhe por dentro, ele sentiu suas vistas escurecerem aos poucos, enquanto a bruxa dançava e gargalhava de um modo estridente e sinistro. Mesmo entorpecido, Edward sentia que tinha se dado mal novamente. Era só o que lhe faltava: Ser drogado por uma mulher louca e ser usado em uma espécie de ritual macabro. Era o epílogo ideal para a história de vida do fracassado Edward Castaway.
Ele estava em um estado de torpor, sua mente nadando em um oceano de confusão. À sua volta, as velas lançavam sombras dançantes, e o corvo sem cabeça jazia sobre a mesa como um presságio sombrio. Ele tentava se mexer, mas seu corpo não respondia. A bruxa, agora com um olhar insano, o observava atentamente.
A sala onde estava com a bruxa sumiu completamente e outra imagem surgiu. Como se tivesse sido teleportado, ele se viu sozinho, no centro da famosa encruzilhada. A lua já ia alta no céu, o que o fez perceber que algumas horas haviam se passado desde que chegou na cabana da floresta. Não se lembrava de como tinha chegado ali, mas de alguma forma, sabia que era ele quem tinha feito os desenhos estranhos no chão, que circulavam o ponto central onde ele estava.
A tigela de barro jazia aos seus pés apenas com o cadáver e a com a cabeça do corvo que a bruxa tinha matado, mostrando que os desenhos tinham sido feitos com o sangue dele. Em sua mão direita, ele segurava um punhal antigo e em sua mente sabia exatamente o que fazer. Fazendo um corte profundo em sua mão, Eddie deixou o líquido vermelho e viscoso escorrer e cair sobre o cadáver do pássaro que jazia dentro da tigela e, após alguns segundos, sentiu o chão tremer e viu os desenhos brilharem com uma luz incandescente que, foi se intensificando até envolvê-lo completamente.
De dentro da luz que o envolvia, Edward começou a ter visões. Ele viu um palácio dourado, rodeado por rios que pareciam ser de lava. Ele sentiu a opressão daquele lugar e viu uma jovem que parecia não estar feliz ali. Dava para ele sentir a tristeza no coração dela enquanto ela corria até uma torre negra. Desviando um pouco o olhar para a paisagem do local estranho, o repórter pode ver figuras estranhas presas a correntes, enquanto indivíduos as chicoteavam ou torturavam. Observando com mais atenção pode ver que as figuras eram sombras humanas e que os indivíduos tinham a pele de um vermelho vivo, parecendo estarem em carne viva, além de chifres em suas cabeças.
Uma luz intensa surgiu no topo da torre negra onde ele viu a jovem entrar, e ele sentiu todo o lugar estremecer enquanto a luz explodia e se lançava em um feixe poderoso na direção do céu daquele lugar. Ele sentiu o seu corpo sendo puxado bruscamente para trás e se viu novamente no vazio total e, instantes depois, estava novamente na encruzilhada, iluminado pela luz do luar naquela noite estrelada.
Foi então que, diante dos olhos dele, um portal mágico se abriu. Como se saísse de um transe, ele se lembrou do que tinha acontecido. Após a bruxa colocar aquela bebida na sua boca, o corpo dele pareceu começar a se mexer sozinho. Ele observou tudo como se fosse apenas um espectador: Pegou a tigela com o sangue e os restos mortais do corvo, o punhal, e partiu em direção a encruzilhada. Chegando no local, ele utilizou o sangue para fazer os desenhos e depois se posicionou no centro e colocou a tigela aos seus pés.
Ele tinha feito um ritual de invocação demoníaca, como aqueles que tinha ouvido falar durante a sua vida em Crossroad Valley e, a menos que aquela bebida que a bruxa lhe deu fosse um alucinógeno, o local que ele viu nas visões deveria ser o inferno, sendo que as sombras humanas que viu, deveriam ser almas e os indivíduos com chifres que as torturavam, seriam demônios. A luz que saiu do topo da torre e foi até o céu, deveria ser o portal que ele abriu com o ritual, e que estava agora aberto na sua frente.
Ele sentiu que algo se aproximava, vindo daquele portal e seu coração acelerou. Seria uma daquelas criaturas com chifres e sem pele, ou seria algo pior? Mesmo sabendo que, sendo ele quem fez a invocação, não seria atacado pelo demônio invocado, ainda estava com bastante medo. Nunca imaginou que aquelas histórias sobre pactos demoníacos poderiam ser verdadeiras, mas agora iria ficar frente a frente com um ser demoníaco e teria que fazer um pacto oferecendo a alma. Não que ele se importasse muito com a própria alma. Para ser sincero, a vida dele era tão desgraçada que ser torturado no inferno seria uma espécie de férias para ele, então pelo menos poderia ter um pouco de sorte na vida que lhe restava.
A espera era angustiante e, mesmo tendo passado apenas alguns minutos desde que o portal se abriu, parecia que ele estava há várias horas ali, olhando para aquele espaço de luz branca e vazio. Finalmente uma silhueta apareceu, ganhando foco aos poucos em meio a luz cegante. O suor frio escorria de sua testa com abundância e suas pernas tremiam compulsivamente à medida em que a figura tomava forma.
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