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Capítulo 96

Heliel desceu dos céus, e pousou os pés na montanha. Como um anjo que se sacrificava ao pisar no impuro. Os reis continuavam no alto das nuvens. Eles repousaram o corpo enquanto aguardavam as ordens do Imperador. Inclusive, próximo a eles, ficou a criança.

— Precisamos mesmo nos confrontar? — Questionou em tédio. — Possuo objetivos maiores do que esta carnificina desnecessária, irmã.

— CADÊ O MEU PODER!? — Barão, o cego. Possuído pela raiva da falha, berrava.

Heliel caminhou até o policial ajoelhado, e tocou no topo da cabeça do Barão. Uma luz celestial começou a brilhar na mão dele.

— Que volte a enxergar... — Proclamou.

Barão recuperou os olhos arrancados. Voltou a enxergar pelo toque do novo Deus a frente dele. A dádiva de Heliel causou nele inveja e admiração. Conseguia enxergar na imagem do anjo um líder digno. Só que esperava ser ele esse líder. Heliel o enxergava como merecedor de pena, e Barão sentia isso. Assim que se recuperou, o policial abaixou a cabeça.

— Me mate, criança. — ordenou. — Você ganhou.

— Eu preciso de você, Barão. — A voz doce tocou-o no coração. — Decidi que não irei mais destruir esse mundo. Farei do Brasil um país onde nenhuma criança tenha de passar fome, morar nas ruas, ou trabalhar até morrer.

— E-e se o resto do mundo for contra? — Questionou, ainda que emocionado.

— Então só sobrará um país.

Barão caminhou para as costas de Heliel, e olhou para os Reis-Slaafs. Sabia que deveria sair dali caso aceitasse a proposta. Barão usou da mana para levitar até eles. Deixou os irmãos a sós na montanha.

— Um humano foi capaz de possuir os poderes do Imperador. — Memória começou a conclamar aos semelhantes.

— Ele se assemelha mais a um Deus agora. — Respondeu Calúnia. — Está o usando como hospedeiro, Imperador? — Questionou a criança.

— Não. — O Imperador respondeu. — Estou confiando nele os nossos ideais. Um mundo onde podemos coexistir com os humanos.

— E quem é ela!? — O Vingança questionou, enraivecido nas palavras. — Pelo cheiro do sangue, parece ser parente.

— É a irmã. — Barão deu a resposta. — São os filhos da família Grozny.

— UMA GROZNY!? — Berrou Imprudência. — PENSEI QUE A LINHAGEM HAVIA MORRIDO!

— Mais respeito com a linhagem da matriarca do Imperador! — Dúvida o colocou no devido lugar. — Quimera imunda...

— Há algo de estranho... — A rainha Engano falou baixo. Forçou o silêncio e respeito dos demais — Ela tem uma mana nada agradável.

— Fico aliviado por não ser o único a perceber. — Apatia complementou. — É a mana do Slaaf do Caos. O maldito Vehuiah...

— Nós não o matamos!? — Proclamou as irmãs Ansiedade.

— Ele deve ter esperado a maga perfeita enquanto recuperava seus poderes. — Desespero respondeu. — Irmãos... Será que ela é capaz de impedir o novo Deus?

— Ela é capaz de evoluir. — Ódio respondeu. — Dá para sentir. Em algum momento, talvez seja um desafio ao Imperador Heliel.

Olhei para cima, e ouvi a discussão dos Slaafs até que ficassem em pleno silêncio. As feições de cada criatura. Pareciam juízes ou nobres na vista da arena.

— Eles falam pra caralho. — Falei a Heliel.

— Ainda não tive tempo para conversar com eles. — Heliel se afastou alguns passos, nos dando plena distância antes de iniciarmos. — Você está lutando desde a invasão às oito da manhã. Quer mesmo fazer isso?

— Ativação de complexidade. Destruidora de Deuses.

A mana que era verde e me acobertou na última vez sumiu. Desta vez, uma mana cinza me acobertou. Algo mais denso e poderoso. "Você ainda não é capaz de dominar meu poder, mas com o tempo, será." Foi o último conselho de Vehuiah. A mana que me cobriu surgiu como uma nova pele. Uma armadura que só deixava a vista meus olhos. Ela dançava no ar como fogo. Um terceiro olho nasceu em minha testa. Sua pálpebra era vertical.

Heliel apontou a mão para frente. — Devastação Celestial.

O raio que saiu da palma dele era muito superior ao que usou antes dos olhos. A face da montanha foi pulverizada no mesmo instante. Não apenas a montanha. Tudo que estava atrás de mim, por quilômetros, sumiu. Água, árvores, relevo. Pus minhas mãos na frente do ataque dele. Rasgava a magia de Heliel ao meio com os dedos nus.

Apenas um filete de escuridão me permitia encará-lo em meio ao poder. Ele havia ficado surpreso. Ainda que tentasse disfarçar. Assim que a magia cessou, permaneci na mesma posição. Das mãos, saia fumaça.

Heliel ascendeu aos céus, começou a aproximar-se dos semelhantes. Mas não muito. — Campo Sagrado! — Ele me prendeu dentro duma esfera. Não era pequena. Tinha o tamanho de um campo de futebol. Evitei tentar fugir de lá, pois tinha receio das consequências de tentar destruir aquilo.

— Eu não quero perder meu tempo duelando, irmã. — Aumentou a voz. Em seguida, trezentos clones dele dentro da esfera. — Espero que isso te entretenha.

Os clones de Heliel partiram para cima de mim em conjunto. Causaram um caos que, acredito, ter impossibilitado-o de ver.

O novo Imperador começou a ascender para próximo dos Reis, para seguir rumo ao objetivo ideal. Assim que ele os encarou, os aliados lhe deram um aviso de contestação.

— Não a despreze, Heliel. — Barão o alertou.

Heliel olhou para trás, e vislumbrou uma quantidade massiva de explosões que ocorriam dentro do Campo Sagrado. Com mais detalhe, percebeu que um a um, eu estava destruindo os clones. Meu corpo se adaptava ao combate. A mente respirava e se adaptava com a mesma velocidade que os músculos pediam resposta. Ninguém dentro daquela esfera conseguia me ferir.

— É o terceiro olho dela. — O antigo Imperador o alertou. — É o olho da guerra de Vehuiah. Ele é capaz de se adaptar aos combates longos. Já deve ter aprendido os padrões de ataque dos clones.

Fiquei sozinha dentro da esfera. Eu e Heliel nos encaramos, e o fiz perceber que não havia volta. Não tinha como me ignorar. Estava disposta a destruir aquele mundo inteiro só para vencê-lo.

— Quinta Quebra de Destruição de Pacto. Flecha do Caos! — Um tremor ruiu os céus. O barulho estrondoso era mais alarmante que uma trovoada.

Os Slaafs olharam para cima, e notaram que o ataque não era direcionado apenas a Heliel.

— A garota está declarando guerra a todos nós. — A rainha Engano proferiu.

— Portal de dois pontos! — Heliel invocou um portal acima da cabeça de todos os aliados.

O segundo ponto da magia era no mar distante. Onde as Flechas que deveriam ferí-los caíram. As que caíam no solo criavam explosões de luz comparadas a bombas.

— O Imperador está evoluindo. Você demorou anos para aprimorar a magia da realidade. — Apatia falou com a criança.

— Foi por isso que eu queria ele... — O antigo Imperador sorriu.

Um soco. Heliel imaginou que eu ficaria parada após usar uma magia. Afundei o rosto dele com a minha mão. O anjo voou pelos céus. Destruía os relevos com as costas, enquanto girava no ar. Tão longe que eu não conseguia vê-lo mais.

Uma asa surgiu em minhas costas. Cinza. Sem o meu devido controle. Como se minha mana tivesse se adaptado ao ar.

— Na época, minha mãe dizia que quando um Grozny possui mais de um filho da mesma geração. — O antigo Imperador falou comigo. — Eles dividem seu poder. Para que se protejam. — Me encarou. — Ou se destruam.

Um som perfurou meu ouvido. A espinha gelou. Algo me ameaçava nas costas. Parei de voar. Me joguei para o solo o mais rápido que podia. Heliel estava lá. Puto, com raiva, como uma criança mimada. Ele direcionou o raio celestial para mim. — Patética.

Invoquei a lança Vehuiah enquanto estava em queda. Arremessei. Nossas magias colidiram, e a luz se intensificou.

— Vingança. O que achou dela? — O antigo Imperador chamou seu servo.

— Hahahahahahaha! É como se eu estivesse vendo os antigos magos na guerra.

— E você ri disso imbecil!? — Calúnia o confrontou.

— É engraçado, Calúnia, tem que admitir. — O Imperador interviu. Riu logo após. — Como se ela tivesse sido criada para nos destruir... Dessa vez não acontecerá. — Olhou para Heliel. — Não mesmo. 

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