49 - Os caminhos do homem estão diante dos olhos do Senhor.
Alex tamborilava os dedos na mesa, ouvindo o relato de Tobias sobre os casos Acabe e Bruno.
- Espero que não apareça um Carlos, Daniel, Edson e etc., e tal por que teremos assim o abecedário. – Disse Adriano sorrindo. Alex sorriu só mesmo o irmão para reparar em algo assim.
- Misericórdia! O A e B já estão dando muito trabalho. – Comentou Tobias sorrindo.
- Meu Deus e o outro ainda dá corda! – Exclamou senhor Henrique também sorrindo. – E o que conseguimos com o advogado da Jussara?
- Ele se recusa a deixa-la falar com Jemima. – Disse Tobias. Aliviado o senhor Henrique suspirou encarando Alex.
- Isso é bom, eu também acho melhor a Jemima ficar longe dessa mulher, não a conhecemos não sabemos o tipo de pessoa que ela seja. – Disse tranquilamente.
- Não sei não, mas ela não me pareceu perigosa ou agressiva, quando elas se encontraram na delegacia ela foi extremamente simpática. – Disse Tobias. Alex encostou-se à cadeira fitando os dois homens.
- Vocês estão se esquecendo de uma coisa, independente do que vocês advogados queiram, as duas querem se encontrar e, acreditem-me elas vão se encontrar! – Disse cruzando os braços.
- Não sei como. – Disse Tobias franzindo a testa. – Jemima não sabe em qual hotel a Jussara está hospedada e Jussara não conhece a cidade não sabe onde encontrar Jemima.
- É aí, onde vocês estão equivocados. Essa cidade é desse tamanho. - fez um circulo com as mãos. - Como vocês acham que o Bruno achou tão facilmente a casa da Jem? – Ele sorriu. – Acreditem-me basta uma delas fazer a pergunta certa para a pessoa certa e elas estarão cara a cara, as pessoas aqui não veem maldade em dizer onde as pessoas moram ou trabalham, além disso, ninguém sabe que o ex-marido de Jemima tem outra ex-mulher procurando por ela.
Os advogados encararam-se, rapidamente Tobias levantou-se com o celular na mão.
- Nisso você tem razão, eu vou ligar para o advogado dela. – Disse preocupado afastando-se. Sorrindo Alex pegou o próprio celular que recebia uma notificação de mensagem.
- Mensagem de Jemima. – Disse abrindo-a, ele gargalhou, ansioso o pai pegou o aparelho de sua mão.
A esposa do Bruno está aqui na Unidade de Saúde, eu vou à sorveteria com ela. – Leu senhor Henrique, Adriano gargalhou, surpresos o irmão e o pai o encararam.
- Desculpe-me, mas me recordei quando no final do ano Pedro e Ariane foram à casa um do outro sem avisar a ninguém, o senhor fez exatamente essa cara papai. – Disse, ainda rindo levantando-se. – Eu vou ajudar minha mãe e minhas sobrinhas.
- Essa menina não tem juízo! Desajuizada igual o cunhado dela. – Resmungou senhor Henrique apontando para Adriano que apenas deu de ombros indo ao encontro da mãe e as sobrinhas que estavam providenciando um jardim.
- Mais ele tem razão, aquele dia foi engraçado o senhor precisa ver a sua cara e a da mamãe, e somos capazes de imaginar a cara do pastor Gustavo e da dona Ana. – Disse sorrindo, senhor Henrique sorriu.
- Eles foram corajosos. – Disse sentando. - Eu sei que ela também é corajosa e pode lidar com essa situação, mas disse que queria estar junto nesse encontro, eu me sentiria mais seguro.
- Eu sei pai, eu também ficaria mais tranquilo comigo ou o senhor por perto, mas acho que o assunto que elas têm para conversar é bastante íntimo para outra pessoa estar presente. – Disse Alex tentando ficar calmo, ele também estava preocupado mais confiava que tudo daria certo e que elas precisavam disso para se livrar do fantasma que se tornaram na vida uma da outra.
- Eu ainda não confio nessa mulher. Onde fica essa sorveteria? – Perguntou se pondo de pé.
- Pai, vamos dar uma chance a elas, por favor! – Pediu passando as mãos na cabeça. – O senhor é muito desconfiado; sabe que não precisa confiar nas pessoas, mas precisa confiar que Deus vai cuidar dos seus, não sabe? – Perguntou arqueando a sobrancelha, frustrado o pai voltou a sentar.
- Eu sei. – Disse com meio sorriso.
- O advogado de Jussara não sabe dela. – Tobias retornou nervoso.
- Nós sabemos. – Respondeu senhor Henrique arqueando a sobrancelha.
- Onde ela está? – Perguntou confuso.
- Ela está com a Jem. – Respondeu Alex ligando para a namorada.
- Eu vou avisar o advogado dela. - Resmungou Tobias.
- Não. – Pediu Alex.
- Oi meu amor. – Jemima atendeu.
- Minha vida, tem certeza que está tudo bem você falar com essa mulher? Não quer que eu vá até aí?
- Está tudo bem, não se preocupe, estarei na sorveteria do seu Moacir, só vamos conversar.
- O Tobias está aqui e ele disse que o advogado dela não permitiu que ela falasse contigo.
- Sério? – Alex sentiu a tensão na voz dela.
- Tem certeza que está tudo bem?
- Tenho sim meu amor.
- Meu pai está aflito. – Disse o encarando, ele revirou os olhos.
- Apenas eu! – Exclamou sorrindo estendeu a mão para o filho. - Deixe-me falar com ela. – Sacudindo a cabeça Alex passou-lhe o celular.
- Oi minha filha. – Cumprimentou expressando toda a preocupação.
- Oi. – Respondeu risonha, ele sacudiu a cabeça.
- Você não tem juízo? E se essa mulher lhe fizer alguma coisa?
- O que ela pode me fazer? Não se preocupe eu estou bem, quando eu terminar de falar com ela, irei direto para casa. – Senhor Henrique suspirou desanimado.
- Tudo bem, se você tem certeza disso. Mais veja bem qualquer problema me liga imediatamente.
- Sim senhor.
- Vou passar o celular para o Alex, fica com Deus! – Contrariado ele passou o celular para o filho. – Cabeça dura igual ao irmão. – Resmungou.
- Oi minha vida.
- Meu amor leva seu pai, Adriano e Tobias para o culto, assim vocês não ficam pensando bobagens e eles conhecem nossa igreja, diga às crianças que vou levar sorvete.
- Boa ideia, eu te vejo em casa quando eu voltar da igreja. Tenha cuidado. Deus lhes dê sabedoria nessa conversa.
- Obrigada meu amor, até mais tarde. – Encarando os dois homens que o fuzilavam com o olhar ele desligou. – Vamos todos para a igreja. – Disse simplesmente.
- Você deveria tê-la convencido a nos deixar ir para lá. – Disse o pai emburrado.
- Ele sabe onde é a sorveteria, nós podemos ir até lá. – Replicou Tobias.
- Não podemos não. Você mesmo disse que ela foi simpática, vamos aguardar qualquer problema a Jem nos liga. Vamos à igreja. – Repetiu Alex levantando-se.
- Quem vê cara não vê coração. – Retrucou Tobias o seguindo.
- Exatamente, por isso nesse momento vamos deixar Deus guiar a conversa das duas, aliás, vocês poderiam orar por esse momento das delas.
- Acho mesmo que é a única coisa que podemos fazer. – Resmungou o pai saindo em direção à esposa.
Jemima encarava a mulher sentada à sua frente, estivera ansiava por este momento, mas agora ambas apenas se encaravam sem saber o que dizer uma à outra, parecia-lhe que Jussara estava tão constrangida e sem ação quanto ela, inquieta mexeu-se na cadeira, as duas eram completamente diferentes, não apenas fisicamente a conduta de Jussara era de alguém pronta para o ataque a qualquer momento.
- Você me disse que sou linda, e sou grata por isso, mas você também é linda, já te falaram que você parece com a atriz Lucy Ramos? – A mulher ficou corada.
- Sim. – Respondeu timidamente. - Seu namorado não ficou feliz por você me encontrar. – Afirmou mudando de assunto.
Jemima sorriu com a súbita timidez da outra, talvez ela não estivesse acostumada a ouvir elogios. Elas foram a pé até a sorveteria e Alex ligara enquanto isso, então fora impossível ela não ouvir o que Jemima falava.
- Na verdade o pai dele está mais preocupado que ele. – Respondeu franzindo o cenho. – Ele foi meu advogado no divórcio, eu acho que isso o deixa nervoso, coisas de advogados.
- Não houve conflito de interesses nesse caso? – Perguntou arqueando a sobrancelha, Jemima sorriu. – Mais aquele homem que estava contigo na delegacia parecia muito jovem para ser seu sogro.
- Não houve conflito de interesses, na época eu não namorava o filho dele e, sim, você tem razão aquele rapaz trabalha com o meu sogro. – Jemima a encarou. – O Tobias disse que seu advogado não concordou com esse encontro.
- Não, ele acha que você poderia me humilhar ou maltratar. – Respondeu a encarando também.
- E por que eu faria isso? – Perguntou confusa.
- Você tem que convir que essa situação seja no mínimo inusitada. – Disse com meio sorriso. – Ele pensou que talvez você pudesse me ver como uma inimiga.
- Lá em casa todos temem que você me veja como uma inimiga. – Disse no mesmo tom, elas sorriram, definitivamente era uma situação peculiar.
- Eu sinto muito invadir seu local de trabalho daquele jeito, mas com as discursões dos advogados eu percebi que se ficasse naquele hotel esperando eu não te encontraria, e realmente queria falar contigo, desde que eu soube que o Bruno tinha outra mulher eu desejei te conhecer, queria saber como era você o que tinha feito com que ele se interessasse a ponto de ter outra esposa, afinal ele abominava ter uma, fiquei curiosa sobre o que poderia tê-lo desejado ter duas. – Concluiu sarcástica.
- E conseguiu as respostas?
- Responderei a essa pergunta no final da nossa conversa.
- Se ele abominava tanto ser casado, por que continuava casado?
- Na verdade não sei se para não desapontar minha sogra e minha mãe ou se para não mostrar que elas estavam certas. – Disse abaixando a cabeça. – Elas acreditavam que éramos felizes, mas não concordaram com o nosso casamento de início. – Confusa Jemima franziu o cenho. – Vamos fazer assim, você me conta a sua história com ele e depois eu te conto a minha, pode ser? - Jemima a encarou por algum tempo.
- O que ele te disse sobre mim? – Perguntou encostando-se.
- Disse que te conheceu no congresso para jovens que a mãe dele nos inscreveu. – Respondeu encarando-a. Jemima arqueou a sobrancelha e ela sorriu. – Sim, era para eu ter ido também, mas não pude ir minha adoeceu.
- Sinto muito por você não ter ido, e sim, nos conhecemos lá, ele me deu um número de telefone, que eu só descobri que não era da casa dele no dia que liguei e me disseram que ele não estava mais hospedado lá, e quando deixei a faculdade perdemos o contato, pois o número que ele tinha meu também não era da minha casa.
- Parece-me que vocês dois não queriam que a amizade de fato fluísse. – Comentou pensativa, Jemima franziu o cenho.
- Nunca pensei nisso, mas talvez você tenha razão, eu estava em um momento delicado. – Disse nervosa. - Voltei a encontra-lo quando ele sofreu um acidente na BR 153 e eu estava de plantão no dia, e depois disso começamos a namorar, pareceu tão natural e providencial.
- Eu soube do acidente, queria ir vê-lo, mas ele pediu para eu não ir que ele estava bem e logo estaria em casa, agora sei o motivo. – Disse sem nenhuma emoção. - E o que ele te disse sobre mim?
- Que era um inferno viver contigo. – Respondeu constrangida. – Na verdade eu não quis saber detalhes. - Jussara deu um meio sorriso.
- Eu entendo. E ele não mentiu. Era um inferno para nós dois, demoramos em compreender o motivo pelo qual nossas mães eram contra o nosso casamento, ambas diziam que era impossível um cego guiar outro cego, mas éramos iludidos demais para entender isso. – Comentou triste mexendo o sorvete derretido. – Como era a relação de vocês?
- No início do nosso namoro ele era maravilhoso, até o dia em que me pediu em casamento e eu recusei; ele ficou visivelmente furioso me deixou no meio da rua sozinha e foi embora, no dia seguinte me pediu desculpas e não falou mais sobre isso, pensei na época que ele havia superado, até convidar a mim e minha família para um jantar para conhecer os pais dele. – Jussara arqueou a sobrancelha, arrepiada Jemima cruzou os braços ao se recordar daquele jantar.
- Eu conheci os 'supostos pais' que ele te apresentou. – Disse Jussara. – Foram eles que me contaram sobre você.
- O Bruno me disse que eles descobriram onde ele morava e contaram tudo para ti. Ele me ligou dias atrás me ameaçando por causa disso, afinal ele havia concordado com o divórcio rapidamente com a condição de que eu jamais te procurasse. – Jussara gargalhou.
- Não, ele não se importava de eu saber de você, ele não queria que a mãe descobrisse, esse era o medo dele de que eu dissesse a ela.
- Mais você não disse. – Afirmou encarando-a.
- Não. Ela já sofreu tanto nessa vida, eu não quis dar esse desgosto a ela, ainda não sei como ela está com tudo o que está acontecendo, espero que consiga ficar bem. – Respondeu abaixando a cabeça. - Mais o que aconteceu no jantar que o príncipe encantado virou um sapo? – Perguntou voltando a encara-la.
- Ele sussurrou no meu ouvido. "Apenas entre na onda, nem ouse me envergonhar", - disse tensa imitando a voz dele – Fora a primeira vez que ele me ameaçou e eu senti medo, logo depois me pediu em casamento e como eu não respondi imediatamente ele quase quebrou minha mão.
- Eu sinto muito por isso. – Lamentou sinceramente.
- Na verdade, aquilo foi só uma amostra do que seria minha vida com ele, quando falei sobre ele ter me ameaçado e quase quebrado minha mão, disse que ficara nervoso e não tinha noção do que estava fazendo e a ameaça na realidade não era contra mim, mas contra ele próprio, pois se não nos cassássemos, ele cometeria suicídio.
- Eu duvido muito que ele pudesse fazer qualquer coisa contra a própria vida. – Disse irônica. – Não sei se você já percebeu mais ele é um pouco narcisista.
- Só um pouco? Quando me separei dele me dei conta de que não tinha mais nenhum amigo, minha vida era em volta dele.
- Eu sei bem como é isso.
- Eu deveria ter caído fora naquele momento, deveria ter pagado para ver e dito não, mas eu continuei e ele quase me matou.
- Eu não quero justificar a mim ou a ele, e menos ainda a ele, mas infelizmente por mais que amassemos as nossas mães e odiássemos aos nossos pais e o que eles faziam com elas, nós nos tornamos exatamente como eles. Eu fiquei igual ao meu pai, então ele simplesmente não conseguia ser comigo como o pai dele era com a mãe, então ele encontrou você.
- Vocês se conhecem desde quando? – Perguntou curiosa.
- Desde sempre, nascemos nas casas onde nossos pais haviam nascido. Apenas a minha mãe era estranha no ninho, - disse pensativa, sacudiu a cabeça e olhou nos olhos de Jemima - éramos vizinhos de porta.
- Então vocês sabiam como eram se conheciam não houve surpresa entre vocês. – Disse mais ressentida do que gostaria.
- Não exatamente. – Respondeu inquieta. - Quando éramos crianças não havia pessoa mais dócil que o Bruno, ele me defendia e cuidava de mim o tempo todo. Vivíamos em um bairro até onde me lembro de eu e minha mãe sermos as únicas pessoas negras e ele sempre estava ao meu lado me defendendo, - ela sorriu triste – ele fez uma casa na árvore no fundo do quintal da casa dele para fugirmos das agressões que nossas mães sofriam, e para eu chorar escondido da mamãe pelo preconceito que havia sofrido. Não sei em que momento o garoto doce e gentil se tornou na pessoa fria e insensível que ele é hoje, assim como também não sei em que momento a garota sonhadora e romântica que precisava ser defendida pelo melhor amigo se tornou em uma sádica grosseira, que fez do melhor amigo um misógino.
- Você acha que ele se casou comigo apenas para ter uma mulher para bater? – Perguntou horrorizada.
- Não sei, mas eu não consigo pensar em outra razão. Recentemente comecei com a terapia e a psicóloga me fez pensar em algumas coisas que nunca pensara 'tipo' quando nós éramos crianças eu ficava feliz por ele cuidar de mim, mas ele também afastava qualquer outro amigo, eu cheguei à vida adulta tendo apenas ele como amigo, nas minhas festas de aniversario havia um monte de conhecidos não de amigos, e eu despertei meu lado dominador quando ele tentou me dominar. – Disse corada.
- Então ele tentou agredir você? - Estranhamente essa informação a deixou surpresa, até agora nada do ouvira combinava com a ideia que fizera de Jussara ao ler o dossiê, definitivamente as pessoas não mostram o que realmente são.
- Uma vez ele puxou meu cabelo, nem me recordo porque, e eu simplesmente me virei e o pressionei contra a parede com o braço em seu pescoço e isso me deixou excitada e fizemos amor ali mesmo e depois disso eu não parei. – Respondeu corada.
Jemima não saberia dizer como se sentia com aquelas informações, imaginava que a psicóloga estivesse certa e a proteção dele fosse mais uma maneira de mantê-la ao seu lado, sentiu um arrepio ao imaginar o tipo de família que eles tiveram, estranhamente não acreditava que a personalidade de Bruno tivesse sido forjada pelas atitudes dos pais, algo nele lhe dizia que havia muito mais do que a maneira como o pai tratava a mãe, inconscientemente passou as mãos nos braços, sentia por Jussara tanto quanto sentia por si mesma, ao que tudo indicava o estrago que ele fizera na vida da primeira esposa fora maior do que fizera a ela.
Desejou sinceramente que a outra estivesse disposta a buscar ajuda e deixar o passado para trás, tanto seu próprio casamento quanto o casamento da mãe, pior ainda era o sentimento de culpa ela acreditava que era a responsável por ele ter se tornado naquela pessoa miserável, recordava-se quando se sentia culpada por ser agredida.
- Quando eu o conheci vocês já eram casados? – Perguntou envergonhada.
- Não. Estávamos noivos, faltavam poucos dias para o casamento, aquele congresso foi um divisor de águas, as nossas mães ainda tentou nos convencer a não casarmos, mas ele voltou tão carinhoso e gentil que eu tive certeza de que era o certo a fazermos, além disso, estávamos decididos a fazer com nossas vidas diferentes do que elas fizeram com as delas.
- E antes desse episódio de ele puxar seu cabelo vocês viviam bem?
- Nos primeiros meses nosso casamento foi maravilhoso, então depois daquele dia eu comecei a me tornar sádica e dominadora, no início ele tentou se encaixar, mas a cada dia para ele era mais difícil, até o dia em que ele não se importou mais, alias ele começou a gostar de tudo aquilo. – Concluiu intrigada como se naquele momento conseguisse enxergar a verdade.
- Por que ele descontava em mim toda a dor que você causava nele. – Replicou Jemima rouca.
- Eu lamento mesmo por isso. - Jemima engoliu seco, não queria ficar com raiva dela, mas também não queria ficar com pena.
- Você acredita que a psicóloga possa estar certa?
- Sinceramente? Não sei o que pensar, no início eu não acreditei até mesmo por que eu sei o quanto eu me tornei insuportável sexualmente falando, eu imagino que aquela situação não fosse fácil para ele, não entendo por que eu não tentei fazer alguma coisa para mudar. - Disse desolada.
- Então por que você decidiu pelo divórcio? Pode mudar agora, ou você não estava mais tão feliz com os joguinhos? – Perguntou sarcástica e mais uma vez Jussara constrangeu-se.
- Eu finalmente percebi que os joguinhos já não eram mais prazerosos e sim doentios, finalmente a minha mãe me fez compreender a dor que o meu pai causou nela com aquela conduta. E eu compreendi que eu e meu melhor amigo havíamos nos tornado dois inimigos, não nos amávamos mais, muito pelo contrario. Quando eu aceitei ir à igreja com a minha sogra foi para salvar meu casamento e principalmente trazer meu amigo para o meu lado novamente, mas quando eu soube de você percebi que não havia o que salvar, nem mesmo nossa amizade.
- Não entendo por que! Eu já estava divorciada dele, eu nunca fui um empecilho para o seu casamento.
- Você é a nora que minha sogra sempre pediu a Deus. Se ele tivesse levado aquele congresso a sério, se ele fosse para a igreja com o intuito de crescer espiritualmente teria percebido que você era a resposta para as preces que fazíamos quando criança.
- Você poderia ser a nora que sua sogra pediu a Deus.
- Você não sabe o que é estar sempre abaixo da expectativa, eu sempre soube que não era a nora perfeita, apesar de saber que ela me ama, se ela pudesse escolher entre mim e você, eu jamais seria a escolha dela e na verdade nem a do Bruno. – Disse triste.
- Sabe que isso não tem nada haver, não sabe? Você pode reconstruir a sua vida com o próprio Bruno ou quem quiser. – Disse solidária, entendia essa sensação de inferioridade.
- Quando pedi o divórcio tive esperança de que ainda houvesse alguém para mim, mas agora sei que não existe. – Disse tensa.
- Por quê? Por causa do acidente? Você pretende cuidar dele?
- Não exatamente. Quero dizer, sim eu vou ajudar a mãe dele a cuidar dele, mas não é por isso. – Disse olhando para a porta, um casal entrava de mãos dadas.
Jemima percebeu que Jussara e Bruno eram duas pessoas quebradas que tentaram remendar um ao outro, sorriu intimamente ao se recordar do que ela dissera sobre as mães de ambos dizerem que um cego não poderia guiar outro cego, elas estavam cheias de razão, pena que os filhos precisaram se destruir ainda mais para perceber isso.
- "Obrigada meu Deus pela minha família". – Pensou suspirando. - Há alguma coisa que eu possa fazer por você? – Perguntou sinceramente.
- Quando eu tinha doze anos, meu pai deu tanto choque na minha mãe que ela desmaiou, eu chamei a polícia e a ambulância. Ela estava determinada a acusa-lo pelos abusos sofridos, mas depois de uma visita do advogado dele, ela retirou a queixa; eu a odiei por isso, até que meses depois eu os ouvi discutirem, ele detestava que eu fosse amiga do Bruno, apesar de ele ser amiguíssimo do pai dele, e ele reclamava por causa disso, minha mãe sempre amou o Bruno como a um filho, então ela gritou com ele e disse para nos deixar em paz, afinal eu era o único motivo por ele não estar amargando em uma prisão, foi ali que percebi que de alguma maneira ele havia me ameaçado para que ela retirasse a queixa, e ali sentada no chão da sala eu decidi que jamais teria filhos, que nunca alguém conseguiria qualquer coisa de mim usando outra pessoa, fosse quem fosse.
Jemima sentiu um profundo pesar por essa mulher que aparentemente era tão forte, mas estava quebrada de todas as formas, em vão tentava Jussara tentou segurar as lágrimas, timidamente Jemima pegou na mão que estava sobre a mesa, surpresa ela levantou o olhar marejado pelas lágrimas.
Jemima mais uma vez tentou imaginar a vida daquelas pessoas que Deus colocara na sua vida, naquele momento não desejou jamais ter conhecido o Bruno como já desejara várias vezes, afinal, apenas Deus sabe o motivo pelo qual ela o conhecera naquele momento tão delicado de sua vida, havia um propósito para Deus ter poupado a vida dele e para as duas estarem ali conversando contra todas as probabilidades.
Naquele momento ela conseguia ver a garota tímida e amedrontada que o Bruno protegia independente do motivo pelo qual ele o fazia, por mais estranho que pudesse parecer ela compreendia que os dois houvessem se tornado exatamente naquilo que odiavam.
- "Se Deus não curar os corações o próprio homem o deixa apodrecer, afinal o homem é incapaz de se curar e tirar boas lições de suas dores". – Pensou triste ainda apertando a mão da outra.
- Desculpe-me na verdade eu não choro tão facilmente. – Disse constrangida.
- Sei que nada de bom habita em mim, porque tenho o desejo de fazer o que é bom, mas não consigo fazê-lo, pois o que faço não é o bem que quero fazer, mas o mal que não quero fazer esse eu continuo fazendo. – Disse calmamente soltando-lhe a mão.
- Não entendi. – Disse confusa secando as lágrimas.
- Deus inspirou o Apóstolo Paulo a escrever sobre isso ao povo da igreja de Roma. Vocês dois tinham consciência do mal que faziam, mas ainda assim não conseguiam deixar de fazer, há coisas Jussara que só Deus pode fazer por nós, enquanto eu não permitia que Deus curasse minhas feridas eu não fui capaz de deixar o Bruno, eu sei que parece que eu o deixei por que ele quase me matou ou por que descobri sobre você, mais a verdade, é que eu o deixei por que finalmente eu me dei conta de que não merecia aquela vida e havia sim outra pessoa para eu amar e me amar de volta.
- Não sei se para mim há alguém assim. – Disse abaixando a cabeça. - Como você soube sobre mim? – Mudou de assunto, Jemima sorriu.
- A esposa de um amigo começou a investigar depois de presencia-lo me expulsando do quarto de hotel, - respondeu inclinando a cabeça – diga-me vocês sempre moraram em Gurupi? – Perguntou intrigada, confusa Jussara assentiu. – Nessa ocasião em especial estávamos em Gurupi. – Jussara suspirou fechando os olhos.
- Por acaso vocês estavam hospedados no Hotel Alvares?
- Sim! – Respondeu franzindo a testa.
- Ele me ligou no meio da noite dizendo que havia acabado de chegar e que ganhara uma cortesia do Ramiro.
- Que pilantra! – Disse arregalando os olhos. – Quem é Ramiro.
- Ramiro é um conhecido para quem ele carregava algumas encomendas vez ou outra, ele é dono de uma rede de hotéis até fora do País.
- Entendo. Na verdade ele nunca me falava nada sobre o trabalho, sempre que eu perguntava alguma coisa ele dizia que era chato e que não queria me incomodar. – Comentou constrangida. – "Como eu pude ser tão estupida?" – Pensou irritada.
- Mais o Bruno não trabalhava, ele comprou o caminhão e fazia serviço para amigos por hobby e para ficar longe de mim, obviamente que ele não sabe que eu sei disso, mas foi exatamente isso que aconteceu.
- Agora quem não está entendendo sou eu. – Resmungou Jemima confusa. – Ele me fez fazer um empréstimo para comprar um caminhão, por que o que ele tinha estava velho, o caminhão que ele estava na ocasião do acidente era de um amigo, e ele passou meses pagando o estrago a esse amigo, por que só a mercadoria era assegurada! – Exclamou furiosamente.
- Não sei o que ele fez com o seu dinheiro, mas ele comprou o caminhão com o dinheiro dele eu estava junto quando ele escolheu todos os caminhões que ele já teve inclusive aquele do acidente.
- Mais que... – Ela não tinha adjetivo para descrevê-lo. – Você acredita que ele me fez dividir com ele tudo o que tínhamos e ainda queria o meu carro? – Jussara franziu o cenho.
- Ele não é apegado ao dinheiro, eu acho que ele só queria te atormentar mesmo, a única pessoa que pagava a ele pelos serviços prestados era o Ramiro, e isso por que ele é todo certinho e metódico.
- Você conhece esse Ramiro?
- Sim, mas ele é todo diferente de nós, a mãe dele era moradora do bairro onde moramos, mas quando jovem foi embora para o Rio de Janeiro casou por lá, enfim, a matriz dos hotéis dele é no Rio de Janeiro ele costumava vir aqui vez ou outra, mas depois que casou raramente a gente o vê, eu nem conheço a mulher dele.
- Ele e o Bruno eram muito próximos? – Perguntou se recordando de que quando perguntara a ele como pagariam a diária daquele hotel, ele apenas sorrira e dissera que a melhor amiga do dono lhe devia por um favor que fizera para ela.
- Não, na verdade o tempo que ficamos mais próximos dele foi quando ele foi acusado de matar o pai, o tio do Bruno era amigo do falecido e o defendeu, na época ele o trouxe para ficar uma temporada conosco. Por quê?
- Ele te disse que estava hospedado lá por cortesia do Ramiro, e para mim ele disse que a melhor amiga do dono lhe devia um favor. – Disse intrigada, agora que conhecia verdadeiramente o Bruno sentia calafrio só de pensar no tipo de favor que ele poderia fazer a uma pessoa.
- Estranho isso. – Disse pensativa. – Eu só me recordo de duas amigas do Ramiro que conhecemos em uma viagem ao Rio de Janeiro, elas são irmãs, e eu não soube que eles tenham desenvolvido uma amizade.
- Melhor não cavar muito, caso contrário vamos achar ainda mais podre dele.
- Verdade. O Ramiro é um cara integro, não creio que ele ser envolvesse com pessoas de índole duvidosa, pelo menos não conhecendo a verdade. O único escândalo que conheço envolvendo o nome dele é sobre a morte do pai, este sim não era lá grande coisa. – Ela sorriu. - A família da minha sogra gosta muito do Ramiro, já meu sogro acha ele esnobe e metido a besta, mas isso já era de se esperar.
- Então esse tio do Bruno advogado é irmão da mãe dele.
- Sim. As famílias dos pais do Bruno são muito diferentes.
- Ainda não acredito que o Bruno seja rico.
- Ele é mais rico que eu, afinal minha mãe era pobre quando casou com meu pai, já os pais dele, os dois vieram de família rica. – Jemima sacudiu a cabeça incrédula.
- Jussara por que você me disse sobre o que houve contigo aos doze anos? – Perguntou focando na mulher a sua frente. – Você ficou muito emocionada, quer compartilhar mais alguma coisa comigo?
- Quando eu me casei, paguei a um médico para ligar minhas trompas. - Disse pegando um envelope branco da bolsa e entregando a Jemima. Por alguma razão estranha ela não se surpreendeu ao ver o resultado do exame em suas mãos.
- Você está grávida. – Disse devolvendo-lhe.
- Recebi ontem o resultado, você pode imaginar meu desespero ao receber esse resultado?
- "Mais do que você pode imaginar". – Pensou tensa, mas apenas assentiu. – Imagino sim. – Disse olhando as próprias mãos. - O que você pretende fazer?
- Ainda estou pensando sobre isso, se fosse há outros tempos, eu apenas abortaria, mas agora sinceramente não sei o que fazer.
- Você vai contar ao Bruno?
- Se eu decidir ter a criança sim. – Respondeu de cabeça baixa. – Afinal ele descobrirá de qualquer jeito. O que você faria se tivesse engravidado dele? – Perguntou encarando-a.
Jemima sentiu o coração apertar, como teria sido sua vida se não tivesse perdido aquele bebê? Ela não fazia ideia, e mais uma vez lembrou que apenas Deus sabia de todas as coisas. Suspirou e encarou-a de volta.
- Por mais que fosse difícil eu teria o bebê, Deus não teria te dado esse bebê nesse momento se Ele não soubesse que fosse o melhor para todos vocês, se eu posso te dar um conselho, apenas peça a Deus para curar o seu coração para que as suas mágoas não interfira na educação do seu filho, eu acredito que Deus pode fazer de vocês bons pais, se vocês permitirem que Ele cure verdadeiramente as feridas que carregam, e você se dá conta que este filho é um pequeno milagre?
- Eu pensei nisso. – Disse tímida. – Então fiquei apavorada, afinal por que Deus me daria um filho?
- E quem é que sabe por que Deus faz as coisas? Ele apenas faz por que Ele pode e quer fazer, apenas O deixe cuidar de tudo por você.
- Eu espero mesmo que Deus me cure e me ajude a superar tudo isso, eu não quero que meu filho sofra o que os pais sofreram, por isso eu desejo sinceramente que Deus cure também ao Bruno e que possamos nos perdoar e dar o nosso melhor para o nosso filho.
- Crie-o no Caminho do Senhor, será o seu melhor para ele. Quando eu era mais jovem pensava que não havia pais mais insuportáveis e chatos que os meus, hoje eu sou imensamente grata por eles serem exatamente assim, a Bíblia diz que devemos ensinar o Caminho em que a criança deve andar, e você como mãe pode sim tentar dar uma vida melhor para o seu filho. - Disse Jemima sinceramente.
- Eu fiquei me perguntando como alguém como você acabou casada com um misógino narcisista como o Bruno. – Comentou Jussara.
- Com assim? Uma pessoa como eu?
- Sendo filha de pastor e tendo uma criação cheia de limites e regras. – Respondeu corada, Jemima sorriu.
- Verdade minha vida era mesmo cheia de regras, como eu disse, eu achava mesmo meus pais chatos mais foram minhas escolhas que me levaram até isso; então assim como o filho pródigo eu tive que me recordar dos ensinamentos do meu pai, me recordar que havia outra realidade que eu poderia viver, eu sempre soube disso por que meus pais me ensinaram, só havia me esquecido.
- Acredita mesmo que eu posso dar uma vida melhor ao meu filho?
- Tenho certeza, principalmente se você confiar em Deus para isso, não faça como o Bruno que se fingia de cristão temente a Deus para enganar as pessoas.
- Deus me livre disso. Quero mesmo que haja uma mudança em mim.
- Jussara! – Disse o homem que Jemima vira com ela na delegacia assustando-as.
- Oi. – Disse tímida.
- Eu pedi para você ficar longe dela. – Resmungou sem o menor constrangimento.
- Renato essa é a Jemima, Jemima esse é o Renato meu advogado. – Cortesmente eles apertaram as mãos.
- Já terminou? – Perguntou nervoso encarando-a, Jemima sorriu com o nervosismo do rapaz.
- Imagino que sim. – Respondeu encarando Jemima.
- Você vai ficar quanto tempo aqui? – Perguntou Jemima.
- Amanhã cedo vamos embora. – Respondeu o advogado tenso.
- Renato, eu ainda posso responder por mim mesma. – Respondeu sorrindo.
- Desculpe-me. – Pediu corado.
- Obrigada por falar comigo. – Disse estendendo-lhe a mão, Jemima apertou sua mão.
- Obrigada a você por falar comigo. – Disse sorrindo. – Foi muito bom conversar contigo.
- Boa noite. – Disse afastando-se com o advogado.
- Boa noite. – Respondeu olhando os dois afastar, Jussara virou-se sorrindo para ela.
- Eu tenho as respostas para as minhas perguntas, - disse sorridente, Jemima franziu o cenho, - a resposta que eu disse que te daria no final da conversa, - a compreensão do que ela falava chegou-lhe à mente e sorriu.
- E quais seriam as respostas?
- Respostas boas e prazerosas, você merece tudo de bom que você venha a receber, seja feliz Jemima.
- Você também, seja feliz sem culpas ou remorsos.
O advogado olhou de uma para a outra e relaxou os ombros. Sorrindo ele colocou a mão nas costas dela e a guiou para longe. Jemima ficou ali os observando caminhar lado a lado, ele com as mãos nos bolsos e ela de braços cruzados, um sorriso travesso surgiu em seus lábios, havia grandes chances das preocupações daquele advogado ultrapassar os limites de advogado e cliente. Seu celular tocando na bolsa a trouxe de volta a realidade: era sua mãe.
- Oi mãe. – Atendeu caminhando de volta para a Unidade de Saúde.
- O que você está fazendo a essa hora sozinha na rua? – Jemima surpresa olhou para os lados.
- Oi?
- Fique ai onde está que estamos chegando.
Ela parou desligando o celular, ainda apreensiva olhava para os lados, o pai parou o carro ao seu lado.
- Mãe, pai! – Exclamou entre surpresa e feliz.
- E eu que liguei para perguntar como chegar à chácara do Alex, e olha minha surpresa quando olho para o lado e vejo uma jovem tão parecida com minha filha parada na porta de uma sorveteria! – Exclamou a mãe abraçando-a.
Continua...
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