3. Companhia
I am gonna lose my mind
부질없는 거 알아
물처럼 투명해
연기처럼 흐릿해
🎶Mamamoo, Morning.*
O DIA SEGUINTE amanheceu nublado. Sem cor. Pincelado apenas por tons de cinza que, segundo mamãe, era uma cor que não favorecia a minha beleza. A nossa beleza, para falar a verdade, já que éramos tão parecidas. E enquanto eu esperava do lado de fora da mansão o senhor Kim terminar o café da manhã e vir ao meu encontro, não deixava de pensar o quão irônico isso era. Digo, o clima se adaptando ao humor — ou falta dele — daquele homem. Já conseguia imaginar a melancolia e tédio que este passeio será, um grande fiasco. Justo quando consegui uma forma de poder caminhar pela propriedade por longos minutos sem ter que ouvir as reclamações de Katherine.
Ouvi passos firmes vindo do hall da entrada e apenas observei a movimentação sutil por sobre o ombro esquerdo, vendo-o se aproximar e parar quando chega ao meu lado, seu ombro não encostava no meu por míseros centímetros. A diferença de altura era evidente, tanto que sou obrigada a erguer um pouco a cabeça para continuar vendo o seu rosto.
Um rosto capaz de arrancar suspiros facilmente.
— Presumo que não goste de ter refeições com sua família, senhorita — comentou sem me dirigir o olhar, pondo luvas pretas em suas mãos.
Respirei fundo, desviando o olhar para frente, e disse:
— Está atrasado.
— Não sabia que tomava café da manhã mais cedo. Não fui informado de um horário específico durante nossa última conversa.
Olhei de soslaio para ele, sustentando um sorriso entediado.
— Agora sabe. E deve saber também que não é educado fazer as pessoas esperarem.
Apertei, no punho cerrado, o guarda-chuva que trouxe por precaução e segui caminho na frente, certa de que ele estaria me acompanhando alguns passos atrás. Na mansão escandalosamente grande de Dong Yul, podia ser confuso e intimidador até mesmo para os mais familiarizados com a propriedade vagar por aí. Como uma pessoa adepta das histórias de suspense, não conseguia olhar para a ampla vista de tudo que ele possuía e não me perguntar se havia mais segredos rastejando pelas paredes imponentes do que se podia imaginar. Mesmo já fazendo um tempo desde que Katherine se casou, ainda sentia arrepios só de pensar em entrar em certas alas da casa. Parecia íntimo demais, o tipo de aproximação que jamais sentirei da família quando esta ainda existia sem nós duas intrometidas nela.
Embrenhamo-nos pelo labirinto verde que formava o jardim. Os muros baixos dos arbustos, na maior parte, sendo a única coisa garantindo que não nos perdêssemos no caminho. As flores foram regadas pouco antes de sairmos, a água cintilava e escorria pelas folhas, deixando-as num tom mais brilhante, ainda que o clima estivesse opaco e sem vida. Quando nos mudamos, pouca coisa foi alterada na decoração da casa. Nada foi adicionado para que o meu quarto ficasse mais com cara de "meu", por exemplo. Mas se tem uma coisa em que Katherine não mediu esforços, foi em reformar e trazer vida ao jardim. Haviam várias fontes de mármore derramando água lentamente, plantas variadas, casas de pássaros e bancos decorativos por todos os lados.
Os ventos se tornaram mais fortes gradualmente, meus cabelos balançavam em desordem, em resposta aquela ameaça de chuva que vinha aí. Desejei ter algo para prender meus cabelos e sanar o incômodo, quando senhor Kim irrompeu o silêncio que já seguia por minutos:
— Gosta de golfe, senhorita?
Evitei olhar-lhe como se ele tivesse criado chifres de repente, era uma pergunta super aleatória, mas isso não o impediu de continuar:
— Eu odeio golfe, mas fui convidado a passar o dia jogando no clube da cidade, com os amigos de Dong Yul. Felizmente, pude recusar o convite hoje e, com sorte, não serei chamado novamente. Eles não me parecem tão receptivos quanto seu pai, sem querer soar rude.
— Não precisa se justificar — cortei sua fala, porque já sabia exatamente o que ele queria dizer. Dong Yul era um homem carismático, e essa característica marcante dele fez com que ele chegasse tão longe, mesmo que em seu círculo pessoal haja pessoas um pouco... difíceis de lidar. Principalmente com as diferenças. Às vezes parecia que Dong Yul era uma agulha no palheiro, uma exceção à regra que eles não tinham a intenção de ampliar para mais alguém. Um sul-coreano no grupo exclusivo deles já era o suficiente. — Não quero saber seus motivos para recusar o convite, até porque não pretendo fazer nada com tal informação. E não muda o fato de que não concordei em lhe fazer companhia espontaneamente. Estou apenas retribuindo um favor.
Notei que ele me olhava atentamente, mas mantive meus olhos presos no caminho a nossa frente. Estávamos quase chegando na parte que Katherine resolveu encher de esculturas, fontes de água e casas de pássaros. Tínhamos visitantes diariamente, vários deles, eram quase que animais de estimação.
— Oh! Mas essa não era a minha intenção quando fiz a pergunta — sua voz soou um pouco afetada, me pondo na posição de precipitada.
Fixei meu olhar nele.
— E qual foi sua intenção, senhor Kim?
— Saber se gosta de golfe, senhorita Smith. Apenas isso.
Quase engasguei com a saliva ao conter uma risada. Isso só tornava a pergunta ainda mais aleatória.
— O senhor só pode estar brincando... — balbuciei, incrédula.
Ele esperou pacientemente, como se precisasse da resposta nem que levasse uma eternidade, como se levasse suas perguntas muito a sério.
— Nunca tive a oportunidade de jogar, mas, ainda que tivesse, não me parece um esporte divertido — respondi, enfim, pois a forma como ele me olhava fixamente me incomodava.
— Agora que sei que não gosta, poderia me dizer algo do que gosta.
Parei de andar e o observei. Ele esperou graciosamente com as mãos nos bolsos das calças sociais, retribuindo meu olhar, parado a poucos passos de distância.
— Da forma que fala, parece que o senhor sabe algo sobre mim. Algo que nem sequer tive a intenção de mencionar.
Pensei em Katherine imediatamente. Nesses dois dias, ela passara mais tempo com ele. Eles haviam conversado sobre mim em minha ausência? Minha suposição fez senhor Kim recuar no rumo que vinha traçando, pois, ele disse em seguida:
— Suponho que não tem a intenção de responder a essa pergunta agora. Nesse caso, poderia me dizer por que estava se escondendo da sua família ontem?
Sua voz não carregava humor algum, era mecânica e indiferente e eu me perguntava por quais razões estava fazendo perguntas sem parecer realmente interessado nas respostas. Ele não queria me conhecer, não de verdade; do contrário, parecia me estudar como uma matéria árdua e importante, que necessitava de extrema dedicação. Pelo menos essa era a impressão que eu tinha, o que me deixava ainda mais curiosa.
Apenas me perguntava por quê, pois, ao passo que me fazia querer manter meu plano inicial de evitá-lo, me fazia também querer contar tudo, porque ele não fazia o tipo de pessoa que iria me aconselhar ou realmente se importar com o que eu digo.
— Não posso ficar exposta ao sol por muito tempo. O sol pode queimar e estragar a minha pele — respondi no tom mais jocoso possível e voltei a caminhar, distraída com a paisagem e as mechas esvoaçantes do meu cabelo. Antecipei-me e respondi o que viria aí: — Katherine, minha mãe, se preocupa muito com a aparência que irei mostrar ao mundo um dia. Uma das funcionárias me contou ontem que vocês estavam fora, então aproveitei a oportunidade para ficar no jardim. Ela só não poderia me ver, pois, iria prejudicar a pessoa que me contou tal informação.
— Você se importa com a pessoa que contou a informação?
— Me importo com qualquer pessoa que tem uma vida difícil e luta para manter o trabalho digno que conquistou. Os empregados que trabalham aqui não são descartáveis, senhor Kim — respondi com naturalidade, sem pensar nas entrelinhas daquela pergunta.
— Pensa diferente da sua mãe, então — ele comentou, mais para si. Apenas fingi que não o ouvi, porque não concordava com aquela afirmação. Eu e Katherine éramos muito parecidas, eu só brincava de ser altruísta, enquanto pisava na linha tênue entre ser uma pessoa decente e ser mais como ela.
— Acho que é a minha vez de perguntar algo, não? — Desviei o assunto, a pergunta escapou antes que eu pudesse raciocinar. Devia ter aproveitado o silêncio que se seguiu.
Ele aquiesceu, distraído com a paisagem. Senhor Kim observava os campos com paz e admiração, parecia estar aproveitando, embora eu não fosse a melhor companhia para ele. Apesar do clima nublado, a sua pele brilhava em um tom de dourado que se destacava na paisagem. Perguntei-me como seria fazer esse passeio com ele quando o clima estivesse ensolarado.
Balancei a cabeça e afastei o pensamento rapidamente. Eu estava apenas retribuindo um favor, não haveria uma segunda vez. Sou sua companhia por um dia. Somente isso.
— Estou aguardando — senhor Kim falou, tirando-me dos meus devaneios. Ele agora olhava-me atentamente.
Com vergonha, meu rosto esquentou. Tive que afastar meus pensamentos sobre um segundo passeio ao seu lado e perguntar qualquer coisa que viesse em mente.
— Por que a sua visita é diferente das outras que já tivemos? Por que irá ficar por algumas semanas?
— Foram duas — ele ergueu uma sobrancelha, me olhando por debaixo dos cílios finos.
— Não, foi uma pergunta. A segunda foi apenas uma tentativa de tornar clara a primeira — retruquei.
Ele contraiu os lábios. Por um momento, pensei que iria sorrir, mas o movimento não passou disso, e seus lábios permaneceram contraídos em uma linha fina até a resposta sair.
— Pensei que soubesse. Agora que herdei as riquezas e as posses do meu falecido pai, estou procurando lugares para fazer investimentos, principalmente em casas de jogos, terras e bares conceituados. Estou ajudando o Dong Yul também, cooperando com seus negócios em expansão. Além disso, procuro um novo lugar para morar, já que em todas as casas que temos sinto no ar um sentimento de melancolia e tristeza.
— Poderia ter escolhido um lugar mais interessante para recomeçar, aqui parece tão calmo e sem graça — ignorei a parte dos seus negócios, porque não estava interessada.
— E qual seria o lugar ideal para a senhorita?
Não pensei antes de responder:
— Qualquer lugar distante daqui. Um lugar repleto de... glamour, sonhos e oportunidades.
— Por quê?
Não queria responder aquela pergunta envolvendo a minha paixão pela música. Por anos vinha sonhando com isso, mas o cenário não era tão favorável enquanto eu não saísse do local pacato e abastado em que moro, perdido no meio do mapa com o nome de Olive Springs. Com o tempo e as frustrações, veio se tornando um tópico difícil de se falar sem eu pensar que talvez esteja confiando demais nas promessas e planos de mamãe.
Estávamos tão focadas quando ela anunciou o casamento precipitado com um homem rico, que sequer morava na mesma cidade que nós. Em vez de me deixar seguir meu caminho, deixar com que eu me lançasse no caos da cidade repleta de vida noturna, ela me arrastou para cá e assim os dias se transformaram em semanas, que se transformaram em meses. Todas as restrições eram preparações para um lançamento ao mundo que eu não sabia como ocorreria — não sabia se ocorreria. Mas eu seguia cumprindo todas as suas ordens. Tinha aulas de canto quatro vezes na semana, consulta com a nutricionista a cada três meses, um encontro com a balança diariamente e aulas de etiqueta aos domingos. Chegava a duvidar se eu estava sendo treinada para ser uma cantora ou apenas agir como uma boneca de porcelana nos palcos.
Mas eu não queria ser uma boneca. Eu queria ser selvagem, de uma forma que somente eu conseguiria ser. Selvagem e sedutora. Queria ser revolucionária, como Elvis Presley foi para o rock n' roll ou a Marilyn Monroe foi para indústria cinematográfica. Queria toda a atenção e holofotes voltados para mim. Queria que todas as manchetes nos veículos de comunicação mais importantes fossem sobre mim. Queria tanto que, por conta própria e às escondidas, resolvi dar meus pequenos passos.
O meu silêncio acabou ficando por isso mesmo. Senhor Kim não fez questão de insistir naquela pergunta. Era difícil até mesmo para eu explicar, lembrava-me apenas de ter lido uma vez, em uma revista antiga que pertencia a única amiga que tive quando morava na sarjeta, falando daquela cidade. Desde pequena, a ideia ficou fixa em minha cabeça. Eu precisava ir até lá para atingir o sucesso.
Passamos pelos campos de rosa e fiquei confusa ao ver o senhor Kim pegar em uma rosa repleta de espinhos, sem sequer se importar quando eles começaram a arranhar a superfície das suas luvas de couro. Ele não parecia achar aquilo minimamente estranho, então apenas ignorei o fato, mas comentei:
— Devia levar uma para Katherine. É a sua flor favorita. Mas não esqueça de cortar os espinhos.
— Por que está tentando me ajudar a conquistar sua família? — Indagou, uma das sobrancelhas sutilmente erguidas.
Dei de ombros. Se ele achava que estava conquistando Katherine com isso, estava enganado, mas não seria eu quem acabaria com essa ilusão. Com o tempo aprendi que a única coisa capaz de conquistá-la eram joias e dinheiro. Infelizmente, não podia oferecer ambas as opções por conta própria. Duarte, por outro lado, podia trazer o mundo a seus pés.
— Porque parece que você precisa disso — respondi, e estava sendo sincera. Senhor Kim não aparentava ter tanta intimidade com eles. No fim do dia, ele era apenas o filho do amigo falecido do Duarte.
— E do que você precisa? — Ele emendou rapidamente. Sua informalidade em resposta não soou nem um pouco estranha.
Antes que tivesse a chance de responder, uma gota d'água caiu em minha bochecha. Depois outra e mais outra. Até que uma chuva pesada e inesperada iniciou-se. Olhei para cima e estava prestes a dizer algo para o senhor Kim, quando ele se aproximou a passos rápidos. Ao sanar nossa distância, enquanto eu ainda estava sem reação, ele pegou o guarda-chuva que carregava comigo e o abriu, cobrindo nós dois da chuva.
Desci lentamente o olhar até seu rosto, após notar que a chuva não batia em mim, mas alguns pingos ainda atingiam seu ombro, molhando a roupa gradativamente.
— Devemos voltar — anunciei em um fio de voz.
Como se retomasse a conversa anterior, ele disse:
— Sei que gosta de cantar, a senhora Smith mencionou. Teria algo a ver com o que precisa?
O clima mudou de repente. Apesar da chuva continuar ao nosso redor, me sentia abafada, envolvida demais na forma como ele me olhava e na forma como ele demonstrava, gradualmente, que já sabia coisas importantes sobre mim. Eu também tinha uma lista. Mesmo torcendo para que sua estadia acabasse logo, minha mente ainda guardava as coisas que reparei nele durante esses dois dias. Seu nome, o timbre da sua voz, suas feições... Eram informações superficiais, havia me tornado incerta quanto a possibilidade de conhecer mais ou não. Mas ele já parecia saber demais. Ele sabia do meu grande sonho. E pensar nisso me deixou nervosa. Não porque eu me importava se ele sabia ou não, mas, porque eu me perguntei o que ele achava disso.
Ele me achava uma fracassada? Uma grande piada? Achava que eu deveria desistir?
O meu objetivo de vida era divulgado por aí por minha mãe já faziam meses, como uma expectativa, mas nunca uma certeza. Eu queria ser uma certeza. E ao contrário dos outros amigos do Dong Yul a quem ela já contou — e eu fiquei sabendo —, eu queria mostrar a este, especificamente, que eu seria uma certeza.
Por isso, estava constrangida.
— Não tenho nada a falar sobre isso, e o senhor não tem nada a ver com o que desejo. Deveria continuar falando sobre dinheiro, festas e negócios com eles e deixar minha vida longe de qualquer menção — disse, enfim, mais rude do que desejei.
Seus lábios se entortaram para o lado, mas não parecia exatamente um sorriso ou uma expressão irônica. Dado o silêncio perpetuando entre nós e a nossa proximidade no mínimo constrangedora, julguei que ele queria apenas demonstrar ter me ouvido.
Seus olhos escuros e indecifráveis estudaram meu rosto, paciente. Seus dedos prendiam o cabo do guarda-chuva com firmeza, sendo a única coisa interposta entre nossos corpos espremidos naquele espaço pequeno. O barulho da chuva caindo acima de nossas cabeças era agitado, ao passo que sua respiração era calma e rítmica. Então, quando estava quase desistindo daquele assunto, uma resposta veio:
— Com o tempo descobrirá que não estou aqui apenas para olhar terras e jogar dinheiro e conversa fora na companhia de Duarte, mas não julgo que seja o momento ou meu papel contar as novidades quanto a isso.
Franzi as sobrancelhas, confusa.
— E se eu quiser descobrir agora? E se eu quiser descobrir o quanto antes? — Emendei.
— Então terá que permitir que eu me aproxime — ele deu um passo a frente.
Engoli em seco, a respiração presa na garganta. Ele notou que eu estava exasperada, e mais uma vez aquele "quase sorriso" se fez presente ali. Mas não havia mais nada a ser dito, então ele encontrou minha mão — parada inerte ao lado do corpo — e levou-a até o cabo do guarda-chuva. Quando se certificou de que eu o segurava também, se afastou, deixando que a chuva molhasse seu corpo.
Antes de sumir no caminho de volta a mansão, ele disse:
— A propósito, pode me chamar de Vincent. Vincent Kim. Detesto ser chamado de senhor.
Não esbocei nenhuma reação, além de apertar mais meus dedos ao redor do guarda-chuva. Os nós da minha pele já estavam brancos.
Enquanto aguardava, Vincent sorriu pela primeira vez sob aquela chuva inesperada de verão. Seu sorriso se espalhava pelo rosto e atribuía uma aura jovial impressionante. Parecia inocente pela primeira vez desde que chegou na mansão. Mas, como eu descobriria meses depois, tudo não passava de uma estratégia barata quando ele revirou os olhos e sibilou com um ar zombeteiro:
— Ora, não seja mal-educada, senhorita. Qual é o seu nome?
»🎙️«
*Tradução:
"Eu vou perder a cabeça
Eu sei que você é vago
É tão claro quanto a água
Está nublado como fumaça."
Espero que tenham gostado, meus amores! Não se esqueçam de votar e comentar, por favorzinho »🥺«
Beijos da Blue e até o próximo capítulo! »💙«
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