7 - O fogo Vence!
Alexis não soube definir o que viu nos olhos violetas. A expressão de Angel, pela primeira vez, não deixava transparecer nada. Nenhuma emoção. Nem mesmo a raiva que ele já antecipava por tê-la presenciado tantas vezes.
Ainda assim, com firmeza continuou:
― Creio que só conseguirei superar totalmente, seja lá o que esteja acontecendo, se a mantiver por perto, caso contrário correrei o risco de mesmo daqui a alguns anos ainda sentir... isso. Ou imaginar esse sentimento.
― A maioria das pessoas pensa de forma contrária. O que os olhos não vêem o coração não sente e tudo o mais – Angel falou com voz monótona.
― Percebo que esse não é o melhor método. As pessoas tendem a romantizar essas situações, como humanos nos deixamos levar pela imaginação. – Alexis refletiu sobre o assunto. - Sonhos e desejos frustrados podem ser ainda mais poderosos do que o que o próprio sentimento em si.
Angel deu dois passos para trás e encostou-se na mesa que tinha as suas costas. Ainda o encarando placidamente, questionou:
― Está dizendo que me quer ao seu lado como uma espécie de antídoto para as emoções que sente por mim? Acredita que a convivência o fará, de alguma forma, perceber que sou apenas mais uma garota de passagem pela sua vida?
Ele balançou a cabeça vagarosamente em concordância.
― Isso mesmo. – Alexis a analisou dos pés a cabeça, ainda pensativo. – Não sei o que exatamente em você me chamou a atenção. É bonita, mas isso não é tão significativo assim. Vivo cercado por garotas igualmente lindas. Já chegamos a conclusão que seus modos não são nada atraentes. É violenta e nada sociável. Me ofendeu e humilhou em todas os nossos encontros. – Ele franziu a testa por um momento. – Isso me intriga e me frustra ao mesmo tempo. Talvez eu apenas não esteja acostumado a ser tratado assim.
― Tem ideia do quanto você está soando mais desagradável do que o normal agora? - Angel ergueu uma sobrancelha.
― Além disso, provoca reações que apenas me deixam irritado. Então, por que você? - ele continuou como se nem ouvisse as palavras da garota, tão perdido estava em seus pensamentos.- Isso não me parece natural.
Angel bufou e revirou os olhos.
Alexis observou aquela pequena figura a sua frente. Sim, ele tinha dito apenas verdades, sobre as dúvidas e a frustração que o tomava, mas ele não havia dito tudo. Não admitiu que normalmente não falava tanto com as pessoas, que não ria como fazia ao lado dela, que nem sabia possuir um senso de humor até conhecê-la. Que lutar com ela havia sido uma das coisas mais divertidas que já fizera na vida. Talvez a mais. Que discutir com Angel era algo reconfortante, pois ninguém, além dela, teria essa coragem. E principalmente, no fundo, sentir todas aquelas coisas havia feito com que percebesse estar vivo. E com medo. E ainda mais vivo e humano por isso.
Então não seria a mudança de atitude, querer que ela ficasse ali por uma razão que julgava lógica, apenas uma mera desculpa?
Não, ele tentava ser prático, era disso que buscava se convencer, tinha falado a verdade, queria que ela ficasse ao seu lado como uma forma de fazê-lo entender que aquilo tudo era uma tolice e, assim como acontecia com tantos outros jovens deslumbrados por uma garota "exótica", logo iria passar e ele continuaria com a sua vida. Seu plano inicial de mandar ela para longe o mais rápido possível não havia passado de uma opção covarde, seria apenas provar que ele não era capaz de resistir a mera presença feminina. Absurdo.
― Acho que chegamos a um acordo. Você fica e eu farei com que se sinta à vontade na Alpha. – Alexis lançou um olhar indagador na direção da garota.
― Só pode estar brincando!
Ele viu a raiva finalmente surgir. Quase sorriu diante da imagem, mas se conteve, afinal estava muito perto dela e prezava seus dentes.
Angel ergueu o queixo, indignada.
― Eu não vou ficar aqui. Eu não vou fazer parte dessa loucura que está propondo!
― De que loucura exatamente estamos falando? - Alexis cruzou os braços, juntando uma paciência que a pouco descobrira possuir.
― Me superar? Vai me colocar em uma maldita sala e ficar algumas horas por dia ao meu lado até se tornar imune a minha presença? Vai me prender na porra de um laboratório como um Príncipe-Cientista-Louco? - Angel esbravejava a plenos pulmões, sem se importar que pudessem ouvir do lado de fora. - Ou quem sabe, para fazer jus as histórias bizarras de psicóticos Sheiks árabes, isso tudo vai ser no seu quarto?! É isso, seu cretino!?
Alexis ergueu as duas sobrancelhas escuras.
― Na verdade não havia pensado em nada do gênero. Mas as duas sugestões são bem interessantes. Principalmente a segunda. – Vendo o belo rosto ficar vermelho, de fúria ou de constrangimento, o rapaz, apesar do perigo, sorriu. – Mas prevejo problemas com essas duas excelentes sugestões. Você poderia tentar me matar, o que seria bem ruim. Ou – seus olhos azuis brilharam sedutores – você acabaria tão louca por mim que poderia tentar me convencer a mantê-la ao meu lado para sempre, o que seria igualmente ruim, principalmente para você. - O belo sorriso com covinhas era frio e arrogante. – Pois isso não aconteceria. Jamais.
― Você tem certeza?
O que era aquela expressão no rosto dela? Alexis ficou preocupado e se preparou para algum ataque repentino. Mas Angel deu um pulinho e sentou-se na mesa em que estivera apoiada até então. Ele relaxou, mas não muito, quando ela voltou a falar.
― E já pensou se tudo o que conseguir, com essa proposta absurda, é ficar ainda mais caído por mim?
― Isso não vai acontecer. – É o que eu espero. Alexis não podia verbalizar aqueles pensamentos.
― Tem certeza? – ela repetiu.
― Cla...
Certo. Ela finalmente conseguiu acertá-lo. Diretamente com os lábios rosados sobre os dele.
Quando Alexis deu por si, estava empurrando Angel contra a mesa, correspondendo de forma insana o que ela havia iniciado sem qualquer aviso prévio, ao jogar-se contra ele e o beijado. Ele preferiu ignorar a parte racional do seu cérebro que ainda tentou alertá-lo para o perigo de suas ações. Contudo, contra tudo que havia previsto, seu corpo venceu facilmente a lógica.
Angel era doce, mais doce do que ele havia pressuposto em seus delírios. Alexis admitia que já havia imaginado como seria beijar a garota na primeira vez em que seus olhos pousaram naquela boca rosada. Tinha imaginado milhares e milhares de vezes ao longo daquelas semanas. Até sonhado com isso. Mas a realidade era infinitamente melhor. E pior. Era viciante, embriagador, o cheiro de jasmim entrava por seus poros, suas mãos já não lhe pertenciam e passavam ora pelos cabelos feitos de seda, ora pelo corpo macio, por cima da blusa preta. Percebia, mais por instinto do que por atenção, que ela se arrepiava com o seu toque. Seus músculos ficaram trêmulos e quando acariciou suavemente a lateral do seio feminino, Angel inclinou a cabeça para trás e arqueou o corpo ainda mais contra o dele, como que implorando por uma maior aproximação. E aquilo o deixava, se possível, mais fora de si. Quando sentiu as mãos pequenas tocarem sua pele de forma possessiva, arranhando e apertando, perdeu totalmente o controle.
Sua boca faminta deixou os lábios macios e passou pelo rosto quente, pelo pescoço de pele fina e sedosa, mordiscou e lambeu, enquanto ouvia os gemidos. Seus. Dela. Não sabia de quem e nem se importava, mas era estimulante. Tudo nela o estimulava e o atraía. Perdido em desejo, voltou a beijar os lábios dela, engolindo os gemidos que escapavam deles e abafando os seus próprios num esmagar febril de corpos, de mãos e bocas.
Estava tão embriagado pelas sensações que não percebeu, e nem conseguiu evitar, quando Angel, com sua força surpreendente, o afastou pelos ombros e o acertou com um soco direto no queixo.
A princípio ele não conseguiu definir exatamente de onde veio a dor. Foi de ter sido afastado dela ou resultado do golpe?
Alexis cambaleou para trás enquanto praguejava em uma mistura de francês e árabe. Passou a mão pela face dolorida. Caramba, como alguém tão miúda podia dar um soco daqueles?! Ainda se recuperando do choque, e da dor, encarou a garota. Angel estava sentada na mesa, calmamente o observando com um leve sorriso na face ruborizada. Le petit diabolique!
― Até que não foi difícil deixar a marca que eu precisava – Angel disse, aumentando o sorriso perverso. – Obrigada por ter me alertado. Se eu não o distraísse antes, jamais conseguiria acertá-lo.
E naquele momento ele percebeu o tamanho da encrenca em que havia se metido. Pois, embora fosse o primeiro soco que recebera na vida, não estava furioso. Estava ocupado demais admirando a linda garota que sorria de forma zombeteira com lábios vermelhos e inchados dos beijos trocados entre eles. Os cabelos prateados haviam se soltado totalmente da trança e, revoltos, escondiam de forma sensual partes dos ombros e dos seios, mal cobertos pela blusa puxada para cima e com as alças caídas, revelando a pele alva coberta por marcas rosadas. Marcas deixadas pelas mãos e pela boca dele. Era a imagem mais sexy que ele já tinha visto.
Ele estava ferrado!
Completa, total e indiscutivelmente ferrado!
Passando as mãos pelos cabelos negros, Alexis virou-se de costas para ela.
― Não pense que venceu. O que aconteceu foi que eu caí e bati o queixo – ele falou indo em direção a camisa que havia jogado no chão. Era melhor sair logo dali.
Estava terminando de vestir a roupa quando ouviu um baque e um gemido. Assustado olhou na direção da mesa e o que viu foi Angel caída no chão se contorcendo. Correu até ela e a pegou nos braços, a garota tentou se desvencilhar, mas estava tão fraca que foi fácil controlá-la.
― Mochi... cof...
Alexis viu que ela apontava para a mochila jogada ao lado da mesa, então ele estendeu o braço e a trouxe para perto. Com mãos trêmulas Angel a agarrou e tirou de dentro um frasco colorido. Vendo que ela não conseguia abri-lo, Alexis a ajudou. Leu no rótulo que eram vitaminas. Lembrou, enquanto ela engolia três das pastilhas, que a médica da Alpha tinha dito da outra vez que aquela era uma situação corriqueira, quando acontecia Angel precisava tomar alguns daqueles comprimidos, dormir por algumas horas e se alimentar.
Olhou para a garota em seus braços e notou que ela estava ficando mais calma, a respiração mais tranquila e o corpo começava a relaxar contra o seu peito. Os olhos mal conseguiam permanecer abertos.
― Me... deixe... aqui... – Angel murmurou antes de fechar os olhos e suspirar, logo caindo no sono.
Alexis olhou para os lados, novamente por culpa dela, se sentindo meio perdido. O que poderia fazer? Como deixá-la naquela sala dormindo desprotegida, por tempo indeterminado, após tomar uma medicação?
Nem pensar, não havia a menor possibilidade de deixá-la ali. Ele ia ficar com ela. E preferiu não se questionar sobre algo óbvio: por que não decidiu levá-la logo até a sala médica, como já havia feito anteriormente?
Alexis puxou a mochila de Angel pela alça e, com a garota nos braços, se ergueu do chão. Passou pela porta, que abriu com o pé, e olhou para os dois lados do corredor. Ninguém a vista. Já passava do horário do almoço, então os alunos provavelmente estariam espalhados pelos restaurantes e lanchonetes do Campus. Rapidamente Alexis foi pelo corredor até a porta onde ficava a escadaria. Estava no quarto andar do prédio onde eram dadas as aulas de Humanas e seu plano era levar Angel para sua sala no CAA que ficava no prédio Central.
Pensando sobre qual era o melhor caminho até seu destino, Alexis começou a descer a escadaria. O subsolo não era o andar mais popular entre os alunos, então seria o ideal. E de forma a provar o seu ponto de vista, durante todo o trajeto até o outro lado da passagem silenciosa, que era apenas um longo corredor bem iluminado, o Príncipe não encontrou ninguém. Chegando ao outro prédio, subiu pelas escadas percorrendo oito andares. Assim que passou pela saída das escadas, apressou o passo até chegar ao seu objetivo.
Já na sua sala, depositou Angel cuidadosamente sobre o sofá de couro preto e macio. Foi até a cadeira próxima a janela e pegou o casaco que costumava deixar pendurado no encosto dela. O dobrou de forma que os botões ficassem para baixo e o usou como travesseiro para a garota adormecida. Percebendo que ela ainda estava com as roupas meio desajeitadas, tirou a camisa que vestia e a cobriu com ela. Ficando satisfeito com o resultado, pois agora ela parecia mais confortável, foi até a sua mesa e ligou o notebook.
Sem sequer tocar no teclado, franziu o cenho ao perceber que era a segunda vez que Angel passava mal na sua frente. Ao contrário do que ela imaginava, Alexis não havia pesquisado sobre sua vida fora da Alpha. Mas podia ter uma ideia, afinal, os Lancaster, em especial George, o patriarca da família, era bastante conhecido por ser absolutamente rigoroso e implacável. E o fato de jamais ter houvido falar da neta, significava que o velho inglês a escondia das pessoas. Alexis poderia também supor que a estivesse protegendo, mas sabia que não era o caso. Se houvesse qualquer tipo de preocupação pela neta, ela não pareceria tão empenhada em irritá-lo, o que, na opinião de Alexis, poderia ser apenas uma forma da garota chamar a atenção do avô.
Seriam seus desmaios também fruto de tal objetivo?
Depois de uns quinze minutos tentando desviar os olhos do sofá sem sucesso, desistiu e resolveu ligar pedindo comida. Não sabia o que ela gostaria de comer então pediu por coisas variadas. Enquanto aguardava, suspirou fechando o aparelho e apoiando o queixo nas mãos cruzadas sobre o vidro da mesa. Finalmente se permitiu, sem mais desculpas, admirar a garota adormecida que fazia tantas dúvidas flutuarem em sua mente até então tão organizada quanto a sólida mesa a sua frente.
Seria de fato covardia querer que ela fosse embora?
Ou teria sido a decisão mais sábia?
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